Acórdão nº 436/07.6TBVRL.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Abril de 2014

Magistrado ResponsávelÁLVARO RODRIGUES
Data da Resolução03 de Abril de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: RELATÓRIO AA, por si e em representação dos seus filhos menores BB e CC, intentou a presente acção de condenação, emergente de acidente de viação, contra Companhia de Seguros DD, SA., todos com os melhores sinais dos autos, peticionando indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que para si advieram como consequência do falecimento do seu companheiro e pai dos seus filhos menores.

Peticiona assim as seguintes quantias: a) € 400 000,00 à A. AA, a título de alimentos; b) € 80 000,000 ao A. BB, sendo € 60 000,00 a título de alimentos e € 20 000,00 para ressarcimento de danos não patrimoniais sofridos pelo próprio com o decesso de seu pai; c) € 82 000,00 à A. CC, sendo € 62 000,00 a título de alimentos e € 20.000,00 para ressarcimento de danos não patrimoniais sofridos pela própria com o decesso de seu pai; d) € 60.000,00 aos AA. BB e CC, a título de ressarcimento pela perda do direito à vida de EE, seu pai.

Sustentava ainda que sobre tais quantias acrescessem juros de mora a partir da data do sinistro até efectivo e integral pagamento.

A fls. 263, a A. AA veio reduzir o pedido para a quantia de € 522 000,00, o que foi admitido por despacho de fls. 265.

Tendo os autos prosseguido para julgamento, com observância das legais formalidades, veio a ser proferida sentença que julgou os pedidos parcialmente procedentes e, em consequência, condenou a Ré a pagar as seguintes quantias: I. Ao Autor BB: 1. € 20 000,00 (vinte mil euros), a título de ressarcimento por danos não patrimoniais próprios decorrentes da morte de seu pai, EE, acrescida de juros de mora, à taxa de 4%, a contar da data da presente sentença até efectivo e integral pagamento; 2. € 38 500,00 (trinta e oito mil e quinhentos euros), acrescida de juros de mora, à taxa de 4%, a contar da citação até efectivo e integral pagamento, a título de ressarcimento por danos patrimoniais – perda de alimentos - decorrentes da morte de seu pai, EE; II. À Autora CC, € 40 000,00 (quarenta mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa de 4%, a contar da citação até efectivo e integral pagamento, a título de ressarcimento por danos patrimoniais – perda de alimentos - decorrentes da morte de seu pai, EE; III. Aos Autores BB e CC, na qualidade de herdeiros e na proporção dos respectivos quinhões, € 60 000,00 (sessenta mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa de 4%, a contar da citação até efectivo e integral pagamento, a título de ressarcimento pelo dano não patrimonial sofrido por seu pai, EE, consistente na perda da vida; IV. À Autora AA, a que se vier a fixar em incidente de liquidação posterior à presente sentença, resultante da dedução ao montante de € 215 000 (duzentos e quinze mil euros) das quantias pagas pela Ré a título de alimentos provisórios e em cumprimento da sentença proferida a fls. 37 do procedimento cautelar de arbitramento de indemnização provisória que constitui o apenso A ao presente processo, acrescida de juros de mora, à taxa de 4%, a contar da citação até efectivo e integral pagamento.

Inconformadas com esta decisão, dela vieram interpor recurso ambas as partes, sendo o principal, a Ré COMPANHIA DE SEGUROS DD, S.A, e o subordinado, a Autora AA, para o Tribunal da Relação do Porto, que, dando procedência parcial a ambos os recursos, proferiu a seguinte decisão: «No seguimento do anteriormente exposto, e na procedência parcial dos recursos principais e subordinando interpostos acordam os juízes na secção cível deste tribunal da Relação em alterar a sentença recorrida nos seguintes termos: I - No que concerne ao valor a pagar aos autores a título de indemnização por danos patrimoniais futuros, determinando a condenação da ré a pagar a esse título as seguintes quantias: À autora DD - €48.000,00 Ao autor BB - € 46.000,00 No que concerne à autora AA, fixando-se a indemnização devida a esse título em €120.000,00, condena-se a Ré seguradora a pagar o que vier a liquidar-se em execução de sentença depois de ser deduzido aquela quantia o valor respeitante às quantias pagas pela ré a título de alimentos provisórios e em cumprimento da sentença proferida no procedimento cautelar de arbitramento de indemnização provisória que constitui o apenso A ao presente processo.

Sobre os valores assim fixados são devidos juros de mora nos termos fixados na sentença recorrida, ou seja, a partir da citação, improcedendo nessa parte o recurso interposto pela ré seguradora; II – Alteram a sentença recorrida no que concerne à contagem dos juros de mora incidentes sobre os danos não patrimoniais do autor BB, determinando, na procedência parcial do recurso interposto por este autor, que os juros de mora fixados na sentença recorrida são devidos desde a citação, e não desde a sentença, como foi decidido; III – Em tudo o mais confirmam a sentença recorrida, improcedendo os recursos principais e subordinando na parte em que sustentavam a sua alteração.

Novamente inconformadas as mesmas vieram interpor recursos de Revista para este Supremo Tribunal de Justiça, tendo os Recorrentes/Autores AA e Outros, requerido julgamento ampliado de Revista, com vista à uniformização de jurisprudência.

As partes remataram as respectivas minutas recursórias, com as seguintes: CONCLUSÕES Dos Recorrentes /Autores, AA e Outros I- Dano não patrimonial próprio da CC 1 - O nascituro tem um direito próprio a ser indemnizado pelo facto de não ter podido conhecer o pai, ou de ter ficado prematuramente privado da sua companhia ao longo da vida, já que isso representa uma grande privação, que se traduzirá numa constante mágoa, dor ou sofrimento.

2 - Quando a lei prevê casos específicos em que reconhece direitos aos nascituros, não está a afastar, por exclusão de partes, a possibilidade de aplicação aos nascituros dos direitos que na lei surgem como próprios dos filhos. Como se diz no Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 2000.03.20, não há razão para criar distinções onde a lei não distingue.

Ubi lex non distinguit, necque nos distinguire licet

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3 - Acresce que o art. 26.° da Constituição, reconhecendo a todos o direito à identidade pessoal, não estaria a ser cumprido, se se interpretasse o artigo 496° do CC de uma forma discriminativa e limitativa, atribuindo o direito de indemnização por danos não patrimoniais aos filhos que já tenham nascido e não reconhecendo esse mesmo direito a quem esteja apenas concebido (nem que seja com um dia ou meras horas de diferença) ainda que comungando da mesma fonte de identidade ou genética da personalidade progenitora.

4 - Violaria, por outro lado, também, o direito constitucional da igualdade em que seriam colocados os descendentes no mesmo grau, do mesmo progenitor, relativamente ao enunciado direito, sendo certo que tanto um como outro provêm das mesmas pessoas e que a identidade física do filho nascido é a mesma do filho nascituro enquanto encerrado no ventre materno, e que se desenvolve ininterruptamente desde a concepção. De trazer à colação os artºs. 24.°, 25º e 13º da Constituição.

5 - Dado que a CC veio a ser reconhecida como filha da vítima, cabe-lhe, portanto, o direito próprio de ser indemnizada pela dor que ao longo da vida vai ter de sentir pela privação do pai que não chegou sequer a conhecer, indemnização essa que deve ser no montante de 20.000,00 €.

6 - O valor a arbitrar deve ser considerado à data da propositura da acção, vencendo juros desde a citação.

7 - Se se entender que o valor da indemnização pedido deve ser considerado à data a que vier a ser fixada, deverá computar-se em valores entre os 25.000,00€ a 30.000,00€, já que, atualmente, a jurisprudência tem atribuído tais valores - a título de exemplo, acórdãos: RE de 21-06-2011, proc° 192/09.3GTSTB.E1 - 30.000,006; RL de 24-01-2012, proc° Í026/07.9TBVFX.L1-1 - 30.000,006; STJ de 03.11.2010, proc° 55/06.4PTFAR.E1.SI -25.000,00€; STJ de 31-01-2012, proc° 75/05.7TBILH.C1.S1 - 25.000,006, todos em www.dgsi.pt.

II - Dos danos patrimoniais 8 - A Portaria 377/2008, de 26 de Junho, com as alterações posteriores não pode ser utilizada no caso concreto, porque o acidente ocorreu em 02.10.2006, tendo a ação sido interposta em 22.02.2007, - Ac. STJ de 13.09.2012, proc° 1026/07.9TBVFX.LI.SI, in www.dgsi.pt. Vide, ainda, Ac. STJ de 10.05.2012, proc° 9319/03.8TCLRS.L1.S1-2ª secção, www.stj.pt.

9 - Acresce que o critério fundamental para a determinação judicial das indemnizações, é fixado pelo Código Civil. A Portaria nº 377/2008, de 26 de Maio, com ou sem as alterações introduzidas pela Portaria nº 679/2009, de 25 de Junho, destina-se, expressamente, a um âmbito de aplicação extra-judicial. Acs. STJ de 07.02.2013, proc° 3557/07.ITVLSB.Ll.Sl;de 31.09.2012, proc° 1145/07.1TVLSB.L1.S1; de 31.01.2012, proc° 875/05.7TBILH.C1.Sl; de 01.06.2011, proc° 198/00.8GBCLD.L1.S1; de 21.04.2010, proc° 54/07.9PTOER.L1.S1, todos em www.dgsi.pt, entre muitos outros.

10 - Além da jurisprudência praticamente unânime, Prof. Menezes Cordeiro (Tratado do Direito Civil, Tomo III, Almedina, 2010, págs. 753 e 759), Mota Pinto (Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual Positivo, Coimbra Editora, Dez 2008, notas 1639 a 1641, págs. 568/571)- 11 - Se se considerar que o salário da inditosa vítima deve ser dividido em 3 partes iguais, para calcular a indemnização a título de danos patrimoniais aos AA., como fez a Relação do Porto, e dado os factos provados a propósito do salário auferido e do que a vítima gastaria consigo própria - pontos 14, 22, 26, 27, 28, 29, 30 e 31 dos factos provados constantes da sentença - a indemnização por danos patrimoniais deve ser de: - BB - 68.897,00 €; - DD - 71.767,71€; - A AA - 71.767,71€, nos primeiros 25 anos, até a DD completar 25 anos de idade.

12 - Quando os menores deixarem de necessitar dos alimentos, o que ocorrerá quando a DD perfizer 25 anos de idade, em Outubro de 2031, os 201,03 € de pelo menos um dos menores devem reverter para a A. durante, previsivelmente, 25 anos, correspondentes à diferença entre a idade que...

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