Acórdão nº 286/20.4T8VCD.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Junho de 2021
Magistrado Responsável | JOÃO CURA MARIANO |
Data da Resolução | 17 de Junho de 2021 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
* I - Relatório Os Autores propuseram ação declarativa, com processo comum, no Juízo de Família e Menores ....., do Tribunal Judicial da Comarca ...., pedindo o reconhecimento judicial da sua situação de união de facto, com vista à obtenção da nacionalidade portuguesa pela Autora AA, ao abrigo do disposto no artigo 3.º, n.º 3, da Lei da Nacionalidade.
Após audição dos Autores, foi proferida decisão, declarando a incompetência material do Tribunal de Família e Menores e absolvendo o Réu da instância.
Os Autores recorreram desta decisão para o Tribunal da Relação ….. que, por acórdão proferido em 26.01.2021, confirmou a decisão da 1.ª instância.
Os Autores embora tenham interposto recurso de revista excecional deste acórdão, não deixaram de alegar que o recurso também poderá ser admitido como revista normal, uma vez que estamos perante uma das situações em que o recurso é sempre admissível, nos termos previstos no artigo 629.º, n.º 2, d), do Código de Processo Civil.
Em síntese, concluíram as alegações do recurso do seguinte modo: ...
5 – Entendem os recorrentes que é à jurisdição de família e menores que compete julgar o processo ora em causa, onde se pretende a obtenção do reconhecimento judicial da união de facto entre os mesmos recorrentes como “conditio sine qua non” para a obtenção posterior da nacionalidade portuguesa por parte da recorrente AA.
6 – Nos termos da LOSJ, o reconhecimento judicial de uma união de facto está incluído na competência interna dos tribunais de comarca.
7 – O critério da competência em razão da matéria releva, não só para determinar que os tribunais da comarca são, “in casu”, competentes, como também para determinar qual o juízo materialmente competente para a apreciação de determinadas causas nos termos pré-determinados pelo legislador.
8 - O artº 112º, nº 1, alínea g) da LOSJ prevê que os juízos de família e menores são competentes para preparar e julgar “outras ações relativas ao estado civil das pessoas e família” 9 - Afigura-se evidente que o legislador determinou a competência material dos juízos de família e menores para o conhecimento e apreciação de ações relativas a uniões de facto, onde se incluem ações como a destes autos, que integram plenamente a previsão daquela alínea g).
10 - A união de facto é, na verdade, uma relação familiar (pelo menos em sentido amplo), estando intimamente ligada ao estado civil das pessoas e família.
11 - Havendo juízos cuja competência especializada é, precisamente, matéria de Direito da Família e dos Menores – sendo isso aquilo que está em causa neste processo –, não parece que o legislador tenha excluído ou pretendido excluir da alínea g) do n.º 1, do artº 122º da LOSJ, a união de facto, que diz respeito ao estado civil das pessoas 12 - É o conceito de família alargada, consequência da evolução mais recente das condições sócio-familiares, incluindo as relações de união de facto, que deve operar na interpretação do disposto no normativo legal referido na conclusão anterior, que prevê como se disse, a competência dos juízos de família e menores para preparar e julgar outras ações relativas ao estado civil das pessoas e família.
13 - São, pois, os Juízos de Família e Menores abstratamente competentes para o conhecimento e apreciação de ações como a presente, ainda que para efeito de aquisição posterior da nacionalidade portuguesa.
14 - Assim sendo, “in casu”, é competente o Juízo de Família e Menores de ..... e não um Juízo Cível Local ou Central.
15 - Mostra-se errada, no entender dos recorrentes, a invocação exclusiva da letra da lei para se decidir como se decidiu no acórdão de que agora se recorre.
16 - É na LOSJ que deveriam tanto a Ilustre Julgadora de 1ª instância como os Ilustres Desembargadores de 2ª instância ter-se baseado para resolver a questão do tribunal materialmente competente para o caso dos autos e não no que refere o artº 3º nº 3 da Lei nº 37/81, de 3/10.
...
Foram apresentadas contra-alegações pelo Ministério Público, em representação do Estado Português, defendendo a improcedência do recurso e a manutenção da decisão recorrida.
* II – A admissibilidade do recurso Incidindo o recurso sobre acórdão do Tribunal da Relação que julgou o tribunal recorrido incompetente em razão da matéria para julgar esta ação, o recurso é sempre admissível (artigo 629.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), pelo que deve o mesmo ser conhecido como revista comum.
III – O objeto do recurso Tendo em consideração o conteúdo da decisão recorrida e as conclusões das alegações de recurso, cumpre apreciar se o Juízo de Família e Menores ....., do Tribunal Judicial da Comarca …., é competente para julgar a presente ação de simples apreciação...
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