Acórdão nº 109/12 de Tribunal Constitucional (Port, 06 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelCons. Vítor Gomes
Data da Resolução06 de Março de 2012
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 109/2012

Processo n.º 730/2011

  1. Secção

Relator: Conselheiro Vítor Gomes

Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

  1. A., recorrente nos presentes autos em que é recorrido o Ministério Público, foi condenado na pena de 7 meses de prisão pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292.º, n.º 1, do Código Penal (CP), tendo a execução da pena sido suspensa pelo período de um ano. A suspensão foi condicionada, nos termos do artigo 52.º, n.º 1, alínea b), do mesmo Código, ao cumprimento do Programa “Stop – Responsabilidade e Segurança”, à frequência de cursos, à comparência a entrevistas com técnicos da DGRS e à realização de consulta de alcoologia e eventual submissão a tratamento. Foi ainda condenado em pena acessória de proibição de conduzir qualquer veículo motorizado pelo período de 18 meses.

    Em 20 de setembro de 2010, o arguido foi notificado, por via postal simples com prova de depósito, da designação de data para a respetiva audição nos termos do artigo 495.º, n.º 2 do Código de Processo Penal (CPP). Em 11 de outubro de 2010, requereu adiamento daquela audiência, invocando deslocação, por motivos familiares e profissionais, ao Brasil. Esse pedido foi indeferido por despacho de 14 de outubro de 2010.

    Em 13 de dezembro de 2010 foi proferida decisão de revogação da suspensão da execução da pena de prisão.

    Em 1 de março de 2011, o recorrente arguiu nulidade insanável, com fundamento no artigo 119.º, alínea c), do CPP, pelo facto de a audiência ter sido realizada sem a sua presença, requerendo a anulação do despacho que determinou a revogação da suspensão da execução e a consequente reabertura da audiência. Por despacho de 11 de março de 2011, o Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa indeferiu o requerido

    Notificado deste despacho, o arguido interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, sustentando a invalidade da notificação por via postal simples da decisão de revogação da pena de prisão e a não aplicabilidade do acórdão de fixação de jurisprudência n.º 6/2010 pelo facto de ter previamente comunicado e justificado a ausência.

    Por acórdão de 9 de junho de 2011, a Relação negou provimento ao recurso, com os seguintes fundamentos:

    “(…)

    Diremos desde já, ser manifesta a improcedência do recurso, desde logo porque não podia o recorrente vir invocar uma nulidade de um despacho que já transitou.

    Na verdade, o despacho que revogou a suspensão da execução e determinou o cumprimento da correspondente pena de efectiva, foi notificado à defensora do arguido, e ao próprio arguido por via postal simples, depositada, conforme fls.252, em 15-12-2010, na caixa do correio do domicílio fornecido pelo arguido no Termo de Identidade e Residência que prestou nestes autos e transitou em julgado no dia 24?01?2011.

    E, tal notificação, ao contrário do que pretende o recorrente, é considerada válida e regular, uma vez que cumpre rigorosamente o entendimento assente pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nº 6/2010, de 15 de Abril de 2010, publicado no Diário da República, 1ª série, nº 99, de 21.05.2010, que tem plena aplicação nos presentes autos já que não está ilidida a presunção de notificação prevista no nº 3 do artº 113º do C.P.P., pelo facto de atempadamente comunicar a ausência da sua residência, como defende o recorrente.

    Na verdade, em 11-10-2010 (carta remetida a 08-10-2010) o arguido veio informar o Tribunal que iria estar ausente por mais de cinco dias, mas não informou qual a sua nova residência ou o lugar onde poderia ser encontrado, nos termos do artº 196º, n.º 3, al. b) do C.P.P.

    Assim, como bem decidiu o Mmo Juiz a quo no despacho recorrido, considera-se notificado nos termos do artº 113º, nº 3 do mesmo código, pois «se assim não fosse, estava encontrada a forma de um arguido, ainda sujeito a T.I.R., inviabilizar a sua notificação - precisamente aquilo que a lei não quis, ao impor ao arguido o fornecimento de nova residência ou lugar para ser contactado. Ou seja, a presunção só seria afastada se o condenado tivesse vindo comunicar a ausência da sua residência e simultaneamente indicado o lugar onde poderia ser notificado, e mesmo assim o Tribunal tivesse remetido a notificação para a residência originalmente indicada no T.I.R».

    Em consequência, o despacho datado de 14/10/20 10 que não considerou motivo justificativo a falta à audição do arguido nos termos do artº 495º, nº 2 do CPP, pela sua ausência para o Brasil, transitou em julgado.

    E, não se verifica a invocada nulidade decorrente do facto de a presença do arguido ser obrigatória, conforme estipula o nº 2 do artº 495º do CPP, visto que, como vimos, apesar de regularmente notificado, o arguido não quis comparecer. Assim sendo, uma vez que foi o recorrente que se colocou numa situação que impediu a sua audição, tendo-lhe sido dadas todas as oportunidades para o efeito, não se verifica a nulidade invocada ou qualquer violação do princípio do contraditório e muito menos qualquer inconstitucionalidade, nomeadamente, por violação dos nºs 1, 5, 6, e 7 do artigo 32º da CRP, das normas constantes dos artigos 113º, nº 3 e 196º, nº 3 alínea c) e d) do CPP, bem como do recurso à aplicação acrítica do acórdão de fixação de jurisprudência nº 6/2010 que assenta numa interpretação normativa inconstitucional do artigo 113º do CPP, por violação do artigo 32º nºs 1, 6 e 10 da CRP, tudo por violação dos princípios da proporcionalidade e do respeito pelas mais amplas garantias de defesa, designadamente os direitos de audiência, de participação e de recurso.

    Assim, estando já transitado em julgado o despacho que revogou a suspensão da execução da pena de prisão, não pode agora vir o arguido, a pretexto do recurso de um despacho muito posterior que indeferiu a arguição da alegada nulidade insanável prevista no artº 119º, alínea c) do CPP, invocar uma nulidade que, no seu entender, ficou a montante daquele trânsito.

    Por ultimo e ainda para demonstrar que não houve qualquer atropelo aos direitos da defesa por parte do tribunal, deverá referir-se, como salienta a decisão recorrida, que no presente caso a revogação nem sequer ocorreu por força da alínea a) do nº 1 do artº 56º do Código Penal, mas sim da alínea b) do mesmo número, pelo que os factos que, concomitantemente com os demais (pois não operam automaticamente), levaram à revogação da suspensão, foram os crimes cometidos durante o período da suspensão, e não o incumprimento de outras condições da suspensão.”

  2. Deste acórdão foi interposto o presente recurso, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional – LTC), para apreciação das questões de constitucionalidade assim identificadas no requerimento de fls. 103 e seguintes: (i) a questão integrada pelas normas constantes dos artigos 113.º, n.º 3 e 196.º, n.º 3, alíneas c) e d), do CPP, quando “interpretados no sentido de se considerar regulamente notificado o arguido, por via postal simples, da decisão de revogação da decisão de suspensão de execução da pena a que foi condenado, quando haja sido depositada carta com notificação na caixa postal da morada dada aquando da prestação de termo de identidade e residência, apesar de este ter comunicado ao processo expressa, formal e previamente a sua ausência e a data do seu regresso”, por violação do artigo 32.º, n.ºs 1, 5, 6 e 7, da Constituição; (ii) a questão relativa à interpretação do artigo 113.º do CPP realizada pelo acórdão de fixação de jurisprudência n.º 6/2010, do Supremo Tribunal de Justiça, de 15 de abril de 2010, “no sentido de o mesmo ser aplicável a quem não tenha o estatuto de arguido, mas apenas de condenado e, bem assim, aos casos em que este se tenha ausentado justificadamente da sua residência e comunicado previamente essa ausência”, por violação do artigo 32.º, n.ºs 1, 6 e 10, da Constituição.

  3. Notificado para o efeito, o recorrente veio apresentar alegações, tendo concluído do seguinte modo:

    “1. As normas constantes dos artigos 113.º, n.º 3 e 196.º, n.º 3, alíneas c) e d), ambos do Código de Processo Penal são a base para a validação da notificação do recorrente por via postal simples da decisão que revogou a suspensão de execução da pena a que fora condenado.

  4. O acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 6/2010, de 15ABR1O, foi indevidamente aplicado a quem - como o recorrente - apenas tem estatuto de condenado e, bem assim, aos casos em que este se tenha ausentado justificadamente da sua residência e comunicado previamente essa ausência.

  5. A revogação da suspensão implica...

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