Acórdão nº 465/09.5PBFIG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 02 de Fevereiro de 2011

Magistrado ResponsávelPILAR DE OLIVEIRA
Data da Resolução02 de Fevereiro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório No processo comum singular nº 465/09.5PBFIG do 1º Juízo do Tribunal Judicial da Figueira da Foz o arguido AS...

, identificado nos autos, foi submetido a julgamento acusado da prática de um crime de emissão de cheque sem provisão p. e p. pelo artigo 11º, nº 1, alínea b) do Decreto-Lei nº 454/91 de 28/12 (com as alterações introduzidas pelos Decreto-Lei nº 316/97 de 19/11, Decreto-Lei nº 323/01 de 17/12 e pela Lei nº 48/2005 de 29/08).

CM... em representação de M&M..., Lda. deduziu contra o arguido pedido de indemnização civil, no qual pede a condenação deste no pagamento da quantia € 388,70, acrescida de juros contabilizados à taxa legal a partir da data de notificação até efectivo e integral pagamento.

Por sentença de 25 de Maio de 2010 foi decidido condenar o arguido AS...: 1. Como autor material de um crime de emissão de cheque sem provisão p. e p. pelo artigo 11º, nº 1, alínea a) do Regime Jurídico do Cheque Sem Provisão, na pena de 6 (seis meses de prisão); 2. A pagar ao demandante CM... em representação de M&M..., Lda. a quantia de €388,70 (trezentos e oitenta e oito euros e setenta cêntimos), acrescida de juros contabilizados à taxa legal a partir da data de notificação até efectivo e integral pagamento.

Inconformado com esta decisão, dela recorreu o arguido AS...

, rematando a correspondente motivação com as seguintes conclusões: I- O Tribunal a quo decidiu condenar o arguido pela autoria material de um crime de emissão de cheque sem provisão, p. e p. pela norma do artº 11/nº 1 al. a) do Regime Jurídico do Cheque Sem Provisão.

II- O arguido foi condenado a uma pena de 6 (seis) meses de prisão.

III- O arguido tinha julgamento agendado para o dia 18 de Maio de 2010 e com segunda data para o dia 25 de Maio de 2010.

IV - O arguido tinha defensora nomeada no processo, a qual pediu escusa no dia antes do julgamento agendado para a primeira data.

V- O arguido por mero desconhecimento julgou que teria que ser notificado para constituir novo mandatário, razão pela qual não compareceu na audiência de discussão e julgamento.

VI-O arguido nunca teve intenção de não pagar ao ofendido o valor titulado no cheque.

VII- Até porque o fez assim que soube da realização do julgamento na sua ausência..

VIII- Precisamente no dia 21 de Maio do corrente ano conforme Declaração que se junta sob doc. nº 1 e se dá por integralmente reproduzida.

IX- A referida Declaração essa que não foi apresentada antes da primeira data designada para a audiência de discussão e julgamento porque simplesmente a mesma não existia, ou seja, antes dessa data não se encontrava paga a quantia em dívida ao ofendido.

X- Neste sentido, cita-se Marques Ferreira em anotação ao artigo efectuada por Simas Santos e Leal-Henriques (Código de Processo Penal Anotado, Vol. I, 2ª Ed., Pág. 848), considera que a apresentação tardia do documento, ainda que injustificada, não deverá impedir a sua junção, por ser esta a solução que melhor se adequa ao princípio da verdade material, sancionando-se, porém com multa a apresentação tardia e não justificada, por aplicação subsidiária do artº 523º do C.P.C. (ex vi artº 4°do C.P.P.).

XI- Tal qualmente menciona-se o artº 340o/n° 1 do Código de Processo Penal, que refere que o Tribunal ordena, oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa.

XII- Também neste sentido, e sempre por aplicação subsidiária do Direito Civil ao Direito Penal, cita-se o art° 265°-A do Código de Processo Civil que diz que quando a tramitação processual prevista na lei não se adequar às especificidades da causa, deve o juiz oficiosamente, ouvidas as partes, determinar a prática dos actos que melhor se ajustem ao fim do processo, bem como as necessárias adaptações.

XIII- Ou seja, o arguido efectuou o pagamento ao ofendido antes da 2ª data designada para a audiência de discussão e julgamento, verificando-se assim, existir causa extintiva do procedimento ou da responsabilidade criminal que pode pôr termo ao processo.

Insuficiência para a decisão da matéria de facto provada: XIV- Refere também o Tribunal a quo que no dia 09 de Abril de 2009, mas com data aposta de 09/04/05, o arguido preencheu e assinou o cheque nº 7000370178, à ordem de M&M..., Lda ....

XV- É o próprio Tribunal a quo que refere que o cheque tinha data aposta de 09/04/05, pergunta-se onde se verifica, onde se averigua estarem preenchidos os requisitos do referido título (cheque).

XVI- São requisitos do cheque, nos termos do artº 1º da Lei Uniforme Relativa ao Cheque: - A palavra «cheque» inserta no próprio texto do título e expressa na língua empregada para a relação desse título; - O mandato puro e simples de pagar uma quantia determinada; - O nome de quem deve pagar (sacado); - A indicação do lugar em que o pagamento se deve efectuar; - A indicação da data em que e do lugar onde o cheque é passado; - A assinatura de quem passa o cheque (sacador).

XVII- Tal qualmente refere o artº 2° do mesmo diploma legal que: «O título a que faltar qualquer dos requisitos enumerados no artigo precedente não produz efeito como cheque ... » XVIII- Refere também na douta sentença o Tribunal a quo, que o arguido agiu com o propósito de causar prejuízo patrimonial à ofendida, o que não corresponde à verdade, facto que se prova pelo simples acto de o arguido ter efectuado o pagamento ao ofendido, pelo que nunca se poderá falar em prejuízo.

Contradição insanável da fundamentação ou entre os fundamentos e a decisão: XIX- Como já foi referido supra, o Tribunal a quo aponta como facto provado no ponto 1 da douta sentença que o cheque tinha data aposta de 09/04/2005.

XX- Se o cheque tem data aposta de 2005, e como igualmente referido como facto provado no ponto 3 da douta sentença, o mesmo foi apresentado a pagamento no dia 17 de Abril de 2009, e devolvido na compensação no dia 20 de Abril de 2009.

XXI- Pelo que, nunca poderia verificar-se aqui a condição objectiva de punibilidade, ou seja, não se pode considerar que o cheque tenha sido apresentado nos prazos previstos da Lei Uniforme Relativa ao Cheque.

XXII- Assim sendo, estamos perante uma contradição entre os fundamentos e a decisão porque existe verdadeira oposição entre o que é dado como provado pelo Tribunal a quo e o que é referido como fundamento da decisão tomada.

Nestes termos e nos melhores de Direito deve ser dado provimento ao presente recurso, e ser revogada a douta sentença do Tribunal a quo, e em consequência: I- Ser o arguido absolvido da pena a que foi condenado por se verificar a extinção do procedimento ou da responsabilidade criminal que pode pôr termo ao processo por não se verificarem os requisitos constitutivos do crime de emissão de cheque, nomeadamente, o prejuízo patrimonial.

II- Ser o arguido absolvido da pena a que foi condenado por se verificar a extinção do procedimento ou da responsabilidade criminal que pode pôr termo ao processo por não se verificar uma das condições de punibilidade do crime de emissão de cheque, mais especificamente, a apresentação no prazo estabelecido na Lei Uniforme Relativa ao Cheque.

111- Requer-se igualmente a V.Exas. se dignem admitir a junção aos autos da presente Declaração sob documento nº 1, uma vez que o mesmo não pôde ter sido junto antes da 1 a data de audiência de discussão e julgamento dada a sua inexistência na altura, para assim se poder realizar de forma adequada e suficiente as formas de punição, atento ter-se verificado a reparação do dano ao ofendido na sua totalidade.

- E se assim não se entender, requer-se uma atenuação especial da pena, e ser sempre aplicada ao arguido uma pena de multa em substituição da pena aplicada pelo Tribunal a quo, realizando de forma adequada e suficiente as formas de punição, por se verificar que a conduta do arguido demonstrou verdadeiramente a reparação do dano causado ao ofendido, e ainda demonstrou verdadeiro arrependimento, estando no bom caminho para a sua ressocialização e poder ser útil à sociedade.

Julgando-se assim ser de grande alcance social merecendo a oportunidade de não lhe ser aplicada uma pena efectiva de prisão.

E, assim decidindo, praticarão V. Exas. a Habitual e Sã Justiça! Notificado, o Ministério Público respondeu ao recurso interposto nos seguintes termos: Entende-se que a sentença recorrida está devidamente fundamentada e não padece de qualquer dos vícios invocados pelo recorrente.

De todo o modo faremos breve apontamento sobre as questões suscitadas.

O recorrente invoca doutrina, o art. 340º nº 1 do CPP e o art. 265º -A do CPC, para justificar que o pagamento efectuado pelo arguido do valor titulado pelo cheque, ainda antes da segunda data designada para o julgamento, constituirá "causa extintiva do procedimento ou da responsabilidade criminal que pode por termo ao processo".

Sucede que a doutrina e disposições legais invocadas não tem aplicação na situação concreta, pois, que concluído o julgamento e proferida decisão final.

A declaração relativa ao pagamento efectuado pelo arguido a 21 de Maio de 2010, poderia ter sido junta aos autos e considerada na sentença mas, não foi. Não o foi em tempo útil, circunstância a que o tribunal é completamente alheio, dado que tal era obrigação do arguido.

De todo o modo, ainda que tal comprovativo do pagamento tivesse sido junto em tempo útil nunca constituiria causa extintiva do procedimento ou responsabilidade criminal, nem se vê onde se ancora o recorrente para invocar tal argumento. Com efeito, a responsabilidade criminal só se extinguiria pelo pagamento nos termos referidos nas disposições conjugadas dos arts. 11º n° 5 e 1º-A do DL. 454/91 de 28.12, o que não é o caso.

Não se concorda com o recorrente quando refere a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, nem a contradição insanável de fundamentação.

Neste...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT