Acórdão nº 07P2077 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Outubro de 2007

Magistrado ResponsávelSANTOS CABRAL
Data da Resolução10 de Outubro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA, BB e CC vieram interpor recurso da decisão proferida nos presentes autos que entendeu ser inaplicável a exigência prevista na alínea b) do nº4 do artigo 105 do RGIT introduzida pela lei do Orçamento de Estado de 2007 em virtude de os impostos em causa no caso concreto resultarem de actividade inspectiva levada a cabo pela Direcção de Finanças competente.

As razões de discordância encontram-se expressas nas conclusões da respectiva motivação de recurso onde se refere que: I.Foram os arguidos, ora recorrentes, condenados pela prática do crime previsto e punido no artº 105° do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei n.º 15/200 I, de 5 de Junho, abreviadamente designado por RGIT. Ora, II.Sucede que em 1/01.2007 entrou em vigor a alteração da norma legal incriminadora dos factos apreciados nos autos, efectuada pelo art.º 95° da Lei nº 53-A/2006, de 29/12, razão pela qual, formularam os recorrentes requerimento no qual invocaram perante o Tribunal "a quo" a aplicação do novo enquadramento legal.

III.Aí alegaram que a conduta do infractor apenas deverá ser passível de sanção mediante a verificação cumulativa dos requisitos impostos pelo nº 4 do artº 105° do RGIT e que verificando-se uma verdadeira sucessão de leis penais, deverá ser trazido à colação o princípio da aplicação retroactiva da Lei Penal de conteúdo mais favorável a o arguido, consignada no artigo 29° da Constituição da República Portuguesa e no artigo r do Código Penal; IV. Defendendo os recorrentes que o novo requisito de punição conduz à despenalização da sua conduta, por não se verificarem todos os pressupostos de punibilidade estabelecidos.

V. Sobre este requerimento proferiu o Venerando Tribunal da Relação acórdão, do qual ora se recorre, no sentido de não ser aplicável, no caso, a exigência prevista na alínea b) do nº 4 do art.º 105° do RGIT, em virtude de os impostos em causa resultarem de actividade inspectiva levada a cabo pela Direcção de Finanças competente, improcedendo, nestes termos a pretensão formulada.

VI-.Contrariamente ao entendimento propugnado pelo Venerando Tribunal "o quo" sempre a alteração do art. 105° do RGIT introduzi da pela Lei n.º 53-A/2006, de 29/12, impunha decisão contrária e. consequentemente, a extinção do procedimento criminal por inobservância da nova condição de punibilidade.

VII.De facto, constam dos autos as declarações que o Venerando Tribunal considera erroneamente como estando em falta, as quais foram, todavia, apresentadas através dos modelos legais e que se encontram juntas aos autos.

VIII.Ora, se a nova redacção da disposição legal constante do art.º 105° do RGIT não exige que esta comunicação seja efectuada em determinado prazo, mas apenas que mesma seja realizada, ao decidir de forma diversa por não ter examinado os documentos constantes dos autos existe claramente erro notário na apreciação da prova que, nos termos do disposto na alínea c) do nº 2 do artº 410° aplicável por força do disposto no art. 434°, ambos do Código de Processo Penal, constitui matéria que pode ser conhecida e apreciada pelo Tribunal "ad quem".

IX. Sendo, desta forma, inequívoca a aplicação no caso "sub judicie" da nova condição de punibilidade, sempre deverá ser proferida decisão que considere extinto o procedimento criminal, pois, a alteração legislativa ocorrida introduziu uma nova condição de punibilidade. sendo exigível que, para que se verifique um crime de abuso de confiança fiscal, para além do decurso do prazo de 90 dias sobre o termo do prazo legal da entrega da prestação, exista o não pagamento na sequência da notificação ora legalmente imposta.

X.Com efeito, o princípio geral do direito penal é o do tempus regit actum,por força do qual. por via de regra, os factos devem ser apreciados de acordo com a lei que estava em vigor no momento da sua prática, todavia, tal princípio não tem aplicação absoluta, pois já serão retroactivamente aplicáveis as leis penais de conteúdo mais favorável ao arguido, conforme resulta claramente do artigo 29.°, n.º 4,2: parte da CRP.

XI. Deste modo, considerando que a alteração legislativa ocorrida é de conteúdo manifestamente favorável aos recorrentes, deverá verificar-se "in casu" o respeito do principio constitucional da aplicação retroactiva da lei penal mais favorável ao arguido, razão pela qual, no caso sub judice, só passará a haver uma conduta criminalmente censurável e susceptível de ser punida como tal - facto típico-ilícito, culpável e punível depois de verificado o não pagamento, XII.Para tal entendimento concorre também a definição do crime constante da alínea a) do nº 1 do art. 1 do Código de Processo Penal - como o conjunto de pressupostos de que depende a aplicação ao agente de uma pena ou de uma medida de segurança -, pois. a conduta do agente só é susceptível de vir a ser considerada crime depois do preenchimento da condição ora prevista na referida alínea do citado art. 105° do RGIT.

XIII.E isto não pode deixar de ser considerado como uma descriminalização ou despenalização devendo findar o processo, visto que, por força da alteração-lei mais favorável aos recorrentes - a conduta destes deixou de ser XIV.Pelo que deverá ser julgado extinto o procedimento criminal. sendo determinado o seu arquivamento, por inobservância da condição de punibilidade que impõe a existência de notificação para pagamento. e consequentemente por não existir qualquer conduta passível de ser considerada como crime.

Respondeu o Ministério Público advogando a manutenção da decisão recorrida.

Nesta instância o ExºMº Sr.Procurador Geral Adjunto pronunciou-se pela forma constante de fls.

Os autos tiveram os vistos legais.

* A compreensão do tema em debate pressupõe uma recopilação dos elementos constantes dos autos por forma a permitir uma...

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