Acórdão nº 08P1129 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Maio de 2008

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA MENDES
Data da Resolução28 de Maio de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça No âmbito do processo comum com intervenção do tribunal colectivo n.º 24/07, do 4º Juízo da comarca de Ponta Delgada, AA, com os sinais dos autos, foi condenado como autor material de um crime continuado de violação, previsto e punível pelos artigos 30º, n.º 2, 164º, n.º 1 e 177º, n.º 4, do Código Penal, na pena de 7 anos e 6 meses de prisão.

O arguido interpôs recurso.

Na motivação apresentada formulou as seguintes conclusões: 1. No caso em apreço: - o comportamento do arguido não é acompanhado de qualquer outro fenómeno de criminalidade; - o comportamento desviante foi um acto praticado num contexto próprio e isolado; - o arguido é uma pessoa relativamente bem inserida socialmente (tem trabalho) e familiarmente está apoiado pelos irmãos.

  1. Além disso: - não obstante o arguido ter sido condenado por dois crimes referentes a factos de 1998 e 1999, não cometeu outros crimes até à presente data; - quanto a crimes de natureza sexual o arguido é primário.

  2. O Tribunal a quo, atendendo aos factos acima referidos, não poderia ter concluído que o arguido deveria ser punido de forma severa e não deveria ter aplicado, por isso, uma pena de prisão de 7 anos e 6 meses.

  3. O Tribunal deveria ter concluído que uma pena de prisão de 5 anos, suspensa por outros 5, realizava de forma adequada e suficientes as finalidades da punição.

Na contra-motivação apresentada o Magistrado do Ministério Público pugna pela improcedência do recurso, com o fundamento de que, a ser atendida a impugnação, estar-se-á a contribuir para a degradação do sentido reprovador das penas.

A Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer no qual se pronuncia no sentido da redução da pena para 6 anos de prisão, face ao grau de ilicitude do facto e ao grau de culpa. Mais entende que caso a pena venha a ser fixada em medida não superior a 5 anos de prisão, não deve ser objecto de suspensão na sua execução, por ausência dos pressupostos exigíveis.

O recorrente não respondeu.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

*** Única questão submetida à apreciação deste Supremo Tribunal é a da medida e espécie da pena, entendendo o recorrente que a pena deve ser reduzida para 5 anos de prisão com suspensão da sua execução.

Questão que oficiosamente se suscita é a da qualificação jurídica dos factos.

O tribunal colectivo considerou provados os seguintes factos (1) «BB nasceu a 26 de Fevereiro de 1996 (2) Até 30 de Dezembro de 2006, viveu em casa dos respectivos avós maternos, no nº ... da Rua do Espírito Santo do Bairro das Laranjeiras, ..., em Ponta Delgada, com a mãe e o padrasto.

Na mesma casa viviam AA e vários irmãos e sobrinhos que tem.

Este AA é tio materno de BB.

Depois de ter mudado de casa, BB continuou a recolher-se a casa dos avós, depois das aulas e ali era recolhida pela mãe, ao fim do dia, depois de largar o trabalho.

AA dispunha de um jogo electrónico no seu quarto (playstation), mas só à BB permitia que o jogasse.

BB passava a maior parte do seu tempo livre no quarto de AA e isso era tido pelos familiares como sinal de afeição e de paciência para com ela.

Em dia não determinado do final do primeiro período do ano lectivo de 2006/2007, AA entrou no quarto e desligou o aparelho em que a menor jogava, sentada na cama. Deu-lhe ordem para que se calasse, quando lhe passou a despir as calças e as cuecas e a fazê-la deitar-se na cama. De seguida, baixou as suas próprias calças, agarrou o pénis, dirigiu-o à vulva de BB e deitou-se sobre ela, ficando os dois sexos em contacto.

Com o pénis erecto e encostado ao órgão genital da menor fez pressão sobre ele, executou movimentos de avanço, de recuo e para os lados.

BB quis gritar, mas ele tapou-lhe a boca com uma das mãos, mandou que se calasse e garantiu-lhe que se fosse contar o acontecido a alguém, que diria à respectiva mãe que tinha sido ela a obrigá-lo a fazer o que fazia.

Cerca de duas semanas depois, BB brincava no quarto dele, sentada no chão, e ele entrou também, a dizer que queria falar com ela. BB levantou-se e, na ocasião AA baixou-lhe as calças e as cuecas, voltou a deitá-la na cama e a cobri-la com o seu corpo e repetiu os gestos já descritos.

Em dado momento BB disse-lhe que ia contar à mãe o que lhe fazia, com o que ele se susteve, mas repetindo a afirmação de que, se o fizesse, lhe diria que fora ela a obrigá-lo, com o que a mãe se zangaria com ela.

A partir daí, AA passou a mandar-lhe mensagens, pelo telefone, a dizer que gostava dela, que lhe oferecia o que quisesse, e outras com os dizeres: «dorme bem beijos», «se queres saber quando estou bem é só quando estou contigo», «estás a pensar em mim agora sinto-me só».

AA era homem de 33 anos de idade e operário da construção civil, tendo a envergadura de um homem comum.

Em ambas as situações, à força física de uma criança de 10 anos de idade, o arguido opôs a sua força e o seu volume de molde a que ela não pudesse afastar-se ou evitar a...

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