Acórdão nº 100/18.0T8MLG-A.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelANA PAULA BOULAROT
Data da Resolução30 de Abril de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I MAPFRE – SEGUROS GERAIS, SA intentou ação com processo comum contra A, LDA, pedindo a sua condenação a pagar-lhe o valor total de € 31.684,90 que esta pagou no âmbito do contrato de seguro existente entre ambas, como consequência direta e necessária de um acidente causado por inobservância das normas de segurança e saúde no trabalho, da inteira responsabilidade da Ré, acrescido de juros de mora desde a data da respetiva citação e até efetivo e integral pagamento.

Alegou em suma, que, no âmbito de contrato de seguro de acidentes de trabalho celebrado com a Ré, em sede de ação especial emergente de acidente de trabalho, que correu termos pelos Juízo do Trabalho de Viana do Castelo (Juiz 1), liquidou a P, trabalhador desta, a quantia global de € 32.426,90, para efeitos de indemnização, em resultado de acidente de trabalho sofrido por aquele, sendo que tal acidente de trabalho se deveu à atuação omissiva da ré, que não deu cumprimento às normas de segurança no trabalho a que estava legalmente adstrita, mais concretamente por não ter dotado a máquina onde o trabalhador viria a sofrer o sinistro dos elementos de proteção adequados, destinados designadamente a impedir o contacto das mãos do respetivo operador com a zona dos rolos e do sem-fim, não providenciando ainda ao trabalhador um instrumento destinado a auxiliar a alimentação da máquina; conduta essa que se agravou pelo facto de a ré ter dado instruções para que, naquelas condições, auxiliassem a entrada da matéria-prima com as mãos e com o equipamento acionado. Deste modo, na medida em que o acidente laboral em causa se deveu à culpa única e exclusiva da ré segurada, a autora pretende exercer o direito de regresso contra a sua segurada, exigindo o reembolso dos montantes liquidados por conta do apontado contrato de seguro de acidente de trabalho em vigor entre as partes, no momento do sinistro A Ré contestou, deduzindo, desde logo, a exceção de caso julgado e, bem assim, da incompetência absoluta, em razão da matéria.

Para o efeito, no que se refere à exceção de caso julgado, invocou, em síntese, que o acidente de trabalho em apreço foi participado pela aqui Autora, junto dos serviços do Ministério Público do Tribunal do Trabalho de Viana do Castelo, dando conta que o sinistrado P, trabalhador da aqui Ré, no exercício das suas funções profissionais, colocou as mãos na tremonha da máquina, ficando com os dedos presos no rolo da máquina, sendo certo que o respetivo processo (n.º …), ficou findo na fase conciliatória, por acordo efetuado entre a aqui autora e o sinistrado, em que a autora aceitou o acidente participado como de trabalho, assim como o nexo de causalidade entre as lesões que o sinistrado apresenta e o acidente a que os autos se reportam, pelo que aceitou a transferência da responsabilidade da entidade patronal pelo salário de € 9.352,14, bem como a IPP de 20%.

Tal acordo veio a ser homologado por despacho judicial de 18 de Novembro de 2016, o qual transitou em julgado, constando do mesmo acordo a identificação completa dos intervenientes, a indicação precisa dos direitos e obrigações e dos factos que servem de fundamento aos referidos direitos e obrigações.

Sendo assim, a aqui autora não invocou naquele identificado processo qualquer fundamento para a sua descaraterização, que impusesse a intervenção da entidade empregadora, aqui ré, para assegurar a sua defesa no âmbito desse processo, pelo que o mesmo se tornou vinculativo e eficaz para a aqui autora, o que conduz à exceção de caso julgado material, que impede a autora de propor esta demanda com fundamento no mesmo acidente de trabalho.

No que se refere à exceção de incompetência em absoluta, em razão da matéria, do tribunal onde a presente ação foi instaurada, invoca a Ré que a causa de pedir na presente ação consiste na ocorrência de acidente de trabalho, por falta de observância pela ré das regras de segurança no trabalho, particularmente no que tange às características e funcionamento da máquina extrusora, onde o mesmo se verificou, pelo que, sendo esta matéria relativa a acidentes de trabalho e à inobservância de regras de segurança do trabalho, a sua apreciação é da competência específica dos tribunais de trabalho.

Invocou igualmente o abuso de direito por parte da Autora, na medida em que a autora ao propor esta ação contra a Ré, quando no processo próprio não suscitou qualquer questão que a pudesse envolver, consubstancia uma atitude insólita e imprevisível e de ostensiva má fé, o que consubstancia uma clara atuação de venire contra factum proprium.

No mais impugnou igualmente a factualidade alegada pela Autora, pugnando ainda pela condenação desta como litigante de má fé.

Em sede de audiência prévia foi proferido despacho saneador onde se conheceu das exceções da incompetência em razão da matéria e do caso julgado suscitadas pela Ré, julgando-as improcedentes.

Inconformada com o assim decidido, veio a Ré interpor recurso de Apelação o qual veio a ser julgado improcedente, com a confirmação do despacho recorrido.

Recorre agora a Ré de Revista, apresentando o seguinte acervo conclusivo: - A Ré/Recorrente na sua contestação deduziu a excepção da incompetência em razão da matéria, do Tribunal e a excepção do caso julgado, sendo que em sede audiência prévia realizada no dia 2/10/2018, foi proferido despacho saneador que julgou improcedentes a excepção da incompetência em razão da matéria, do tribunal e a excepção do caso julgado.

- Concretamente no tocante à excepção do caso julgado, sustenta o douto despacho saneador "Atento o exposto, julgo improcedente a excepção de caso julgado deduzida pela R.".

- A Ré Recorrente interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Guimarães do douto despacho que julgou improcedentes as excepções deduzidas pela R., nomeadamente a excepção do caso julgado, sendo que o douto Acórdão proferido em 10.01.2019, na respectiva delimitação do objecto do recurso, decidiu pelo não conhecimento da excepção do caso julgado, pelo facto de o despacho saneador recorrido não ter conhecido do mérito da causa, de modo a que o mesmo pudesse vir a ser objecto de recurso.

- O douto despacho saneador conheceu da excepção do caso julgado alegada pela Ré e pronunciou-se quanto à mesma, tendo decidido pela sua improcedência, pelo que, o douto Acórdão recorrido deve, como devia, ter conhecido, apreciado e decidido a excepção de caso julgado alegada pela Ré na sua contestação e apreciada e decidida no douto despacho saneador.

- O douto acórdão recorrido padece de nulidade, por não se ter pronunciado sobre questão que deveria apreciar, nos termos do disposto nos artigos 615°, n° 1, ai. d) do Cód. Proc. Civil, nulidade que se arguiu para os devidos e legais efeitos.

- Entende a recorrente que não compete aos Tribunais comuns, nomeadamente de competência cível ou genérica, conhecer da acção proposta por...

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