Acórdão nº 6261/19.4T8ALM-A.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Julho de 2021

Magistrado ResponsávelFÁTIMA GOMES
Data da Resolução06 de Julho de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – Relatório 1. AA e BB vieram, por apenso aos presentes autos, deduzir oposição à execução, suscitando a questão da inexigibilidade do pagamento da quantia exequenda por prescrição.

Pugnaram pela procedência da oposição e consequente extinção da execução.

2.

O exequente respondeu defendendo a improcedência da oposição.

3.

O tribunal julgou improcedente a oposição (“Por tudo o exposto, julgo a presente oposição à execução improcedente.).

Os embargantes interpuseram recurso de apelação, conhecido pelo Tribunal da Relação de Lisboa e que deu provimento ao recurso, decidindo: “Pelo exposto, acordamos em julgar procedente o recurso, e, consequentemente, em revogar a decisão recorrida que substituímos por outra que julga procedente a excepção de prescrição e consequentemente os embargos com extinção da execução.” 4.

Inconformado o exequente, NOVO BANCO, S.A., veio interpor recurso de REVISTA EXCECIONAL para o Supremo Tribunal de Justiça, apresentando as competentes ALEGAÇÕES.

Nas conclusões da revista diz (transcrição): “1 - No acórdão recorrido considerou-se que a obrigação assumida contratualmente pelas partes no contrato de crédito se subsume à previsão do regime jurídico previsto pelo artigo 310.º, alínea e) do Código Civil, ou seja, abrangida pelo prazo prescricional de cinco anos.

2 - Os acórdãos fundamento aderem ao entendimento segundo o qual, após o incumprimento do contrato e o vencimento imediato das restantes prestações, o valor de capital fica sujeito ao prazo de ordinário de prescrição de vinte anos.

3 - Os acórdãos em causa foram proferidos no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito.

4 - O acórdão recorrido considerou que: (…) No caso sujeito discute-se no essencial se o prazo prescricional é de 5 anos ex artigo 310.º, e) CC, como pretendem os recorrentes, ou se é o prazo ordinário de 20 anos ex artigo 309.º como sustenta o banco. (…) Tratando-se de uma obrigação unitária, em que o pagamento do capital tem lugar ao mesmo tempo que o pagamento dos juros vencidos, aplica-se-lhe o prazo quinquenal de prescrição.

Concluímos, pois, que tendo podido o recorrido reclamar o seu crédito desde 21.06.2003 – cfr.

artigo 306.º CC – o prazo quinquenal já se encontrava esgotado quando em 11.09.2019 a execução deu entrada em juízo”.

5 - Contudo, os acórdãos fundamento julgaram a mesma questão de direito em sentido totalmente contraditório, tendo considerado que: “O vencimento imediato das prestações restantes imposto pelo artigo 781.º do Código Civil, tornando o capital imediatamente exigível e assim fazendo cessar o regime de pagamentos conjuntos de capital e juros que justificava o prazo curto de prescrição a que se refere o artigo 310.º, alínea e), implica que a dívida de capital fique sujeita, apenas, ao prazo ordinário de prescrição de 20 anos.” - Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 16-04-2018, Processo n.º 2483/15.5T8ENT-A.E1.

“Mas se em caso de incumprimento, o mutuante considerar vencidas todas as prestações, ficando sem efeito o plano de pagamento acordado, os valores em divida voltam a assumir em pleno a sua natureza original de capital e de juros, ficando o capital sujeito ao prazo ordinário de 20 anos.” - Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 16-03-2017, Processo n.º 589/15.0T8VNF-A.G1.

“O vencimento imediato das prestações restantes, significa que o plano de pagamento escalonado anteriormente acordado deixa de estar em vigor, ocorrendo uma perda do benefício do prazo de pagamento contido em cada uma das prestações: desfeito o plano de amortização da dívida inicialmente acordado, os valores em dívida voltam a assumir a sua natureza original de capital e de juros.

Desfeita a ligação anteriormente contida em cada uma das prestações entre uma parcela de capital e outra a título de juros, nenhuma razão subsiste para sujeitar a dívida de capital e a dívida de juros ao mesmo prazo prescricional: os juros que se forem vencendo prescreverão no prazo de cinco anos, e o capital, no valor de 10.329,75 €, encontrar-se-á sujeito ao prazo ordinário de prescrição de 20 anos.” - Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 26-04-2016, Processo n.º 525/14.0TBMGR-AC1.

6 - No caso dos presentes autos, estamos perante um contrato denominado “Crédito ao Consumo”, entregando o Exequente uma quantia pecuniária aos Executados, que estes se comprometeram a devolver, acrescida da respetiva remuneração, em 60 prestações, mensais e sucessivas, de capital e juros, prestações essas que correspondem ao fracionamento da obrigação da restituição do capital mutuado e compreendem parte do capital e respetivos juros remuneratórios (artigo 1145.º do Código Civil).

7 - Relativamente ao contrato, estamos na presença de uma única obrigação (i.e.

a de pagamento junto do Exequente do valor acordado decorrente da concessão de um mútuo) que resulta da celebração do contrato de crédito ao consumo, embora passível de ser fracionada e diferida no tempo, não podendo ser equiparada a uma prestação periódica, renovável e cuja constituição depende do decurso do tempo.

8 - A obrigação dos Executados – ou seja, o pagamento do valor fixado no contrato de mútuo celebrado – seria cumprida em prestações mensais e sucessivas, mas previamente fixadas, tratando-se assim claramente de prestações repartidas.

9 – Ora, a dívida dos Executados decorre de contrato de mútuo celebrado em 21.03.2000 com o aqui Exequente, sendo que a última prestação foi paga em 21.06.2003 ou seja 30 meses após a celebração do mesmo e o contrato previa a duração de 60 meses.

10 - O contrato de mútuo veio a ser incumprido, e por esse motivo o Exequente interpelou efetivamente os Executados denunciando o contrato a 30 de Maio de 2019, que não colocaram em causa a sua situação de devedores, convertendo a mora em incumprimento definitivo.

11 - A carta de cessação do contrato determina que não são as prestações vincendas da obrigação resolvida que se vencem, mas sim a obrigação de restituir o valor no seu todo.

12 - Assim, o plano de pagamento dos contratos de empréstimo em prestações mensais e sucessivas acordado deixou de estar em vigor, ocorrendo uma perda do benefício do prazo de pagamento contido em cada uma das prestações, cessando o plano de amortização da dívida inicialmente acordado, e tendo os valores em dívida voltado a assumir a sua natureza original de capital e de juros.

13 - Sendo certo que estamos perante uma única obrigação, i.e.

a de pagamento junto do Exequente do capital em dívida decorrente do contrato de empréstimo denunciado, o qual, salvo melhor opinião, não poderá estar sujeito ao prazo prescricional de 5 anos.

14 - O crédito que o Exequente veio exigir não é relativo a qualquer quota de amortização ou a quaisquer outras prestações periodicamente renováveis, mas apenas e só o capital em dívida e os juros de mora a ele associados, decorrente do vencimento das prestações por força do disposto no artigo 781.º do Código Civil, não sendo por isso enquadrável esta obrigação na al. e) do artigo 310.º do Código Civil 15 - Mais se diga que o capital peticionado não abrange juros remuneratórios nem corresponde à soma das prestações que ficaram por liquidar mas apenas à totalidade do capital em dívida após afetação das prestações recebidas.

16 - Com o devido respeito, estamos perante posições antagónicas, entre o acórdão recorrido e os acórdãos fundamento – a defesa da aplicação de diferentes prazos de prescrição aos contratos de crédito.

17 - Verifica-se assim uma total contradição entre os referidos acórdãos, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, que carece de apreciação.

18 - Considerando, assim, a Exequente que se impõe a revogação da douta decisão e a sua substituição por outra que considere a aplicação do prazo de prescrição de vinte anos ao valor de capital peticionado.

Assim decidindo, Venerandos Conselheiros, uma vez mais se fará a já costumada e esperada JUSTIÇA!” 5.

Foram oferecidas contra-alegações, com as seguintes conclusões (transcrição): “i. No contrato de crédito ao consumo ficou estipulado que o Reembolso seria em prestações MENSAIS iguais e sucessivas de capital e juros, podendo a primeira prestação ser de valor diferente; ii. O dito contrato foi outorgado em 20-03-2000; iii. O prazo prescricional de 5 anos é aplicável “sempre que se tenha estipulado o pagamento do capital em prestações, com os juros”; iv. Segundo Ana Filipa Morais Antunes, “Na situação prevista na alínea e), não está em causa uma única obrigação pecuniária emergente de um contrato de financiamento, ainda que com pagamento diferido no tempo, a que caberia aplicar o prazo ordinário de prescrição, de vinte anos, mas sim, diversamente, uma hipótese distinta, resultante do acordo entre credor e devedor e cristalizado num plano de amortização do capital e dos juros correspondentes, que sendo composto por diversas prestações periódicas, impõe a aplicação de um prazo especial de prescrição, de curta duração. O referido plano obedece a um propósito de agilização do reembolso do crédito, facilitando a respectiva liquidação em prestações autónomas, de montante mais reduzido”...

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