Acórdão nº 1786/17.9T8PVZ.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelFERNANDO SAMÕES
Data da Resolução02 de Fevereiro de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n.º 1786/17.9T8PVZ.P1.S1[1] * Acordam no Supremo Tribunal de Justiça – 1.ª Secção[2]: I. Relatório NORMAGO – Reabilitação de Edifícios, Lda.

, instaurou a presente acção declarativa, com processo comum, contra AA e BB, pedindo que estes sejam condenados a pagarem-lhe a quantia de 48.248,30 €, acrescida dos juros de mora vincendos, à taxa legal, até integral e efectivo pagamento.

Para tanto, alegou, em resumo, que, no exercício da sua actividade de construção civil, acordou com os réus construir uma moradia, em conformidade com uma lista de trabalhos orçamentados, pelo preço de 131.733,06 €, acrescido de IVA à taxa em vigor, que os réus não pagaram na totalidade, tendo resolvido o contrato e impedido a autora de prosseguir com a obra, sem que tivessem pago os trabalhos realizados, no valor de 39.874,74 €, e impossibilitando-a de auferir um lucro de 7.974,95 €.

Os réus contestaram, por impugnação, e deduziram reconvenção, formulando os seguintes pedidos: a) Ser declarada válida a resolução do contrato de empreitada promovida pelos réus, por facto imputável à autora. Consequentemente, b) Ser a autora/reconvinda condenada a pagar aos autores uma indemnização pelos danos causados, de natureza patrimonial, consubstanciados: b.1) no valor de 500,00 € prevista na cláusula penal moratória no artigo 9.º do contrato de empreitada; b.2) na quantia de 6.114,91 € pelos danos resultantes de obra contratada não realizada pela autora reconvinda, mas integralmente paga pelos réus; b.3) na quantia correspondente aos trabalhos integralmente pagos, mas apenas parcialmente executados, identificados nas verbas 4.4 e 10.1 do orçamento, cujo montante presentemente se desconhece e que, no caso de não ser apurado até à data da audiência de julgamento, deve ser relegado para ser liquidado em execução de sentença; b.4) na quantia relativa ao custo do arrendamento que vem sendo suportado pelos réus desde 01.10.17 em virtude do incumprimento do contrato de empreitada pela autora, presentemente no valor de 2.250,00 €, valor que, no caso de não ser apurado até à data da audiência de julgamento, deve ser relegado para ser liquidado em execução de sentença; c) Ser a autora condenada a pagar aos réus uma indemnização pelos danos causados, de natureza não patrimonial, no montante de 5.000,00 €.

Como fundamento da reconvenção deduzida, alegaram, em síntese, que a autora não executou a totalidade dos trabalhos nem cumpriu os prazos acordados, o que levou os réus a resolverem o contrato, tendo sofrido ainda prejuízos que discriminam e quantificam.

A autora replicou impugnando motivadamente os factos alegados pelos réus como fundamento da reconvenção e invocando a excepção de não cumprimento do contrato.

Na audiência prévia realizada, foi admitida a reconvenção deduzida e foi proferido despacho saneador tabelar, bem como foi fixado o objecto do litígio e foram enunciados os temas de prova, sem reclamações.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, onde se decidiu: a) julgar a acção improcedente e absolver os réus do peticionado; b) julgar a reconvenção parcialmente procedente e, em consequência: b.1) Declarar validamente resolvido o contrato de empreitada celebrado entre a autora e os réus; b.2) Absolver a autora do demais que foi peticionado pelos réus.

Inconformada, a autora interpôs recurso de apelação em que impugnou tanto a matéria de facto como a matéria de direito, apresentando as respectivas alegações com as seguintes conclusões: “1. É nula a sentença, quando o juiz condene em objecto diverso do pedido (art.º 615.º, n.º a, alínea e) do C.P.C.; 2. Em nenhum momento do processo, os Recorridos peticionaram que a Recorrente perdesse os créditos que detinha sobre a Recorrente; 3. Os Recorridos peticionaram a compensação de créditos e contestaram a perfeição dos trabalhos prestados pela Recorrente, mas nunca peticionaram, ou sequer, invocaram, que a Recorrente perdesse os créditos e totalidade do valor que teria a receber pelos trabalhos que se dessem por efectivamente provados terem sido prestados; 4. O Tribunal a quo julgou incorrectamente o facto da Recorrente se ter atrasado na entrega da obra, tendo por fundamento a falta de pagamento, pelos Recorridos, de créditos existentes a favor da Recorrente, não considerando que o atraso na entrega da obra se ficou a dever, igualmente, ao facto dos Recorridos não terem providenciado pela finalização dos trabalhos da sua competência (zinco, serralharia e carpintaria) e que condicionou o prosseguimento da obra pela Recorrente; 5. Julgou incorrectamente esses concretos pontos de facto; 6. Existem provas constantes do processo, designadamente, a audição das testemunhas CC, DD, EE, FF, que confirmaram a inexistência de clarabóias no local e falta de colocação das placas de zinco e de janelas e vidros, que possibilitassem que a Recorrente pudesse prosseguir as obras de pladur e pinturas interiores da moradia; 7. Sem a colocação de clarabóias, placas de zinco e janelas e vidros, a Recorrente nunca poderia ter prosseguido e concluído a sua parte da obra, designadamente, com a colocação de pladur e pinturas interiores da moradia, sob pena, de estragar e inutilizar os trabalhos, em caso de entrada de chuvas; 8. Os Recorridos abusam do seu direito de invocar atrasos na obra pela Recorrente, quando contribuíram para tais atrasos, com a não finalização, por eles, dos trabalhos que lhes competiam (serralharia, colocação de zinco); 9. Esses concretos meios probatórios, constantes do processo, impunham decisão diversa da recorrida, porquanto, o atraso na entrega da obra não foi culpa exclusiva da empreiteira, mas, também dos Recorridos, que contribuíram para tal atraso com a ausência de finalização da sua parte nos trabalhos de empreitada; 10. Deveria, assim, ter sido proferida decisão que não reconhecesse a culpa exclusiva da Recorrente no atraso da entrega da obra e que os Recorridos contribuíram igualmente para tal desiderato não providenciando pela finalização dos trabalhos que lhes competia fazer, alguns deles condicionantes do trabalho da empreiteira; 11. A realização desses trabalhos por parte dos Recorridos era condição absoluta do prosseguimento dos trabalhos pela Recorrente; 12. A Recorrente não poderia prosseguir com a execução dos trabalhos de pladur e pinturas interiores da moradia, sem que a casa estivesse convenientemente fechada e com a colocação de janelas e clarabóias e zinco colocado na cobertura; 13. A sentença proferida confere um enriquecimento sem causa avultado aos Recorridos à custa dos trabalhos efectivamente prestados pela Recorrente, aquando da sua saída da obra; 14. O Tribunal a quo pecou por omissão na análise destes concretos pontos de facto, que ficaram confirmados, de forma concludente, pelos meios probatórios – prova testemunhal – testemunhas CC, EE, DD e FF e nas passagens dos respectivos testemunhos reproduzidas no corpo do presente articulado; 15. Esses testemunhos impunham decisão diversa da proferida, reconhecendo-se a quota parte de responsabilidade dos Recorridos no atraso de entrega de obra pela Recorrente; 16. A testemunha DD, prestou declarações, cujas passagens se reproduzem no corpo do presente articulado e aqui se fazem remissão, das quais resultam que a empreiteira ora Recorrente sempre entregou autos de medição para obter os pagamentos dos seus trabalhos da parte dos Recorridos, não ficando à espera de terminar fases de trabalhos; 17. Esse testemunho foi completamente desconsiderado pelo Tribunal a quo, sem fundamentação bastante; 18. Violando-se, assim, os princípios aplicáveis, de boa fundamentação; 19. A 31 de Julho de 2017, deveria ter ocorrido pagamento por parte dos Recorridos, de parte da obra, à Recorrente, conforma resulta da cláusula 4.ª, alínea 4.2, ponto 4) do contrato de empreitada; 20. A falta de pagamento, pelos Recorridos, justifica a excepção de não cumprimento do contrato invocada pela Recorrente, referente a falta de pagamentos da parte dos Recorridos; 21. Pese embora o reconhecimento da soberania das partes no estabelecimento da cláusula penal, o nosso ordenamento jurídico permite possíveis abusos, a redução de cláusula penal, em termos de equidade, conforme o art.º 812.º do Código Civil; 22. É manifestamente excessivo a perda da Recorrente de todos os créditos que tiver pendentes contra os Recorridos; 23. Tal acarreta um enriquecimento desmesurado e desproporcional dos Recorridos à custa da Recorrente; 24. O valor da cláusula pena não poderá exceder o da obrigação principal, sob pena de se tornar fonte de enriquecimento sem causa (art.º 811.º do Código Civil); 25. O valor da obrigação principal dos Recorridos perante a Recorrente era o valor das facturas emitidas pela Recorrente, correspondentes à obrigação principal de pagamento; 26. Por tal motivo, o teor da cláusula penal aplicada pelo Tribunal a quo, correspondente ao art.º 28.º, n.º 2 do caderno de encargos, é manifestamente excessivo e/ou ilegal; 27. Constitui, ademais, uma onerosidade excessiva a um dos contratantes com manifesto enriquecimento indevido da outra parte; 28. Em nenhuma fase do processo e nem na própria audiência de julgamento, os Recorridos alegaram e invocaram a aplicação do art.º 28.º do caderno de encargos; 29. Nos termos do art.º 639.º, n.º 2, alínea c) e 640.º, alínea a), ambos do Código de Processo Civil, existiu erro na determinação da norma aplicável; 30. Deveria ter sido aplicada a cláusula penal prevista no contrato de empreitada, nomeadamente, a cláusula 9.ª do contrato de empreitada, que fixa o regime em caso de incumprimento, pela Recorrente, do prazo de...

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