Acórdão nº 274/18.0PBCTB.C2 de Tribunal da Relação de Coimbra, 2024-03-06

Data de Julgamento06 Março 2024
Ano2024
Número Acordão274/18.0PBCTB.C2
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (CASTELO BRANCO (JUÍZO CENTRAL CRIMINAL DE CASTELO BRANCO – J2))
*

Acordam em conferência os Juízes da 4º Secção do Tribunal da Relação de Coimbra:

I. RELATÓRIO

1. No âmbito do Processo nº274/18.0PBCTB do Tribunal Judicial da Comarca de Castelo Branco, Juízo Central Criminal de Castelo Branco, por acórdão proferido a 25-11-2021 [referência 33926903], foi decidido (transcrição):

«Pelo exposto, tendo em atenção as considerações produzidas e as normas legais citadas, este Tribunal Coletivo decide:

I – EM SEDE DE ILICÍTOS CRIMINAIS

A) Condenar o arguido AA pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelos art.ºs 14.º, n.º 1, 26º, 152, n.ºs 1 al. a), 4 e 5 todos do Código Penal, na pena de três anos e três meses de prisão;

B) Condenar o arguido AA pela prática de um crime de detenção de arma proibida p.e p. pela al. d) do art.º 86º da Lei das Armas na pena de oito meses de prisão;

C) Proceder ao cúmulo jurídico das duas penas aplicadas em a) e b) deste dispositivo e, em consequência, condenar o arguido AA na pena única de três anos e seis meses de prisão.

D) Determinar que o cumprimento da proibição de contactar, por qualquer meio, com a ofendida seja fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância caso seja concedida liberdade condicional ao arguido antes de decorrido o período de três anos e seis meses;

E) Condenar o arguido AA nas custas da acção penal, fixando-se a taxa de justiça devida em três UC’s.

II) - NA PARTE CÍVEL:

O Tribunal Colectivo decide julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado e, consequentemente:

a) Condenar o demandado AA a proceder ao pagamento à demandante BB da quantia de 10.000,00 (dez mil euros) a título de danos não patrimoniais acrescida dos juros à taxa legal, actualmente de 4% (Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril), que se vençam a partir da data da presente acórdão até integral pagamento;

b) Condenar o demandado AA a proceder ao pagamento à demandante BB da quantia de€ 1.437,54, a título de danos patrimoniais sofridos, quantia a que acrescerão os respectivos juros vencidos e vincendos desde a data da notificação do pedido de indemnização civil e até efectivo e integral pagamento.

c) Absolver o demandado do demais contra si peticionado

d) - Custas a cargo do demandante e demandado na proporção do respectivo decaimento (cf. art.º 527º do Cód. Processo Civil

2. Inconformados com tal decisão, dela interpuseram recurso o arguido/demandado AA e o Ministério Público, sobre os quais incidiu o acórdão proferido por este Tribunal da Relação de Coimbra de 08-04-2022 [referência 10169446], onde se decidiu:

«Pelo exposto, acordam os juízes da Secção Criminal deste Tribunal da Relação em declarar nulo o acórdão recorrido por falta de fundamentação quanto aos aspectos acima indicados e, em consequência, determinam a sua substituição por outro que supra a apontada nulidade, nos termos enunciados em 3.1.1., devendo para tanto atender aos elementos cuja obtenção repute necessária para cabal satisfação das exigências de fundamentação da decisão, assegurando-se ainda a fundamentação bastante mencionada em 3.1.2. e a observância do requisito descrito em 3.1.3.

Recurso sem tributação.»

*

3. Na sequência do decidido por este Tribunal superior, foi proferido novo acórdão pelo Tribunal a quo, datado de 07-06-2022 [referência 34680299], com o seguinte dispositivo (transcrição):

«Pelo exposto, tendo em atenção as considerações produzidas e as normas legais citadas, este Tribunal Coletivo decide:

I – EM SEDE DE ILICÍTOS CRIMINAIS

A) - Condenar o arguido AA pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelos art.ºs 14.º, n.º 1, 26º, 152, n.ºs 1 al. a), 4 e 5 todos do Código Penal, na pena de três anos e três meses de prisão;

B) - Condenar o arguido AA pela prática de um crime de detenção de arma proibida p.e p. pela al. d) do art.º 86º da Lei das Armas na pena de oito meses de prisão;

C) - Proceder ao cúmulo jurídico das duas penas aplicadas em a) e b) deste dispositivo e, em consequência, condenar o arguido AA na pena única de três anos e seis meses de prisão.

D) - Determinar que o cumprimento da proibição de contactar, por qualquer meio, com a ofendida, seja telefone, seja e-mail, sms, carta e muito menos pessoalmente e seja fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância caso seja concedida liberdade condicional ao arguido antes de decorrido o período de três anos e seis meses;

E) Condenar o arguido AA nas custas da acção penal, fixando-se a taxa de justiça devida em três UC’s.

II - ) NA PARTE CÍVEL:

O Tribunal Colectivo decide julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado e, consequentemente:

a) - Condenar o demandado AA a proceder ao pagamento à demandante BB da quantia de 10.000,00 (dez mil euros) a título de danos não patrimoniais acrescida dos juros à taxa legal, actualmente de 4% (Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril), que se vençam a partir da data da presente sentença até integral pagamento;

b) - Condenar o demandado AA a proceder ao pagamento à demandante BB da quantia de € 1.437,54, a título de danos patrimoniais sofridos, quantia a que acrescerão os respectivos juros vencidos e vincendos desde a data da notificação do pedido de indemnização civil e até efectivo e integral pagamento.

c) - Absolver o demandado do demais contra si peticionado;

d) - Custas a cargo do demandante e demandado na proporção do respectivo decaimento (cf. art.º 527º do Cód. Processo Civil

4. Inconformado, o Ministério Público interpôs novo recurso, formulando as seguintes conclusões (transcrição):

«1. O arguido AA, vinha pronunciado entre o mais, pela prática do crime de homicídio qualificado agravado, na forma tentada, p. p. pelos arts. 132º, nºs 1 e 2, al. b), 131º, 22º, nºs 1 e 2, al. c), 23º, nº 2 e 26º do Código Penal e art. 86, nºs 3 e 4 da Lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro.

2. O tribunal a quo absolveu o arguido da prática do indicado crime.

3. Porém, da matéria de facto provada resultam elementos de facto que impunham a condenação do arguido nos precisos termos em que foi pronunciado

4. Quando o tribunal a quo deu como não provados os factos inscritos sob as alíneas oo), pp), qq) e rr) não o fundamenta de forma lógica e racional e perceptível na respectiva motivação, tendo em conta a prova produzida em sede de julgamento.

5. Incorrendo, assim, o acórdão em nulidade prevista no artº 379º, nº 1, al. a) do Código de Processo Penal.

6. Acresce que, não tendo dado como provados os factos que veio a dar como não provados, violou o tribunal a quo as regras da experiência comum na formação da sua convicção para obter a conclusão a que chegou de os considerar não provados.

7. Incorreu o tribunal em erro notório na apreciação da prova, o que se constata a partir do próprio texto da decisão recorrida, previsto no artº 410º, nº 2, al. c) do Código de Processo Penal, tendo ainda em atenção o disposto no artº 127º do mesmo diploma legal.

8. Diferentemente, fez-se prova da intenção do arguido em tirar a vida à assistente, prova segura a que se chega mediante um raciocínio lógico, estando, assim, verificados todos os elementos típicos, objectivos e subjectivos do crime de homicídio qualificado agravado, na forma tentada, p. p. pelos arts. 132º, nºs 1 e 2, al. b), 131º, 22º, nºs 1 e 2, al. c), 23º, nº 2 e 26º doCódigo Penal e art. 86, nºs 3 e 4 da Lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro.

9. Deverá o acórdão recorrido ser revogado e substituído por outro na parte em que considera não provados os factos oo) a rr), considerando os mesmos provados.

10. E, assim, considerar verificada a prática pelo arguido do crime de homicídio qualificado agravado, na forma tentada, p. p. pelos arts. 132º, nºs 1 e 2, al. b), 131º, 22º, nºs 1 e 2, al. c), 23º, nº 2 e 26º do Código Penal e art. 86, nºs 3 e 4 da Lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro.

Alterando o acórdão recorrido nos termos preditos farão Vossas Excelência a habitual JUSTIÇA!»

(…)

7. – Pelo Exmo. Senhor Procurador-geral Adjunto foi emitido parecer, pugnando pela improcedência do recurso interposto pelo Arguido e pela procedência do recurso interposto pelo Ministério Público.

8. Efetuado exame preliminar e colhidos os vistos, o processo foi presente à conferência, por o recurso dever ser aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419º, n.º 3, alínea c) do citado código.

II. FUNDAMENTAÇÃO

1. Delimitação do objeto dos recursos.

Segundo jurisprudência pacífica, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso - como seja a deteção de vícios decisórios ao nível da matéria de facto resultantes da simples leitura do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, referidos no artigo 410º, n.º 2, do Código de Processo Penal[1], e a verificação de nulidades que não devam considerar-se sanadas, nos termos dos artigos. 379º, n.º 2, e 410º, n.º 3, do mesmo código - é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação, onde sintetiza os fundamentos de discordância com o decidido e resume as razões do pedido (artigo 412º, n.º 1, do referido diploma), que se delimita o objeto do recurso e se fixam os limites do conhecimento do mesmo pelo tribunal superior.

Atentas as conclusões formuladas pelos recorrentes, as questões a decidir são as seguintes:

A) Recurso do Ministério Público:

1 - Vício de erro notório na apreciação da prova – artigo 410º nº2 alínea c) do Código de Processo Penal [conclusão 7.]

2 - Erro de julgamento relativamente à matéria de facto descrita nas alíneas oo), pp), qq) e rr) dos factos provados, devendo tal matéria ser levada ao elenco dos factos provados e, em consequência, ser o Arguido condenado também pela prática de um crime de homicídio qualificado agravado, na forma tentada, previsto e punido pelos artigos 132.º, n.ºs 1 e 2, alínea b), 131.º, 22.º, n.ºs 1 e 2, alínea c), 23.º, n.º 2 e 26.º do Código Penal e artigo 86.º, n.ºs 3 e 4 da Lei n.º...

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