Acórdão nº 1130/18.8T8FNC.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Novembro de 2019
Magistrado Responsável | CHAMBEL MOURISCO |
Data da Resolução | 06 de Novembro de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I Relatório: 1. AA, por requerimento apresentado em 1 de março de 2018, impugnou judicialmente a regularidade e licitude do seu despedimento efetuado por BB, S.A.
, em 22 de fevereiro de 2018.
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Realizada a audiência de partes e não tendo havido conciliação foi ordenada a notificação da empregadora para apresentar o articulado a motivar o despedimento e o processo disciplinar, o que fez.
Em síntese, alegou, no que ora releva, que no início do ano de 2017 o grupo CC «adquiriu a sociedade DD, SA» e nela o autor exercia funções de Diretor ..., que havia sido contratado no dia 15 de agosto de 2016, conforme contrato de trabalho que diz anexar (o que não ocorreu) juntamente com a demais documentação relativa ao procedimento disciplinar. Alegou também que, em novembro de 2017, o autor adotou os comportamentos que relata no articulado e que, na sua ótica, constituem justa causa do despedimento disciplinar a que procedeu, o que deve ser declarado.
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O autor apresentou articulado com contestação e pedido reconvencional, tendo impugnado parte dos factos alegados pela ré e alegado, em resumo, que os motivos invocados para o despedimento devem ser considerados improcedentes e o despedimento declarado ilícito.
Alegou também, relativamente ao contrato de trabalho que o vinculava à ré, que em agosto de 2017 «a Ré fez um aditamento ao contrato a termo do Autor, para renovar o contrato por mais 12 meses, mas com uma cláusula em que o Autor consentiria na deslocação do seu local de trabalho para qualquer hotel do Grupo na Europa», o que não aceitou, respondendo-lhe o Diretor da ré que ia tomar providências para o dispensar dos serviços dentro de 30 dias.
Terminou formulando o seguinte pedido: «A) Ser declarada a ilicitude do despedimento do Autor; B) Ser condenada a Ré a reintegrar o Autor, sem prejuízo da sua categoria profissional e antiguidade ou no pagamento da indemnização em substituição; C) Ser condenada a Ré a pagar ao Autor as retribuições que deixou de auferir desde a data de despedimento até ao trânsito em julgado da sentença, sem prejuízo do disposto no art.º 98º-N, nºs 1 a 3, do Código de Processo do Trabalho; D) Ser a Ré condenada a pagar uma indemnização por danos não patrimoniais e patrimoniais ao Autor em montante não inferior a EUR 24.000,00 (…)».
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A ré respondeu à contestação-reconvenção deduzida pelo autor, impugnando todos os documentos apresentados pelo autor não traduzidos em língua portuguesa e requerendo, a final, fosse mantido todo o anteriormente peticionado.
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Realizada a audiência de julgamento foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo: «Nestes termos, tudo visto e ponderado, julgo a ação parcialmente procedente por provada e, consequentemente, declaro: a) A ilicitude do despedimento do Trabalhador pelo empregador e, em consequência, condeno o empregador: b) A pagar ao Trabalhador as retribuições vencidas desde 22.02.2018 até ao trânsito em julgado da presente decisão, tendo-se em consideração o valor de retribuição mensal de EUR 4 003,71; c) A reintegrar o Trabalhador na sua categoria e antiguidade; d) No mais, vai o empregador absolvido.
Custas por ambas as partes na respetiva proporção.
Valor: EUR 52 000 (atento o valor da condenação e pedido indemnizatório).» 6. Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação.
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O Tribunal da Relação do Lisboa, conhecendo do recurso por acórdão datado de 27 de março de 2019, decidiu nos seguintes termos: «Em face do exposto: 7.1 Determina-se o desentranhamento e entrega ao recorrente dos documentos juntos com as alegações da apelação a fls. 186-189, condenando a recorrente na multa de 2 UC’s; 7.2. Adita-se à decisão de facto o ponto 27-A. acima enunciado; 7.3. Altera-se o ponto 39 da decisão de facto nos termos sobreditos; 7.4. Nega-se provimento ao recurso, mantendo a decisão final da 1.ª instância.» 8. Novamente inconformada, a ré interpôs o presente recurso de revista, em que alinha as conclusões seguintes: 1. O presente recurso de revista vem interposto do douto acórdão que determinou o desentranhamento e entrega ao Recorrente do documento junto com as alegações da apelação de fls. 186-189, e negou provimento ao recurso de apelação, mantendo a decisão final da 1.ª instância, que condenou a Recorrente a pagar ao Recorrido as retribuições vencidas desde 22 de Fevereiro de 2018 até ao seu trânsito em julgado, tendo-se em consideração o valor de retribuição mensal de EUR 4 003,71, e a reintegrar o Recorrido na sua categoria e antiguidade, doravante designado por douto acórdão recorrido.
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Embora o douto acórdão recorrido tenha negado provimento ao recurso de apelação e mantido a decisão final da 1.ª instância, que condenou a Recorrente a pagar ao Recorrido as retribuições vencidas desde 22 de fevereiro de 2018 até ao seu trânsito em julgado, tendo-se em consideração o valor de retribuição mensal de EUR 4.003,71, e a reintegrar o Recorrido na sua categoria e antiguidade, o certo é que a questão do documento junto com as alegações do recurso de apelação de fls. 186-189 e a questão da aplicação do regime estabelecido no 393.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), do Código do Trabalho, suscitadas no presente recurso de revista, constituem temas novos (as questões foram somente submetidas a apreciação no recurso de apelação), pelo que o presente recurso de revista é, quanto a eles, admissível; 3. Embora no artigo 6.º, do articulado motivador do despedimento do Recorrido, o então Mandatário do Recorrente refira expressamente que anexa o contrato de trabalho celebrado pelo Recorrido com a Recorrente no dia 15 de agosto de 2016, o mesmo não foi anexado ao articulado motivador do despedimento do Recorrido pelo então Mandatário do Recorrente, por motivos que o Recorrente desconhece; 4. O então Mandatário da Recorrente estava absolutamente convencido de que tinha anexado ao articulado motivador do despedimento do Recorrido, o contrato de trabalho celebrado pelo Recorrido com a Recorrente no dia 15 de agosto de 2016, tal como refere expressamente no artigo 6.º, do articulado motivador do despedimento do Recorrido, pois, não requereu, posteriormente, a junção do mesmo aos autos.
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Na contestação, o Recorrido não suscitou a questão da falta de anexação do «contrato de trabalho que se anexa» referido no artigo 6.º, do articulado motivador do despedimento do Recorrido, admitindo, no artigo 1.º, da contestação, que «É verdade que o Autor foi contratado pela Ré a 15 de agosto de 2016 para exercer as funções de Diretor ..., auferindo à data do despedimento a retribuição base de EUR 4 003,71 (cf. doc.1)»; 6. Nos artigos 38.º e 41.º, da contestação, o Recorrido refere-se expressamente ao contrato de trabalho a termo certo celebrado com a Recorrente no dia 15 de agosto de 2016, e até juntou aos autos uma cópia do aditamento ao contrato de trabalho a termo certo celebrado com a Recorrente no dia 15 de agosto de 2016, como doc. n.º 10.
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Na contestação, o Recorrido, em momento algum, alegou que o seu contrato de trabalho a termo certo celebrado no dia 15 de agosto de 2016 se considerava sem termo, nos termos do disposto no artigo 147.º, n.º 1, do Código do Trabalho, ou que o seu contrato de trabalho a termo certo celebrado no dia 15 de agosto de 2016 se havia convertido em contrato de trabalho sem termo em data anterior à do seu despedimento, nos termos do disposto no artigo 147.º, n.º 2, do Código do Trabalho.
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Na contestação, o Recorrido, em momento algum faz qualquer referência aos artigos 390.º e 391.º, do Código do Trabalho, sendo certo que, atenta a data de instauração da presente ação (01 de março de 2018), a data de início da Audiência de Julgamento da presente ação (28 de maio de 2018) e a data de termo do contrato a termo certo do Recorrente (14 de agosto de 2018), é por demais evidente que todos os pedidos formulados pelo Recorrido na contestação tinham perfeita sustentação no artigo 393.º, n.º 2, do Código do Trabalho; 9. Quer a contratação seja sem termo, quer seja a termo, o empregador apenas se pode opor à reintegração do trabalhador com base no artigo 392.º do Código do Trabalho, pelo que a Recorrente apenas se poderia ter oposto à reintegração do Recorrido nos termos do artigo 392.º do Código do Trabalho; 10. Embora o então Mandatário do Recorrente tivesse referido expressamente no artigo 6.º, do articulado motivador do despedimento do Recorrido, que anexava o contrato de trabalho celebrado pelo Recorrido com a Recorrente no dia 15 de agosto de 2016, não tendo o mesmo sido anexado ao articulado motivador do despedimento do Recorrido pelo então Mandatário do Recorrente, o Tribunal de 1.ª instância nunca notificou o então Mandatário do Recorrente para proceder à referida junção.
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Neste enquadramento, é por demais evidente que, para a Recorrente (e para o Recorrido), era um facto assente que o Recorrido se encontrava vinculado à Recorrente mediante contrato de trabalho a termo certo celebrado no dia 15 de agosto de 2016, pelo prazo de 12 meses, e renovado automaticamente por igual período, ou seja, pelo prazo de 12 meses.
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A decisão final da 1.ª instância que condenou a Recorrente a pagar ao Recorrido as retribuições vencidas desde a data do seu despedimento (22 de fevereiro de 2018) até ao seu trânsito em julgado, e a reintegrar o Recorrido na sua categoria e antiguidade, como se o Recorrido, à data do seu despedimento (22 de fevereiro de 2018) se encontrasse vinculado à Recorrente mediante contrato de trabalho sem termo, é uma novidade da questão decisória justificativa da junção do documento junto com as alegações do recurso de apelação de fls. 186-189 (contrato de trabalho a termo certo celebrado pelo Recorrido com a Recorrente no dia 15 de agosto de 2016) com o recurso, como questão operante (apta a modificar o julgamento) só revelada pela decisão recorrida, pois, a mesma funda-se em regra de direito com cuja aplicação ou interpretação as partes não contavam.
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