Acórdão nº 65/23.7PTFAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 19-03-2024

Data de Julgamento19 Março 2024
Ano2024
Número Acordão65/23.7PTFAR.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora
Acordam em conferência na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora
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I – RELATÓRIO

1. No Juízo Local Criminal de … (Juiz …), o arguido AA, com os demais sinais dos autos, foi submetido a julgamento em processo especial sumário, sendo-lhe imputada a prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos arts. 292.º, nº 1, e 69, nº 1, al. a), ambos do Código Penal.

2. Por sentença de 29 de junho de 2023, foi decidido:

“Em face do exposto, pelos factos praticados no dia 19 de junho de 2023, pelas 22 horas e 26 minutos, na Estrada …, em …, sita nesta localidade de …, o Tribunal decide:

A) Condenar o arguido, AA, pela prática, em autoria material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.º 292.º, 1, do Código Penal, na pena de 60 (sessenta) dias de multa, à razão diária de 6,75€ (seis euros e setenta e cinco cêntimos);

B) Proceder ao desconto, na pena imposta em A), de 1 (um) dia, atenta a detenção sofrida pelo arguido à ordem dos autos e nos termos do que se dispõe no n.º 2 do art.º 80.º do Código Penal, impondo-lhe o cumprimento de 59 (cinquenta e nove) dias de multa, à razão diária de 6,75€ (seis euros e setenta e cinco cêntimos), o que perfaz o montante global de 398,25€ (trezentos e noventa e oito euros e vinte e cinco);

C) Declarar que à pena de multa imposta em B) correspondem, nos termos do art. 49.º do Código Penal, 39 (trinta e nove) dias de prisão subsidiária;

D) Condenar o arguido, AA, na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados de qualquer categoria pelo período de 6 (seis) meses, nos termos do art.º 69.º, 1, a), do Código Penal, devendo proceder à entrega da carta de condução e/ou de qualquer outro título que o habilite a conduzir veículos motorizados na via pública, na Secretaria deste Juízo, ou em qualquer posto policial, no prazo de 10 (dez) dias a contar do trânsito em julgado da presente decisão, sob pena de, não o fazendo, incorrer na prática de um crime de desobediência, e ser ordenada a apreensão daquele título de condução - art.º 500.º, 2 e 3 do Código de Processo Penal;

E) Condenar o arguido no pagamento das custas processuais, fixando-se a taxa de justiça em 1 UC (cfr. art.º 8.º, 9 e Tabela III do Regulamento das Custas Processuais), reduzida a metade em vista da confissão integral e sem reservas, e sem prejuízo do apoio judiciário de que aquele, eventualmente, beneficie.

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Após trânsito:

a) Remeta boletim à Direção dos Serviços de Identificação Criminal (cfr. artigos 6.º, alínea a), e 7.º, n.º 2 da Lei n.º 37/2015, de 05.05);

b) Comunique à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária - art.º 500.º, 1, do Código de Processo Penal -, bem como ao IMT, I.P..

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Notifique e proceda-se ao depósito da sentença (artigo 372.º, n.º 5, do Código de Processo Penal).”.

3. Dessa decisão final interpôs recurso o Ministério Público, limitado à parte referente à pena acessória em que o arguido foi condenado, pedindo que se revogue a decisão nessa parte e se substitua por decisão que condene o arguido na pena acessória de proibição de conduzir por um período de 12 meses.

Extraiu o recorrente da sua motivação de recurso as seguintes conclusões:

“1 - O arguido foi condenado, nos presentes autos, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelos artigos 292.º, n.º 1 e 69.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 60 dias de multa, bem como na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 6 meses.

2 - A determinação da medida concreta da pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados deve fazer-se mediante os critérios utilizados na fixação da pena principal e definidos no art. 71 do Código Penal.

3 - Assim, há que ter em conta, quanto a tal questão, as exigências de prevenção de futuros crimes, o grau de culpa do arguido, o grau de álcool com que conduzia, a sua inserção social e familiar e a sua idade.

4 - A duração da pena acessória pode ser proporcionalmente diferente da concretamente encontrada para a pena principal por via, desde logo, da diversidade dos objetivos de política criminal ligados à aplicação de cada uma delas.

5 - Esta pena acessória deve contribuir decisivamente para a emenda cívica do condutor infrator, prevenindo a perigosidade deste, mas essencialmente, e cada vez mais, deve ter um efeito de prevenção geral de intimidação, face ao aumento da sinistralidade rodoviária decorrente do consumo abusivo de álcool.

6 - Contra o arguido releva a crescente incidência deste tipo de crimes e a importância do bem jurídico que lhe está subjacente, mostrando-se elevadas as exigências de prevenção geral, que demandam uma maior necessidade de sancionamento com vista ao restabelecimento da confiança na norma violada.

7 - Mostra-se, de igual modo, desfavorável para o arguido, o grau de culpa com que atuou, o qual se situa ao nível do dolo, bem como o elevado grau de ilicitude, patente na concreta taxa de álcool no sangue apresentada, já muito superior ao limite mínimo a partir do qual a prática dos factos em discussão constitui ilícito criminal.

8 - Pesando assim fundamentalmente contra o arguido, a circunstância de conduzir de noite com uma taxa elevadíssima de alcoolemia de 3,03 gr./l,

9 - A aplicação de uma pena de proibição de conduzir por 6 meses transmitiria uma ideia de laxismo que a consciência da comunidade não suportaria, criando um sentimento de desconfiança e de insegurança dos cidadãos nas instituições jurídico-penais.

10 - No caso em apreço, face à intensidade do dolo (art. 71 nº 2 alínea b) do Código Penal), bem como ao grau de ilicitude da conduta, tendo em atenção a elevadíssima taxa de álcool no sangue apresentada (art.71 nº 2 alínea a) do C.P.), parece-nos que a pena de 6 meses de proibição de conduzir fixada está desajustada da sua função preventiva especial e da sua função de proteção da comunidade em relação ao arguido ( art.71 nº 1 do Código Penal ).

11 – Face ao exposto e atendendo essencialmente à circunstância de que o arguido conduzia de noite com uma taxa elevadíssima de alcoolemia de 3,03 gr./l, entendo que a pena acessória de proibição de conduzir nunca poderia ser inferior a 12 meses, pelo que se nos afigura que a opção adotada na sentença está desajustada das circunstâncias do caso, parecendo injustificada face às elevadas necessidades de prevenção especial (face a um comportamento apto a colocar em perigo bens jurídicos essenciais, como sejam a segurança rodoviária e indiretamente bens pessoais, como seja a vida ,de indiscutível valor supremo).

12 - Foram assim violados os artigos 69 nº1 alínea a) e 71 nº 1 e nº 2 alíneas a), b) do Código Penal.”.

4. O recurso foi admitido, por ser tempestivo e legal.

5. Foi cumprido o disposto no artigo 411.º, n.º 6, do Código de Processo Penal, não tendo a defesa apresentado resposta ao recurso.

6. Neste Tribunal, a Sra. Procuradora-Geral Adjunta apresentou parecer no sentido da procedência parcial do recurso, exprimindo da seguinte forma a sua posição:

“Vem o Ministério Público recorrer da sentença, que, entre o mais condenou o arguido pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelos artigos 292.º, n.º 1 e 69.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 60 dias de multa, bem como na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 6 meses.

Por síntese, não se conforma o Ministério Público recorrente com a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 6 meses em que foi o arguido condenado.

Fundamentando que a determinação da medida concreta da pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados deve fazer-se mediante os critérios utilizados na fixação da pena principal e definidos no art. 71 do Código Penal, deve relevar as exigências de prevenção de futuros crimes, o grau de culpa do arguido, o grau de álcool com que conduzia, a sua inserção social...

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