Acórdão nº 0240256 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Novembro de 2002 (caso NULL)

Data27 Novembro 2002
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO CRIMINAL (4.ª) DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO I 1. No processo n.º .../... do ... Juízo do Tribunal Judicial de C....., após julgamento, em processo comum e perante tribunal singular, com documentação em acta das declarações oralmente prestadas em audiência, por sentença de 30 de Novembro de 2001, foi decidido: - absolver o arguido Joaquim ..... da prática de um crime de difamação agravada, p. e p. pelos artigos 180.º, n.º 1, e 183.º, n.º 2, do Código Penal, em conjugação com os artigos 25.º e 26.º, n.º 2, alínea a), do Decreto-Lei n.º 85-C/75, de 26 de Fevereiro, ou com os artigos 30.º e 31.º da Lei n.º 2/99, de 13 de Janeiro, de que tinha sido pronunciado, - julgar o pedido de indemnização civil deduzido pelo assistente Rui ..... improcedente e, consequentemente, absolver o arguido demandado e Jornal ....., Lda. do pedido.

  1. O assistente e demandante Rui ..... veio interpor recurso da sentença, circunscrevendo,«expressamente, a sua discordância à parte da douta sentença que considerou que, no caso "sub judice", ocorrem causas que excluem a ilicitude do comportamento do recorrido/arguido Joaquim....., subsumíveis à previsão do n.º 2 do artigo 180.º do Código Penal e, consequentemente, que o absolveu, quer do crime, por que este foi pronunciado, quer do pedido de indemnização civil».

    Rematou a motivação apresentada com a formulação das seguintes conclusões: «1.ª Os factos pelos quais o recorrido foi pronunciado preenchem a previsão do crime de difamação, através da imprensa, p. e p. pelos artigos 180.º, n.º 1, e 183.º, n.º 2, do C. Penal.

    «2.ª Não ocorrem, no caso, causas de exclusão da ilicitude do comportamento do recorrido.

    «3.ª Não há razão para que o direito de informar que ao recorrido assistia prevaleça sobre o direito ao bom nome e reputação do recorrente.

    «4.ª A douta sentença violou, por erro de interpretação, o artigo 180.º, n.º 2, do C. Penal, bem como os artigos 26.º e 37.º da Constituição da República Portuguesa, e o artigo 11.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 62/79, de 20 de Setembro.

    5.ª A douta sentença, em apreciação, deve ser substituída por douto acórdão desse Venerando Tribunal da Relação do Porto, que condene o recorrido na pena adequada, pelo crime por que foi pronunciado, e, consequentemente, em indemnização, proporcional ao profundo dano moral causado ao assistente/demandante cível, aqui recorrente.

    3. Admitido o recurso e efectuadas as legais notificações, apresentou resposta o arguido no sentido de ser negado provimento ao recurso.

  2. Nesta instância, o Exm.º Procurador-Geral Adjunto suscitou a questão prévia da rejeição do recurso, por ter sido interposto fora de prazo.

  3. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal (em diante referido abreviadamente pelas iniciais CPP), o recorrente respondeu, sustentando a tempestividade do recurso.

  4. Efectuado exame preliminar e colhidos os vistos, prosseguiram os autos para audiência, que se realizou com observância do formalismo legal, como a acta documenta, mantendo-se as alegações orais no âmbito das questões postas no recurso.

    II Cumpre decidir.

  5. Antes de mais, impõe-se tomar posição sobre a questão prévia suscitada pelo Exm.º Procurador-Geral Adjunto.

    Nos termos do parecer emitido, o recurso deve ser rejeitado por intempestivo, em síntese, pelas seguintes razões: - os factos por que o arguido estava acusado ocorreram em 22/3/96, sendo, então, vigente o Decreto-Lei n.º 85-C/75, de 26 de Fevereiro, - segundo o respectivo artigo 52.º (na redacção do Decreto-Lei n.º 377/88, de 24 de Outubro, repristinado pela Lei n.º 8/96, de 14 de Março, que derrogou a Lei n.º 15/95, de 25 de Maio, que, por sua vez o havia revogado), a natureza urgente dos processos por crimes de abuso de liberdade de imprensa implica a redução a metade de qualquer prazo previsto no Código de Processo Penal (n.º 2), - o recurso foi interposto ao cabo de 15 dias (no prazo previsto no CPP - artigo 411.º, n.º 1), quando o prazo legal era de metade, ou seja, de 8 dias, ainda que acrescidos de 3 dias úteis (artigos 145.º do Código de Processo Civil e 4.º do CPP).

    Vejamos.

    A Lei de Imprensa, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 85-C/75, de 26 de Fevereiro, no artigo 52.º (redacção primitiva e na redacção dada aos n.os 1 e 3 pelo Decreto-Lei n.º 181/76, de 9 de Março), sobre celeridade processual, estabelecia a natureza urgente dos processos por crime de liberdade de imprensa.

    O Decreto-Lei n.º 377/88, de 24 de Outubro, que alterou a Lei de Imprensa em matéria processual, no sentido de a adaptar ao novo Código de Processo Penal, manteve a natureza urgente dos processos por crimes de imprensa e, na redacção que deu ao artigo 52.º, concretamente ao n.º 2, definiu que a natureza urgente dos processos por crimes de imprensa implica a redução a metade de qualquer prazo previsto no CPP.

    Esta redacção do n.º 2 do artigo 52.º do Decreto-Lei n.º 85-C/75 era a que se encontrava em vigor à data dos factos por que o arguido se encontrava pronunciado (22 de Março de 1996), uma vez que a Lei n.º 15/95, de 25 de Maio, que revogou o artigo 52.º do Decreto-Lei n.º 85-C/75, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 377/88 (artigo 4.º), foi, por sua vez, revogada pela Lei n.º 8/96, de 14 de Março [Com excepção do artigo 26.º (na redacção dada pelo artigo 1.º da Lei n.º 15/95)].

    Entretanto, entrou em vigor a nova Lei de Imprensa, aprovada pela Lei n.º 2/99, de 13 de Janeiro [Rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 9/99, publicada no Diário da República, I-A Série, n.º 53/99, de 4 de Março], que nada estatui sobre celeridade processual e sobre o carácter urgente dos processos por crimes de imprensa [Revogando (artigo 40.º) os Decretos-Leis n.os 85-C/75, 181/76, 377/88 e as Leis n.os 15/95 e 8/96]. E, nas disposições especiais de processo (Capítulo VII), no artigo 37.º, define que o procedimento criminal por crimes de imprensa rege-se pelas disposições do CPP e da legislação complementar, em tudo o que não estiver especialmente previsto nessa lei.

    Por isso, em conformidade com o referido artigo 37.º da actual Lei de Imprensa, aos processos por crimes de imprensa aplicam-se, sem alteração ou modificação, os prazos estabelecidos no CPP, designadamente, o prazo previsto no artigo 411.º, n.º 1 - «o prazo para a interposição do recurso é de 15 dias e conta-se a partir da notificação da decisão ou, tratando-se de sentença, do respectivo depósito na secretaria».

    Não se nos apresentando como passível de controvérsia a natureza processual da norma do artigo 37.º da Lei n.º 2/99, a questão que, agora, importa dilucidar, está em saber se aquela norma, no concreto aspecto do prazo de interposição de recurso, é de aplicação imediata.

    A lei processual é de aplicação imediata, sem prejuízo da validade dos actos praticados na vigência da lei anterior (artigo 5.º, n.º 1, do CPP). E, relativamente aos processos iniciados anteriormente à sua vigência, só o não será se da sua aplicabilidade imediata resultar agravamento sensível e ainda evitável da situação processual do arguido, nomeadamente uma limitação do seu direito de defesa, ou quebra da harmonia e unidade dos vários actos do processo (artigo 5.º, n.º 2, alíneas a) e b), do CPP).

    Reconhecido o direito ao recurso no sistema anterior, o mero alargamento do prazo de interposição de recurso (para o dobro), consentido pelo artigo 37.º, não gera qualquer conflito ou desajustamento com o sistema anterior que signifique quebra da harmonia e unidade processual nem desfavorece a posição processual do arguido por não se repercutir, de modo limitativo, no conjunto de direitos de que goza [Neste sentido, cfr. acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 17-12-1969 e 10-12-1986, publicados no Boletim do Ministério da Justiça, respectivamente, 192-192 e 362-474, anotados por M. Simas Santos e M. Leal-Henriques, Código de Processo Penal Anotado, I Volume, Rei dos Livros, 1999, p. 87].

    Não se verifica, assim, nenhuma das duas ordens de excepções, constantes das alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 5.º do CPP, à regra tempus regit actum formulado no seu n.º 1.

  6. As relações conhecem de facto e de direito das decisões do tribunal singular, desde que não se verifique renúncia ao recurso em matéria de facto (artigo 428.º do CPP).

    De acordo com as conclusões da motivação, que...

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