Decreto-Lei n.º 57/2021

ELIhttps://data.dre.pt/eli/dec-lei/57/2021/07/13/p/dre
Data de publicação13 Julho 2021
SectionSerie I
ÓrgãoPresidência do Conselho de Ministros

Decreto-Lei n.º 57/2021

de 13 de julho

Sumário: Altera o regime jurídico do contrato de transporte rodoviário nacional de mercadorias.

O Governo criou o grupo de trabalho para a avaliação das condições de cargas e descargas nos operadores logísticos e portos marítimos, através do Despacho n.º 7580-A/2019, de 26 de agosto, com o objetivo de avaliar o funcionamento das operações de carga e descarga no transporte rodoviário de mercadorias, visando a sua regulamentação.

O referido grupo de trabalho, coordenado por um representante da área governativa das infraestruturas e da habitação, e composto por intervenientes relevantes do setor do transporte rodoviário de mercadorias, incluindo associações representativas dos transportadores, associações representativas das empresas de distribuição, carregadores e associações sindicais, decidiu propor ao Governo um modelo de autorregulamentação para as matérias em referência, incluindo, para além das operações de carga e descarga, a regulação e regulamentação dos respetivos tempos de espera.

Assim, no dia 2 de dezembro de 2019, os membros do referido grupo de trabalho celebraram um acordo-quadro que incluiu, de acordo com o modelo de autorregulamentação consensualizado, entre outras, as matérias relativas aos tempos de espera e cargas e descargas, considerando a clarificação da responsabilidade dos diversos intervenientes nas operações de transporte, no âmbito da cadeia logística e, ainda, a regulamentação convencional, designadamente o contrato coletivo de trabalho vertical em vigor, no que respeita aos motoristas do transporte rodoviário de mercadorias e a legislação laboral aplicável.

Este acordo-quadro previa a criação e funcionamento de uma comissão de acompanhamento para avaliação do modelo de autorregulamentação consensualizado, que vigorou durante um período probatório, inicialmente estabelecido entre 6 de janeiro e 30 de junho de 2020 e depois, por força dos condicionalismos impostos pela pandemia da doença COVID-19, até setembro de 2020. Esta comissão de acompanhamento entregou ao Governo um relatório final, datado de 12 de outubro de 2020, apresentando as suas conclusões e propostas de atuação.

Decorrido o referido período probatório e recolhida informação sobre a aplicabilidade e eficácia das cláusulas acordadas, obtida através de diversas denúncias feitas pelos motoristas através do preenchimento do formulário elaborado com essa finalidade pela comissão de acompanhamento e ainda através de visitas inspetivas que esta comissão realizou a algumas empresas, cumpria ponderar se o modelo de autorregulamentação seria suficiente ou se subsistem matérias que, tendo em conta os objetivos de política pública expressos no acordo-quadro e relacionados com questões que visam a melhoria da eficiência da economia nacional, aconselham uma intervenção legislativa.

Ora, de acordo com a análise da comissão de acompanhamento da implementação do acordo-quadro, os resultados, obtidos com base em dados recolhidos através de formulários, questionários e ações de fiscalização, têm vindo a revelar-se insuficientes para o cumprimento dos objetivos de política pública assumidos como pressupostos do referido acordo-quadro. Ademais, tem-se verificado que os tempos de espera excessivos se têm revelado prejudiciais para a economia nacional e para a produtividade empresarial.

Face à circunstância descrita, considera-se adequado proceder à alteração do teor atual do Decreto-Lei n.º 239/2003, de 4 de outubro, consagrando normativos relativos às matérias relacionadas com cargas e descargas, tempos de espera, fiscalização e regime sancionatório.

O presente decreto-lei tem em conta que o contrato de transporte rodoviário de mercadorias é um contrato de direito privado, pelo que se conforma, designadamente, com os limites consagrados no artigo 61.º da Constituição.

Assim, considerando os limites constitucionais quanto à liberdade de iniciativa económica privada, as normas relativas à responsabilidade pelas operações de carga e descarga são estabelecidas a nível supletivo, deixando margem para que as partes, no âmbito da sua liberdade de auto-organização, possam convencionar em sentido contrário. Por outro lado, tendo em conta a necessidade de preservar as regras relativas à segurança no trabalho, caso o transportador assuma tal responsabilidade, deve assegurar que os trabalhadores responsáveis pelas operações em causa - que não motoristas - recebam a formação profissional adequada.

No que respeita aos tempos de espera, consagrando o princípio da reciprocidade, estabelece-se o regime indemnizatório, por incumprimento contratual, e não sancionatório, com base nas tabelas já testadas no acordo-quadro em vigor.

O regime sancionatório está de acordo com o regime geral, respeitando os respetivos limites, consoante se trate de pessoa singular ou coletiva.

O presente decreto-lei foi sujeito a apreciação pública, mediante publicação na separata n.º 5 do Boletim do Trabalho e Emprego de 9 de abril de 2021.

Assim:

Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:

Artigo 1.º

Objeto

O presente decreto-lei procede à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 239/2003, de 4 de outubro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 145/2008, de 28 de julho, que estabelece o regime jurídico do contrato de transporte rodoviário nacional de mercadorias.

Artigo 2.º

Alteração ao Decreto-Lei n.º 239/2003, de 4 de outubro

O artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 239/2003, de 4 de outubro, na sua redação atual, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 1.º

[...]

O presente decreto-lei estabelece o regime jurídico do contrato de transporte rodoviário nacional de mercadorias e das operações de carga e descarga de mercadorias realizadas em território nacional, incluindo dos tempos de espera, sejam elas relacionadas com transportes nacionais ou internacionais.»

Artigo 3.º

Aditamento ao Decreto-Lei n.º 239/2003, de 4 de outubro

São aditados ao Decreto-Lei n.º 239/2003, de 4 de outubro, na sua redação atual, os artigos 23.º-A, 23.º-B, 23.º-C, 23.º-D, 23.º-E, 23.º-F, 23.º-G, 23.º-H e 23.º-I, com a seguinte redação:

«Artigo 23.º-A

Tempo de espera

1 - Considera-se tempo de espera o período durante o qual o motorista se registe no cliente e esteja disponível para:

a) Que seja dado início às operações de carga e descarga, o que corresponde ao tempo de espera inicial; ou

b) Sair das instalações do cliente depois de efetuada a operação de carga ou de descarga, o que corresponde ao tempo de espera final.

2 - O tempo máximo de espera estabelecido para realizar cada operação de carga e de descarga da mercadoria, que inclui o tempo de espera inicial e o tempo de espera final, é de duas horas, contabilizadas a partir da hora previamente acordada ou agendada entre o expedidor, o destinatário e o transportador.

3 - Caso não tenha sido acordada ou agendada uma hora determinada e a viatura se apresente nas instalações em que a operação de carga ou de descarga deve ter lugar, a contagem do tempo de espera inicia-se a partir da hora de registo da viatura no sistema do carregador, do expedidor ou do destinatário, salvo quanto às entregas a lojas.

4 - O tempo de espera não inclui o tempo necessário à operação de carga e descarga, salvo se contratualizado em sentido diferente entre as partes.

5 - A operação de carga e de descarga deve ser agendada com:

a) 24 horas de antecedência, para o transporte nacional, ou no dia útil precedente, caso se trate de transporte de mercadorias perigosas;

b) 48 horas de antecedência, para o transporte entre Portugal e Espanha, ou no dia útil precedente, caso se trate de transporte de mercadorias perigosas; e

c) 72 horas para os restantes transportes internacionais.

6 - Não obstante o disposto no número anterior, deve atender-se a situações de exceção, nomeadamente situações de rutura, intervenções urgentes, intervenções técnicas ou questões de segurança, que limitem a atividade normal e não permitam obedecer à antecedência normal do planeamento.

7 - No caso de o cliente ter informado o transportador sobre o horário de funcionamento do local onde a carga ou a descarga tem lugar e o motorista lá se apresente em momento prévio ao agendado ou durante o respetivo período de encerramento, o tempo de espera só tem início após a indicação de novo horário de agendamento.

8 - O período máximo de espera de duas horas não se aplica aos contratos em vigor que disponham em sentido diferente nesta matéria.

Artigo 23.º-B

Responsabilidade pelo tempo de espera

1 - A responsabilidade relativa ao tempo de espera assenta no princípio da reciprocidade e aplica-se em caso de incumprimento por parte do carregador, do expedidor, do destinatário ou do transportador.

2 - Não obstante o disposto no número anterior, é da responsabilidade do expedidor ou do destinatário, conforme se trate de carga ou descarga, respetivamente, garantir que todos os procedimentos necessários a estas operações, nomeadamente os administrativos e aduaneiros, são antecipada e atempadamente cumpridos por forma a respeitar o período de espera de duas horas.

3 - Excetua-se do disposto nos números anteriores o transporte de produtos perecíveis que, pela sua natureza, possa ser agendado em prazo inferior ao das 24 horas.

4 - Quando o tempo de espera de duas horas seja ultrapassado por motivo respeitante ao expedidor ou ao destinatário, o transportador tem direito a uma indemnização a cargo do responsável pelo incumprimento, pelo tempo de paralisação do veículo que não inclui as duas horas do tempo de espera, por cada hora ou fração subsequente, até ao limite de 10 horas, tendo por referência a tabela constante do anexo ao presente decreto-lei e do qual faz parte integrante.

5 - Se a paralisação do veículo for superior a 10 horas por motivo não imputável ao transportador, este tem direito a uma indemnização, a cargo do responsável pelo incumprimento, de acordo com os valores da tabela referida, por cada hora ou fração, acrescidos de 25 % até ao final da paralisação.

6 - Sem prejuízo do estabelecido no artigo...

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