Acórdão nº 870/18.6PBSTR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Julho de 2020
Magistrado Responsável | JOÃO AMARO |
Data da Resolução | 14 de Julho de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam os Juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - RELATÓRIO No Processo Comum (Tribunal Coletivo) nº 870/18.6PBSTR, do Juízo Central Criminal de Santarém (Juiz 3), e mediante pertinente acórdão, foi decidido: “Responsabilidade Criminal A) Condenar o arguido RMRR pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido, conjugadamente, pelo artigo 145.º, n.º 1, alínea c), e n.º 2, por referência ao artigo 132.º, n.º 2, alíneas a) e c), e art.º 144.º, alíneas b), c) e d), todos do Código Penal, na pena de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão; B) Condenar o arguido RMRR pela prática de um crime de um crime de ofensa à integridade física simples previsto e punido no artigo 143.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão; C) Operando o cúmulo jurídico entre as penas aplicadas, condenar o arguido na pena única de 8 anos de prisão
D) Condenar o arguido no pagamento das custas do processo, fixando a taxa de justiça em 4 UC - artigos 374.º, n.º 4, 513.º, n.º 1, e 514.º, n.º 1, do Código de Processo Penal e artigo 8.º e Tabela III do Regulamento das Custas Processuais
Responsabilidade Civil 1) Julgar o pedido de indemnização civil deduzido pelo HDS EPE contra o demandado RMRR procedente e, consequentemente, condenar o demandado a pagar ao demandante a quantia de € 4 513,64 acrescida de juros vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a data da notificação do demandado para contestar o pedido até integral pagamento
2) Condenar o demandado nas custas desta instância civil (artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, ex vi artigo 524.º do Código de Processo Penal)
3) Julgar o pedido de indemnização civil deduzido pelo CHU de L C EPE contra o demandado RMRR procedente e, consequentemente, condenar o demandado a pagar ao demandante a quantia de € 30 687,20 acrescida de juros vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a data da notificação do demandado para contestar o pedido até integral pagamento
4) Condenar o demandado nas custas desta instância civil (artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, ex vi artigo 524.º do Código de Processo Penal)”
* Inconformado, o arguido interpôs recurso do acórdão, formulando na respetiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: “1ª - O Tribunal refere ter alicerçado a sua convicção quanto aos factos 1 a 5 nos depoimentos das testemunhas CM e JD, conjugados com as declarações do arguido, e no relatório pericial de fls. 540, menção que se crê ser devida ao englobamento nessa afirmação desses mesmos diferentes factos; 2ª - Salvo o devido respeito, o depoimento de CM, as declarações do arguido e o relatório pericial são inócuos para o julgamento do seguinte trecho do facto que o Tribunal deu como provado em 3.: “(…) pelo que este se levantou e, inopinadamente, dirigiu-se a esta e desferiu-lhe vários murros e pontapés, que acertaram na cabeça e no tronco de J, fazendo com que ficasse a sangrar da zona frontal do crânio (…)”; 3ª - Consta até expressamente do relatório, na sua página 12, tal como na página 5 do do psiquiatria, que “(…) excetua-se a agressão em relação à avó paterna, que refere não recordar, face a ter acontecido na sequência de estar seriamente alcoolizado”, tal como consta a alusão a um «empurrão», coisa bem diferente do consta em 3.; 4ª - Salvo o devido respeito, só por erro notório na apreciação da prova podem o relatório pericial e/ou as declarações do arguido ter servido de base à formação da convicção do Tribunal quanto ao facto 3., o que, aliás, se extrai do próprio relatório das perícias e da douta fundamentação do acórdão; 5ª - Salvo melhor opinião, extrai-se ainda do próprio acórdão que o depoimento de CM foi inócuo para a formação da convicção do Tribunal quanto ao facto dado como provado em 3. (após “amarrotar” e até “ao mesmo tempo que proferia”); 6ª - Resta, assim, o depoimento da testemunha JD, e, quanto a isso, ou abrangendo ainda neste passo o da testemunha C (sendo que nesse caso o que é contado a um vai muito além do que é contado a outra), crê o arguido estarmos perante prova proibida, e, como tal, nula; 7ª - Tem-se por pacífico que a lei reconhece que o interesse público da descoberta da verdade deve ceder ao interesse da testemunha referida no nº 1 do artigo 134º do CPP em não ser constrangida a prestar declarações. Trata-se de um direito pessoal intransmissível, inalienável e insuscetível de renúncia antecipada; 8ª - E se o depoimento, ou a decisão de depor, terá forçosa e legalmente que partir de decisão informada (prévia advertência da faculdade de recusa a depor), vislumbra-se não se poder ser menos exigente para a decisão de contar, «desabafar», ou até «segredar» e sem consciência dessa possível implicação e efeitos, e com o que poderia testemunha com privilegio familiar conformar-se ou não
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- Não está também em causa nenhuma perceção dos factos da testemunha agente da PSP, mas meramente o que JF lhe possa ter contado e que não terá contado a mais ninguém, nem sequer à vizinha agredida
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- Cremos humildemente que o disposto no artigo 129º, nº 1, do CPP, terá ainda, no caso dos autos, que ser conjugado com o regime da recusa a depor e toda a problemática que tal levanta, e que a sua correta interpretação seja que a exceção da sua parte final não é aplicável quando a pessoa indicada seja uma das referidas no nº 1 do artigo 134º do CPP e não tenha esta optado por prestar depoimento após expressamente advertida da faculdade de recusar o depoimento; 11ª - Pelo que se expôs, e afastado o depoimento indireto de JD da valoração probatória para efeito de formação de convicção e fundamentação da matéria de facto quanto ao facto 3., não poderia o Tribunal dá-lo como assente, o que se extrai da própria fundamentação do acórdão e elementos dos autos, e para o que o Tribunal se baseou em prova proibida nos termos sobreditos, e como tal nula; 12ª - E, não sendo dado como provado o facto 3., consequentemente se não poderão dar como assentes os factos 7 (quanto a ser consequência direta, necessária e imediata das agressões), 13 e 14, daquele dependentes, pelo que na dúvida deverá o arguido ser absolvido da prática do crime que lhe é imputado sobre sua avó; 13ª - Independentemente do que se vem dizendo, o arguido não se conforma com a atribuição dolosa que lhe é feita quanto ao trágico resultado que foram as lesões referidas em 14., não podendo equacionar tivesse sequer previsto ou representado como possível aquele resultado, ou com ele se tivesse conformado, e também tendo em conta que transparece da fundamentação do douto acórdão que primeiramente sua avó estava “consciente e lícita”, de forma concordante com o “relatório de urgência constante de fls. 54, referindo expressamente que estava calma, consciente e orientada”, o que a proceder dita a sua condenação já não pelo crime de ofensa à integridade física grave, mas antes por crime agravado em função do resultado (artigo 147º nº 2 do C.P.); 14ª - E, também independentemente disso, não se conforma ainda o arguido com a pena de 7 anos e 6 meses de prisão que concretamente lhe foi fixada quanto ao crime de ofensa à integridade física qualificada, que reputa de excessiva, tal como a pena fixada em cúmulo jurídico, necessariamente também a adequar; 15ª - Foram violados os artigos 127º, 129º e 134º do CPP, e os artigos 71º, 143º, 144º, 145º e 147º do CP; 16ª - Por tudo quanto se vem dizendo, antes deverá ser o arguido absolvido da prática do crime que lhe é imputado sobre sua avó, ou sê-lo antes pelo crime p. e p. no artigo 145º, nº 1, a), e 147º, do CP (agravação pelo resultado) ou, sem conceder, ser condenado a pena de prisão não superior a 5 anos pela prática do crime perpetrado sobre sua avó, e em todo o caso com a necessária afetação da pena única a fixar em cúmulo jurídico”
* O Ministério Público junto da primeira instância apresentou resposta ao recurso, concluindo do seguinte modo (em transcrição): “1ª - O arguido, inconformado com o douto Acórdão que o condenou pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p., conjugadamente, pelo art.º 145º, n.º 1, alínea c), e n.º 2, por referência ao art.º 132º, n.º 2, alíneas a) e c), e art.º 144º, alíneas b), c), e d), todos do Código Penal, na pena de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão; e pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art.º 143º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão, e, em cúmulo jurídico das penas aplicadas, na pena única de 8 (oito) anos de prisão, dele veio interpor recurso
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- No essencial alega que o Tribunal a quo deu como provada a matéria constante dos pontos 3, 7, 13 e 14 dos factos provados, o que não se pode manter
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- Mais alega que o Tribunal alicerçou a sua convicção quanto aos factos 1 a 5 no depoimento das testemunhas CM e JD conjugadas com as declarações do arguido e no relatório pericial de fls. 540
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- Sustenta que só por erro notório na apreciação da prova podem o relatório pericial e/ou as declarações do arguido ter servido de base à formação da convicção do Tribunal quanto ao facto 3
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- Também alega que o depoimento da testemunha JD, agente da PSP, é um depoimento indireto, e que o Tribunal o valorou, na medida em que se verifica a exceção prevista no art.º 129º, n.º 1, do CPP, mas que o interesse público da descoberta da verdade deve ceder ao interesse da testemunha referida no n.º 1 do art.º 134º, do CPP, em não ser constrangida a prestar declarações
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- Defende que, conjugando o regime e figura que norteiam a recusa de depor, a correta interpretação do disposto no art.º 129º, n.º 1, do CPP, na sua parte final, não é aplicável quando a pessoa indicada seja uma das referidas no n.º 1 do art.º 134º, do CPP, e não tenha optado por prestar depoimento após expressamente advertida da faculdade de recusar o depoimento
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- Entende que, estando alcoolizado, não podia sequer equacionar ou...
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