Acórdão nº 189/22.8GBAND.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-03-15

Ano2023
Número Acordão189/22.8GBAND.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo n.º 189/22.8GBAND.P1

Acordam, em conferência, na Segunda Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:
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1. RELATÓRIO

Após realização da audiência de julgamento no Processo Sumário nº 189/22.8GBAND do Juízo de Competência Genérica da Anadia do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, foi em 07.06.2022 proferida sentença, na qual se decidiu (transcrição):

“VII – DECISÃO
Nestes termos o Tribunal decide:
1. Condenar a arguida AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punível pelas disposições conjugadas dos art.s 292º, n.º 1 e 69, n.º 1, alínea a), bem como 14.º, 26.º todos do Código Penal, por referência ao artigo 1.º, al. x), 105.º e 148.º, n.º 2 todos do Código da Estrada, na pena 75 (setenta e cinco) dias de multa, à taxa diária de €7 (sete euros).
2. Condenar ainda a arguida na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 4 (quatro) meses.
3. Condenar a arguida a pagar as custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 2 U.C (artigo 513º do Código de Processo Penal conjugado com artigos 8.º do Regulamento das Custas Processuais e tabela III anexa), e legais encargos com o processo nos termos do art.º 514.º do C.P.P.
(…)”

Inconformada com esta decisão, a arguida AA recorreu para este Tribunal da Relação do Porto, com os fundamentos descritos na respectiva motivação e contidos nas seguintes “conclusões”, que se transcrevem:

“1. Decorrida a audiência de julgamento veio a Mmª. Juíz do Tribunal da Comarca de Aveiro – Juízo de Competência Genérica de Anadia:
2. Condenar a arguida AA pela prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p.p. pelo art.º 292.°, do C. Penal.
3. Em primeiro lugar, verifica-se erro na resposta dada a alguns factos que foram objecto de julgamento, merecendo, também alguns reparos o julgamento em matéria de direito;
4. Impõem-se a reapreciação da prova e a consequente reapreciação da matéria constante dos Pontos 4. 5. 6. 7. e 10. dos Factos Provados, e da constante dos Factos Não Provados: - Para “Provada” a matéria de facto constante dos Factos Não Provados: - A arguida, à data dos factos, estava a tomar Prozac e Alprozalan e - Aditado e dado como provado um Novo Facto com o seguinte teor: - A arguida, face à condução desempenhada, não representou como possível ser portadora de uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,20g/l., porquanto do cruzamento dos depoimentos prestados pelo militar da GNR-Depoimento de BB (Início Gravação: 09.05.2022 - 10:29:24), com as declarações da arguida - Depoimento de AA (Início Gravação: 25.05.2022 - 14:42:35); e Depoimentos de CC -Testemunha (Início Gravação: 09-05-2022 - 10:46:35) e DD – Testemunha (Início Gravação - 09.05.2022 - 10:55:13) conclui-se que a arguida não conduziu o veículo em causa, sobre elevado teor de “álcool” presumidamente apurado no sangue da arguida.
5. Não ignorando, que a arguida acusou 2,11 g/l, e o tribunal a quo limitou-se a julgar, com base em ténues provas, em particular no depoimento do militar da GNR, que reduziu o Auto ao teor do presumido álcool, sem ter lançado mão de elementos complementares – de eventual contraprova/analise ao sangue, que se revelariam essenciais e imprescindíveis à descoberta da verdade, e teriam levado seguramente à absolvição da arguida ou a aplicação de uma pena mínima, eventual Admoestação.
6. Ficaram seguramente por apurar e provar factos que auxiliassem a averiguar se a arguida foi claramente informada de que poderia ter efectuado contraprova ou análises ao sangue, uma vez que por não se encontrar bem de saúde, andava a tomar, entre outros medicamentos, ansiolíticos;
7. Bem como se o alcoolímetro Drager, Modelo 7110 MKIIIP, que não se encontra aprovado, é actual, confiável, foi correctamente operado e se o referido militar da GNR tinha formação e conhecimentos adequados para efectuar o referido teste.
8. Pelo que, cruzada e valorizada a prova testemunhal e reapreciada a prova documental deverá ser alterada para “Não Provada” a matéria de facto constante dos Factos Provados, Pontos 4. 5. 6. 7. e 10. da douta sentença recorrida, e,
9. Para “Provada” a matéria de facto constante dos Factos Não Provados: - A arguida, à data dos factos, estava a tomar Prozac e Alprozalan e - Aditado e dado como provado um Novo Facto com o seguinte teor: - A arguida, face à condução desempenhada, não representou como possível ser portadora de uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,20g/l.;
10. Por outro lado, verificou-se erro na aplicação do direito à matéria de facto dada como provada;
11. Estriba-se a sentença recorrida na conclusão de que a arguida circulava com excesso de álcool no sangue pelo que cometeu um crime de condução em estado de embriaguez, p.p. pelo art.º 292.° do C. Penal;
12. Face ao que dispõe a Lei Penal, ao que ficou provado nos autos e acima de tudo ao que não ficou provado e ainda à falta de prova complementar segura, não era possível à Mmª. Juíz a quo, salvo o devido respeito, retirar as conclusões que sintetizam a condenação da arguida, quando tudo fazia prever o contrário, ou seja a sua absolvição ou a redução das penas principal e acessória aplicadas, ao mínimo legal facultando à arguida, face a profissão de utilidade publica que desempenha, o cumprimento da mesma em período de férias e fins-de-semana;
13. Do que se retira da sentença, o Tribunal a quo não levando em conta o depoimento da arguida, limitou-se a fazer uma dedução, com base em ténues provas, sem ter lançado mão de outros elementos complementares que se revelariam imprescindíveis à descoberta da verdade, e teria levado à absolvição da arguida;
14. Todavia não nos parece que o critério adoptado seja suficiente para se subsumir a actuação da arguida à norma em questão, pelo que não nos restam dúvidas que a Mmª. Juíz condenou a arguida não, porque se provaram os elementos objectivos da norma em apreço, mas porque, analisando os elementos disponíveis, presumiu através de deduções subjectivas a suposta conduta da arguida;
15. Salvo o devido respeito, que é muito, as incertezas e dúvidas existentes, além do mais, quanto à ilegalidade do alcoolimetro Drager 7110 MKIIIP ao contrário do que seria esperado – a absolvição, serviram para condenar a arguida;
16. De toda a matéria produzida em audiência de julgamento, não haviam, em nossa opinião, elementos que permitissem pensar, muito menos provar, que a arguida conduzia o referido veículo com o elevado teor de álcool de que vem acusada;
17. Verificou-se assim um erro de interpretação na subsunção dos factos ao direito, já que não se mostram preenchidos os requisitos objectivos e subjectivos do respectivo normativo, tendo a Mmª. Juíz a quo violado a interpretação destes;
18. Estamos em crer por tudo quanto foi aqui explanado que, mesmo a admitirem-se os factos relatados pelo senhor militar da GNR, o que só por mero raciocínio académico se admite, não estão preenchidos os elementos típicos do crime pelo qual vem a arguida acusada;
19. Mesmo que não se considerasse a prova nos termos em que se alega, isto é, ainda que não se aceite que a prova produzida impunha decisão diversa, não podemos deixar de considerar que a mesma cria forte e insolúveis dúvidas, pelo que deveria o Tribunal “a quo” ter-se socorrido igualmente do princípio o “in dúbio pró reo”;
20. Bem como por falta de CONSCIENCIA DA ILICITUDE, ficando a clara ideia - certeza absoluta - que a arguida conduzia do regresso de um jantar convivio de Cantanhede para a ..., Anadia, e o facto de não compreender, uma vez que conduziu uma distância considerável, sem qualquer sintoma de que tinha álcool, ou pelo menos 1,20g/l de álcool no sangue;
21. Assim, do supra alegado resulta que, jamais, a arguida poderia ter sido condenada pela prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p.p. pelo art.º 292.° do C.Penal;
22. A pena a que a arguida foi sujeita é na opinião da mesma, e salvo o devido respeito por interpretação diversa, infundada e injusta, quer quanto à pena de multa aplicada a arguida (518,00€), quer quanto à pena acessória de proibição de condução (4 meses), e em custas 2 Ucs, que se impõe revogada;
23. Pelo que, deverão V. Exas. Digníssimos Desembargadores dar provimento ao recurso, absolvendo a recorrente;
24. Como acima se disse, dúvidas acentuadas permanecem relativamente à prova do cometimento, enquanto conduzia, por parte da arguida do crime de condução com álcool no sangue;
25. Na nossa opinião, a pena aplicada a recorrente, não foi a melhor opção em termos de política de aplicação de penas;
26. Não atendeu o Tribunal a quo à experiência, ao profissionalismo da arguida, à sua postura em tribunal, nem às demais circunstâncias referidas como determinantes, designadamente a necessidade de trabalhar para se sustentar, para apurar a pena e a sua verdadeira extensão – exclusão da culpa – vd. Art.º35., n.º 1 CP.;
27. Ora, a pena aplicada, foi para além de tudo, um severo castigo para a arguida e para a sua família e amigos, não levando em conta sequer o estado de saúde da arguida as incertezas do incidente, a idade desta, a utilidade publica das suas funções e a sua inserção na sociedade a que pertence, pelo que se quer revogada.
Face ao exposto, e à interpretação dada pelo Tribunal a quo, consideram-se desde logo violadas, salvo melhor opinião, e entre outras, as normas seguintes:
- Artigos 40.º, 71.º e 292° do Código Penal;
- Artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa;
- Artigo 82.º, nºs 1 a 6 do Cód. da Estrada.
- e, consequentemente, os basilares princípios de matriz constitucional do " in dúbio pro reo", da legalidade, de tipicidade e da culpa.
INDICA-SE, por mera facilidade de pesquisa: (i) lista dos equipamentos aprovados para uso na fiscalização do trânsito (ANSR e IPQ); (ii) Despacho IPQ nº 743/2016 de
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