Acórdão nº 121/05.3JDLSB-H.L1-5 de Tribunal da Relação de Lisboa, 07-03-2023

Data de Julgamento07 Março 2023
Ano2023
Número Acordão121/05.3JDLSB-H.L1-5
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordaram, em conferência, na 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:

I-RELATÓRIO
I.1 No âmbito do processo comum coletivo n.º 121/05.3JDLSB que corre termos pelo Juízo Central Criminal de Lisboa – Juiz 22, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, em 07 de dezembro de 2022, foi proferida a seguinte decisão [transcrição]:
Fls. 6793 a 6828, 6830, 6863 a 6877:
Veio o arguido A requerer que:
- A liquidação de pena seja reconsiderada tendo em conta os descontos ainda por realizar, de acordo com os factos supra identificados e os documentos, nos termos e efeitos do art.º 80.º do CP;
- A respectiva restituição à liberdade uma vez que se mostram cumpridos mais de 5/6 da pena global.
Para tanto, o arguido, invocando a Decisão-Quadro 2008/675/JAI, alegou, em síntese, que:
- No processo 441/2012, de Espanha, foi condenado nas penas de 10 anos e 3 meses de prisão (pela prática do crime de tráfico de estupefacientes) e de 6 meses de prisão (pela prática do crime de falsificação de documento);
- Durante a execução destas penas de prisão, foi entregue, pelas autoridades judiciais espanholas, às autoridades judiciais francesas, para em França ser submetido a julgamento;
- Enquanto permaneceu em França, continuou em cumprimento das referidas penas de prisão em que foi condenado em Espanha;
- Durante esse período foi decretado em França o perdão das penas de prisão em dois meses;
- Esse período de dois meses não foi descontado na execução das penas de prisão em que foi condenado em Espanha, pelo que, aquando da liquidação da pena de prisão imposta nestes autos deverão ser descontados tais dois meses;
- As duas penas de prisão em que foi condenado no aludido processo 441/2012, de Espanha, não foram cumuladas juridicamente, como o seriam se a condenação em causa tivesse sido proferida em Portugal, na medida em que o ordenamento jurídico espanhol não o permite, pelo que, deverá nos presentes autos proceder-se a tal cúmulo jurídico;
- Em Espanha, poderia ter beneficiado em momento anterior de liberdade condicional, apenas tal não tendo ocorrido devido à emissão, por este tribunal, de mandado de detenção europeu, tendo em vista o cumprimento da pena de prisão que neste processo lhe foi imposta, pelo que, refere, deveria (…) ser concedido o benefício da compensação dos dias de liberdade provisória que seria concedida em Espanha, conforme o regime do art.º 59.º do Código Penal Espanhol, em dias no cumprimento da pena de prisão em execução nos presentes autos, que se contabilizam em 36 por ano, desde o ano de 2015 (ano do transito em julgado da sentença de Espanha) e 2022, que se contabilizam no momento em 7 (sete) anos, devendo também este período temporal ser considerado em sede de liquidação de pena nos presentes autos.
- O somatório das penas de prisão em que foi condenado em Espanha e em Portugal perfaz 18 anos e 9 meses, pelo que, à presente data, (…) tem cumpridos 15 anos e 7 meses, o que corresponde a 5/6 do cômputo geral das penas de prisão a que foi condenado.
Cumpre apreciar e decidir.
Não consta destes autos, nem o arguido em algum momento o alegou, que a sentença em matéria penal proferida no processo que identificou, que terá corrido termos no Reino de Espanha, foi objecto de reconhecimento em Portugal, nomeadamente nos termos previstos na Lei n.º 144/99, de 31.08, e na Lei n.º 158/2015, de 17.09, e que, portanto, produza os efeitos que a lei portuguesa confere às sentenças proferidas pelos tribunais portugueses, incluindo aqueles que o mesmo pretende atribuir-lhe.
Por seu turno, prevê o art.º 82.º do Código Penal que é descontada, nos termos dos artigos anteriores, qualquer medida processual ou pena que o agente tenha sofrido, pelo mesmo ou pelos mesmos factos, no estrangeiro. No entanto, não consta da documentação junta a estes autos pelo arguido, nem este o alegou, que a sentença em matéria penal proferida no referido processo, que terá corrido termos no Reino de Espanha, teve por objecto os mesmos factos que levaram à condenação daquele no presente processo.
Nesta medida, carece de qualquer fundamento a pretensão do arguido no que respeita aos descontos que, afirma, estão ainda por realizar.
Por fim, quanto à requerida restituição à liberdade uma vez que se mostram cumpridos mais de 5/6 da pena global, tal como se fez constar do despacho proferido em 05.10.2021, a competência material para a concessão da liberdade condicional pertence ao Tribunal de Execução das Penas [art.º 138.º, n.º 4, al. c), do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade] (fls. 6722).
Pelo exposto, indefere-se o requerido.
Notifique.
*
Fls. 6878:
Na sequência da emissão de mandado de detenção europeu para assegurar o cumprimento pelo arguido A da pena única de prisão que lhe foi imposta nestes autos, aquele mandado veio a ser executado pelas autoridades do Reino de Espanha, o que foi comunicado a este processo em 04.08.2022.
Na medida em que no expediente remetido a este processo não se mostrava certificada a data em que o mandado de detenção europeu foi executado e, portanto, a partir de que momento o arguido passou a estar privado da liberdade à ordem dos presentes autos, o Ministério Público procedeu em 10.08.2022 a uma liquidação daquela pena única de prisão meramente condicional (cf. fls. 6747 e 6748), que foi homologada por despacho judicial de 12.08.2022 (cf. fls. 6749).
Aquando dessa liquidação de pena, o Ministério Público, invocando o disposto no artigo 80.º do C. Penal, descontou 2 anos e 2 dias que, segundo fez constar, foram já cumpridos no âmbito dos autos 131/2009, que correu termos no Tribunal de Almeria, Espanha. No entanto, não resulta dos presentes autos que a sentença em matéria penal proferida no aludido processo que terá corrido termos no Reino de Espanha foi objecto de reconhecimento em Portugal, nomeadamente nos termos previstos na Lei n.º 144/99, de 31.08, e na Lei n.º 158/2015, de 17.09, e que, portanto, produza os efeitos que a lei portuguesa confere às sentenças proferidas pelos tribunais portugueses. Também não resulta dos presentes autos que a sentença em matéria penal proferida no citado processo que terá corrido termos no Reino de Espanha teve por objecto os mesmos factos que levaram à condenação do arguido no presente processo. Assim, o desconto de 2 anos e 2 dias a que se procedeu na mencionada liquidação de pena condicional (de 10.08.2022) foi indevidamente efectuado. Contudo, tendo tal liquidação de pena sido elaborada condicionalmente apenas por não haver certeza quanto ao dia de início de cumprimento da pena única de prisão imposta nestes autos, não podem agora colocar-se em crise os efeitos jurídicos decorrentes da homologação de fls. 6749.
Em 30.11.2022, o Gabinete Sirene informou que o arguido passou a estar privado da liberdade à ordem do mandado de detenção europeu emitido nestes autos em 05.08.2022 (cf. fls. 6859 e 6860).
Nesta sequência, o Ministério Público elaborou a liquidação (definitiva) da pena única de prisão imposta ao arguido (fls. 6878).
E, atento o que acima se deixou exposto, concordo com a liquidação de pena de fls. 6878 e, como tal, homologo-a – art.º 477.º, n.º 4, do Código de Processo Penal.
Notifique e comunique ao estabelecimento prisional onde o arguido se encontra preso.
Passe e remeta certidões nos termos promovidos (art.ºs 477.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, e 35.º da Portaria n.º 280/2013, de 26.08).”
*
I.2 Recurso da decisão
Inconformado com tal decisão, dela interpôs recurso o arguido para este Tribunal da Relação, com os fundamentos expressos na respetiva motivação, da qual extraiu as seguintes conclusões [transcrição]:
“IV - DAS CONCLUSÕES
A. O ora Recorrente foi notificado da Reformulação da Liquidação da pena de prisão realizada pela Digníssima Magistrada junto do Tribunal a quo, bem como do Despacho que recaiu sobre a homologação da mesma, e ainda sobre douto Despacho proferido sobre o requerimento apresentado pelo Recorrente em 31.12.2022, que indeferiu o pedido de cúmulo das Penas Espanholas e Portuguesa, sendo desta Liquidação de Pena e destes Despachos que ora Recorre,
Porquanto,
B. O Arguido foi condenado, em Portugal, na pena de prisão efetiva de 8 anos, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa - Juízo Central Criminal de Lisboa - Juiz 22,
C. Foi também condenado em Espanha na pena de prisão de 10 anos e 3 meses, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes e a 6 meses de pena de prisão, pelo crime de falsificação de documento, no Processo 441/2012,
D. Tudo somado perfaz a condenação na pena de prisão de 18 anos e 9 meses.
E. O Recorrente cumpriu à ordem dos presentes autos, I dia de detenção (15.06.2005), tendo, ainda, ficado sujeito à medida de coação de prisão preventiva, à sua ordem, no dia 16.06.2005 (conforme resulta de fis. 766 do processo), tendo sido restituído à liberdade no dia 15.12.2007 (por, à data, não se mostrar transitada em julgado a decisão, conforme resulta de fls. 5722/5724), ou seja, esteve privado da liberdade 2 anos e 6 meses;
F. Esteve, ainda, detido no âmbito do Processo Abreviado 131/2009, que correu termos no Tribunal de Almeria, Espanha, no período compreendido entre o dia 8.06.1998 a 11.06.1998, data em que ficou sujeito à medida de coação de prisão preventiva, a qual se manteve até 10.06.2020, ou seja 2 anos e 5 dias, tendo este processo sido arquivado, e este período de detenção não ter sido descontado, em qualquer outro processo em Espanha.
G. Esteve detido em Espanha, em virtude do MDE, desde o dia 05.08.2022 até ao dia 08.09.2022, ou seja, 4 dias, tendo sido entregue às autoridades portuguesas em 08.08.2022, pelo que em Portugal já cumpriu mais 4 meses e 28 dias,
H. Ou seja, tem cumprido um total de 15 anos, sete meses e 28 dias, pelo que à presente data tem cumprido 5/6 do somatório de ambas as penas, o qual se atingiria
...

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