Acórdão nº 715/17.4T8STR.E1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA JOÃO VAZ TOMÉ
Data da Resolução27 de Junho de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, * I - Relatório 1. AA, Lda., intentou ação declarativa contra Freguesia de BB e, com fundamento na aquisição originária (usucapião) e derivada (contrato de compra e venda) do prédio urbano sito na Rua ..., freguesia de BB, Concelho do ..., descrito no registo predial a seu favor, e na ocupação de parte dele pela Ré, pediu que fosse (a) declarada a propriedade do prédio a seu favor, (b) a Ré condenada a restitui-lo à A e (c) a abster-se da prática de qualquer ato que impeça ou diminua a utilização pela A daquela parte do prédio ou, (d) subsidiariamente e na impossibilidade da restituição, a pagar uma indemnização de 744.000 euros – I Vol., fls. 2 a 7.

  1. De um lado, a Ré contestou, excecionando a nulidade do contrato de compra e venda decorrente da ausência de menção ao alvará ou a documento equivalente; a ilegitimidade da Autora por não ser proprietária do prédio, porquanto a fração do imóvel em discussão é composta por três lotes cedidos para domínio público; a autorização da Câmara Municipal do ... e dos proprietários para a ocupação dos referidos lotes – em virtude dessa autorização a Ré requereu a intervenção principal da primeira e de CC.

  2. De outro lado, a Ré contestou, impugnando a matéria alegada pela Autora e deduzindo reconvenção, em que invocou factos relativos à aquisição originária da parcela do imóvel ora objeto de litígio. Concluiu pela (i) improcedência da ação, (ii) declaração de nulidade do negócio, (iii) condenação da Autora como litigante de má fé e (iv) declaração de propriedade da faixa de terreno em causa a seu favor – I vol., fls. 22 a 38.

  3. A Autora replicou – I Vol., fls. 63 a 107.

  4. Deferida a intervenção principal, o Município do ... e, habilitados, os herdeiros de CC, contestaram – I Vol., fls. 228 a 245 e II Vol. fls. 563 a 572 .

  5. Foi, oportunamente, proferida sentença que julgou parcialmente procedente a ação, declarando o prédio como propriedade da Autora, com exceção da parcela de terreno em discussão e, na impossibilidade da sua restituição, condenando a Junta de Freguesia a pagar à Autora o valor de 519.992 euros, e improcedente a reconvenção – VI Vol., fls. 1722 a 1752.

  6. A Ré interpôs recurso de apelação – VI Vol., fls. 1776 a 1924 – e a Autora, por seu turno, recurso subordinado – VII Vol., fls. 1934 a 2079.

  7. Por acórdão do Tribunal da Relação do Porto foi decidido: “julgar procedente o recurso da Ré, e em consequência, julgam totalmente improcedente a presente acção, absolvendo a ré dos pedidos, e procedente a reconvenção, declarando que o terreno referido em L), onde foi construída a ampliação do Cemitério Paroquial de BB é propriedade da ré” – VII Vol. fls. 2149 a 2248.

  8. A Autora interpôs recurso de revista – VIII Vol., fls. 2251 a 2287, apresentando as seguintes Conclusões: “A - Nos presentes autos sempre foi claro que uma coisa é o prédio propriedade da A-Recorrente (“com a área de 2578 m2,”, como foi julgado provado sob A)) e outra coisa é a parte dele ocupada pela ampliação do cemitério de BB (com a “área compreendida entre 1471 m2 e 1483,5m2, na parte norte” daquele, como foi julgado provado sob L)), o que no Acórdão recorrido não é claro.

    B - A Recorrente peticionou que fosse reconhecido o seu direito de propriedade sobre a totalidade do prédio identificado em A) dos factos provados, o que foi procedente em 1ª Instância e mais peticionou a restituição da parte desse terreno identificada em L) da factualidade julgada provada ocupado com a ampliação do cemitério de BB e subsidiariamente relativo a este último pedido, ser indemnizada.

    C – A Ré-Recorrida, por seu turno, deduziu pedido reconvencional peticionando que fosse reconhecido o seu (alegado) direito de propriedade sobre a parte identificada sob L) do prédio identificado em A) dos factos provados.

    D - A douta Sentença de 1ª Instância julgou a ação parcialmente procedente, julgando A.-Recorrente proprietária do prédio identificado sob A) dos factos provados, com exceção da parte dele identificada sob L) dos mesmos factos – por “impossibilidade de restituição” - e por isso procedente (parcialmente) o pedido subsidiário de indemnização (respeitante a esta parte daquele prédio).

    E - A Ré-Recorrente não se conformou com a procedência do pedido subsidiário de indemnização relativo à parte identificada sob L) do prédio identificado em A) dos factos provados e, bem assim, com a improcedência do pedido reconvencional de declaração do seu (alegado) direito de propriedade sobre este último trato de terreno tendo interposto recurso de Apelação.

    F - O Acórdão recorrido embora declare, como a Ré-Reconvinte peticionou, a reconvenção procedente, julgando “que o terreno referido em L) onde foi construída a ampliação do Cemitério Paroquial de BB é propriedade da Ré.” vai para além do peticionado e contraria a factualidade julgada provada (sob A) e L) em conjunto consideradas) julgando “totalmente improcedente a presente ação, absolvendo a Ré dos pedidos”, incluindo, pois, integralmente o peticionado sob A) (“Declarar-se que o prédio em causa, é propriedade da A.;”); assim nessa decisão, inclui a parte do prédio identificado em A) que está para além do trato de terreno ocupado com a ampliação do cemitério de BB identificada sob L) dos factos provados.

    G - O Acórdão recorrido padece de “lapso manifesto” (cfr. art.º 614º, nº 1, do C. P. Civil) na parte em que julga a ação “totalmente improcedente”, não julgando, pois, a A.-Recorrente proprietária do prédio referido em A) dos factos provados (com 2578m2) na parte em que excede o trato ocupado com a ampliação do cemitério de BB, identificado na alínea L) dos factos provados (com uma “área compreendida entre 1471 m2 e 1483,5m2”), pelo que deve o mesmo lapso ser retificado nos termos do referido preceito o que se requer.

    H - A não se entender assim o Acórdão recorrido é nulo nos termos do disposto no art.º 615º, nº 1, al. c) do Cód. Proc. Civil, no qual, sob a epígrafe de “causas de nulidade da sentença” se estabelece ser “nula a sentença quando: (…) c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível (...)” e, consequentemente, no deferimento da invocada nulidade, deve manter-se inalterada a primeira parte da douta Sentença proferida em 1ª instância (“Pelo exposto, considero parcialmente procedente o pedido formulado pela autora e declarando que o terreno referido em A) é sua propriedade, exceção feita à parcela referida em L)” – sic.), sem prejuízo e sem prescindir do demais peticionado na presente Revista.

    I - Acresce, ainda, que, a não se entender assim, deverá entender-se que o Acórdão recorrido é nulo por excesso de pronúncia, nos termos do disposto na al. d) do n° 1 do artigo 615° do Cód. Proc. Civil, nos termos do qual a sentença (ou o Acórdão atento o disposto no art.º 666º) é nula quando o juiz “conheça de questões de que não podia tomar conhecimento” (cfr. douo Ac. STJ de 30.5.2017, processo 4891/11) pois que sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões (cfr. art.ºs 635º, nº 3 e 4) e 639º, nº1, ambos do C. P. Civil) e não estando em causa no recurso de Apelação da ora Recorrida senão a “parcela de terreno reclamada nos autos e onde se encontra construído a ampliação do cemitério da Freguesia de BB (vulgo cemitério novo).” (sic. a conclusão 43 da Apelação) e tendo a Relação conhecido da demais parte do prédio, ocorre a referida nulidade, que se requer seja deferida, mantendo-se inalterada, pois, a primeira parte da douta Sentença proferida em 1ª Instância (“Pelo exposto, considero parcialmente procedente o pedido formulado pela autora e declarando que o terreno referido em A) é sua propriedade, exceção feita à parcela referida em L)” – sic.), sem prejuízo e sem prescindir do demais infra peticionado.

    Sem prescindir, J - A Ré-Reconvinte interpôs recurso de apelação da douta Sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância e, de tal notificada, a A. veio “interpor RECURSO SUBORDINADO, nos termos do disposto no n.º1, e 2 do artigo 633.º do Cód. Proc. Civil,”, para além de, obviamente, ter respondido à Apelação, tendo sido julgado no Acórdão recorrido que “Atendendo à procedência da reconvenção e do recuso da Ré, na primeira linha argumentativa, o conhecimento do recurso da Autora fica naturalmente prejudicado” (sic. o Acórdão recorrido).

    K - Como é referido no douto Acórdão deste Sup. Trib. Justiça de 7.04.2005 (in http://www.dgsi.pt, porc.:05B205) “O recurso subordinado só deve ser apreciado pelo tribunal de recurso se este conhecer do objeto do recurso principal, julgue-o procedente ou improcedente "(Lebre de Freitas e Ribeiro Mendes, "CPC Anotado", 3º (2003), 27, nota 4. Ribeiro Mendes, em "Recursos em Processo Civil "( 1992 ), 175, esclarece que "(...) o recurso subordinado só será julgado se o recurso principal vier a ser julgado, independentemente de este último ser julgado procedente ou improcedente " -destaques nossos ). Em suma: "o recurso subordinado só é afetado pela insubsistência do principal nos três casos previstos no nº3 (do art. 682º CPC), e não em qualquer outra hipótese, designadamente quando a este tiver sido negado provimento "(Rodrigues Bastos, Notas ao CPC", III (3ª ed., 2001 ), 224, nota 1. ; destaque nosso)”.

    L - Consequentemente, e nos termos referidos em tal douto Aresto, “Do erro em que se incorreu a este respeito no tribunal recorrido resultou óbvia omissão de pronúncia sobre toda a matéria do recurso subordinado.”, donde, verifica-se a nulidade do Acórdão recorrido, que expressamente se invoca, consubstanciada na omissão de pronúncia, nos termos do disposto no artigo 615º, nº 1, al. d) ex vi do disposto no artigo art.º 666º, nº 1, ambos do CPC, devendo o mesmo ser revogado e, bem assim, ser proferida decisão que conheça do recurso subordinado (cfr. art.º 665º aplicável ex vi do disposto no art.º 726º, ambos do C.P.Civil). Sem prescindir, M - No Acórdão recorrido julga-se a Ré-Recorrida proprietária do...

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