Acórdão nº 02642/22.4BEPRT-S1 de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Setembro de 2023

Magistrado ResponsávelRogério Paulo da Costa Martins
Data da Resolução13 de Setembro de 2023
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: «AA» veio interpor RECURSO JURISDICIONAL do despacho da M.ma Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 04.05.2023, pelo qual foi ordenado o desentranhamento da réplica que apresentou na acção que moveu contra o Estado Português, representado pelo Ministério Público.

Invocou para tanto, em síntese, que a decisão ora recorrida violou o disposto no artigo 85º- A do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, bem como o artigo 3.°, n.° 3, do Código de Processo Civil, ex vi, artigo 1.° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, por se tratar de uma resposta às exceções aduzidas em sede de contestação.

Não foram apresentadas contra-alegações.

* Cumpre decidir já que nada a tal obsta.

* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: I - O Mmo. Juiz do Tribunal a quo, salvo o devido respeito, cometeu erro de julgamento ao determinar o desentranhamento da Réplica apresentada pelo Autor.

II - Considera a aqui Recorrente que a Réplica apresentada é processualmente admissível, ao abrigo do disposto no artigo 85.°-A do CPTA, e bem assim ao abrigo do Princípio do Contraditório e da igualdade de armas, uma vez que a Recorrente apenas se limita responder a matéria de exceção invocada pelo Recorrido, porquanto: III - O Recorrido defende-se na sua contestação invocando uma exceção inominada (ainda que não a identifique e a classifique enquanto defesa por impugnação), e que só pode ser tida como uma exceção perentória, uma vez que toda a argumentação expressa nos artigos 16° e 19°, 40° a 42°, 68°, 71° a 73° da contestação, introduz a juízo factos novos, distintos dos factos invocados como causa de pedir no articulado inicial para deles retirar efeitos que podem conduzir à improcedência total ou parcial da ação, motivo pelo qual o Recorrente utilizou o meio processual adequado à sua resposta, defendendo-se das exceções invocadas, IV - O Professor Manuel de Andrade in “Noções elementares de processo civil” Coimbra Editora/1979, págs.130/131, ensina que as exceções perentórias são “ ... as que se traduzem na invocação de factos ou causa impeditivas, modificativas ou extintivas do direito do Autor, por isso mesmo levando à improcedência total ou parcial da ação – a uma sentença material desfavorável (mais ou menos) a esse pleiteante. O Réu não nega os factos donde o Autor pretende ter derivado o seu direito, mas opõe-lhe contra-factos que lhe teriam excluído ou paralisado desde logo a potencialidade jurídica ...

V - A decisão ora recorrida padece, assim, de erro , violando o disposto no Art.° 85 A do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, bem como o artigo 3.°, n.° 3, do Código de Processo Civil, ex vi, artigo 1.° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, por se tratar de uma resposta às exceções aduzidas em sede de contestação.

VI - Não se pode olvidar, que o principio do contraditório, é hoje entendido como garantia de participação efetiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, em termos de, em plena igualdade, poderem influenciar todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação, direta ou indiretamente, com o objeto da causa e em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão.

VI - Devendo o despacho proferido, ser substituído por outro que em face do exposto, determine a manutenção nos autos da Réplica apresentada.

* II –Matéria de facto.

Com interesse para o presente recurso mostram-se os seguintes factos, documentados no processo: 1. O Autor apresentou a seguinte petição inicial em acção intentada contra o Estado Português (cfr. certidão junta aos autos): “(…) .

1. O Autor, apresentou queixa crime contra «BB», solicitadora portadora da Ced. Prof. n.º ..., com escritório em Rua ... ... ; imputando-lhe 2.A pratica de um crime de difamação p.e.p pelos arts.ºs 180º e 182º do Código Penal; porquanto 3. Aquela na qualidade de procuradora do pai do Autor, «CC», falecido a .../.../2022, e na sequência de correspondência trocada, via email, com o aqui Autor, após o decesso do progenitor daquele, endereçou 4. Ao então ilustre patrono do Autor, Dr. «DD», portador da Ced Prof. 9655P , com domicilio profissional em Praça ...; email, em que 5. Injuriou o Autor, afirmando que aquele não tinha prestado qualquer auxilio ou assistência ao pai, bem sabendo que tal afirmação não correspondia nem corresponde á verdade, tal como resulta dos docs. n.ºs ... a ..., que ora se juntam e cujo teor considera-se reproduzido para os devidos e legais efeitos; protestando 6. O Autor, juntar certidões dos documentos n.ºs ... a ..., aludidos supra, mas também dos documentos que indicará infra; logo que as mesmas lhe sejam disponibilizadas, tal como resulta do requerimento que se junta como doc. n.º ...

7. No seguimento da apresentação da queixa crime, por parte do Autor, «BB» foi constituída arguida, e instaurado inquérito com o n.º 576/20...., que corre termos na Procuradoria da Comarca do Porto, DIAP – Secção de Vila do Conde, tendo o 8. O Autor constituindo-se Assistente no processo (Ut. doc.n.º ... cujo teor considera-se reproduzido para os devidos e legais efeitos).

SUCEDE PORÉM QUE, E 9. Pese embora as inúmeras diligências levadas a cabo pelo Autor, que por diversas vezes requereu junto do Ministério Público que o seu então Patrono Dr. «DD», fosse notificado para juntar aos autos, o email contendo as afirmações injuriosas proferidas por «BB»; tal como resulta dos documentos n.ºs ... e ... que ora se juntam e cujo teor considera-se reproduzido para os devidos e legais efeitos; tal notificação 10. Apenas foi efectuada a 07 de Abril do corrente ano (doc. ref.º ...56) - Ut. Doc. n.º ... cujo teor se considera reproduzido para os devidos e legais efeitos.

11. O Ministério Público, a 01 de Junho do corrente ano, proferiu despacho de arquivamento dos autos, no qual refere e passa-se a transcrever: – “ Compulsados os autos resulta, então que, apesar de não se saber em concreto em que data a denunciada «BB» enviou ao então Mandatário do assistente, Dr. «DD», o e-mail cujo teor, o assistente considera ofensivo da sua honra, a mesma será muito próxima do dia 30 de Janeiro de 2020, data em que o assistente teve conhecimento do mesmo … Efectivamente notificado que foi para proceder à junção de cópia do e-mail, o Dr. «DD» não a remeteu, invocando o sigilo profissional, mais referindo que iria requerer junto da Ordem dos Advogados o seu levantamento … Assim, sendo é forçoso concluir que o procedimento criminal referente aos factos imputados á arguida prescreveu em 30-01-2022, nos termos das disposições conjugadas dos art. 118-º n.º 1 alínea c), 121º, n.º 1, al. a) e art.º 181º, n.º 1, todos do Código Penal” (sublinhado nosso) – Ut. doc. n.º ...0 cujo teor se considera reproduzido para os devidos e legais efeitos.

ORA 12. Atendendo à data constante da notificação remetida ao Dr. «DD», constata-se que aquela, não obstante a insistência do Autor para que o email fosse junto aos autos, foi enviada estando já prescrito o processo crime. Com efeito 13. Em conformidade com o despacho proferido pelo(a) Digno(a) Magistrado(a) do Ministério Publico, supra parcialmente transcrito; o procedimento criminal pelos factos imputados á Arguida («BB») prescreveu em 30 de Janeiro de 2022, ou seja cerca de 3 meses antes de ser remetida notificação para a junção do email, contendo as afirmações difamatórias; elemento essencial para demonstrar a existência de crime.

DOS FUNDAMENTOS DA ACÇÃO 14. Assiste ao Autor, bem como a todos os cidadãos, no âmbito da Tutela jurisdicional efectiva consagrada nos arts.ºs 20º e 268º da Constituição da Republica Portuguesa, o direito de obter, em prazo razoável, uma decisão judicial que aprecie, com força de caso julgado, cada pretensão regularmente deduzida em juízo, bem como a possibilidade de a fazer executar.

15. O Autor apresentou junto do Ministério Publico, denúncia pela prática de um crime de difamação, indicando o elemento que suportava o crime, o qual não podia juntar diretamente, pelo que insistiu na notificação do seu então patrono.

16. Notificação que a Digno(a) Magistrado(a) do Ministério Publico, que é a autoridade judiciária a quem compete dirigir o inquérito, apenas ordenou que fosse realizada a 07 de Abril do corrente ano; data em que como se referiu, o procedimento criminal estaria prescrito.

17. Ora, o exercício da acção penal assume um papel central no conjunto das atribuições do Ministério Público, no âmbito desse exercício evidencia-se a direcção do inquérito, nos termos do artigo 53.º, n.º 2, alínea b), do Código de Processo Penal; fase que compreende, o conjunto de diligências que visa investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles, descobrir e recolher as provas, em ordem à decisão sobre a acusação, - art.sº 262.º, n.º 1 e 263º ambos do Código de Processo Penal.

18. Consubstanciando o inquérito, a fase em que devem ser realizados, pelo Ministério Público, todos os actos necessários para fundamentar a acusação ou o arquivamento. Donde se afigura patente a orientação da actividade investigatória para a decisão do inquérito.

19. No caso em apreço, e considerando os factos elencados supra, suportados pelos documentos juntos, afigura-se que o(a) Digno(a) Magistrado(a) do Ministério Publico, salvo o devido respeito, não cumpriu as funções que lhe são conferidas por lei, não dirigiu activamente o inquérito, nomeadamente recolhendo provas, em ordem à decisão sobre a acusação.

20. Face à actuação do Ministério Publico, em deixar prescrever o crime denunciado, o Estado Português incorre em responsabilidade civil extracontratual nos termos do Art.º 12º da Lei n.º 67/2007 de 31 de Dezembro na versão que lhe foi dada pela Lei n.º 31/2008 de 17 de Julho, decorrente da violação do...

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