Acórdão nº 00385/23.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 2024-02-02

Ano2024
Número Acordão00385/23.0BEPRT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF do Porto)
EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

«AA» veio interpor RECURSO JURISDICIONAL da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 10.07.2023 pela qual foi julgada procedente a excepção de caducidade do direito de acção e, com esse fundamento, foi absolvido a instância o Instituto de Segurança Social I.P., na acção movida pelo ora Recorrente contra o ora Recorrido para declaração de “nulidade e inconstitucionalidade da decisão final proferida pelo Réu quanto à fixação da pensão de velhice do Autor, devendo a mesma ser substituída por outra que reconheça o período contributivo de 1977-01 a 1977-07 e não aplique qualquer factor correctivo à pensão atribuída, tudo com as devidas e legais consequências”.

Invocou para tanto, em síntese, que a decisão recorrida desconsiderou a violação do conteúdo essencial de um direito fundamental, por errónea interpretação das normas constitucionais ínsitas nos artigos 2º (princípio da confiança e da segurança jurídica) e 63º (direito à segurança social) da Constituição da República Portuguesa, ao julgar caducado o direito do Recorrente à acção, quando devia, ao invés, considerar a essencialidade e inseparabilidade do direito ao recebimento duma pensão do direito à justeza e correção do seu quantum, admitindo a causa de nulidade do acto impugnado e, nessa decorrência, que a tempestividade da entrada em juízo da presente acção de impugnação.

O Recorrido contra-alegou defendendo a manutenção da decisão recorrida.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

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Cumpre decidir já que nada a tal obsta.
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I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:

[A] A sentença proferida nos presentes autos julga improcedente a impugnação judicial oportunamente apresentada, decidindo que à data da instauração da ação se encontrava caducado o direito do Autor/Recorrente à mesma, por considerar que as causas de invalidade do ato impugnado não consubstanciam causas de nulidade.

[B] Considera o Tribunal ad quo que os reais fundamentos de invalidade invocados na p.i. se reconduzem ao regime da anulabilidade, já que repousam na invocação seja de erro nos pressupostos de facto (desconsideração do período entre janeiro e julho de 1977) seja de vício de violação de lei (aplicação de um facto de correção).

[C] Conforme bem refere a douta sentença ad quo, (…) o legislador só determina a nulidade relativamente ao conteúdo essencial dum direito fundamental, o que significa que este regime jurídico não é aplicável quando o âmago do direito fundamental não é ofendido.

[D] O direito fundamental sub judice encontra-se consagrado no artigo 63º da CRP.

[E] À questão de saber qual é conteúdo essencial (o âmago) do direito à segurança social e solidariedade, o Tribunal ad quo responde restringindo-o ao mero acesso, à mera concessão, de uma pensão (in casu, de velhice/reforma).

[F] O direito à segurança social é um típico direito social de natureza positiva cuja realização exige o fornecimento de prestações por parte do Estado, impondo-lhe verdadeiras obrigações de fazer e de prestar.

[G] E, apesar da sugestão constitucional de financiamento pelo Estado, o sistema de segurança social assenta efetivamente no financiamento através das contribuições dos seus beneficiários, decorrentes do princípio da contributividade (cfr. artigo 54º da LBSS) às quais se encontram obrigados por força da sua integração obrigatória.

[H] A principal decorrência do princípio da contributividade é a existência duma relação sinalagmática, inafastável mas não meramente aritmética, entre a obrigação de pagamento das contribuições e o direito aos diversos apoios sociais, designadamente a pensão de velhice/reforma.

[I] Assim sucedendo, se o princípio da contributividade constituiu um elemento essencial do direito à segurança social, o seu umbilical e sinalagmaticamente associado direito à proteção/recebimento não pode ser tido como um elemento secundário ou de menor importância.

[J] Esta conformação do direito à segurança social enquanto misto de dever de contribuição e direito de recebimento cria uma expetativa, legítima! de o contribuinte/beneficiário vir a receber um valor aproximado àquele que foi o seu rendimento do trabalho.

[K] O respeito por este direito individual ao recebimento duma pensão - enquanto legítima expectativa – pressupõe a sobreposição do princípio da proteção da confiança do beneficiário sobre o princípio do interesse público (caso algum exista que possa obstar ao direito do beneficiário).

[L] E a legitimidade da expectativa dum cidadão, aferindo-se casuísticamente, assenta simultaneamente na ponderação dos princípios da proteção da confiança e do interesse público na constatação da enunciação de sinais exteriores produzidos pela Administração suficientemente concludentes para um destinatário normal e onde seja razoável ancorar a invocada confiança.

[M] O Recorrente assenta a sua expetativa relativamente ao quantum a receber a título de pensão em sinais inequívocos emanados pela administração pública – o reconhecimento do Recorrido ISS, IP, em Julho de 2020, do período contributivo entretanto substraído ao cálculo da pensão, e a existência duma norma geral e abstrata (o DL nº 119/2018) a cuja aplicação aquele se encontra obrigado por força do princípio da legalidade -, que se somam à consciência do cumprimento escrupuloso duma carreira contributiva de mais de 44 anos de...

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