Acórdão nº 861/18.7FAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelJOSÉ AMARAL
Data da Resolução06 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO Os autores J. C.

e esposa M. S.

instauraram, em 12-09-2018, no Tribunal de Fafe, acção declarativa, em forma de processo comum, contra os réus A. C.

e esposa M. F.

.

Foi este o pedido que formularam: “…serem os Réus condenados a:

  1. Reconhecer o direito de propriedade dos Autores e absterem-se de o violar; b) Demolir todas as obras e aberturas por eles efetuadas na propriedade dos Autores, colocando-a na situação em que se encontrava anteriormente; c) Pagar aos Autores uma indemnização, a liquidar em execução de sentença, pelo facto de, abusivamente, terem invadido a sua propriedade.

  2. Pagar as custas legais, procuradoria condigna e demais encargos com o processo.” Para o fundamentar, alegaram – e alegaram apenas –, na petição, de essencial, que são donos de certo prédio rústico que identificaram pelo nome, composição, área, confrontações, matriz e registo, “conforme” certidões destas, e que os réus são donos de outro, que referiram da mesma maneira e por reporte à certidão do registo predial. Este confronta de norte com aquele.

    No prédio dos réus, construíram estes diversas “infraestruturas, nomeadamente dois pavilhões industriais.” Nessa altura e “no seguimento da edificação dos mesmos, foram colocadas ventoinhas, tubos para esvaziamento de águas pluviais e residuais, sempre em desrespeito pelas distâncias legalmente exigidas” e “sem autorização” dos autores. Além disso, cavaram uma vala no terreno destes, para escoamento das águas pluviais, também “sem, autorização”.

    Mais tarde, foram abertas janelas e uma porta de acesso, também sem o seu “consentimento”, em “abuso e afronta” do seu direito.

    Após uma queixa à Câmara, foi colocada uma “vedação em arame em toda a extensão dos pavilhões em questão, com uma apropriação indevida e ilegal, de 1,5 m do terreno dos Autores, impedindo-os de aceder a essa parte do seu terreno”.

    As descritas infraestruturas “foram construídas no limite dos terrenos dos Autores e Réus”. O revestimento da parede exterior de um pavilhão ocupa 15 cm do seu terreno em parte da sua extensão e a vedação ocupa o citado 1,5 em toda a extensão do terreno.

    Tais obras violam “elementares preceitos constitucionais” e de “direito administrativo e do urbanismo” e especialmente o direito de propriedade dos autores, principalmente a vedação. Aliás, são actos de “esbulho”. Trata-se de “violência sobre as coisas” que impede os autores de usufruir do “terreno sua pertença”, e que, assim “causaram e causam danos na propriedade”.

    Juntaram fotos e documentos.

    Em contestação, os réus defenderam-se por impugnação de parte da factualidade alegada, negaram qualquer ocupação, confirmaram que implantaram a vedação mas “numa área de terreno que é sua” e de acordo com a planta do loteamento feito no seu prédio, acrescentando que in loco pode-se verificar que as sapatas dos muros que executaram estão enterradas na área de terreno a que se referem os autores, isto há mais de 20 anos, sem que estes algo questionassem.

    Juntaram um documento, que os autores impugnaram.

    Foi dispensada a audiência prévia, fixado o valor da causa, saneados tabelarmente os autos, identificado o objecto do litígio (“a pretensão dos autores em ver reconhecido o direito sobre o prédio” e a “pretensão de ver demolidas as construções”), enunciados os temas da prova, apreciados os requerimentos probatórios e designando data para a audiência final.

    Esta realizou-se nos termos e com as formalidades narradas nas respectivas actas, no seu decurso tendo sido tomadas declarações do autor e tomado depoimento do réu (bem como declarações de parte), ouvidas testemunhas, efectuando-se inspecção ao local.

    Por sentença de 22-10-2019, foi decidido: “Nestes termos, julgo a ação parcialmente procedente, por parcialmente provada, e em consequência:

  3. Reconheço o direito de propriedade dos Autores sobre o prédio rústico mencionado em 1) da factualidade provada e condeno os Réus a absterem-se de violá-lo.

  4. Condeno os Réus a demolirem a vala cavada para além da vedação existente, do lado do prédio dos Autores.

  5. Absolvo os Réus do demais peticionado.

    Atento o decaimento de ambas as partes, as custas em dívida serão devidas na proporção de 1/5 pelos Réus e 4/5 pelos Autores – cfr. art. 527º do CPC.

    Notifique. ”.

    Insatisfeitos, os autores apelaram a que esta Relação revogue a sentença e condene em conformidade com o recurso, tendo apresentado como conclusões: “1 – Os Recorrentes não concordam essencialmente com a resposta dada às alíneas a), b), c), d), e) e f) dos factos não provados da p.i., cuja reapreciação pelo presente recurso se requer.

    2 - A convicção do Tribunal “a quo”, relativamente ao julgamento da matéria de facto, ...u na posição assumida pelas partes nos respectivos articulados, no teor dos documentos juntos aos autos, na inspecção ao local realizada, nos depoimentos e declarações de parte prestados e na inquirição das testemunhas na audiência final, sendo que os elementos instrutórios foram apreciados conjuntamente segundo as regras do ónus da prova e as regras da experiência.

    3 – Na óptica do Tribunal Recorrido a grande questão de facto em causa nos presentes autos respeita não à titularidade dos prédios e realização das obras invocadas, mas sim à delimitação dos prédios de Autores e Réus e inerente construção, ou não, das obras realizadas no terreno de uns e outros.

    4 – Foi com base nesta premissa, que os Recorrentes partiram para a presente demanda, esgotados que foram todos os esforços extrajudiciais.

    5 - As Fotografias junto aos autos, o Ofício do Município ... datado de 13/05/2019, a Caderneta Predial do prédio propriedade dos A.A., as queixas apresentadas na Câmara Municipal ..., as cartas enviadas aos Recorridos conjugados com os depoimentos prestados pelas testemunhas M. A., J. L., J. F., A. R. E M. V., C. J. E J. P.

    , impunham uma decisão diversa sobre as alíneas a), b), c), d), e) e f) dos factos não provados da P.I.

    6 - O MMº Juiz “a quo” na fundamentação da decisão sobre matéria de facto constante dos mencionados pontos, para além de não ter tido em consideração e por isso não ter valorado devidamente estes depoimentos, não fez uma correcta interpretação da referida prova documental.

    7 - A conjugação destes depoimentos com a referida prova documental, assume particular importância para a reapreciação e alteração da matéria de facto constante das alíneas a), b), c), d), e) e f), impondo decisão diversa sobre os mencionados pontos da matéria de facto.

    8 – O MMº Juiz “a quo” na livre apreciação que fez da prova, utilizou dualidade de critérios.

    9 - Todas as testemunhas inquiridas foram consentâneas, quanto à existência dum antigo muro que delimitava as propriedades de Recorridos e Recorrentes.

    10 - Muro esse que foi sendo destruído ao longo dos anos, dando lugar a novas edificações, existindo apenas resquícios das extremidades do mesmo.

    11 - No local em discussão nos presentes autos, os resquícios desse muro estão a uma distância tal uns dos outros, que não permitem, a olho nu, concluir por onde o mesmo seguiria e se implantaria.

    12 - À parte este ponto de convergência, a prova testemunhal separou-se, naturalmente, em duas versões contraditórias.

    13 - As testemunhas dos Recorrentes declararam que, o mencionado muro delimitava as propriedades por uma linha que hoje corresponde à parede das traseiras do pavilhão industrial construído no prédio dos Recorridos.

    14 - O antigo muro, ou melhor os resquícios do mesmo, são a pedra basilar para o desfecho da presente lide.

    15 - Todas as testemunhas basearam as conclusões a que chegaram para a tomada de posição quanto a quem pertencia a faixa de terreno em causa, na existência do antigo muro e mormente na existência dos seus resquícios.

    16 – O antigo muro, separava e separa duas freguesias, do concelho de Fafe, Ribeiros e ..., onde se encontram os prédios em análise.

    17 - Do lado da freguesia de Ribeiros situa-se o prédio dos Recorrentes e do lado de ..., o prédio dos Recorridos.

    18 – Os Recorrentes sempre mantiveram boas relações de vizinhança com todos os seus confrontantes, fazendo com os mesmos inclusive, cedências mútuas de faixas de terreno.

    19 – Tal realidade resulta do depoimento prestado pela testemunha J. L.

    e das quatro fotografias ampliadas do local ora juntas ao abrigo do disposto no artigo 423.º do Código de Processo Civil. E, 20 – Da inspecção ao local.

    21 - O MMº Juiz “a quo” não valorou a existência dos resquícios do muro.

    22 - O Tribunal recorrido, desvalorizou por inteiro o depoimento das testemunhas M. A., J. L. e J. A..

    23 – Tais depoimentos assumem particular importância para o apuramento dos factos e consequente desfecho da presente lide.

    24 – O Tribunal “a quo” fez uma interpretação demasiado redutora e pejorativa da prova produzida pelas testemunhas dos Recorrentes e dos documentos que aqueles carrearam para os autos, com particular importância o Ofício, datado de 13/05/2019, emitido pelo Município ....

    25 – Na Fundamentação da douta Sentença objecto de recurso, o Tribunal recorrido, apenas valorou o depoimento das testemunhas A. C.

    , M. V., C. J.

    e J. P., todas arroladas pelos Requeridos e o documento junto por eles aos autos.

    26 - O tribunal recorrido, teve dois pesos e duas medidas na apreciação da prova.

    27 – Não há dúvidas que a vedação em arame colocada pelos Recorridos nas traseiras do seu pavilhão, ocupa uma área de 1,50 cm em toda a extensão do seu prédio.

    28 – O revestimento de parte da parede exterior traseira do referido pavilhão, invade também o terreno dos Recorrentes, em cerca de 15 cm, ao longo da sua extensão.

    29 – Tal ocupação/invasão impede os Recorrentes de utilizarem o seu prédio nas áreas delimitadas e invadidas pela vedação e revestimento ali referidos, na sua plenitude.

    30 – Tal realidade resulta do teor do já mencionado Ofício, datado de 13/05/2019, emitido pelo Município ..., sob a epígrafe: “Proposta de demolição de obra executada sem licença/Urbanização...

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