Acórdão nº 136/07.7TBTMC.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Março de 2014

Magistrado ResponsávelGRANJA DA FONSECA
Data da Resolução27 de Março de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

A AA (AA), pessoa colectiva de direito helvético, com sede na …., SUÍÇA, intentou a presente Acção Ordinária contra a BB – Companhia de Seguros, SA, com sede em Lisboa, pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a quantia de CHF 117.852,00, ou seja € 71.353,49, acrescida de juros de mora desde 3/03/2006, bem como danos futuros e respectivos juros de mora que o AA ou a CC tenham de pagar, designadamente pensões futuras decorrentes do acidente dos autos.

Fundamentando a sua pretensão, alega, em síntese, ser uma seguradora suíça, que tem como segurado DD.

Porém, na Suíça, a autora tem um papel análogo à segurança social e cobre a assistência médica e medicamentosa dos segurados, bem como o pagamento de montantes de assistência pecuniária aos mesmos, cabendo-lhe ainda proceder ao reembolso dos montantes pagos pelas outras entidades da segurança social suíça.

Ora, sucede que, no dia 16 de Março de 2000, pelas 14 horas e 30 minutos, na Estrada Nacional n.º ... ao km 17,350 ocorreu um acidente entre o veículo automóvel ligeiro de passageiros, matrícula -FX propriedade e conduzido por EE, seguro na BB e o motociclo matrícula -LR propriedade e conduzido por DD.

O local do acidente é uma recta com boa visibilidade, o tempo estava bom e o motociclo e o EX circulavam no sentido M - C.

Cerca do quilómetro 17, o FX pretendeu virar e entrar para os Armazéns do FF e, ao aproximar-se do local, o condutor do veículo não fez o sinal luminoso a sinalizar a sua intenção e não viu que o LR vinha à sua rectaguarda e que pretendia ultrapassar.

O FX circulava à frente do LR em marcha lenta e sem qualquer sinal luminoso que indicasse a intenção de mudar de direcção.

O condutor do LR, verificando que não existia qualquer veículo, quer à sua rectaguarda, quer em sentido contrário, fez o sinal luminoso a mostrar a sua intenção e iniciou a manobra de ultrapassagem e quando se encontrava já na faixa contrária, em plena manobra de ultrapassagem, em frente aos armazéns do FF, foi surpreendido pelo veículo FX que virou de repente para a esquerda, invadindo a faixa contrária ao seu sentido de trânsito, e colocou-se no trajecto do LR que, confrontado com o obstáculo imprevisto, colidiu frontalmente com aquele.

O LR não teve tempo sequer para evitar o embate ou travar.

O embate deu-se na roda do lado esquerdo, no momento em que o EX iniciava a manobra de mudança e direcção.

O veículo FX tinha os faróis pintados de negro e, por isso, mesmo que fizesse pisca, nunca poderia qualquer outro condutor ver tal facto.

Acrescenta que a ré assumiu a responsabilidade pelo sinistro e pagou € 37.500 à viúva do DD.

O condutor LR sofreu ferimentos graves, que lhe causaram a morte.

0 DD vivia na Suíça e trabalhava nos correios (Die Post) como assistente administrativo, sendo beneficiário da AA com o n.º ….

Faleceu no estado de solteiro mas à data da morte a sua companheira estava grávida e meses após o acidente nasceu o filho DD, em 20/06/2000.

Então a autora, como é uma entidade equiparada à Segurança Social, que presta a assistência aos seus beneficiários nos termos da Lei Suíça, assumiu as prestações em espécie de assistência médica e outras prestações conexas, incluindo tratamento médico e prestações pecuniárias, designadamente indemnização por perdas patrimoniais e prestações a favor de cônjuge e descendentes, sendo que das várias prestações assumiu as despesas de transporte do corpo e de funeral, que ascenderam a CHF 3.609, o pagamento de pensões com a periodicidade mensal destinadas ao descendente do falecido DD, no montante de 510,00 CHF, e outra de 804 CHF.

As pensões são pagas 12 vezes ao ano, sendo os valores das pensões actualizadas todos os anos, tendo pago um total pensões CHF 114.243; CHF 43.443; CHF 70.800.

A autora reclama ainda os valores das pensões futuras já que estas são devidas ao menor até aos 18 anos, sendo tal prazo estendido até aos 25 anos, caso estejam a estudar, pelo que assim sendo, e segundo a regra das probabilidades, a autora irá pagar pensões, cuja capitalização segundo reserva matemática ascendem aos seguintes valores: AA CHF 107.374 e CC CHF 118.061.

Actuou o condutor do FX com imperícia, desatenção, inconsideração e culpa, violando dolosa, culposa e ilicitamente normas do Código da Estrada destinadas a proteger os interesses de terceiros, devendo, por isso, a ré indemnizar a autora na quantia de CHF 117.852, ou seja € 71.353,49, acrescidas de juros de mora.

Contestou a ré, alegando que o sinistro “sub judicio” ficou a dever-se a culpa única e exclusiva do falecido DD, não podendo, por isso, ser responsabilizada pelo pagamento da quantia peticionada pela autora.

Com efeito, o acidente ocorreu dentro da localidade de C..., onde, atento o sentido de marcha M... - C..., a via se encontra delimitada com placas verticais que proíbem o trânsito de veículos a velocidade superior a 60 Km/hora, sendo que na recta onde ocorre o sinistro a via é marginada por casas de habitação e outras edificações de natureza vária, pelo que a velocidade dos veículos sempre se encontraria limitada a 50 Km/hora.

O acidente ocorreu de dia, fazia sol e o piso da via encontrava-se seco e em bom estado de conservação.

O local onde ocorreu o acidente apresenta-se como uma recta plana com mais de 200 metros de extensão e cerca de 6, 40 metros de largura.

Do lado esquerdo atento o sentido de marcha do “Golf’, encontram-se sediadas as instalações da firma “FF”, para onde o segurado da Ré se dirigia, tendo o condutor do FX tomado todas as precauções, nomeadamente, aproximou-se e colocou-se no eixo da via, abrandou a marcha do veículo para cerca de 5 Km/hora, ligou o sinal luminoso da esquerda, (pisca pisca), observou se provinha trânsito da sua retaguarda, tendo reparado que não circulava qualquer veículo atrás de si, certificando-se também que não circulava veículo algum em sentido contrário.

Então, como a via se encontrava livre, o condutor do “Golf’ iniciou a manobra de mudança de direcção à esquerda, com todo o cuidado, obliquou para a esquerda, invadindo, precisamente, a metade esquerda da via e, quando se encontrava com a frente do veículo orientada para o portão da firma supra referida, e já junto à berma do lado esquerdo da via, sem que nada o fizesse prever, o Golf foi embatido na sua roda (jante e pneu) do lado esquerdo da frente, pela parte frontal do motociclo, que, por efeito da forte pancada, destruiu por completo a jante, o pneu da frente do lado esquerdo do “Golf” e ainda o seu guarda-lamas frontal esquerdo.

O malogrado DD procedeu à ultrapassagem do “FX” sem tomar qualquer precaução, já que circulava a uma velocidade nunca inferior a 120 ou mesmo 140 Km/h e completamente distraído, sendo que no decurso da ultrapassagem não ligou qualquer sinal luminoso, nem efectuou sinal com o braço.

Devido à velocidade que levava, o motociclo foi depois embater no muro situado no lado esquerdo da via, atento o sentido M... - C..., onde se imobilizou, tendo ficado com a parte frontal completamente destruída.

As instalações da firma “FF” ficam situadas a cerca de 50 ou 60 metros da curva que se desenvolve para a direita que antecede a recta do local do sinistro, sentido M... - C..., sendo esta uma curva com visibilidade reduzida, dado que, do seu lado direito, se forma um morro em terra, sobranceiro à via, com mais de três metros de altura.

Portanto, o que sucedeu, foi que o motociclo surgiu como uma flecha atrás do “Golf”, no momento em que este iniciava a manobra, circulando, à saída da curva, junto à berma direita - a cortar a curva - a uma velocidade superior a 120 Km/h.

Além disso, o motociclista dispunha de toda a metade direita da via, atento o sentido M... C..., completamente livre.

O Golf ficou imobilizado totalmente na metade esquerda da via, atento o sentido M... - C... e o motociclo foi parar à berma esquerda da via, sendo que o ponto do embate localizou-se a cerca de 50 centímetros da linha que delimita a berma esquerda da via, atento o sentido M... - C....

Salienta que a pancada foi de tal modo forte que o “Golf” rodopiou para a direita, ficando já orientado para M..., mas ainda totalmente na metade esquerda da via, atento o sentido M... - C..., ficando pois, o sinistro a dever-se unicamente à distracção, negligência, imprevidência e manifesta falta de cuidado da própria vítima.

Replicou a autora e veio com a ampliação do pedido, terminando pela improcedência das excepções, pela admissão da ampliação do pedido e que seja a ré condenada a pagar à autora a quantia de € 71.353,49, acrescida de juros de mora desde 3/03/2006, bem como a quantia de 50.460,95 CHF, ou seja € 30.551,58 acrescidos de juros de mora contados desde a notificação da ampliação do pedido.

Requereu ainda a ampliação do pedido em 26.394,30 CHF, ou seja € 24.018,81, acrescidos de juros de mora contados desde a notificação da ampliação do pedido.

Oportunamente foi proferida sentença, julgando-se a acção totalmente improcedente por não provada e, em consequência, a ré foi absolvida do pedido.

Inconformada, recorreu a Autora para o Tribunal da Relação do Porto que, por acórdão de 10/09/2013, reformado pelo acórdão de 29/10/2013, julgando procedente a apelação, revogou a sentença recorrida e condenou a Ré a pagar à Autora o contravalor em euros de CHF 58.926, acrescido de juros de mora á taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento e ainda o contravalor das seguintes quantias: (I) 25.230,48 CHF, acrescidos de juros de mora desde 11/05/2010 e (ii) 13.197,15 CHF, acrescidos de juros de mora, desde 16/11/2011. Mais condenou a Ré a pagar metade do valor das pensões futuras por morte de DD e decorrentes do acidente dos autos que a Autora tenha de pagar, a liquidar em incidente de liquidação.

Agora, é a Ré que, inconformada, recorre de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, finalizando a alegação com as seguintes conclusões: 1ª - No douto acórdão recorrido entendeu-se responsabilizar os condutores com base na...

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