Acórdão nº 4086/18.3T8FAR.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Fevereiro de 2021
Magistrado Responsável | ROSA TCHING |
Data da Resolução | 25 de Fevereiro de 2021 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL *** I. Relatório 1. AA intentou ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra Ageas Portugal-Companhia de Seguros, S.A, pedindo a condenação desta no pagamento da quantia global de €180.000,00 devida a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência de acidente de viação que causou a morte do seu do pai e cuja verificação imputa a culpa do condutor de veículo automóvel seguro nesta ré.
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A ré contestou, excecionando a ilegitimidade do autor por se encontrar desacompanhado do membro sobrevivo da união de facto, imputando a culpa na produção do acidente ao comportamento da vítima e impugnando os alegados danos bem como os respetivos montantes.
Deduziu incidente de intervenção principal provocada da seguradora da entidade patronal, por se tratar de acidente em simultâneo de trabalho.
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O autor veio requerer a intervenção principal provocada de BB, que vivia em união de facto com a vítima.
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Admitidas as requeridas intervenções principais provocadas, a Allianz Portugal- Companhia de Seguros, S.A., deduziu pedido de reembolso da quantia de €16.495,85, referente a pensões e outras despesas pagas, acrescida de juros vincendos a contar da citação e até integral pagamento, e a BB deduziu pedido de condenação da ré no pagamento da quantia de €120.000,00, acrescida de juros de mora a contar da notificação até integral pagamento, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais decorrentes da morte do companheiro.
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Citado, o Centro Nacional de Pensões veio deduzir pedido de reembolso da quantia de €899,70, paga a título de pensão de sobrevivência, acrescida das pensões que se vencerem e forem pagas na pendência da ação, com juros de mora legais, desde a citação até integral pagamento.
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A ré contestou o pedido formulado pelo CNP, concluindo pela sua improcedência.
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Realizada audiência prévia, nela foi proferido despacho saneador, fixado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.
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Foi admitida a ampliação do pedido formulada pelo Centro Nacional de Pensões para o valor de €1.209,48, a título de pensões de sobrevivência pagas.
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Foi admitida a ampliação do pedido formulada pela interveniente Allianz para a quantia de €17.990,91, a título de pensões e outras despesas pagas.
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Realizada audiência de discussão e julgamento, foi subsequentemente proferida sentença que decidiu julgar a ação parcialmente procedente e, em consequência: - condenou a ré Ageas Portugal- Companhia de Seguros, S.A a pagar ao autor a quantia de € 47.500,00 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa de juros legal de 4%, ou outra que lhe sobrevier, contados desde a data da prolação da sentença até integral pagamento; - condenou a ré Ageas Portugal- Companhia de Seguros, S.A a pagar à interveniente BB a quantia de € 42.500,00 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa de juros legal de 4%, ou outra que lhe sobrevier, contados desde a data da prolação da sentença até integral pagamento; - condenou a ré Ageas Portugal- Companhia de Seguros, S.A a pagar à interveniente Allianz Portugal- Companhia de Seguros, S.A. a quantia de € 8.995,45 a título de reembolso das quantias pagas, acrescida de juros de mora, à taxa de juros legal de 4%, ou outra que lhe sobrevier, contados desde a data da notificação para contestar o pedido até integral pagamento; - condenou a ré Ageas Portugal- Companhia de Seguros, S.A a pagar ao interveniente Centro Nacional de Pensões a quantia de € 656,49 a título de reembolso das quantias pagas, acrescida de juros de mora, à taxa de juros legal de 4%, ou outra que lhe sobrevier, contados desde a data da notificação para contestar o pedido até integral pagamento; - absolveu a ré do demais peticionado.
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Inconformados com esta decisão, dela apelaram o autor e as intervenientes Allianz Portugal- Companhia de Seguros, S.A. e BB bem como a ré Ageas Portugal- Companhia de Seguros, S.A para o Tribunal da Relação de Évora que, por acórdão proferido em 24 de setembro de 2020, julgou: a) Improcedentes as apelações do autor, da Allianz Portugal-Companhia de Seguros, S.A. e de BB; b) Parcialmente procedente a apelação da ré Ageas Portugal-Companhia de Seguros, S.A e, alterando a sentença recorrida, decidiu: - Condenar a ré Ageas Portugal- Companhia de Seguros, S.A a pagar ao autor a quantia de € 33.750,00 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa de juros legal de 4%, ou outra que lhe sobrevier, contados desde a data da prolação da sentença até integral pagamento; - Condenar a ré Ageas Portugal- Companhia de Seguros, S.A a pagar à interveniente BB a quantia de € 26.250,00 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa de juros legal de 4%, ou outra que lhe sobrevier, contados desde a data da prolação da sentença até integral pagamento.
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Inconformados com este acórdão, o autor e a interveniente BB dele interpuseram recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões, que se transcrevem: «1 - Conforme factos provados nºs 1, 2, 3, 4, 5, 6, 8, 9, 10, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 21, 22, 23, 24 e 25 da sentença da 1ª instância o acidente ficou a dever-se, exclusivamente, ao condutor do veículo ...-LO-... segurado pela Ré.
2 - O condutor do ...-LO-... conseguia visualizar o peão a pelo menos 100 metros de distância do local onde o peão se encontrava parado na berma e com os pés na berma.
3 - O condutor do ...-LO-..., não reduziu a velocidade, não travou, não desviou a marcha que seguia, e aproximou-se do local onde se encontrava o peão, e sem guardar a distância da berma para evitar embater com o espelho lateral direito do ...-LO-... no corpo do peão, o que veio a ocorrer e causou a morte do peão.
4 - Sendo a condução de veículos automóveis uma actividade perigosa cabe aos condutores desses veículos o respeito absoluto pelos peões que são utilizadores vulneráveis.
5 - Mesmo que o peão tenha efectuado um movimento de inclinação do seu corpo na direcção da faixa de rodagem por onde seguia o ...-LO-... e sem que os seus pés (do peão) ultrapassassem a linha delimitadora existente entre a berma e a hemi-faixa de rodagem desse movimento não se pode imputar qualquer responsabilidade ao peão na ocorrência do acidente, pois este nunca penetrou na hemi-faixa de rodagem por onde circulava o ...-LO-....
6 - O artº. 13º, nº 1 do Cód. da Estrada impunha ao condutor do ...-LO-... que este circulasse pela hemi-faixa de rodagem conservando da berma (onde o peão se encontrava) uma distância suficiente que permitisse evitar o acidente - o que o condutor do ...-LO-... não fez, e em clara violação do artº. 13º, nº 1 do Cód. Estrada.
7 - E os artºs. 24º, nº 1, e 25º, nº 1, al. e), ambos do Cód. da Estrada impunham ao condutor do ...-LO-... que este regulasse e moderasse especialmente a velocidade à aproximação do utilizador vulnerável (o peão e vítima CC), o que o dito condutor não fez.
8 - E o artº. 38º, nº 2, al. e) do Cód. da Estrada impunha que o condutor do ...-LO-... face à presença do peão na berma guardasse a distância lateral mínima de 1,5 metros do dito peão e abrandasse a velocidade do ...-LO-..., o que também não foi cumprido pelo dito condutor.
9 - E pelo que o condutor do ...-LO-... violou as normas dos artºs. 13º, nº 1, 24º, nº 1, 25º, nº 1, al. e) e 38º, nº 2, al. e), todos do Código da Estrada.
10 - E sendo pois o condutor do ...-LO-... 100% responsável pela ocorrência do acidente.
11 - Os Tribunais não devem ser miserabilistas e sendo justo e equilibrado o valor de 80.000,00€ para o dano morte, o valor de 20.000,00€ para o dano sofrido pela vítima, o valor de 45.000,00€ como indemnização ao A. e o valor de 35.000,00€ como indemnização à Interveniente.
12 - O Acórdão recorrido violou o disposto nos artºs. 483º, 487º, 503º, 562º e 563º, todos do Código Civil, e nos artºs. 13º, nº 1, 24º, nº 1, 25º, nº 1, al. e) e 38º, nº 2, al. e), todos do Código da Estrada».
Termos em que requerem seja dado provimento à revista, considerando o condutor do veículo seguro na ré o único responsável pela produção do acidente, condenando-se a ré seguradora a pagar ao autor a quantia total de 95.000,00€ e a à interveniente/recorrente BB a quantia total de 85.000,00€.
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A ré Ageas Portugal- Companhia de Seguros, S.A respondeu, terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões, que se transcrevem: «1. O art. 674.º, n.º 1 do CPC prescreve o seguinte: “A revista pode ter por fundamento: a) A violação de lei substantiva, que pode consistir tanto no erro de interpretação ou de aplicação, como no erro de determinação da norma aplicável; b) A violação ou errada aplicação da lei de processo; c) As nulidades previstas nos artigos 615.º e 666.º.” (destaque nosso).
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A revista interposta pelos Recorrentes omite qual a fundamentação do recurso e não faz subsumir o mesmo a qualquer das alíneas do n.º 1, do apenas invocado art. 674.º, do CPC.
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De acordo com o disposto no n.º 3 do art. 671.º do CPC: “Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte.” 4. Quer a 1.ª Instância, quer a Relação de Évora, entenderam pela fixação de repartição de responsabilidades na proporção de 50/50.
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Estamos, assim, perante a figura da dupla conforme, traduzida na inadmissibilidade de recurso de acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido, e sem fundamentação substancialmente diversa, a decisão proferida pela 1.ª Instância.
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Não pode, por isso, ser admitida a revista interposta, porquanto os Recorrentes pretendem a alteração de segmento decisório proferido na 1.ª Instância e confirmado pela Relação.
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Neste conspecto, deverá o recurso de revista ser...
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