Acórdão nº 22/22 de Tribunal Constitucional (Port, 10 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelCons. Lino Rodrigues Ribeiro
Data da Resolução10 de Janeiro de 2022
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 22/2022

Processo n.º 10/22

Plenário

Relator: Conselheiro: Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Por requerimento datado de 1 de janeiro de 2022, veio Fernando Silva, na qualidade de mandatário do Partido Aliança às eleições para a Assembleia da República, designadas para o próximo dia 30 de janeiro, interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 32.º da Lei Eleitoral para a Assembleia da República, aprovada pela Lei n.º 14/79, de 16 de maio, na redação dada pela Lei n.º 4/2020, de 11 de novembro (LEAR), da decisão proferida no dia 30 de dezembro de 2021 pelo Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo (fls. 552-555), que negou provimento à reclamação pelo mesmo apresentada no dia 29 de dezembro de 2021 (fls. 550-551), ao abrigo do disposto no artigo 30.º, n.º 1, da LEAR, da decisão proferida pelo mesmo tribunal no dia 27 de dezembro de 2021, que admitiu a lista apresentada naquele círculo eleitoral pelo CDS-Partido Popular (CDS – PP).

2. A referida reclamação apresentava, para o que aqui mais releva, o seguinte teor:

«(...)

4. [A] Lei da Paridade nos Órgãos Colegiais Representativos do Poder Político (Lei Orgânica n.º 3/2006, de 21 de agosto, doravante "Lei da Paridade") estabelece o seguinte, nos seus artigos 2.º, 3.º e 4.º:

“Artigo 2.º Paridade

1 – Entende-se por paridade, para efeitos de aplicação da presente lei, a representação mínima de 40 % de cada um dos sexos, arredondada, sempre que necessário, para a unidade mais próxima.

2 – Para cumprimento do disposto no número anterior, não podem ser colocados mais de dois candidatos do mesmo sexo, consecutivamente, na ordenação da lista.

Artigo 3.º Notificação do mandatário No caso de uma lista não observar o disposto na presente lei, o mandatário é notificado, nos termos fixados na lei eleitoral aplicável, para proceder à sua correção no prazo estabelecido na mesma lei.

Artigo 4.º Efeitos do incumprimento

1 – A não correção da lista de candidatura no prazo previsto na respetiva lei eleitoral determina a rejeição de toda a lista.

2 – No caso da eleição dos vogais das juntas de freguesia, é nula a deliberação da eleição de listas de candidatos que não cumpram os requisitos do artigo.”

5. Assim sendo, quando a lei refere uma representação mínima de 40%, nunca a mesma pode ser inferior a essa.

6. O arredondamento à unidade, necessário pois não se pode ter meio, um quarto, ou 0,1% de candidato esse arredondamento só pode ser feito por excesso, pois qualquer que seja por defeito indicará sempre uma percentagem inferior ao estatuído na referida lei da paridade.

7. A alteração à Lei da Paridade ocorrida em 2019 vem aumentar a necessária representação do género em minoria (por norma mulheres), qualquer outra interpretação que a reduza, contrariará o estatuído nos artigos, bem como o espirito do legislador.

8. Na mesma sequência é vedada qualquer possibilidade de estarem mais que dois indivíduos do mesmo sexo seguidos em cada lista apresentada.

9. Assim sendo no Círculo Eleitoral de Viana do Castelo a lista apresentada pelo CDS/PP tem apenas 4 mulheres em 11 candidatos, o que não assegura o mínimo de 40% previstos na lei, esteve pois mal o Tribunal ao aceitar assim a referida lista.»

3. A decisão proferida no dia 30 de dezembro de 2021 pelo Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo, que constitui, para estes efeitos, a decisão recorrida, apresentou a fundamentação seguinte:

«(...)

Cumpre decidir, dispensando-se, por manifestamente desnecessário, o cumprimento no n.º 2 do artigo 30.º da Lei Eleitoral para a Assembleia da República.

Dispõe o artigo 2.º da Lei da Paridade nos Órgãos Colegiais Representativos do Poder Político (aprovada pela Lei Orgânica n.º 3/2006, de 21 de agosto, retificada pela Declaração de Retificação n.º 71/2006, de 4 de outubro, alterada pela Lei Orgânica n.º 1/2017, de 2 de maio, e pela Lei Orgânica n.º 1/2019, de 29 de março) que:

“1 - Entende-se por paridade, para efeitos de aplicação da presente lei, a representação mínima de 40% de cada um dos sexos, arredondada, sempre que necessário, para a unidade mais próxima.

2 - Para cumprimento do disposto no número anterior, não podem ser colocados mais de dois candidatos do mesmo sexo, consecutivamente, na ordenação da lista”.

Dispõe, por seu turno, o artigo 9.º do Código Civil, sob a epígrafe interpretação da lei, que:

“1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.

2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.

3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”.

Por outro lado e como é sabido, a interpretação extensiva não é lícita relativamente a preceitos limitativos de direitos, nomeadamente, nos que se referem à limitação do direito de participação na vida política e de acesso a cargos públicos.

Vejamos.

Preliminarmente se dirá que a exigência de uma representação mínima de 40% de cada um dos sexos, resultante do n.º 1 do artigo 2.º da Lei da Paridade, vale, dúvidas não haverá, para cada lista apresentada, tomada na sua unidade (ou seja, com a totalidade do número de efetivos e suplentes) como se decidiu no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 462/2019, de 12 de setembro de 2019.

Efetivamente, não se vislumbra na letra, nem resulta da respetiva ratio, a necessidade ou conveniência de se proceder a uma interpretação restritiva dos seus termos de forma a que a regra da paridade não...

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