Acórdão nº 643/06 de Tribunal Constitucional (Port, 28 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelCons. Maria dos Prazeres Beleza
Data da Resolução28 de Novembro de 2006
EmissorTribunal Constitucional (Port

Acórdão n.º 643/2006

Processo nº 277/2006

  1. Secção

Relatora: Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza

Acordam, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:

1 .A. propôs contra B., SA uma acção emergente de contrato individual de trabalho que veio a terminar por transacção, junta a fls. 61, homologada pela sentença de fls. 63.

Da referida transacção consta uma cláusula segundo a qual “As custas em dívida a juízo serão suportadas a meias”. Assim, a sentença homologatória determinou que as custas ficavam a cargo de ambos os litigantes: “Custas pelas duas partes, nos termos acordados”.

Tendo sido notificado para efectuar o pagamento da conta de custas, o autor veio, a fls. 89, requerer a respectiva reforma, sustentando que “já pagou ao processo a parte da taxa de justiça que era da sua responsabilidade, pelo que apenas tem a pagar ao Tribunal o valor devido a título de procuradoria”.

Em síntese, afirmou que, dado o valor da causa, a taxa de justiça global do processo teria o valor de 11 unidades de conta (979,00€). Todavia, tendo o processo terminado antes da apresentação da oposição e da marcação da audiência final, tal montante foi reduzido a metade (5,5 unidades de conta, 489,50€), não sendo então devida taxa de justiça subsequente, nos termos dos artigos 14º, n.ºs 1 e 2 do Código das Custas Judiciais.

Ora, decorrendo da transacção e da lei (artigo 451º, n.º 1, do Código de Processo Civil) que as custas são suportadas em partes iguais, e tendo ele, autor, pago a taxa de justiça inicial, no montante de 2,75 unidades de conta (244,75€), faltava apenas, para se haver por paga a taxa global devida, que o réu procedesse ao pagamento de igual quantia, ficando então só por pagar a procuradoria.

Não lhe cabe assim, segundo entende, pagar metade da taxa de justiça em falta (122,38 €), como consta da conta de que foi notificado.

Sustentou ainda que tal conta se não pode basear no disposto nos artigos 31º, n.º 1, 33º E 33º-A, n.º 1 do Código das Custas Judiciais, na redacção resultante do Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro, preceitos, aliás, que, se comportassem uma interpretação que a permitisse, conteriam normas inconstitucionais, por violação do princípio da igualdade, do princípio do processo equitativo e do disposto no n.º 2 do artigo 266º da Constituição.

O pedido de reforma foi indeferido, pelo despacho de fls. 95, nestes termos:

“A conta foi elaborada de acordo com o disposto no artº 56º do CCJ. Como o A. Não desconhece, as taxas de justiça já pagas são reclamadas pela parte que tem direito a receber custas de parte à parte contrária nos termos do artº 33-A/1 do CCJ (artº 31/1 e 33/1/b do CCJ) para que esta proceda ao seu pagamento.

E bem sabendo o A. Desta disposição legal que refere expressamente no seu articulado e cuja inconstitucionalidade suscita, poderia ter acordado numa repartição de custas diferente, de modo a que nada mais tivesse que pagar, para evitar ter que pagar ao Tribunal e reclamar da parte contrária o que adiantou quando instaurou a acção.

Os artigos 31º, 33º e 33º-A do CCJ não violam o princípio da igualdade previsto na Constituição nem o da equidade. O A. Terá apenas que lançar mão do procedimento previsto neste artigo para ser reembolsado do que adiantou. Haveria sim violação se a lei não tivesse previsto uma forma de o A. Ser ressarcido.

Ao Tribunal não cabe criticar as opções do legislador, desde que em conformidade com a Constituição, estando obrigado a aplicar a lei.

Consequentemente, indefiro o requerido”.

  1. A. veio então recorrer para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, do despacho de fls. 95, pretendendo a apreciação da interpretação com que os artigos 31º, 33º e 33º-A do Código das Custas Judiciais, na redacção decorrente do Decreto-Lei n.º 324/2003, foram aplicados, por serem orgânica e materialmente inconstitucionais.

    A inconstitucionalidade orgânica decorreria de o autor ser colocado perante a necessidade de pagar ao Estado uma quantia que não tinha a natureza de taxa, pois não correspondia a nenhuma contraprestação pelos serviços de justiça de que ele, autor, beneficiou, mas antes ao pagamento de uma dívida do réu. Deveria, pois, ser considerada como o pagamento de um imposto, criado por decreto-lei não autorizado, organicamente inconstitucional (artigo 165º, n.º 1, i) da Constituição).

    Quanto à inconstitucionalidade material, resultaria da violação dos princípios da legalidade tributária (artigo 103º da Constituição), da igualdade (artigo 13º) e do processo equitativo (n.º 4 do artigo 20º), bem como do artigo 266º da Constituição, que impõe à Administração que conforme a sua actuação com os princípios da igualdade e da proporcionalidade.

    O recurso foi admitido, por decisão que não vincula este Tribunal (nº 3 do artigo 76º da Lei nº 28/82).

  2. A fls. 115, foi proferido o seguinte despacho:

    “Nos termos do disposto nos n.ºs 1, 5 e 6 do artigo 75º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, convido o recorrente a definir as normas, contidas nos preceitos legais que indica no requerimento de interposição de recurso – os artigos 31º, 33º e 33º- A do Código das Custas Judiciais – cuja inconstitucionalidade pretende que o Tribunal Constitucional aprecie.

    Com efeito, é ao recorrente que incumbe a definição do objecto do recurso; não é suficiente, quando se questiona uma determinada interpretação normativa, a afirmação de que é aquela que a decisão recorrida adoptou, assim transferindo para o Tribunal ad quem – no caso o Tribunal Constitucional – o ónus de delimitar o objecto do recurso e impossibilitando-o de verificar o preenchimento de todos os pressupostos de admissibilidade do recurso.”

    A fls.119, o autor veio responder.

    Relativamente ao artigo 31º, que restringe à parte em que prevê que “as taxas de justiça pagas por cada parte integram as custas de parte”, o autor sustentou que “é inconstitucional esta norma na interpretação que permita, não apenas (como seria a interpretação correcta) integrar nas custas de parte as taxas de justiça adiantadas em momento em que não se pode ainda saber qual das partes, a final, será responsável pelo pagamento dessas quantias (única hipótese para a qual faz sentido a previsão legal da posterior devolução dessa quantia, caso a parte que pagou não seja, a final, responsável, e na medida em que não o seja), como também cobrar a uma das partes, a título de taxa de justiça, uma determinada quantia, em momento em que já seja certo que essa parte não é responsável perante o tribunal pelo pagamento dessa quantia, com fundamento na ideia de que, para essa quantia, a mesma, sendo “taxa de justiça paga”, integrará as custas de parte e a parte que a pagou poderá pedir a sua devolução à parte contrária”.

    Quanto ao artigo 33º, nº1, o recorrente, esclarecendo que apenas impugna na parte a que respeita a respectiva alínea b),“As custas de parte compreendem o que a parte haja despendido com o processo a que se refere a condenação e de que tenha direito a ser compensada em virtude da mesma, designadamente. […] b) As taxas de justiça pagas,” sustenta a inconstitucionalidade enquanto possa ser interpretado com o sentido atrás referido ao artigo 31º e esclarece que “a interpretação que se pretende ver julgada inconstitucional é, pois, aquela segundo a qual possa ser exigido a uma parte o pagamento de quantias pelas quais não é responsável (designadamente, porque o que já pagou a mais, em momento anterior, chega para cobrir todo o montante pelo qual veio, a...

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