Case Law
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Acórdão nº 878/23.0T8FAR.S1 of Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), March 16, 2023
Quando a prisão preventiva do requerente foi ordenada pelo Juiz de Instrução, o requerente foi acusado da prática de crime que admite essa medida de coação e a procedência do recurso do arguido que impugnou o despacho que lhe indeferiu o pedido de abertura de instrução ocorreu quando os correspondentes autos de processo crime já se encontravam na fase de julgamento, são os prazos de prisão preventiva previstos para tal fase processual que têm de ser, quanto a ele, considerados e que, nessa medida, ao não se mostrarem ultrapassados no caso concreto, determinam que o pedido de habeas corpus seja negado, por falta de fundamento legal.
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Acórdão nº 27871/19.4T8LSB.L1.S1 of Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), March 15, 2023
I- No seguro de coisas (como é o caso do seguro de danos próprios por choque, colisão e capotamento de veículo automóvel), o segurador só responde pela privação do uso da coisa segura se a cobertura de tal risco estiver convencionada no contrato de seguro. II- Assim, não estando tal cobertura convencionada, o atraso do segurador na realização da prestação convencionada – entrega do valor do veículo, por ter ocorrido o evento (com perda total) que desencadeou o acionamento da cobertura do risco – apenas dá lugar, em princípio, ao pagamento de juros de mora. III- Todavia, em caso de atraso injustificado na realização da prestação convencionada – caso a seguradora não tenha atuado de forma diligente, equitativa, transparente e com consideração e respeito pelos interesses do segurado/credor na prestação, caso a seguradora haja violado os deveres acessórios de conduta e não haja tomado todas as providências necessárias (e razoavelmente exigíveis) para que a obrigação a seu cargo satisfaça o interesse do credor na sua prestação – tem a seguradora que indemnizar a não satisfação do interesse do credor, tendo, a tal título e com tal enfoque jurídico, que indemnizar o chamado dano de privação de uso. IV- Terá sempre que ser perante os contornos da concreta situação que tal conclusão (a propósito da violação ou não dos deveres acessórios de conduta) pode/deve ser estabelecida. V- Assim – ficando excluída a cobertura facultativa quando o condutor do veículo conduza sob o efeito de álcool, ou sob a influência de estupefacientes, outras drogas ou produtos tóxicos, ou ainda quando este se recuse a submeter-se aos testes de alcoolemia ou de deteção de estupefacientes, bem como quando, voluntariamente e por sua iniciativa, abandone o local do acidente de viação antes da chegada da autoridade policial, quando esta tenha sido chamada por si ou por outra entidade – não atrasa injustificadamente a realização da prestação convencionada a seguradora que invoca, para declinar a sua responsabilidade, que o condutor abandonou o local do acidente antes da chegada da autoridade policial, o que se demonstrou (a autoridade policial foi chamada ao local do acidente e já não encontrou o condutor) e que preenche o “núcleo fundamental” da cláusula de exclusão, apenas não conferindo vencimento à posição da seguradora por não se ter provado que o condutor sabia, antes de abandonar o local, que a autoridade policial havia sido chamada.
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Acórdão nº 1936/15.0T8VFX-R.L1.S1 of Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), March 15, 2023
I- Não preenche os requisitos/elementos da simulação absoluta o trespasse dum estabelecimento comercial efetuado entre duas sociedades com o fim de desmantelar/esvaziar a trespassante e de defraudar e prejudicar os seus credores: a realização de tal negócio é até, em termos forçosamente efetivos e reais, um instrumento para a consecução do pretendido fim/resultado negocial, ao arrepio de toda e qualquer intencionalidade simulatória. II- Estando provado que a trespassante, entretanto declarada insolvente, alienou o seu estabelecimento comercial “a fim de defraudar as expectativas dos seus credores de poderem ver parte dos seus créditos ressarcidos”, “com intento prejudicial aos interesses dos seus credores” e visando “desmantelar” a trespassante que assim ficou “sem ativos imprescindíveis ao exercício do seu objeto social”, dando-se o caso de as contraentes em tal alienação/trespasse serem sociedades da titularidade, em idêntica percentagem, dos mesmos dois sócios e da trespassária haver sido constituída no próprio dia do negócio e não ter ficado provado o pagamento do respetivo preço, deve entender-se que ocorre ilicitude do fim com que as partes celebram tal negócio jurídico. III- Um tal negócio, atenta a finalidade do mesmo, configura uma conduta próxima das que estão tipificadas como constituindo crimes de insolvência dolosa do art. 227.º do C. Penal, devendo considerar-se que o fim de tal negócio colide com os princípios que integram a Ordem Pública e que se deduzem de tal tipo criminal e dos preceitos legais (como os arts. 601.º, 605.º e 610.º do C. Civil) que defendem o credor contra os atos de esvaziamento e dissipação do património do devedor. IV- Ademais, alienar património, para fugir aos credores, em proveito próprio (indireto, na medida em que, através da trespassária, o estabelecimento continuava na titularidade das mesmas pessoas), deixando a alienante/trespassante “sem ativos imprescindíveis ao exercício do seu objeto social”, é um negócio que é eticamente reprovável, que não está de acordo com a decência económica e do inter-relacionamento entre pessoas e cujo fim, por isso, é contrário aos Bons Costumes. V- Com um tal negócio/trespasse, apenas se visou retirar o estabelecimento da esfera jurídica da devedora e ora insolvente, para defraudar os seus credores, colocando-o “a salvo” (dos credores) na esfera jurídica de outra sociedade (detida exatamente pelas mesmas duas pessoas que eram titulares da vendedora/trespassante), pelo que é incompatível e inadmissível à luz dos princípios fundamentais da ordem jurídica portuguesa manter a validade de um negócio jurídico celebrado em tais termos e com tal fim. VI- Tendo-se provado que a ilicitude do fim é comum aos dois contraentes do negócio, é a globalidade negocial que fica em causa, tendo tal ilicitude do fim negocial como consequência a nulidade do próprio negócio, de acordo e nos termos do art. 281.º do C. Civil.
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Acórdão nº 01514/22.7T8PVZ.P1.S1 of Tribunal dos Conflitos, March 13, 2023
Compete aos tribunais judiciais a apreciação de uma providência cautelar respeitante a uma relação de consumo referente à prestação de um serviço público essencial, excluída do âmbito da jurisdição administrativa e fiscal, nos termos da nova alínea e) do n.º 4 do art.º 4.º do ETAF, na redação introduzida pela Lei n.º 114/2019, de 12 de Setembro, tal como se encontraria excluída a correspondente acção principal.
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Acórdão nº 583/13.5GCMTJ.L2.S1 of Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), March 09, 2023
I- Na fundamentação da medida da pena única apenas se pode atender aos factos dados como provados e ao que deles se pode deduzir em termos objetivos. O que não foi dado como provado não pode ser atendido. Portanto, as transcrições que o recorrente faz, na motivação de recurso, do teor de parte de relatórios sociais que constam dos autos (que são meios de prova que já foram avaliados pelo Tribunal, quando formou a sua convicção quanto à decisão que proferiu sobre a matéria de facto e que não se confundem com os factos provados), são irrelevantes, pois o que aqui interessa é o que foi dado como provado no acórdão impugnado. II- Sendo certo que o arguido/recorrente apresenta sentimentos de remorso e uma postura de arrependimento, a verdade é que tem pouco significado e consistência esse seu posicionamento em relação à globalidade dos factos cometidos (tanto mais que nem os reconhece na totalidade), sendo frágil a sua capacidade crítica, imputando ainda responsabilidades a terceiros e apresentando um discurso de vitimização, numa perspetiva autocentrada, o que mostra bem que tem simultaneamente um discurso de desresponsabilização, pelo que tem ainda de se esforçar por melhorar e ajustar o seu comportamento e personalidade, de acordo com os valores e regras socialmente aceites. De resto, também não manifestou, nem praticou atos de arrependimento ativo, para que pudesse ser atribuído diferente valor à sua atitude em relação ao conjunto dos factos ilícitos (em concurso) que cometeu. III- O facto de o tribunal não dar a mesma relevância que o arguido pretendia quanto às circunstâncias atenuantes que se apuraram, não significa que tivesse feito uma avaliação errada ou incorreta. O que se passou é que o arguido/recorrente parte de pressupostos errados, inclusive de factos não apurados e sobrevaloriza circunstâncias a seu favor indevidamente e de forma subjetiva, portanto, sem razão.
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Acórdão nº 579/12.4JAFUN-C.S1 of Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), March 09, 2023
I- Neste caso, é até anunciado pelo recorrente na petição deste recurso extraordinário da revisão da decisão condenatória, que ainda não dispõe de uma sentença transitada em julgado, antes apenas instaurou uma ação cível, na qual peticiona (além do mais) que seja declarado falso o juízo científico ou técnico do segundo relatório pericial que, na sua perspetiva, consubstanciará a existência de um falso meio de prova, determinante para a sua condenação. II- Sucede que, sem dispor de sentença transitada em julgado a declarar a falsidade do referido relatório pericial (não se discutindo agora, por ser uma inutilidade, se o mesmo fora ou não determinante para a sua condenação, como alega) é manifesto que está desde logo afastado o preenchimento do invocado fundamento previsto no art.449.º, n.º 1, al. a), do CPP. III- Daí que, não se verifique o fundamento invocado previsto no art. 449.º, n.º 1, al. a), do CPP, sendo temerário apresentar recurso de revisão sem deter a sentença transitada em julgado que declarasse a falsidade de meios de prova que tiverem sido determinantes para a decisão a rever (ou seja, como resulta claro do art. 449.º, n.º 1, al. a), do CPP não deveria o recorrente ter apresentado a presente providência sem dispor de sentença transitada que lhe fosse favorável e lhe permitisse tentar alcançar a sua pretensão de rever a sentença condenatória). IV- Acrescente-se que nem faz sentido, sendo um contra senso, além de não haver fundamento legal (visto o disposto no art. 7.º do CPP) para o efeito, atento precisamente o pressuposto que invocou para a revisão (art.449.º, n.º 1, al. a), do CPP), instaurar este recurso extraordinário e, ao mesmo tempo, pedir a suspensão da instância até que seja decidida a ação que instaurou e obtenha uma sentença transitada que lhe seja favorável, isto é, que declare falso aquele segundo relatório pericial aludido na sentença condenatório que pretende rever.
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Acórdão nº 1831/12.4TXLSB-V.C1-A of Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), March 09, 2023
I - O objeto do recurso extraordinário de fixação de jurisprudência, exige, entre outros requisitos, a identidade dos factos contemplados nas duas decisões em conflito, dado que só assim é possível estabelecer uma comparação que permita concluir que relativamente à mesma questão de direito existem soluções opostas. II - No acórdão fundamento a pendência de dois processos-crimes, anteriores à reclusão do condenado, era o único fundamento para ser recusada a liberdade condicional ao recluso aos 2/3 da pena, pelo que decidindo a Relação que essa situação não era imputável ao recluso, nem se presumindo que nesses processos será condenado, concedeu-lhe a liberdade condicional. III - Já o acórdão recorrido, para recusar a liberdade condicional ao ora recorrente aos 2/3 da pena, anota que a referencia ao processo-crime contra o recorrente é feita no contexto de factos ocorridos em reclusão, que este aceita e por cuja prática se mostrou contristado, e que o número dos crimes por este praticados, a sua gravidade, a pena que cumpre e a não interiorização da censurabilidade da sua conduta leva a “não ser, ainda, o tempo, de o arguido ser libertado”. IV - Assentando em situações de facto diversas, as soluções divergentes, tomadas nos arrestos em confronto, não se verifica o requisito de oposição de julgados.
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Acórdão nº 122/13.8TELSB-BQ.L1-B.S1 of Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), March 09, 2023
I - De um modo geral, pode dizer-se que a causa da suspeição há de reportar-se a um de dois fundamentos: uma especial relação do juiz com alguns dos sujeitos processuais, ou algum especial contacto com o processo. II - Sabendo-se que o ora requerente da escusa foi nomeado pelo ex-Primeiro Ministro para cargos públicos, por nele ter confiança política, que dele já dependeu hierarquicamente, privando os dois institucionalmente e em eventos sociais durante vários anos, do ponto de vista objetivo, de um cidadão médio, a participação do ora Juiz desembargador na presidência da Conferência que vai julgar o recurso em que aquele é recorrente, é suscetível de gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade. III - Embora, em termos subjetivos, o requerente ofereça garantias suficientes para excluir qualquer dúvida legítima, na medida em que afirma “… que não duvida da sua capacidade para presidir, com imparcialidade e isenção, à referida Conferência”, em termos objetivos, a conduta do Juiz desembargador não fica livre de suspeição, de perda da equidistância, que deve caracterizar o exercício da função judicial de presidir à Conferência.
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Acórdão nº 2386/20.1T9OER.L1.S1 of Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), March 09, 2023
I - O acórdão proferido pelo tribunal da Relação, em recurso, que confirma a decisão de não pronúncia da 1.ª instância, é irrecorrível nos termos das disposições conjugadas dos arts. 432.º, n.º 1, al. b) e 400.º, n.º 1, al, c), do CPP, por não conhecer, a final, do objeto do processo. II - A opção do legislador do CPP de 1987, rompendo abertamente com a tradição que, há quase um século, geminara os recursos penais e cíveis, foi a de consagrar um regime dos recursos em processo penal com autonomia dogmática e metodológica em relação ao processo civil. III - Não é viável franquear à assistente o acesso ao STJ através do recurso de revista excecional, previsto no art. 672.º do CPP, ex vi do art. 4.º do CPP (integração de lacunas por analogia), porquanto, a não consagração deste recurso não resulta de uma “incompletude contrária a um plano”, no âmbito da admissibilidade de recursos em processo penal; a existir uma lacuna da lei em recurso da matéria penal a sua integração por analogia, através do recurso cível configuraria analogia «in malam partem», que o princípio da legalidade impediria, por desfavorecer os arguidos; e a revista excecional está limitada aos casos em que, sendo admissível, em tese, recurso de revista, se verifica o impedimento decorrente da dupla conforme desenhado pelo n.º 3 do art. 671.º do CPC e, no caso, não é uma dupla conforme que impede o recurso interposto para o STJ.
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Acórdão nº 1368/20.8JABRG.G1.S1 of Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), March 09, 2023
I – A partir do texto da decisão recorrida não se verifica a existência de qualquer um dos vícios previstos no art. 410.º, n.º 2, do CPP. II — O crime de homicídio qualificado constitui um tipo agravado do crime de homicídio simples dada a culpa agravada decorrente de uma especial censurabilidade ou perversidade do comportamento; da imagem global do facto deverá decorrer especial censurabilidade aqui se integrando “as condutas em que o especial juízo de culpa se fundamenta na refração, ao nível da atitude do agente, de formas de realização do facto especialmente desvaliosas” , ou uma especial perversidade integrando as condutas em que “o especial juízo de culpa se fundamenta diretamente na documentação no facto de qualidades da personalidade do agente especialmente desvaliosas” . III — Nos termos do art. 132.º, n.º 2, al. g), do CP, integra o tipo legal de crime o agente que pratica o homicídio tendo em vista preparar, facilitar, executar ou encobrir a prática de outro crime, não havendo necessidade de que este outro crime seja efetivamente praticado, bastando que, no plano do agente, o homicídio surja numa relação meio-fim com aquele outro. IV — Nos termos do art. 132.º, n.º 2, al. i), do CP, a especial censurabilidade da conduta decorre da utilização de meio insidiosos para lesar o bem jurídico vida, isto é, a utilização de um meio que torne especialmente difícil a defesa da vítima, utilizando um meio “enganador, traiçoeiro sub-reptício, dissimulado ou oculto ”elegendo o agente as condições favoráveis para apanhar a vítima desprevenida (...), o aproveitamento consciente pelo agente da ingenuidade e da incapacidade de defesa da vítima no momento do início da execução”. V — Os factos são reveladores da persistência da sua intenção no sentido de levar em frente os seus desígnios, indiciando a agravação decorrente do disposto no art. 132.º, n.º 2, al. j), do CP. VI — Se no dolo direto a realização do tipo objetivo de homicídio “surge como verdadeiro fim da conduta” , também se deve considerar como integrando o dolo direto aqueles outros onde a realização do homicídio constitui um grau intermédio para conseguir a finalidade última — nas palavras de Figueiredo Dias “como casos de dolo direto intencional serão ainda de considerar aqueles em que a realização típica não constitui o fim último, o móbil de atuação do agente, mas surge como pressuposto ou estádio intermédio necessário do seu conseguimento” ; diferentemente dos casos de dolo necessário ou de segundo grau onde “a realização do facto surge não como pressuposto ou degrau intermédio para alcançar a finalidade da conduta, como sua consequência necessária, no preciso sentido de consequência inevitável, se bem que “lateral” relativamente ao fim da conduta”.