Acórdão nº 246/19.8GCSSB-A.L1-5 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-05-23

Data de Julgamento23 Maio 2023
Ano2023
Número Acordão246/19.8GCSSB-A.L1-5
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. No processo n.° 246/19.8GCSSB, do Juízo Local Criminal do Seixal, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, foi proferido despacho, de 17 de Fevereiro de 2023, em que a Mmª Juíza a quo decidiu manter a decisão reclamada, proferida pela senhora escrivã do juízo, que rejeitou o pagamento de honorários, na parte cível, à ilustre senhora advogada.
*
2. Inconformada com essa decisão, dela recorreu a Ilustre Defensora, pugnando pela sua revogação e substituição por outra, que confirme o pedido de pagamento / compensação, efectuado pela recorrente, designadamente pela contestação do pedido de indemnização civil apresentado, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões:
“A. A questão objeto do presente recurso, como emerge do que supra se expôs, está em aferir se são ou não devidos honorários pela contestação do pedido de indemnização civil em processo penal, pelo ponto 3.2 da tabela anexa à Portaria 1386/2004, de 10 de novembro, quando o Defensor Nomeado, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 64.° do Código de Processo Penal, ainda não conhecia da decisão por parte da Segurança Social quanto ao requerimento de proteção jurídica apresentado pelo Arguido.
B. Refira-se que a aqui recorrente, submeteu a pagamento na Plataforma informática SINOA (Sistema de Informação Nacional da Ordem dos Advogados) os seus devidos e legítimos honorários, designadamente, pelo exercício do patrocínio de forma plena nos termos da nomeação, em virtude das alíneas a) e b) do n.° 1 do artigo 16.° da Lei 34/2004, de 29 de Julho, alterada e republicada pela Lei n.° 47/2007 de 28 de Agosto.
C. Neste intuito, a aqui recorrente, apresentou, nos termos e para os efeitos do disposto no n.° 1 do art.° 25.° da Portaria 10/2008, de 03 de janeiro, do previsto na Portaria 1386/2004, de 10 de novembro e tabela anexa, nomeadamente do constante do ponto 3.2 desta, o respetivo pedido de pagamento dos honorários devidos.
D. Não obstante, o referido pedido de pagamento de honorários foi rejeitado pela Secretaria do Tribunal apesar de tal pagamento ser legalmente devido nos termos do acervo legal supra citado.
E. Na notificação referente à recusa do pagamento em causa peticionado consta "Motivo: Identificação da entidade que não confirmou a prestação do(s) serviço(s) "
F. Não se conformando com o entendimento da Secretaria (cfr. Doc. 7), a Recorrente apresentou Reclamação do ato de não confirmação dos honorários por si lançados, nos termos do disposto no n.° 5 do art.° 157.° do CPC ex vi art.° 4.° do CPP. (Cfr. Doc. 5 e Doc. 6)
G. Por Despacho de 17.02.2023, veio o Tribunal recorrido pronunciar-se pelo indeferimento da Reclamação apresentada pela Recorrente, sustentando o entendimento da Secretaria. (Cfr. Doc. 8)
H. Ora, mantendo o entendimento da Secretaria e indeferindo a Reclamação apresentada pela ora Recorrente, o Despacho em referência e de que ora se recorre enferma, salvo melhor opinião que não se discerne, de errónea apreciação dos factos, bem como de equívoca interpretação e aplicação do quadro jurídico pertinente in casu.
I. Resulta claro, incontrovertido e incontrovertível, que a Recorrente foi nomeada para representar o Arguido A, no âmbito do processo-crime n.° 246/19.8GCSSB, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 64.° do Código de Processo Penal, tendo, a ora recorrente, ficado nomeada para o respetivo processo, de acordo com o estipulado artigo 2.° da Portaria 10/2008, de 03 de janeiro, dando origem ao Processo AJ n.° 38242/2022. 
J. Ora, ao contrário do entendimento prolatado pelo Tribunal a quo, dando sustentação a recusa de confirmação dos honorários lançados por parte da Secretaria, a verdade é que, muito embora a contestação do PIC não conste da tabela anexa à portaria 1386/2004, de 10.11, também as contestações das ações cíveis não estão previstas e obviamente que têm de ser pagas, pelo que tal argumento é completamente desprovido de razão.
K. Mais, os instrumentos de apoio invocados pela Senhora Escrivã e confirmados pela Meritíssima Senhora Juiz de Direito no despacho ora em causa face à Reclamação apresentada pela Recorrente, não constituem fonte de Direito, mas simplesmente um mero documento de apoio, razão pela qual é de atentar na Portaria n.° 1386/2004, de 10.11., a qual dispõe, no seu n.° 1 do art. 2.° que "São devidos aos Advogados, pelos serviços que prestem no âmbito da proteção jurídica, os honorários constantes da tabela em anexo."
L. Aliás, inclusivamente já existem diversas decisões judicias proferidas em casos análogos ao presente em que, justamente os Tribunais Judiciais respetivos decidiram das reclamações dos atos de rejeição proferidos pelas secretarias.
M. E, pois, manifesto que as decisões judiciais já proferidas e transitadas em julgado sobre a presente matéria, prevalecem sobre os documentos de apoio invocados (Manual da DGAJ) que não são de todo fontes de direito, ao contrário do que sucede com as decisões judiciais!
N. Atendendo ao supra referido, há que fazer menção, a título meramente exemplificativo de várias situações análogas - existindo muitas outras - à questão em apreço, que foram apreciadas e bem decididas, designadamente:
• Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, no âmbito do processo n.° 144/18.2T9BRG-A.G1, datado de 04-04-2022, do qual se cita no sumário:
- Tendo sido a ilustre advogada nomeada defensora ao arguido por imposição legal, na sequência de acusação contra ele deduzida nos mitos, essa representação mantém-se para os actos subsequentes do processo, incluindo para os atinentes à instância cível enxertada nos autos, independentemente de a nomeação não decorrer de requerimento de proteção jurídica nessa modalidade formulado pelo arguido à autoridade administrativa competente.
II - Decorre do disposto no art. 66°, n° 5, do CPP a possibilidade de os honorários devidos ao defensor nomeado serem suportados pelas «partes civis», isto é, demandante ou demandado, consoante o desfecho do pedido de indemnização civil, do que se depreende que a remuneração do defensor inclui a sua actividade no que tange à instância cível, pois que de outra maneira não se compreenderia que a «parte civil» que decaiu fosse responsabilizada pela liquidação de honorários devidos a advogado com intervenção circunscrita à parte criminal.
III- Tendo a ilustre advogada nomeada deduzido contestação à matéria criminal e cível em nome do arguido/demandado, arrolado testemunhas e igualmente defendido o arguido/demandado na audiência de julgamento tem direito, de acordo com o previsto nos pontos 3.1.1.2 e 3.2 da Tabela anexa à Portaria n° 1386/2004, de 10.11 [ex vi do art. 66°, n°5, do CPP], a receber, cumulativamente, honorários pelos serviços prestados na acção penal e na acção civil, pagamento que incumbe ao Estado em virtude de o seu representado ter obtido, entretanto, protecção jurídica na modalidade de dispensa de pagamento da compensação devida ao seu defensor.(...)" (negrito e sublinhado nosso)
Lmfc:http://Www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/afe87a897482aa298025882c004db896?OpenDocument
E,
• Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, no âmbito do processo n.° 1958/15.0T9BRG-E.G1, datado de 12-09-2022, do qual se cita no sumário:
" (...)! - Por força do art.º 44°, L. n.° 34/04, 29/7 (Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais) são aplicáveis aos casos de nomeação de Advogado em Processo Penal, os preceitos anteriores que se referem ao apoio judiciário, com exceção dos n.° 2) e 3), do respetivo art.º 18°,
II - São pois, nesta sede diretamente aplicáveis as normas dos nº. 4) e 5) do referido art.° 18°, em que se pretende que a nomeação abranja tudo o que se relaciona com o processo em que ocorreu a nomeação.
III - A nomeação de Defensor em Processo Crime abrange, pois, e também o pedido cível, se deduzido.
IV - A Portaria nº 386/04, 10/11, trata autonomamente os honorários devidos ao Advogado pela intervenção em Processo Crime e no Processo Cível enxertado, pelo que os respetivos montantes devem ser cumulados - cfr. pontos 3.2. e 11.1.3., da referida tabela/...)'' (negrito e sublinhado nosso)
Li«fe:http://Www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/400a6fle63a38fd9802588cb00335496?OpenDocument
O. Nesta conformidade, salvo o devido respetivo por opinião distinta, toma-se evidente que não há qualquer fundamento legal para o determinado pela Meritíssima Juiz de Direito a quo no despacho ora em causa.
P. Aliás, com a prolação do Despacho Judicial em
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