Acórdão nº 3755/15.4T8LRA.C2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Abril de 2019
Magistrado Responsável | HENRIQUE ARAÚJO |
Data da Resolução | 30 de Abril de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
PROC. N.º 3755/15.4T8LRA.C2.S1 REL. 87[1] * ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. relatório AA e BB instauraram acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra CC, pedindo que esta seja condenada: 1 - A ressarcir os Autores, a título de responsabilidade contratual, pelos serviços prestados e não pagos, na quantia liquidada de 63.650,00 €, sendo 32.350,00 € a favor da Autora BB e 28.875,00 € a favor do Autor AA; 2 - Quando assim se não entenda, a pagarem tal quantia aos Autores com base no instituto do enriquecimento sem causa; 3 - Em qualquer circunstância, nas quantias acrescidas de juros moratórios à taxa legal em vigor, desde a citação, até efectivo e integral pagamento; 4 - E, após sentença condenatória transitada, acrescidas de juros compulsórios, à taxa legalmente estabelecida.
Para tanto, alegaram o seguinte: - Sendo os Autores conhecidos da Ré e do seu falecido marido, estes, em Outubro de 2009 contrataram aqueles para lhes prestarem serviços, cuidados e assistência pessoal, para além do tratamento do gado e da exploração agrícola dos seus prédios; - Os Autores passaram a prestar trabalhos na casa de habitação da Ré, confeccionando refeições, fazendo limpezas, realizando trabalhos agrícolas e transportando ainda a Ré e o seu marido às compras, consultas, tratamentos médicos, etc.; - Para tal apoio chegavam a pernoitar na casa de habitação da Ré e do falecido marido, assistindo-os 24 horas durante todos os dias da semana; - Em contrapartida de tais serviços, a Ré e o seu falecido marido acordaram, dada a falta de liquidez financeira ou de rendimento, em instituí-los seus únicos sucessores e beneficiários do seu património imobiliário; - Após o falecimento do seu marido, em 11 de Abril de 2010, em cumprimento da sua intenção e como compensação, a Ré instituiu a Autora mulher como sua única e universal herdeira através de testamento lavrado perante o Notário, em 15 de Novembro de 2010; - Os Autores continuaram a prestar assistência à Ré, conforme o acordado, durante todos estes anos, até que a Ré, em 10 de abril de 2015, vedou a entrada na casa à Autora, proibindo os Autores de permanecerem na sua habitação e de continuarem a explorar as suas propriedades ou a tratar dos seus animais domésticos; - Com esta atitude, abrupta e injustificada, a Ré demonstra não pretender pagar aos Autores qualquer compensação pelos serviços que lhe foram prestados desde Outubro de 2009 a Abril de 2015; - Tais créditos traduzem-se em 28.875,00 € ao Autor e em 32,350,00 € à Autora (que os Autores calculam multiplicando a quantia de 450,00 € por cada mês de 2009, 475,00 € por cada mês de 2010 a 2014, e 505,00 € por cada mês de 2015); - A Ré encontra-se favorecida em prejuízo dos Autores na justa proporção dos serviços prestados, sem qualquer correspondência financeira ou outra contrapartida, não se justificando qualquer outra circunstância ou relação subjacente que legitime tal vantagem patrimonial.
A Ré apresentou articulado de contestação/reconvenção, alegando, em síntese: - A aproximação da Autora mulher à Ré e seu falecido marido ocorreu nos anos de 2008/2009, em virtude de os Autores atravessarem uma grave crise financeira e porque precisavam da ajuda da Ré e do marido; - Os Autores aproximaram-se da Ré e do seu marido para que estes lhes emprestassem dinheiro para resolverem o problema de penhora de bens, e cerca de um ano e meio antes da morte do seu marido, a Autora mulher pediu-lhes ainda para lhe darem guarida na sua habitação; - Só depois morte do marido da Ré é que a Autora lhe pediu para o seu marido também ir viver na habitação da Ré, já que haviam doado a casa à filha de ambos a fim de evitar que a mesma fosse objeto de penhora; - A partir daí, e embora fosse a Autora quem confeccionava as refeições, foi a Ré que os passou a alimentar, suportando o seu custo, e ambos aí passaram a constituir a sua residência; - O Autor marido apenas após a morte do marido da Ré passou a agricultar os terrenos, mas em proveito próprio; - A Ré apenas outorgou o testamento a favor da autora mulher, por esta lhe haver prometido apoio na velhice, apoio que de imediato esqueceram, chegando uma vez a empurrá-la com tal violência que, em consequência da queda, fissurou a coluna vertebral; - O Autor transportava-a porque era a Ré quem cumpria com o pagamento da prestação mensal do veículo que adquiriu, mas com o dinheiro da Ré; - A Ré chamou a GNR com receio das ameaças do Réu, tendo os Autores marcado com a advogada o dia e a hora para procederem ao levantamento dos animais bovinos que ainda mantinham no seu terreno.
Conclui pela improcedência da acção, pedindo, em reconvenção, a condenação dos Autores a lhe restituírem as quantias recebidas a titulo de empréstimo, no total de 28.862,29 €, ou caso assim não se entenda, com base no enriquecimento sem causa, sempre acrescida dos juros legais contados da notificação até efectivo e integral pagamento, tudo com as legais consequências.
Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença em que se decidiu: “1. Julgar a ação parcialmente procedente, por provada, e, consequentemente, a) condenar a Ré a pagar aos Autores a quantia de € 57.975,00, acrescida de juros civis legais de mora, devidos desde a data da citação da ré, calculados à taxa legal de 4% (cfr. Portaria n.º 291/03, de 08-04) e até efetivo e integral pagamento, e de juros compulsórios calculados, à taxa de 5% ao ano, desde a data em que a presente sentença transitar em julgado; b) Absolver a Ré do demais peticionado; 2. Julgar a reconvenção totalmente improcedente, por não provada”.
Inconformada com tal decisão, a Ré dela interpôs recurso de apelação.
E fê-lo com sucesso, pois a Relação de Coimbra, julgando a apelação parcialmente procedente, revogou a decisão da 1ª instância e absolveu a Ré dos pedidos dos Autores, mantendo, contudo, a improcedência da reconvenção.
São agora os Autores que recorrem, de revista, formulando as seguintes conclusões: 1. Ao Julgador é permitido a inclusão de factos complementares aos essenciais e/ou concretizadores da matéria alegada pelas partes, apurados pela prova produzida. Na verdade, 2. Tais, factos resultantes do acervo probatório produzido, em conjugação com as regras de experiencia comum, permitiram ao Juiz de Primeira Instância dar como provado que; Previamente ao referido no ponto 10 dos factos provados, a Ré e o seu falecido marido, como contrapartida económica da prestação dos serviços contratados aos AA, haviam acordado o pagamento, a cada um destes, do montante mensal equivalente a um ordenado mínimo mensal;” Não é infundado nem ilegal ou exorbita os poderes, deveres do Julgador com vista à realidade material e à boa decisão da causa.
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Conforme, consta da fundamentação da decisão da matéria de facto proferida numa análise crítico-reflexiva à luz da experiencia comum, da livre apreciação e convicção da prova, e do bom senso.
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O Tribunal da Relação de Coimbra considerou, erroneamente, não ser possível ao Julgador aditar à matéria de facto dada como provada tal facto.
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Considerando que o mesmo não é complementar da factualidade alegada pelos Recorrentes, mas sem fundamento legal, face ao novo paradigma do processo civil que privilegia e homenageia a verdade material ao formalismo processual.
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Excluindo-o da factualidade dada como provada, cometendo nulidade que expressamente se invoca.
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Violando por essa circunstância o disposto no artigo 5º n. º 2 alínea b) do Código de Processo Civil e, designadamente, a Jurisprudência deste mais alto Tribunal.
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Tal alteração pela Segunda Instância à resposta da matéria de facto da Primeira Instância pode dentro dos poderes desta Instância recursiva ser sindicada por violação da mens legis e da lei expressa.
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E, por essa via atendendo à fundamentação e...
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