Assento n.º DAS4/92, de 10 de Julho de 1992

Assento Acordam, em tribunal pleno, no Supremo Tribunal de Justiça: 1 - António Gomes Júlio, casado, fogueiro, com os demais sinais dos autos, veio, a fl. 276, interpor recurso para o tribunal pleno do Acórdão de fls. 271 e seguintes deste Supremo Tribunal de Justiça de 27 de Fevereiro de 1991, com o fundamento de haver decidido, em oposição com o Acórdão deste Tribunal de 8 de Outubro de 1969, proferido no processo n.º 32987, que, contrariamente a este aresto, a inibição da faculdade de conduzir constitui uma pena acessória e não uma medida de segurança.

Está, assim, o acórdão recorrido em oposição, sobre a mesma questão de direito, com o Acórdão de 8 de Outubro de 1969, este último transitado em julgado.

2 - Seguiu o processo os seus regulares termos.

A fls. 16 e seguintes decidiu-se, por acórdão de 27 de Novembro de 1991: Que existia oposição sobre a mesma questão de direito; Que foram ambos os acórdãos relatados no domínio da mesma legislação, já que, durante o intervalo da sua prolação, não ocorreu modificação legislativa que interferisse, directa ou indirectamente, na resolução da questão de direito controvertida; E que o recurso prosseguisse os seus termos.

A fls. 20 e 22 mostram-se juntas as alegações escritas, respectivamente, do recorrente e do ilustre representante do Ministério Público.

Em ambas as doutas e bem elaboradas peças processuais os seus signatários mostram-se concordes no sentido de que a inibição da faculdade de conduzir concretiza uma medida de segurança, devendo lavrar-se assento nessaconformidade.

3 - Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

Não se vê motivo para discordar, nos termos do n.º 3 do artigo 766.º do Código de Processo Civil, do acórdão da secção que reconheceu a existência de oposição.

A questão problematizada no presente recurso equaciona-se, em síntese, em averiguar e julgar se a inibição da faculdade de conduzir consignada na lei estradal reveste a dignidade de uma medida de segurança ou se, ao invés, envolve a grandeza de uma pena acessória, como sufraga o acórdão agravado.

Desde já se tem de sublinhar que tal proposta questão não tem apenas carácter académico, mas é de grande relevo de natureza prática, atenta a diferente terapêutica a utilizar em determinados planos, nomeadamente nos aspectos da suspensão da execução da pena, no caso de amnistias, e na determinação da autoridade competente para operar a sua aplicação.

Preceitua o artigo 61.º do Código da Estrada, sob a epígrafe 'Inibição do direito de conduzir', o seguinte: 1 - São inibidos definitivamente de conduzir e para tal fim privados das respectivaslicenças: a).....................................................................................................................

b).....................................................................................................................

c).....................................................................................................................

2 - Serão inibidos temporariamente da faculdade de conduzir e privados das respectivaslicenças: a).....................................................................................................................

b).....................................................................................................................

c).....................................................................................................................

d).....................................................................................................................

3 - ....................................................................................................................

4 - ....................................................................................................................

5 - ....................................................................................................................

6 - ....................................................................................................................

Além do preceito acabado de descrever, há que ter em conta a Lei n.º 3/82, de 29 de Março, em que expressamente se permite se decrete também a medida em apreço a todos aqueles que conduzam veículos sob a influência do álcool e em casos de habituação alcoólica.

Destes normativos legais se infere que a nossa lei autoriza que, ao lado das penas a aplicar aos condutores que, com culpa, tenham desencadeado acidentes, os tribunais possam aplicar-lhes outras sanções que, não sendo penas no verdadeiro sentido jurídico da palavra, pois delas se distinguem, são medidas que se destinam à prevenção criminal, tendo como silhar a perigosidade do delinquente.

Que natureza jurídica revestem tais medidas ou previdências? Vejamos, em rápido bosquejo, o que a esse respeito tem sido perfilhado através da história doutrinal e jurisprudencial.

Várias têm sido as posições defendidas: Pinheiro de Farinha, in Scientia Juridica, ano V, 1956, a pp. 177 e seguintes, protege a tese de que a inibição da faculdade de conduzir assumiria a natureza de pena complementar ou acessória, nos casos do n.º 2 do artigo 61.º, de efeito da pena nos casos do artigo 46.º, n.º 2, alíneas a) e b), e n.os 1 e 2, alíneas c) e d), e 4 do mesmo artigo e, finalmente, de medida de segurança nos casos previstos no artigo 46.º, n.º 2, alínea a), n.º 1, alínea e), e ainda no artigo 61.º, n.º 1, alíneas b) e c).

Cavaleiro de Ferreira, in Direito Penal, parte IV, a p. 202, defende que a interdição de conduzir seria um efeito da pena quando contribuísse uma incapacidade resultante de uma ou várias condenações penais - casos das alíneas a), b), c) e e) do n.º 2 do artigo 46.º - e medida de segurança nos restantes casos, designadamente os previstos nas alíneas b) e c) do n.º 1 e n.º 2 do artigo 61.º Victor Faveiro, in Prevenção Criminal, admite a proposição de que a apreensão da carta é uma verdadeira pena acessória, podendo, porém, em certas hipóteses, ser considerada como medida de segurança aplicável administrativamente.

Maia Gonçalves sustenta no seu Código Penal, 1968, a p. 14, que a medida em estudo constitui uma pena acessória.

Há também quem tenha firmado o princípio de que, em certos casos - quando a inibição se encontra confrontada com a prática de crimes estradais -, estamos em presença de uma medida de segurança e, quando assim não suceder, a inibição reveste a natureza de uma medida de polícia (cf. Acórdão da Relação de Coimbra de 23 de Novembro de 1983, in Colectânea, ano VIII, 1983, 5, p. 81).

Finalmente, a jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça vem, desde há muito, perfilhando, una voice sine discrepante (segundo cremos, só o acórdão...

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