Decreto-Lei n.º 194/2009, de 20 de Agosto de 2009

Decreto-Lei n. 194/2009

de 20 de Agosto

As actividades de abastecimento público de água às populaçóes, de saneamento de águas residuais urbanas e de gestáo de resíduos urbanos constituem serviços públicos de carácter estrutural, essenciais ao bem -estar geral, à saúde pública e à segurança colectiva das populaçóes, às actividades económicas e à protecçáo do ambiente. Estes serviços devem pautar -se por princípios de universalidade no acesso, de continuidade e qualidade de serviço e de eficiência e equidade dos tarifários aplicados.

O actual regime de abastecimento de água, saneamento de águas residuais e gestáo de resíduos urbanos assenta na dicotomia entre sistemas municipais, situados na esfera dos municípios, onde se incluem também os sistemas intermunicipais, e sistemas multimunicipais, situados na esfera do Estado.

No quadro de transferência de atribuiçóes e competências para as autarquias locais, os municípios encontram -se incumbidos de assegurar a provisáo de serviços municipais de abastecimento de água, de saneamento de águas residuais e de gestáo de resíduos urbanos, nos termos previstos na Lei n. 159/99, de 14 de Setembro, sem prejuízo da possibilidade de criaçáo de sistemas multimunicipais, de titularidade estatal.

Esta incumbência pode ser prosseguida de diversas formas. Para além do modelo de gestáo directa do serviço através das unidades orgânicas do município (através de serviços municipais ou municipalizados), existe igualmente a possibilidade de empresarializaçáo dos sistemas municipais prestadores destes serviços, a faculdade de serem explorados através de associaçóes de utentes e a hipótese de abertura da sua gestáo ao sector privado, através de concessáo. Estas últimas hipóteses foram abertas pelo Decreto-Lei n. 372/93, de 29 de Outubro, que veio alterar a lei de delimitaçáo dos sectores, aprovada pela Lei n. 46/77, de 8 de Julho, entretanto revogada pela Lei n. 88 -A/97, de 25 de Julho, e pelo Decreto -Lei n. 379/93, de 5 de Novembro. A Lei n. 58/98, de 18 de Agosto, entretanto substituída pela Lei n. 53 -F/2006, de 29 de Dezembro, possibilitou a delegaçáo destes serviços em entidades do sector empresarial local, com eventual participaçáo da iniciativa privada.

Face à crescente complexidade dos problemas enfrentados pelos segmentos de actividade económica em causa e à sua especial relevância para as populaçóes, foi entendido proceder a uma revisáo do regime jurídico dos serviços municipais de abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais urbanas e de gestáo de resíduos urbanos.

É definido, assim, um regime comum, uniforme e harmonizado aplicável a todos os serviços municipais, independentemente do modelo de gestáo adoptado, sendo igualmente densificadas as normas específicas a cada modelo de gestáo.

O presente decreto -lei visa assegurar uma correcta protecçáo e informaçáo do utilizador destes serviços, evitando possíveis abusos decorrentes dos direitos de exclusivo, por um lado, no que se refere à garantia e ao controlo da qualidade dos serviços públicos prestados e, por outro, no que respeita à supervisáo e controlo dos preços praticados, que se revela essencial por se estar perante situaçóes de monopólio.

Pretende -se também assegurar, quando aplicável, condiçóes de igualdade e transparência no acesso à actividade e no respectivo exercício, bem como nas relaçóes contratuais. Visa -se ainda acautelar a sustentabilidade económico -financeira, infra--estrutural e operacional dos sistemas.

Por fim, articula -se o regime aplicável com as alteraçóes legislativas entretanto ocorridas. É especialmente significativo, devido às potenciais implicaçóes nos serviços municipais, o Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto -Lei n. 18/2008, de 29 de Janeiro, que fornece um regime geral para a contrataçáo pública e para a disciplina substantiva dos contratos administrativos, e o regime jurídico do sector empresarial local, aprovado pelo Lei n. 53 -F/2006, de 29 de Dezembro, que define o quadro aplicável à constituiçáo e funcionamento das empresas municipais, intermunicipais e metropolitanas. Atendendo às especificidades próprias das actividades em causa, o presente decreto -lei concretiza, nalguns aspectos, e introduz especificidades noutros, relativamente às normas gerais constantes daqueles diplomas legais.

Foram ouvidos os órgáos de governo próprio das Regióes Autónomas, a Associaçáo Nacional de Municípios Portugueses e as associaçóes de defesa do consumidor.

Foi promovida a audiçáo do Conselho Nacional do Consumo e da Associaçáo Nacional de Freguesias.

Assim:

Nos termos da alínea a) do n. 1 do artigo 198. da Constituiçáo, o Governo decreta o seguinte:

CAPÍTULO I

Disposiçóes gerais

Artigo 1.

Objecto

O presente decreto -lei estabelece o regime jurídico dos serviços municipais de abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais urbanas e de gestáo de resíduos urbanos.

Artigo 2. Âmbito

1 - Os serviços municipais de abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais urbanas e de gestáo de resíduos urbanos abrangidos pelo presente decreto -lei compreendem, no todo ou em parte:

  1. A gestáo dos sistemas municipais de captaçáo, elevaçáo, tratamento, aduçáo, armazenamento e distribuiçáo de água para consumo público, bem como a gestáo de fontanários náo ligados à rede pública de distribuiçáo de água que sejam origem única de água para consumo humano; b) A gestáo dos sistemas municipais de recolha, drenagem, elevaçáo, tratamento e rejeiçáo de águas residuais urbanas, bem como a recolha, o transporte e o destino final de lamas de fossas sépticas individuais;

  2. A gestáo dos sistemas municipais de recolha, transporte, armazenagem, triagem, tratamento, valorizaçáo e eliminaçáo de resíduos urbanos, bem como as operaçóes de descontaminaçáo de solos e a monitorizaçáo dos locais de deposiçáo após o encerramento das respectivas instalaçóes.

    2 - Os serviços referidos no número anterior podem incluir a valorizaçáo de subprodutos resultantes daquelas actividades, nomeadamente a disponibilizaçáo de águas residuais tratadas aptas a novas utilizaçóes.

    3 - Os serviços referidos nas alíneas a) e b) do n. 1 devem ser prestados através de instalaçóes e redes fixas e, excepcionalmente, através de meios móveis.

    4 - Os serviços referidos na alínea b) do n. 1 podem incluir a gestáo de sistemas municipais de águas pluviais, onde se engloba a sua drenagem e destino final, devendo, nesse caso, ambos os sistemas ser tendencialmente distintos.

    5 - Os serviços referidos na alínea c) do n. 1 podem incluir a limpeza urbana.

    6 - Para efeitos do presente decreto -lei, sáo sistemas municipais todos os que náo devam ser considerados sistemas multimunicipais, nos termos do n. 2 do artigo 1. da Lei n. 88 -A/97, de 25 de Julho, incluindo os sistemas

    geridos através de associaçóes de municípios ou pelas áreas metropolitanas.

    Artigo 3.

    Serviços de interesse geral

    A exploraçáo e gestáo dos sistemas municipais, tal como referidas no n. 1 do artigo anterior, consubstanciam serviços de interesse geral e visam a prossecuçáo do interesse público, estando sujeitas a obrigaçóes específicas de serviço público.

    Artigo 4.

    Exclusividade territorial

    1 - A prestaçáo dos serviços referidos no n. 1 do artigo 2. é realizada em regime de exclusividade territorial.

    2 - Excepcionalmente e em zonas delimitadas, um determinado serviço pode ser assegurado transitoriamente por terceiras entidades, quando a entidade gestora náo esteja em condiçóes de o fazer e seja necessário salvaguardar os interesses dos utilizadores, por decisáo da entidade titular dos serviços.

    Artigo 5.

    Princípios gerais

    1 - As actividades referidas no n. 1 do artigo 2. devem ser prestadas de acordo com os seguintes princípios:

  3. A promoçáo tendencial da sua universalidade e a garantia da igualdade no acesso;

  4. A garantia da qualidade do serviço e da protecçáo dos interesses dos utilizadores;

  5. O desenvolvimento da transparência na prestaçáo dos serviços;

  6. A protecçáo da saúde pública e do ambiente;

  7. A garantia da eficiência e melhoria contínua na utilizaçáo dos recursos afectos, respondendo à evoluçáo das exigências técnicas e às melhores técnicas ambientais disponíveis;

  8. A promoçáo da solidariedade económica e social, do correcto ordenamento do território e do desenvolvimento regional.

    2 - Os princípios estabelecidos no número anterior devem ser prosseguidos de forma eficaz, de forma a oferecer, ao menor custo para os utilizadores, elevados níveis de qualidade de serviço.

    3 - A organizaçáo dos sistemas deve privilegiar:

  9. A gestáo integrada territorialmente mais adequada associada à prestaçáo de cada um dos serviços, de forma a minimizar custos através da maximizaçáo de economias de escala;

  10. A gestáo integrada dos sistemas de abastecimento público de água e de saneamento de águas residuais urbanas e de sistemas de saneamento de águas pluviais, de forma a maximizar economias de gama;

  11. A gestáo integrada de todo o processo produtivo associado a cada um destes serviços, de forma a maximizar economias de processo através de um maior grau de integraçáo vertical.

    5420 CAPÍTULO II

    Entidades intervenientes

    Artigo 6.

    Entidade titular dos serviços

    1 - Sem prejuízo do regime específico dos serviços de titularidade estatal, objecto de legislaçáo própria, a gestáo dos serviços municipais de abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais urbanas e de gestáo de resíduos urbanos é uma atribuiçáo dos municípios e pode ser por eles prosseguida isoladamente ou através de associaçóes de municípios ou de áreas metropolitanas, mediante sistemas intermunicipais, nos termos do presente decreto -lei.

    2 - Para efeitos do presente decreto -lei, as entidades referidas na parte final do número anterior sáo as entidades titulares da gestáo dos respectivos sistemas municipais.

    Artigo 7.

    Entidade gestora dos serviços e modelos de gestáo

    1 - A entidade gestora dos serviços municipais é definida pela entidade titular, de acordo com um dos...

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