Acórdão nº 1777/18.2JAPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelJORGE BISPO
Data da Resolução11 de Maio de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I.

RELATÓRIO 1.

No processo comum com intervenção de tribunal coletivo que, com o NUIPC 1777/18.2JAPRT, corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga, no Juízo Central Criminal de Guimarães (Juiz 4), realizado o julgamento, foi proferido acórdão, em 31-10-2019, depositado na mesma data, com o seguinte dispositivo (transcrição[1]): «IV. - Decisão Pelo exposto, os Juízes que compõem este Tribunal Coletivo julgam a acusação do Ministério Público (para a qual a decisão de pronúncia remete) parcialmente procedente e, em consequência, decidem: Quanto à instância criminal:

  1. Condenar o arguido H. M. pela prática, em autoria material e em concurso efetivo, de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 14.º, n.º 1, 22.º, n.º 1 e n.º 2, al. b), 23.º, n.º 1 e 2, 30.º, n.º 1, 73.º, 131.º, 132.º, n.º 2, als. c) e j), todos do Código Penal, na pena de 6 (seis) anos de prisão.

  2. Condenar o arguido H. M. pela prática, em autoria material e em concurso efetivo, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 14.º, n.º 1, 30.º, n.º 1, 203.º e 204.º, n.º 1, al. d), todos do Código Penal, em face da alteração substancial dos factos operada em julgamento, na pena de 1 (um) ano e 3 (três) meses de prisão.

  3. Em cúmulo jurídico, nos termos do artigo 77.º, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal, condenar o arguido H. M.

    na pena única de 6 (seis) anos e 5 (cinco) meses de prisão.

  4. Determinar que se proceda à recolha da amostra de ADN ao arguido, nos termos e para os efeitos do artigo 8.º, da Lei n.º 5/2008, de 12 de fevereiro.

  5. Determinar a devolução aos seus proprietários dos objetos apreendidos, após o trânsito em julgado da presente decisão, porquanto não se verificam em causa os requisitos legais previstos no artigo 109.º do Código Penal.

  6. Condenar o arguido no pagamento das custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC (quaro unidades de conta), nos termos do artigo 8.º, n.º 9 do Regulamento das Custas Processuais e tabela III anexa ao mesmo.

    G) Até ao trânsito em julgado da presente decisão deve o arguido continuar sujeito à medida de coação de obrigação de permanência na habitação constante do termo de identidade e residência, com fiscalização do seu cumprimento por meios técnicos de controlo à distância, nos termos dos artigos 191.º, 193.º, 196.º, 201.º, 204.º, als. c), e 213.º, n.º 1, al. b), todos do Código de Processo Penal, sem prejuízo do cumprimento das periódicas revisões da medida e do prazo legal máximo de duração da referida medida de coação.

    Quanto à instância cível conexa:

  7. Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido pela demandante S. T.

    contra o demandado H. M.

    e, em consequência: 1.- condenar o demandado no pagamento da quantia de 50.000 € (cinquenta mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida do pagamento de juros de mora, à taxa legal (ou seja, à taxa anual de 4 %, vide artigo 559.º, n.º 1, do Código Civil, e Portaria n.º 291/2003, de 08/04) calculados a partir da data do acórdão e até integral pagamento, nos termos do acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 4/2002, de 9 de Maio de 2002, do Supremo Tribunal de Justiça, proferido na Revista Ampliada n.º 1508/01 (publicado no Diário da República, I Série-A, de 27/06/2002, págs. 5057 a 5070).

    2.- condenar o demandado no pagamento de 1.190 € (mil cento e noventa euros) referentes aos custos suportados pela demandante com as mensalidades e despesas à ACAPO, 390 € (trezentos e noventa euros) referentes à compra de um telefone adaptado iphone 7, e 50 € (cinquenta euros) referentes à compra de uma bengala, acrescida do pagamento de juros de mora, à taxa legal (ou seja, à taxa anual de 4 %, vide artigo 559.º, n.º 1, do Código Civil, e Portaria n.º 291/2003, de 08/04), calculados a partir da data em que foi notificada (ou seja, da data da interpelação ao devedor) para contestar o pedido de indemnização civil e até integral pagamento (cfr. artigos 805.º e 806.º do Código Civil).

    3.- condenar o demandado no pagamento do que vier a ser liquidado em decisão ulterior, nos termos dos artigos 564.º, n.º 2 do Código Civil e artigo 609.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, quanto aos custos do aparelho auricular e do pagamento do salário de uma empregada para auxiliar a ofendida/demandante na sua incapacidade física permanente.

    4.- absolver o demandado do demais peticionado.

    B) Condenar demandante e demandado no pagamento das custas do pedido de indemnização civil de acordo com o respetivo decaimento, pois o seu valor é superior a 20 UCs – cfr. artigo 527.º do Código de Processo Civil ex vi artigo 523.º do Código de Processo Penal e artigo 4.º, n.º 1, al. n), a contrario, do Regulamento das Custas Processuais.

    (…)» 2.

    Dessa decisão final interpôs recurso o arguido e demandado civil, formulando no termo da sua motivação as seguintes conclusões, que, pela sua excessiva extensão, se afastam claramente do que é legalmente previsto e desejável (um resumo das razões do pedido), mas que, ainda assim, se opta por transcrever integralmente: 1. (…); 2. O recorrente requer, nos termos do n.º 5 do artigo 411º Código Processo Penal, que se realize audiência, devendo nesta ser debatida a impugnação da matéria de facto, a qual se encontra errada e incorretamente julgada, bem como, nesta audiência deverá ser debatida a matéria de direito, nomeadamente a concreta medida de pena aplicada; 3. Não podemos deixar de começar por salientar, e a título de questão prévia, que, na formação da convicção, o Tribunal a quo deveria ter sempre como presente que, tal como preceitua o artigo 32º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, “[t]odo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação (…)”, e que deste principio da presunção de inocência decorre, como salienta JOSÉ M. ZUGALDÍA ESPINAR, que “partindo ele da ideia que o acusado é, em princípio, inocente (…), a sentença condenatória contra o mesmo só pode pronunciar-se se da audiência de julgamento resultar a existência de prova que racionalmente possa considerar-se suficiente para desvirtuar tal ponto de partida” (JOSÉ M. ZUGALDÍA ESPINAR (dir.)/ESTEBAN J. PÉREZ ALONSO (coord.), Derecho Penal, Parte General,2002, pág. 231); 4. Ora, tal só sucederá quando, por um lado, a prova produzida em audiência permita logicamente (no sentido de racionalmente, coerentemente, etc.) afirmar a presença, no caso concreto, de todos os elementos (objetivos e subjetivos) do crime trazido a Juízo, e, por outro lado, conduza, nos mesmos moldes, à conclusão de que foi o arguido o responsável pela sua ocorrência (assim, MERCEDES FERNANDEZ LÓPEZ, Prueba y presuncion de inocência, 2005, pág. 143 e nota 89). No fundo, do que se trata é de que só se pode condenar alguém se for possível imputar-lhe a realização de todos os pressupostos e condições legais exigidos para o efeito, devendo ditar-se uma absolvição se se provarem factos que neguem a possibilidade dessa imputação, ou se aqueles pressupostos e condições se não se verificarem no caso concreto (em sentido convergente, vd NEVIO SCAPINI, La prova per indizi nel vigente sistema de processo penal, 2001, pág. 2); 5. E nestes autos, face a prova produzida, devera ter sido ditada uma absolvição do arguido pelo crime de homicídio qualificado na forma tentada, reconhecendo-se, se não a legítima defesa, o excesso de legítima defesa, nos termos e com os efeitos do artigo 33º do Código Penal, devendo "apenas" considerar-se e dar por assente que a sua conduta ilícita era integradora do crime de ofensa à integridade física grave, prevista e punida pelo artigo 144º do Código Penal; 6. Encontra-se errada e incorretamente julgada a seguinte matéria de facto dada como provada nos pontos 1.3, 1.4, 1.5, 1.6, 1.7, 1.8, 1.9, 1.11, 1.12, 1.16, 1.17, 1.18, 1.19, 1.20, 1.21, 1.22, 1.23, 1.24, 1.25, 1.28, 1.31, 1.32, 1.34, 1.35, 1.36, 1.37, 150, 160, factos esses supra transcritos e que aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais; 7. Ora, salvo o devido respeito, não foi produzida prova segura e inequívoca que o arguido, ora Recorrente H. M.

    , praticou os factos dados por assentes ou que estes tiveram lugar nas exatas circunstâncias de tempo, modo e lugar conforme foram descritos e vertidos nos supra citados pontos de facto dados como provados, que aqui impugnamos; 8. Estes concretos pontos da matéria de facto que aqui impugnamos por se encontrarem incorretamente julgados, e que impugnaremos especificadamente mas conjugadamente, na sendo da metodologia empregue pelo douto Tribunal a quo, uma vez que estão concatenados, nomeadamente os pontos 1.3, 1.4, 1.5, 1.6, 1.7, 1.8, 1.9, 1.11, 1.12, 1.16, 1.17, 1.18, 1.19, 1.20, 1.21, 1.22, 1.23, 1.24, 1.25, 1.28, 1.31, 1.32, 1.34, 1.35, 1.36, 1.37, 150 e 160 dos factos provados, deveriam ter sido antes dados respetivamente como não provados porque a prova infra transcrita e a produzida assim o impunha e também a ausência de prova em sentido contrário; 9. Foi erradamente dado como provado no ponto 1.3 a seguinte factualidade: "1.3. – O arguido sabia que S. T. não tinha 90% de visão no olho direito e no esquerdo tinha apenas 20%"; 10. Ora, o Tribunal deu erradamente como provada esta factualidade uma vez que apenas considerou a documentação junta aos autos - que se encontrava, quanto ao diagnóstico e respetivas conclusões desfasada da realidade - e não as próprias declarações da ofendida S. T. e do arguido H. M., mas particularmente da primeira, que afirmou expressamente que à data dos factos aqui em julgamento esta já não tinha qualquer acuidade visual ou visão no olho direito - Cfr. declarações da assistente S. T., gravadas em CD através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal desde o minuto 00:00:01 a 01:31:34 (ficheiro 20190919110917_5706427_2870533.wma), conforme ata de...

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