Acórdão nº 5416/18.3T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelVERA SOTTOMAYOR
Data da Resolução17 de Dezembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães APELANTE: X – CARGOS TRANSPORTES, S.A.

APELADO: J. S.

Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo do Trabalho de Vila Nova de Famalicão I – RELATÓRIO J. S.

, instaurou ação declarativa de condenação, emergente de contrato de trabalho, com processo comum contra X – CARGOS TRANSPORTES, S.A.

pedindo a condenação da Ré nos seguintes pagamentos: a) 22.836,00€ a título de retribuição nos termos da cláusula 47º do CCT; b) 20.966,40€, relativa a retribuição nos termos da cláusula 74º do CCT; e c) 5.076,00€ de prémio TIR, tudo acrescido de juros de mora a contar do vencimento de cada uma das prestações até efectivo e integral pagamento.

A Ré contestou, aceitando o contrato celebrado entre o Autor e a Transportes X, Lda., bem como a transmissão do contrato para si, negando ser devedora dos valores reclamados pelo autor. Por um lado, diz que não aceita os dias alegados como sendo de trabalho prestado em dia de descanso. E por outro lado, no que respeita à cláusula 74ª e ao prémio TIR alega que Autor e a Transportes X, Lda. acordaram que, independentemente da prestação de trabalho suplementar, o autor receberia todos os dias o valor de duas horas de trabalho suplementar e o prémio TIR, acordo que se manteve com a ré, sendo tais valores normalmente incluídos nos recibos de vencimento sob a forma de trabalho suplementar.

Subsidiariamente, invoca ainda o abuso de direito por parte do autor, já que a situação de processamento salarial do autor foi estabelecida com o acordo do autor.

O Autor apresentou resposta à contestação, mantendo a posição defendida na petição inicial.

Findos os articulados, foi proferido despacho saneador tabelar, com dispensa da fixação do objecto do processo e dos temas da prova.

Por fim, realizou-se a audiência de julgamento e foi proferida sentença, pelo Mmª. Juiz a quo, que terminou com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, julgo parcialmente procedente o pedido formulado e, consequentemente, I) Declaro nulo o acordo remuneratório descrito em H) a O) e Q) dos factos provados e, consequentemente, condeno a ré a pagar ao autor a quantia de 12.818,61€, a título de diferenças entre a cl. 74ª, prémio TIR e trabalho prestado em dia de descanso entre Janeiro de 2014 e Agosto de 2017, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, a contar da data do respectivo vencimento de cada uma das prestações até efectivo e integral pagamento (artigo 559.º, 804.º, 805.º e 806.º do Código Civil); e II) No mais, absolvo a ré do pedido.

Custas da acção na proporção do respectivo decaimento.

Notifique.” Inconformada com o assim decidido apelou a Ré formulando as seguintes conclusões: “I. Quanto a matéria de facto, o presente recurso visa apenas a alteração do facto julgado provado P), no sentido do aditamento, à lista de pagamentos mensais inclusa nesse facto, dos meses de dezembro de 2015 e dezembro de 2016.

  1. A douta sentença recorrida não contempla os referidos meses porque não foram juntos aos autos os recibos corretos relativos a esses meses; nos meses de dezembros, a Ré emite dois recibos (um para o subsídio de natal e outro para a retribuição mensal) e, ao reunir a documentação a juntar à presente ação, por lapso, incluiu os recibos relativos ao pagamento do subsídio de natal e não os outros, onde constam os valores que realmente interessam.

  2. O lapso – pelo qual a Ré e o mandatário se penitenciam – é notório e, tendo em vista a justa composição do litígio e aplicando o princípio da cooperação (art. 7.º do Código do Processo Civil), o dever de gestão processual (art. 27.º do Código do Processo do Trabalho) e o princípio do inquisitório (art. 411.º do Código do Processo Civil), deveria o tribunal recorrido ter convidado a Ré a suprir tão evidente falha probatória.

  3. Considerando que só agora se dá conta do lapso, apontado na fundamentação da decisão de facto da sentença recorrida, a Ré requer a junção dos dois recibos de vencimento nesta fase processual, atenta a circunstância de que, também como refere a sentença recorrida, os recibos de vencimento não terem sido objeto de impugnação por parte do Autor.

  4. Em face da junção dos documentos, o facto P) julgado provado deve passar a ter a seguinte redação: “P) No âmbito deste acordo, a ré pagou ao autor as seguintes quantias a título de cl. 74º, prémio TIR e trabalho prestado em dias de descanso: - Em 2014: Fevereiro: 737,51€, Março: 845,20€, Maio: 1.525€, Junho: 987,50€, Julho: 837,50€, Agosto: 1.487,50€, Setembro: 687,51€, Outubro: 924,98€, - Em 2015: Fevereiro: 824,99€, Março: 1.087,52€, Abril: 1.625€, Maio: 87,99€, Junho: 1.179,90€, Julho: 1.050,01€, Agosto: 1.087,50€, Setembro: 548,03€, Outubro: 587,49€, Novembro: 1.375,02€, Dezembro: 762,49€ - Em 2016: Janeiro: 1.162,51€ Fevereiro: 900€, Março: 899,99€, Abril: 974,99€, Maio: 850,01€, Junho: 408,50€, Julho: 1.123,81€, Agosto: 1.350,01€, Setembro: 58,51€, Outubro: 612,51€, Novembro: 1.320,98€, Dezembro: 844,32€, - Em 2017: Janeiro: 691,27€, Fevereiro: 1041,70€, Março: 1.066,24€, Abril: 578,14€, Maio: 677,79€, Junho: 1.291,18€, Julho: 621,62€, Agosto: 1.207,27€.

  5. Em face da alteração deste facto, impõe-se a alteração dos cálculos expressos na tabela da página 23 da sentença recorrida, conforme abaixo se demonstrará.

  6. Subsidiariamente, se não for admitida a junção dos referidos documentos nesta fase processual, deve a sentença ser revogada por omissão de ato essencial à descoberta da verdade e remetidos os autos ao tribunal de primeira instância, a fim de convidar a Ré à junção destes documentos e elaborar nova sentença que os tenha em consideração.

    Do Direito: VIII. Para cálculo do valor devido ao Autor por cada dia de trabalho em dia de descanso, a sentença recorrida toma como base para aplicação da cláusula 41.ª do CCT à data em vigor, não só a retribuição base e diuturnidades, mas também os complementos remuneratórios, como o previsto na cláusula 74.ª e o “prémio TIR” – o que viola o disposto no art. 262.º do Código do Trabalho.

  7. Salvo o devido respeito, não é procedente a invocação do disposto no art. 82.º da já revogada LCT no sentido de defender que, à data da celebração do CCT, aqueles complementos remuneratórios faziam parte do conceito de retribuição, porque o conceito de retribuição não deve ser confundido com o modo de cálculo dos complementos remuneratórios.

  8. Com efeito, o atual Código do Trabalho mantém uma norma muito semelhante à citada LCT (vd. art. 258.º do Código do Trabalho) e o tribunal reconhece que, à luz do atual Código, faria uma aplicação diferente.

  9. Como se pode ver, por exemplo, nos acórdãos do STJ, de 12.03.2009 e de 25.09.2002, supra citados, é perfeitamente compatível com o art. 82.º da LCT a interpretação segundo a qual os complementos remuneratórios não servem de base para cálculo uns dos outros.

  10. Assim, o conceito de “remuneração normal” previsto na cláusula 41.ª do CCT compreende apenas retribuição base e diuturnidades, devendo os cálculos ser corrigidos em conformidade com esta conclusão.

  11. Ainda quanto ao cálculo do valor por cada dia de trabalho em dia de descanso, a sentença recorrida viola o disposto na cláusula 41.ª do CCT à data em vigor, pois, soma o valor de um dia “normal” ao valor de 200%; mas, no termos do CCT, o valor a pagar por cada dia de trabalho prestado em dia de descanso é unicamente o valor de 200% do dia “normal”.

  12. Com efeito, a redação da cláusula 41.ª que vigorou durante todo o período em causa nos presentes autos foi a resultante da alteração publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 16, de 29 de abril de 1982 (acessível no seguinte link: http://bte.gep.msess.gov.pt/completos/1982/bte16_1982.pdf) onde consta uma explicação exemplificativa no seu § único que não deixa margem para dúvidas sobre a respetiva interpretação.

  13. Em face do que se alegou nas conclusões antecedentes, o valor de cada dia de trabalho prestado em dia de descanso é o seguinte: a) de janeiro a março de 2014: € 40,17; b) de abril a dezembro de 2014: € 40,86; c) de janeiro de 2015 a março de 2017: € 54,48; d) de abril de 2017 a agosto de 2017: € 55,40.

  14. Isto posto, fazendo-se novamente os cálculos em moldes semelhantes aos da sentença recorrida na respetiva página 23, conclui-se que, afinal o Autor auferiu um valor superior àquele que receberia segundo uma aplicação estrita do CCT então em vigor (vd. tabela no ponto II.3 das alegações).

  15. A sentença recorrida condena a Ré no pressuposto de que o acordo remuneratório descrito nos factos provados I), J), L), M), N) e O) é nulo, por não ser mais favorável ao trabalhador. No entanto, fazendo-se uma correta aplicação da cláusula 41.ª do CCT aplicável, é forçoso concluir em sentido contrário, pelo que o acordo ali descrito é, afinal válido.

  16. Subsidiariamente, para o caso de algum das conclusões acima aduzidas não ser julgada procedente e o cálculo a realizar continuar a indicar uma situação desfavorável para o Autor, então há ainda que ter em conta a forma como a sentença recorrida apurou o valor de € 12.819,61 em que condena a Ré (vd. tabela na página 23 da sentença recorrida).

  17. Aquele valor resulta de apenas se terem somado os valores negativos da coluna “Diferença entre o devido e o recebido”, simplesmente se desconsiderando os valores positivos (os valores positivos resultam de meses em que o Autor auferiu mais do que aquilo que lhe seria devido pela aplicação estrita do CCT).

  18. Salvo o devido respeito, não se compreende esta opção do tribunal recorrido, contrária à matemática, mas também ao disposto no art. 289.º do Código Civil, pois, nos termos desta norma, sendo um negócio jurídico nulo, deve ser restituído tudo o que no cumprimento do mesmo tenha sido prestado.

  19. Pelo exposto, se houver que condenar a Ré – o que apenas se admite como hipótese de raciocínio – o valor a pagar deve ser o que resulte da soma de todos os valores da coluna “Diferença entre o devido e o recebido”, incluindo valores negativos e positivos, e não...

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