Acórdão nº 1158/17.5T8VIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelRAMALHO PINTO
Data da Resolução10 de Julho de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: R...

(adiante designado por Autor) instaurou a presente acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, com processo especial, contra Centro Hospitalar ..., E.P.E.

(adiante designada por Ré), através do formulário a que se alude no artº 98º, nº 1, do Cod. Proc. Trabalho, na versão do Decreto-Lei nº 295/2009 de 13/10, alegando que foi despedido pela Ré em 24 de Janeiro de 2017. Frustrada a tentativa de conciliação realizada em audiência das partes, a Ré apresentou articulado de motivação do invocado despedimento, no qual alegou, em síntese, que o procedimento disciplinar foi válido e que o Autor cometeu factos integradores de justa causa de despedimento.

Com tais fundamentos, requereu a declaração da regularidade e licitude do despedimento, com a improcedência da acção.

O Autor apresentou contestação, invocando a caducidade (parcial) do procedimento disciplinar e impugnando os fundamentos do despedimento, pedindo que seja declarada a ilicitude do despedimento e requerendo a condenação da Ré: a pagar-lhe 45 dias de retribuição de base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade; a pagar os créditos salariais em dívida, no valor global de 5.340,11€, tudo acrescido de juros de mora, vencidos e vincendos, sobre as quantias peticionadas; a pagar-lhe a quantia de 20.000€, a título de indemnização por danos não patrimoniais.

A Ré apresentou resposta/réplica, impugnando os factos alegados pelo Autor, reafirmando a licitude do despedimento e, após aceder ao convite formulado pelo tribunal, apresentou pedido reconvencional contra o Autor, no montante global ilíquido de €1.176,33 e líquido de €903,02, e, por via desse pedido, seja o eventual crédito do Autor compensado no seu contra crédito.

Realizado o julgamento foi proferida sentença, cuja parte dispositiva transcrevemos: “Em face do supra exposto decide-se: - Declarar a ilicitude do despedimento do Trabalhador R... promovido pelo Centro Hospitalar ..., E.P.E. e, consequentemente, julgando-se parcialmente procedente o por si peticionado, condena-se o Empregador a pagar-lhe: a) a indemnização correspondente a 45 dias de retribuição-base, por cada ano completo ou fracção (contado a partir de 20 de Agosto de 2008) até ao trânsito em julgado da presente decisão, tendo por referência o salário auferido pelo Trabalhador a partir de 1 de Novembro de 2014; b) o salário relativo aos dias 2 a 23 de Janeiro de 2017, de acordo com o horário de trabalho que vigorou entre as partes a partir de 1 de Novembro de 2014, descontado da quantia líquida já paga pelo Empregador de €1.242,11 euros; c) a remuneração que o Empregador indevidamente descontou ao Trabalhador pelas faltas que considerou injustificadas; d) o valor das retribuições que o Autor deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da presente sentença, ponderando o salário pago pelo Empregador a partir de 1 de Novembro de 2016, ponderando-se o disposto no art. 390.º, n.º 2, al. b) do Código do Trabalho; e) a quantia de €5.000 (cinco mil euros) a título de danos não patrimoniais; Mais se condena o Empregador no pagamento de juros de mora vencidos sobre as quantias referidas em b) e c) desde a data em que deviam ter sido pagos ou em que foram indevidamente descontadas ao Trabalhador, sendo que quanto às demais alíneas deverá o Empregador pagar os juros que se vencerem desde a data do trânsito em julgado, mais os juros vincendos até integral pagamento.

Julga-se totalmente improcedente o peticionado pelo Empregador.

Custas a cargo da Autora e Ré, de acordo com o respectivo decaimento, que, quanto ao peticionado pelo Trabalhador, se fixa em 1/10 para o Trabalhador e 9/10 para o Empregador.

Fixo à acção o valor de € 50.000,00 (cfr. art.º 98-P, n.º 2 do CPT)”.

x Inconformada, veio a Ré interpor o presente recurso, formulando as seguintes conclusões: ...

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Exmº PGA emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

Definindo-se o âmbito do recurso pelas suas conclusões, temos, como questões em discussão: - nulidade da sentença; - a reapreciação da matéria de facto; - a caducidade do procedimento disciplinar; - se existiu justa causa de despedimento; - montante da indemnização por despedimento ilícito; - existência e ressarcibilidade de danos não patrimoniais.

x A 1ª instância deu como provada a seguinte matéria: ...

x - o direito: - a primeira questão: a nulidade da sentença: For arguida expressa e separadamente, com as seguintes conclusões: 1. Da nulidade do segmento condenatório constante da alínea c) da sentença recorrida A) Sob a alínea c) do dispositivo da sentença, é o empregador condenado no pagamento da “remuneração que o empregador indevidamente descontou ao Trabalhador pelas faltas que considerou injustificadas”.

B) Na sentença em crise não estão identificadas as “faltas que considerou injustificadas” e os montantes pecuniários que “o Empregador indevidamente descontou ao Trabalhador” a que se refere tal condenação.

C) Pelo que tal segmento decisório é ininteligível e, por isso, nulo, ex. vi o disposto no artigo 615º, nº 1, alínea c) do CPC D) Mas mesmo que se considere inteligível, no que não se concede, tal decisão seria nula por falta de especificação dos factos e fundamentos que justificam tal condenação – ex vi artigo 615º, n.º 1, alínea b) do CPC E) Não há na factualidade assente matéria que especifique e justifique tal decisão.

F) O facto jurídico que serve de fundamento à ação objeto dos autos em epígrafe é a impugnação do despedimento do Trabalhador e as respetivas consequências.

G) O empregador não deixou de pagar, por desconto nos créditos laborais ou por outra via, quaisquer dias de ausência ao trabalho, com fundamento em faltas injustificadas.

H) Por cautela de patrocínio, especificadamente se invoca a prescrição de quaisquer créditos do Trabalhador que não tenham sido reclamados no prazo de um ano a contar do vencimento – art.º 337º do CT.

I) Por outro lado, o Trabalhador não deduziu qualquer pedido a tal título, pelo que o Tribunal não pode condenar em objeto diverso do que se pedir – art.º 609º do CPC.

J) O pedido de reconhecimento de um crédito do Trabalhador, incluindo os créditos emergentes do contrato de trabalho, e o respetivo pagamento, só é admissível se deduzido em sede de reconvenção (ex vi n.º 3 do artigo 98º-L, do CPT) e, na reconvenção que deduziu, o Trabalhador não peticionou o pagamento de quaisquer quantias descontadas pelas faltas que deu [cfr. fls 56 verso e fls 57, dos autos em epígrafe].

L) Donde, no apontado segmento, a decisão em causa sempre seria nula por ter conhecido questões de que não podia tomar conhecimento e, ou, por condenar em objeto diferente do pedido – artigo 615º, nº 1, alíneas d) e e) do CPC.

Pelo que a sentença, no segmento do dispositivo inserto na alínea c) incorreu na nulidade a que se referem as alíneas c), segunda parte do artigo 615º, n.º 1, ou, assim se não entendendo, incorreu em nulidade por não especificação dos factos fundamentos de facto que justificam esta sua decisão ou, por conhecimento de questões de que não podia tomar conhecimento e por condenação em objeto diverso do pedido, conforme o mesmo artigo 615º, n.º 1, alíneas b), d), segunda parte, e e), do C.P.C..

São, pois, os seguintes os fundamentos com base nos quais a recorrente entende que a sentença é nula: - não ser inteligível, e se verificar falta de especificação dos factos e fundamentos que justificam tal condenação; - ter condenado além do pedido no que diz respeito ao desconto na retribuição das faltas consideradas como injustificadas, por tal não ter sido peticionado pelo Autor.

Vejamos: A sentença, entre outras coisas, condenou a Ré a pagar ao Autor “a remuneração que o Empregador indevidamente descontou ao Trabalhador pelas faltas que considerou injustificadas”.

Condenação que encontra suporte na seguinte passagem da fundamentação de direito da sentença: “Mais resulta que o Empregador procedeu a um acerto de contas, tendo-lhe procedido ao desconto de remuneração equivalente ao tempo de faltas injustificadas que apurou, o que se revela, pelo que já deixou supra explanado, injustificado, devendo assim ser repostas tais quantias”.

Daqui resulta, claramente, que a sentença condenou a Ré a devolver ao Autor a remuneração correspondente às faltas que considerou injustificadas, sendo que a mesma sentença não considerou como tal as ausências ao trabalho do Autor, como ficou explanado na parte da fundamentação referente à inexistência de justa causa de despedimento.

Não se verificam, pois, as alegadas ininteligibilidade e falta de fundamentação.

E quanto à prescrição invocada, não sendo a mesma de conhecimento oficioso, aparece agora como uma questão nova, que, por não ter sido objecto de conhecimento por parte da 1ª instância, também o não pode ser por este Tribunal da Relação.

As questões novas suscitadas pela parte apenas em sede de recurso, que não foram alegadas oportunamente, nem consideradas pelo tribunal de 1ª instância, não podem por isso ser levadas em conta, estando vedada a sua apreciação ao tribunal de recurso.

Tal contrariaria a função dos recursos, que é a de proceder ao reexame das decisões da instância a quo e não a de criar decisões sobre matéria nova, não ponderada pelo tribunal recorrido. Aliás, tem sido este o entendimento unânime da nossa jurisprudência- cfr., a título meramente exemplificativo, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 25/03/2009, Proc. 09P0308 e de 18/06/2006, proc. 06P2536 Não sendo a referida questão de conhecimento oficioso, constituindo tal temática uma questão nova, não pode este tribunal conhecer da mesma.

Por outro lado, e no que diz respeito à condenação além do pedido, também invocada pela recorrente, temos que, nos termos do artº 615º, nº 1, al. e), do CPC, a sentença é nula quando “O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do...

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