Acórdão nº 521/07 de Tribunal Constitucional (Port, 16 de Outubro de 2007

Magistrado ResponsávelCons. João Cura Mariano
Data da Resolução16 de Outubro de 2007
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 521/2007

Processo n.º 730/07

  1. Secção

    Relator: Conselheiro João Cura Mariano

    Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional

    Relatório

    1. propôs no Tribunal de Trabalho do Porto uma acção (proc. nº 139/07.1TTPRT, do 2º Juízo, 3ª sec.) contra a sua entidade patronal, B., Soc. Unipessoal, Limitada, tendo pago uma taxa de justiça inicial no montante de € 86,40, reduzida em virtude da Autora ter utilizado os meios electrónicos (artigos 23.º, n.º 1, e 15.º, n.º 1, do C.C.J.).

    Tendo sido designada data para a realização da audiência das partes, veio a acção a terminar mediante transacção, que foi homologada judicialmente antes da demandada ser sequer notificada para contestar.

    As partes transigiram igualmente em matéria de custas judiciais, tendo ficado então acordado que as custas seriam suportadas em partes iguais pelas partes.

    Na elaboração da conta final de custas, em suposta observância da lei e da sentença homologatória da transacção quanto a custas, apenas metade do valor da taxa de justiça inicial paga pela Autora foi abatido ao valor final da taxa de justiça por ela devida, tendo a restante metade sido abatida ao montante da taxa de justiça final devida pela Ré.

    A Autora reclamou da conta, tendo sido proferida decisão, deferindo a reclamação, com a seguinte fundamentação:

    “A autora veio reclamar da conta elaborada, pedindo que a mesma seja reformulada por forma a que nela seja considerado o montante de € 86,40 que efectivamente pagou a título de taxa de justiça inicial, nos termos do seu requerimento de fls. 57 a 58 que aqui se dá por reproduzido.

    O Senhor contador exarou a informação de fls. 59, referindo que os dados introduzidos foram processados pelo programa informativo.

    O Ministério Público pronunciou-se conforme consta a fls. 62.

    Decidindo.

    Resulta dos autos que as partes se conciliaram, tendo a autora e a ré B. acordado que as custas seriam suportadas por ambas em partes iguais, prescindindo de custas de parte e de procuradoria (cfr. acta de fls. 43 e 44).

    Por outro lado, a autora procedeu ao pagamento do montante de € 86,40 a título de taxa de justiça inicial (cfr. fls. 18 e 32), sendo que aquela ré nada pagou a esse título.

    Contudo, verifica-se que nas contas elaboradas a fls. 48 e 49 que cada uma das partes pagou ao processo a quantia de € 43,20.

    O art. 13º/2 do Código das Custas Judiciais prescreve que a taxa de justiça do processo corresponde à soma das taxas de justiça inicial e subsequente pagas por cada parte.

    Por outro lado, decorre dos arts. 31º/1 e 33º/1 do mesmo Código que as taxas de justiça pagas integram as custas de parte, significando que para delas ser consignada, a parte terá de recorrer ao mecanismo previsto no art. 33º-A do referido Código.

    Da aplicação de tais normas ao caso em apreço resulta que a autora que pagou € 86,40, teria de pagar a quantia liquidada a fls. 48, omitindo-se metade daquele pagamento.

    Por seu lado, a ré que nada pagou, apenas teria de pagar a quantia de € 52,80 liquidada a fls. 49, como se tivesse pago já € 43,20.

    Contudo, pelos fundamentos invocados no douto Acórdão do Tribunal Constitucional de 23/01/2007 (DR., 2ª série, de 27/2/2007) aquele art. 13º/2 do Código das Custas, na interpretação segundo a qual o autor que já suportou a taxa de justiça inicial ainda ter de suportar metade da taxa de justiça devida, com o ónus de mais tarde a reaver da parte contrária, é inconstitucional por violação do princípio da proporcionalidade inerente ao princípio do Estado de Direito democrático (art. 2º da Constituição da República).

    Nestes termos, a conta terá de ser reformulada como pretendido, recusando-se a aplicação daquele normativo.

    Em conformidade, decide-se determinar a reforma da conta por forma a que nela seja considerada a quantia efectivamente paga pela autora a título de taxa de justiça inicial.”

    O Ministério Público interpôs recurso desta decisão para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea a), do n.º 1, do art.º 70.º, da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), suscitando a fiscalização da constitucionalidade concreta nos seguintes termos:

    “O magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal vem, nos autos supra identificados, interpor recurso do despacho proferido a fls. 63 a 64 verso, para o Tribunal Constitucional, nos termos e fundamentos e ao abrigo do art. 280º nº 1 alínea a) e nº 3 da Constituição da República Portuguesa e dos art. 70º nº 1 alínea a); 72º nº 1 alínea a) e nº 3; 75º nº 1 e 75º-A nº 1 da Lei do Tribunal Constitucional, Lei 28/82 de 15.11 (com as alterações e redacção introduzidas pelas Leis 143/85 de 26.11; 85/89 de 07.09; 88/95 de 01.09 e 13-A/98 de 26.02), porquanto o despacho em causa recusou a aplicação da norma contida no art. 13º nº 2 do Código das Custas Judiciais, por inconstitucionalidade da mesma, por violação do princípio da proporcionalidade inerente ao princípio do Estado de Direito democrático (art. 2º da C.R.P.).

    Assim, e para os efeitos do art. 75º-A nº 1 da Lei do Tribunal Constitucional, o presente recurso é interposto ao abrigo da alínea a) do nº 1 do art. 70º de tal diploma, e a norma cuja inconstitucionalidade se pretende apreciada pelo Tribunal Constitucional é a contida no nº 2 do art. 13º do Código das Custas Judiciais.”

    O Ministério Público junto deste Tribunal apresentou posteriormente alegações, culminando as mesmas com a formulação das seguintes conclusões:

    “1.ª) É inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade, a interpretação normativa do artigo 13º, nº 2, do Código das Custas Judiciais, segundo a qual, no caso de transacção judicialmente homologada, segundo a qual as custas em dívida a juízo serão suportadas a meias, incumbe ao autor que já suportou integralmente a taxa de justiça a seu cargo garantir ainda o pagamento de metade do remanescente da taxa de justiça em dívida, com o ónus de sub sequentemente reaver tal quantia do réu, a título de custas de parte.

  2. ) Termos em que deverá confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade formulado pela decisão recorrida.”

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    *

    Fundamentação

    1. Do objecto do recurso

      O Recorrente pretende submeter à apreciação do Tribunal Constitucional a norma contida no art.º 13.º, n.º 2, do Código das Custas Judiciais aprovado pelo D.L. n.º 224-A/96, de 26 de Novembro, na redacção introduzida pelo D.L. n.º 324/2003, de 27 de Dezembro, quando interpretada no sentido de que no caso de transacção judicialmente homologada, segundo a qual as custas em dívida a juízo serão suportadas a meias, incumbe ao autor, que já suportou integralmente a taxa de justiça a seu cargo, garantir ainda o pagamento de metade do remanescente da taxa de justiça em dívida, com o ónus de subsequentemente reaver tal quantia do réu, a título de custas de parte.

      O n.º 2, do art.º 13.º, do Código das Custas Judiciais de 1996, com a redacção resultante das alterações introduzidas em 2003, dispõe que “a taxa de justiça do processo corresponde ao somatório das taxas de justiça inicial e subsequente de cada parte”.

      É discutível que a referida norma legal permita a interpretação normativa ora sob escrutínio constitucional, tanto mais que este resultado hermenêutico já foi anteriormente alcançado por referência a outras normas, nomeadamente as constantes dos artigos 31.º, n.º 1, 33.º, n.º 1, b), e...

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