Acórdão nº 532/16.9GBTMR.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 09 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelBEATRIZ MARQUES BORGUES
Data da Resolução09 de Março de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I. RELATÓRIO 1. Das decisões final e interlocutória 1.1.

No Processo Comum Singular n.º 532/16.9GBTMR, do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, Juízo Local Criminal de Tomar, Juiz 2, submetida a julgamento foi a arguida (...), : - Condenada pela prática, em autoria material e na forma consumada, de quatro crimes de violência doméstica, previsto e punível pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea d) e n.º 2 do CP, na pena de dois anos de prisão, para cada um dos crimes.

- Condenada na pena única de quatro anos de prisão após a realização do cúmulo jurídico das penas parcelares, cuja execução foi suspensa pelo período de quatro anos; - Condenada no pagamento da quantia de três mil euros, a título de danos não patrimoniais, cujo pedido cível havia sido deduzido por (...); - Absolvida do restante pedido cível peticionado.

1.2.

No decurso do julgamento por despacho interlocutório, datado de 26-3-2019, o Tribunal a quo indeferiu a junção de fotografias apresentadas pela arguida, condenando-a em multa.

  1. Dos recursos do despacho interlocutório e da decisão final 2.1. Das conclusões da arguida Inconformada com as decisões a arguida interpôs recurso extraindo das respetivas motivações as seguintes conclusões: 2.1.1.

    Quanto ao despacho interlocutório (transcrição) “A.- A recorrente interpôs recurso na ata, do douto despacho proferido na sessão da audiência de discussão e julgamento de 26 de março de 2019, que indeferiu a junção aos autos de 5 fotografias e condenou a arguida em 2 UC’s por junção extemporânea de elementos de prova.

    B.- A recorrente não se conforma com tal despacho, porquanto tal junção foi requerida no decurso das declarações da assistente, nas quais referiu que em casa da arguida era proibida de brincar e conviver com a restante família desta, assim como nunca passeava com a família.

    C.- Porque a defesa tinha em seu poder várias fotografias tiradas à assistente e aos netos da arguida em diferentes épocas, e em situações de lazer, convivo e brincadeiras, perante tais declarações e com vista à descoberta da verdade material, requereu a junção de 5 dessas fotografias, que contrariam frontalmente as mencionadas declarações da assistente; D.- Pretendendo com a junção de tais fotografias que o Tribunal “a quo” apurasse a verdade material, com os devidos esclarecimentos a prestar pela assistente sobre tais imagens, em que se vê a mesma a conviver com todos os elementos da família da arguida, em passeio e a brincar com os netos da arguida. Por isso, a defesa requereu a sua junção ao abrigo do disposto no artigo 340º, nº 1, o Cód. Proc. Penal, por se tratar de prova indispensável à descoberta da verdade e boa decisão, em especial na sequência das declarações da assistente que estavam a decorrer no momento em que foi requerida a junção daqueles documentos e que eram no sentido de que não brincava, nem convivia com os netos da arguida.

    E.- Tanto mais que a recorrente está a ser julgada pelo crime de violência doméstica na pessoa da assistente, pelo que a defesa pretende infirmar aquelas imputações feitas à arguida pela assistente, que a descreve nas suas declarações que uma pessoa que nunca a deixava conviver com a família, designadamente, brincar ou conviver com os netos da recorrente!.

    F.- Prova documental que urgia o Tribunal apreciar, especialmente porque as declarações da assistente, pelas vicissitudes constantes dos autos, só foram produzidas após a produção da prova testemunhal indicada pela defesa, pelo que tais declarações (e para evitar mais delongas processuais) só podiam ser infirmadas por via daqueles documentos.

    G.- Deve, assim, ser revogado o douto despacho proferido em 26 de março de 2019, que indeferiu a junção de tal prova documental por a mesma ser imprescindível para a descoberta da verdade, porquanto com aquela decisão, violou o Tribunal “a quo” o disposto no artigo 340º, nº 1 do C. Processo Penal, que consagra os princípios da investigação e da descoberta da verdade material.

    H.- Deve, ainda, ser revogado aquele douto despacho na parte condenou a arguida no pagamento de 2 UC’s a título de custas pela alegada junção intempestiva de documentos, porquanto tal decisão incorre em erro na interpretação e aplicação das normas constantes dos artigos 165º, 340º e 515º do Código Processo Penal bem como dos artigos 7º, 8º, 27º n.º 1 do RCP.

    I.- O artigo 165º do Código Proc. Penal respeitante à junção de documentos, não faz nenhuma referência à possibilidade de penalização pela apresentação tardia e não justificada do documento, pelo que, nessa medida, é inaplicável o consagrado no artigo 27.º, n.º 1 do RCP, cuja aplicação está dependente da previsibilidade da condenação em multa pela prática de determinado ato.

    J.- Além disso, a tributação do processo em matéria penal segue regras distintas das estabelecidas para os demais processos (não obstante a sua convergência num mesmo diploma, ou seja, no Regulamento das Custas Processuais), pelo que no caso de junção de documentos, não há lugar à aplicação subsidiária do artigo 423º, n.º 2 do Cód. Proc. Civil - neste sentido ver Germano Marques da Silva, Direito Processual Penal – II, p. 160, nota 1 e Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado e Comentado, 16ª ed., nota ao artigo 165º.

    L.- Na situação em apreciação, trata-se de uma junção de documentos no decurso da audiência de julgamento, e esta norma tem de ser vista em íntima articulação com os princípios gerais reguladores e estruturantes da produção de prova em audiência, designadamente, o princípio da verdade material consagrado pelo artigo 340º, do CPP.

    M.- Este artigo 340.º do Código Processo Penal, que faz referência na admissão posterior de outros documentos não prevê a condenação em multa no caso de formulação intempestiva de requerimento de prova.

    Por sua vez, o artigo 27.º do RCP estipula os valores e regula critérios para fixação da multa nas hipóteses em que a lei processual prevê a condenação em multa ou penalidade de algumas das partes ou outros intervenientes.

    Mas não existe na lei processual penal norma que comine com multa a apresentação tardia de documentos, à semelhança do que sucede no âmbito da lei processual civil, em que se prevê, no artigo 423.º, n.º 2, do Código Processo Civil, a admissão de documentos posterior ao momento próprio, com a expressa menção de que a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado.

    N. - Por outro lado, o despacho ora recorrido viola o princípio de igualdade de armas, porquanto o Ministério Público, em situação idêntica, está isento do pagamento da multa – artigo 522.º, n.º 1, do CPP.

    O.- Mas ainda que assim não se entenda — o que não se concede mas apenas se concebe por mero dever de patrocínio —, sempre se dirá que, o valor da multa aplicada é excessiva atenta a simplicidade da questão levantada e a da decisão proferida, designadamente, a não admissão de tal prova documental.

    Tanto mais que não foi exigido um grande trabalho de desenvolvimento e criação intelectual à Mª Juiz a quo na decisão por si proferida e aqui em recurso, além de que a apreciação de tal questão não prejudicou o regular andamento da sessão.

    P.- Pelo que tal multa no valor de 2 UC’S é desproporcional e injusta ! E como defende Germano Marques da Silva, o regime processual civil de admissão de documentos se não mostra harmonizável com o processo penal, mormente com os princípios fundamentais da verdade material e da investigação.

    Q.- Por conseguinte, no presente caso a requerida junção aos autos dos documentos apresentados pela arguida tem suporte legal, o que já não acontece com a condenação em multa ora recorrida, que não tem apoio legal, impondo-se a revogação do decidido.

    R.- Deve o douto despacho ser revogado e substituído por outro que ordene a junção aos autos das 5 fotografias cuja junção foi requerida em sede de audiência de julgamento e deve sempre ser revogado a decisão que condenou a recorrente em 2 UC’s de multa por junção extemporânea dos elementos de prova (…).” 2.1.2.

    Quanto à decisão final (transcrição) “1.- Por douto Acórdão desse Venerando Tribunal da Relação de Évora, a douta sentença proferida em 31/10/2019 foi declarada nula e determinado que fosse proferida nova sentença para que fossem colmatadas as deficiências apontadas e suprida a nulidade em causa; 2.- O Tribunal de Primeira Instância proferiu nova sentença, mantendo in totum a parte decisória, e por isso a arguida continua a não se conformar com a sentença que: a) a condenou pela prática, em autoria material e na forma consumada, de quatro crimes de violência doméstica, previsto e punível pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea d) e n.º 2 do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão, para cada um dos crimes; b) procedendo ao cúmulo jurídico destas penas parcelares, condenou a arguida na pena única de 4 (quatro) anos de prisão; d) julgou parcialmente procedente o pedido civil deduzido por (...) e condenou a arguida no pagamento da quantia de 3.000€ (três mil euros), a título de danos não patrimoniais, absolvendo-se a arguida do restante peticionado.

  2. - E não se conforma porquanto da prova carreada para os autos e produzida em sede de audiência de julgamento não resultou factualidade que permita tal condenação, que constitui uma injustiça clamorosa para a arguida.

    Da prova produzida resulta claramente que a arguida foi uma avó sempre presente, preocupada com os ofendidos, sempre procurou proporcionar-lhes tudo o que estava ao seu alcance para que nada lhes faltasse quer a nível patrimonial, a nível emocional e moral, e tornar estas crianças e em jovens e adolescente com valores e educação e prepará-los para o futuro de forma a serem pessoas felizes, apesar das suas más primeiras infâncias.

  3. - A recorrente, recorre de facto e de direito, havendo erro notório na apreciação da prova e insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, nos termos e para os efeitos...

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