Acórdão nº 98/22.0T9VFC.L1-9 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-06-26

Ano2023
Número Acordão98/22.0T9VFC.L1-9
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Decisão Sumária
I Relatório

1. Nos presentes autos de recurso de contraordenação, oriundos do Tribunal judicial da Comarca dos Açores, Juízo de Competência Genérica de Vila Franca do Campo, realizado julgamento, foi proferida decisão da qual se transcreve o dispositivo:

IV – DECISÃO:
Pelo exposto, julgo o recurso improcedente e, em consequência, decido manter a decisão do Coordenador do Serviço Coordenador dos Transportes Terrestres – Direção Regional das Obras Pública e Transportes Terrestres – Secretaria Regional das Obras Públicas e Comunicações – Região Autónoma dos Açores, que aplicou ao Arguido AA, coima no valor mínimo de 120,00 EUR (cento e vinte euros) e a sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 30 (trinta) dias, pela prática da contraordenação prevista e punida pelas disposições conjugadas dos artigos 21.º e 23.º alínea a) do Regulamento de Sinalização de Trânsito (doravante RST), aprovado em anexo ao Decreto Regulamentar n.º 22-A/98, de 01/10, na redação atualmente em vigor, e dos artigos 133.º, 138.º n.º 1, 140.º, 146.º alínea n) e 147.º n.º 2 do Código da Estrada (doravante, CE), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, 03/05, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 102-B/2020, de 09/12.
Condeno o Recorrente nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 1 UC, nos termos do artigo 8.º n.º 7 e Tabela III do Regulamento das Custas Processuais.
Notifique e deposite.
*
Ao abrigo do disposto nos artigos 160.º n.º 3 do Código da Estrada, fica desde já o Arguido notificado para proceder à entrega da carta de condução no SCTT ou na Secretaria deste Tribunal, no prazo de 15 (quinze) dias úteis, após o trânsito em julgado da sentença, sob pena de, não o fazendo, incorrer na prática de um crime de desobediência, nos termos do disposto no artigo 348.º n.º 1 al. b) do Código Penal.
Vai ainda o Arguido advertido de que caso conduza veículos com motor durante o período de inibição incorre na prática de um crime de violação de proibições ou interdições, previsto e punido pelo art.º 353.º do Código Penal.
*
Vila Franca do Campo, 20 de outubro de 2022

2. Inconformado com tal decisão, dela veio o arguido apresentar recurso.
Da motivação, extraiu as seguintes conclusões:
a) Vem o presente recurso interposto da circunstância de o recorrente não se conformar com a douta sentença proferido pelo Reverendíssimo Tribunal Judicial de Vila Franca do Campo, Juízo Local de Competência Genérica, Comarca de Açores, nos presentes autos, que veio a condená-lo na sanção de inibição de condução pelo período de 30 dias e subtração de 4 pontos no título de condução.
b) A contraordenação de que o arguido vem condenado reporta-se ao facto de, alegadamente, “circular com o citado veículo na referida via, não cumpriu com a indicação dada pelo sinal vertical B2- STOP” (ipsis verbis).
c) O ora recorrente, não se pode conformar, uma vez que o Tribunal “a quo” ao formar a sua convicção, decidiu em sentido contrário ao direito, no que concerne ao que entende o recorrente carecer o sinal violado de homologação/aprovação para que daí se retire o seu cumprimento e eventual procedimento coercivo em face da sua infração.
d) Resulta da sentença ora recorrida que é dado por provado que:
2. O referido sinal foi adquirido e colocado pela Câmara Municipal de Vila Franca do Campo, respeitando as formas, cores, inscrições, símbolos e dimensões, bem os materiais utilizados e as regras da respetiva colocação.
e) A questão que aqui se nos coloca, é que a prova produzida em audiência de julgamento, independentemente da apreciação que lhe for cometida, não é suficiente nem poderá conduzir sem mais à condenação do arguido na sanção acessória aqui posta em crise.
f) O Tribunal a quo dá como provado o facto 2., contudo ao perscrutar a sentença recorrida, não há especificação ou menção de que prova se socorreu o Julgador para dar como provado tal facto.
g) Apelou o recorrente alegando que o sinal B2 em crise não está homologado e como tal, não se provando encontrar-se aquele aprovado pela entidade competente, cessa o dever de obediência, até que seja reposta a validade formal do mesmo,
h) Que não se contende apenas em ter o formato, as cores e indicações similares a um sinal de trânsito daquela tipologia.
i) A fundamentação que o Tribunal a quo alicerça a sua convicção posiciona-se precisamente na presunção que o sinal foi colocado pela entidade competente para o efeito, ou seja, a Câmara Municipal de Vila Franca do Campo, entidade com jurisdição para o efeito.
j) Contudo e em sentido diverso, a alegação do recorrente não se colocou a esse nível, antes, se o sinal foi aprovado ou homologado pela entidade competente para o efeito,
k) A própria Câmara Municipal esclarece que não dispõe de qualquer documento de onde conste a aprovação do referido sinal.
l) Ora, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 21/98 de 3 de janeiro dispõe que: “A instalação de sinais de trânsito nas vias públicas só pode ser efectuada pelas entidades competentes para a sua sinalização ou mediante autorização destas entidades.” (sublinhado nosso).
m) Não está em causa a instalação do sinal ou a entidade competente para a instalação, mas antes o seu registo e aprovação.
n) A Edilidade não dispõe de qualquer comprovativo de aprovação e consequente homologação dos sinais nessa mesma data.
o) Mas ainda que assim não se entenda, a mesma Edilidade que diz ser entidade competente para o efeito, nem com a colocação dos sinais se procedeu à sua aprovação e homologação, carecendo tais sinais de cumprir tal requisito legal cumulativo, ficando-se por ter as cores, dimensões e formato de um sinal de trânsito B2, mas faltando a respetiva homologação que é o que gera obrigatoriedade coerciva do seu cumprimento, com o respetivo fundamento legal para punir o seu incumprimento.
p) Ora, as competências das entidades publicas são exercidas através de atos administrativos, os quais resultam de deliberações sejam camarárias ou do seu Presidente, conforme seja aquela a entidade competente para a decisão.
q) Por maioria de razão e de direito, os atos praticados pelas Câmaras Municipais ou seu Presidente estão fundamentadas em atos administrativos saídos de deliberações necessariamente reduzidas a escrito e sob forma legal, não havendo quanto a esta matéria discricionariedade.
r) Ora, de que serve dizer-se competente para a aprovação e não agir em conformidade com a obrigação legal de prever tal deliberação na forma escrita e legalmente adequada,
s) Não podemos perder de vista que cabe à entidade administrativa o ónus da prova no sentido de refutar tal alegação e oferecer prova para o efeito.
t) Recebida a impugnação judicial, a entidade administrativa não a alterou ou reviu, nem tão pouco se importou em certificar-se se efetivamente existe alguma deliberação camarária (independentemente da entidade orgânica competente para o efeito) a aprovar o referido sinal de trânsito.
u) Salvo o devido respeito não se apurou dos factos que a Câmara Municipal tenha aprovado, deliberado ou autorizado a colocação do sinal de trânsito, já que a mesma não o consegue de forma alguma o comprovar, conforme resulta da informação por esta prestada, datada nos autos de 01/09/2022.
v) Os sinais de trânsito de carácter impositivo, como são os que estabelecem prescrições e proibições, em que se enquadra o sinal de “stop” ou “paragem obrigatória no cruzamento ou entroncamento” (art.º 21º do regulamento acima referido, ali identificado sob a designação de “B2”), contêm uma ordem legítima imposta aos condutores.
w) Grosso modo, a Câmara Municipal afirma ter colocado os sinais, mas não oferece qualquer registo, sumula ou memória descritiva que o tenha feito,
x) De igual modo, protela-se competente para a aprovação do aludido sinal de trânsito, contudo não junta a deliberação de onde emana o ato administrativo que o instituiu.
y) Neste sentido os acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 30.10.2013 Proc.º208/13.9TBGDR.C1 e Tribunal da Relação do Porto de 11.04.2018, proc. N.º
1930/17.6T9AVR.P1.
z) Mantendo-se a sentença recorrida, tal sugere que o ato de aprovar um sinal de trânsito para dar resposta a uma necessidade ou interesse público, bem como a sua colocação, será um ato totalmente discricionário, verbalmente empreendido,
aa) Sem que tal passe por uma deliberação camarária ou despacho do Presidente da Câmara, de acordo com o procedimento normal e característico de um qualquer outro procedimento.
bb) Verificando-se falta de fundamentação para a decisão, uma vez que não consta nos autos qualquer deliberação camarária, da Assembleia Municipal ou despacho do Presidente da Câmara que a prove o sinal contestado nos autos e delibere na sua colocação pela Câmara Municipal.
cc) Pelo que deverá ser dado por não provado o facto n.º 2 da sentença ora recorrida,
dd) E em consequência, absolvido o recorrente uma vez que não resulta provado com a consequente fundamentação, que o sinal em causa constasse de registo na entidade competente para a sua colocação e aprovação,
ee) Tão pouco nenhuma informação foi junta aos autos que esclareça quando foi colocado o sinal em causa, pelo que não se alcança como o Tribunal a quo dá por provado terem sido cumpridas todas as regras relativamente à sua colocação, se nem:
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO, DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, POR VIA DELE, SER REVOGADA A SENTENÇA RECORRIDA, E SUBSTITUIDA POR OUTRA QUE ABSOLVA O RECORRENTE DA PRÁTICA SANÇÃO DE INIBIÇÃO DE CONDUÇÃO A QUE FOI CONDENADO.
FAZENDO-SE, ASSIM, A ESPERADA JUSTIÇA

3.O recurso foi admitido a subir nos autos, de imediato e com efeito suspensivo.

4.O Digno Magistrado do Ministério Público na primeira instância apresentou a sua resposta em 17.11.2022.
Transcrevem-se as conclusões da resposta:
“1- Por sentença proferida nos presentes autos o douto
...

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