Acórdão nº 1787/05-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Dezembro de 2007
Magistrado Responsável | RICARDO SILVA |
Data da Resolução | 10 de Dezembro de 2007 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em audiência, no Tribunal da Relação de Guimarães, I 1. Por sentença, proferida no processo comum n.º 231/04.4GTBRG, do 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Fafe, em 2007/05/07, foi, além do mais ora sem interesse, decidido: I ) – EM SEDE DE ILÍCITOS CRIMINAIS: a)- Condenar o arguido MANUEL S..., pela prática, como autor material, de 2 (dois) crimes de homicídio por negligência grosseira, p. e p. pelo artigo 137.º, n.os 1 e 2, do Código Penal (CP), na pena de 14 (catorze) meses de prisão, por cada um dos crimes apurados.
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Procedendo ao cúmulo jurídico das penas parcelares referidas em I. a, condenar o arguido, na pena única de 15 (quinze) meses de prisão.
* II – EM SEDE DE ILÍCITO DE MERA ORDENAÇÃO SOCIAL.
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Declarar prescrito o procedimento por contra-ordenação resultante da prática pelo arguido das contra-ordenações previstas e punidas pelas disposições conjugadas dos artigos 13.º, n.os 1 e 3; 17.º, n.os 1 e 2; 24.º, n.os 1 e 3; 25.º, n.º 1, alíneas c) e d), e n.º 2; 27.º n.º 1, e n.º 2, alínea a), 28.º, n.º 1, alínea b), todos do Código da Estrada, (CE) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de Maio, revisto e republicado pelos Decretos-Leis n.os 2/98, de 3 de Janeiro, e 265-A/2001, de 28 de Setembro, e alterado pela Lei n.º 20/2002, de 21 de Agosto.
* III - ) NA PARTE CÍVEL: Julgar o pedido deduzido pelo assistente Fernando F... e Paulo F..., Eduardo C..., Marília C..., e Ana C... contra a S..., Companhia de Seguros, parcialmente procedente, condenando esta no pagamento a; A) - Fernando F... da quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros) a título de dano patrimonial sofrido pelo assistente Fernando F... , em razão da perda dos rendimentos futuros que a vítima auferiria não fora o seu decesso, acrescida dos juros à taxa legal de 4% (Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril) que se vençam a partir da data da sentença até integral pagamento; B) - Fernando F... da quantia de € 20.000,00 (vinte mil euros), a título de dano não patrimonial próprio sofrido pelo assistente inerente à perda de Maria T..., acrescida dos juros à taxa legal de 4% (Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril) que se vençam a partir da data da sentença até integral pagamento; C) - Paulo F..., Eduardo C..., Marília C..., e Ana C... a quantia de € 15.000,00 (quinze mil euros) a cada um deles a título de danos não patrimoniais próprios dos nomeados – filhos de Maria T... –, sofridos em resultado da morte desta, acrescida dos juros à taxa legal de 4% (Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril) que se vençam a partir da data da sentença até integral pagamento; D) - a pagar em conjunto ao assistente Fernando F... e a Paulo F... Correia; Eduardo C...; Marília C... e Ana C..., quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), decorrentes da perda de direito à vida de Maria T..., acrescidas dos juros à taxa legal de 4% (Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril) que se vençam a partir da data da presente sentença até integral pagamento; E) - Absolver a “S..., Companhia de Seguros, S. A.”, do demais contra si peticionado.
* * * 2. Inconformados com esta decisão, dela recorreram: – 2.1. O arguido MANUEL S....
Terminou a motivação de recurso que apresentou coma formulação das seguintes conclusões: « 1° - A douta sentença proferida, fundamentada nos factos supra enunciados, subsumiu a conduta do arguido ao tipo legal de homicídio por negligência grosseira, previsto no n° 2 do artigo 137° C.P.
« 2°- Assim, após análise dos elementos constitutivos do tipo de ilícito, o Tribunal julgou, no caso "sub judice" convocar as regras atinentes à circulação rodoviária e que regulam os comportamentos dos condutores, para concluir que o acidente decorreu do facto do arguido circular em excesso de velocidade. Concordantemente, entendeu que o mesmo, de uma assentada, violou os deveres objectivos de cuidado que enforma os artigos 13°, n° 1 e 2, 17°, n° 1, 25°, n° 1, alíneas c) e d), e 27°, n° 1 todos do Código da Estrada.
« 3°- Ora, a experiência mostra-nos que a velocidade não é um factor indiferente para a eclosão de acidentes, porém, a causalidade tem de ser vista na perspectiva do curso normal ou anormal das coisas.
« 4°- Assim, a nosso ver, salvo o devido respeito, um homem médio, prudente, que circula a uma velocidade a mais 60 Km/h em local onde as condições da estrada, do clima atmosférico e da iluminação pública são boas, numa curva que precedia a recta, também ela de certa forma não muito fechada, constitui sempre um risco, mas um risco legalmente permitido, na medida em que qualquer condutor médio e minimamente previdente, perante o piso e bom tempo que se fazia sentir, naquele tipo de via, conduziria a uma velocidade superior, adequando assim a velocidade a tais condições.
« 5°- Todavia, e como é jurisprudência mais que estabelecida, a inobservância de leis e regulamentos, como sejam os que se reportam ao trânsito rodoviário, faz presumir a culpa na produção dos danos, bem como a existência de causalidade.
« 6°- Assim, em boa verdade, não obstante a existência da aludida presunção, o que importa determinar no caso "sub judice" é o grau de culpa, e que no caso foi considerada como sendo uma negligencia inconsciente, agravada, porque se subsumiu o comportamento do arguido ao crime de homicídio por negligência grosseira, subsunção essa com a qual o arguido não concorda.
« Assim, « 7°- para que se possa censurar o agente por não ter actuado de modo diverso, seria necessário averiguar se ele, no caso concreto, tinha a suficiente liberdade de determinação, e as suas próprias qualidades pessoais, se revelassem particularmente desvaliosas e censurareis, v. g., em casos como os da brutalidade e da crueldade que acompanham muitos factos dos psicopatas insanáveis, os da inconstância dos lábeis ou os da pertinácia dos fanáticos.
« 8°- Consequentemente, a conduta do arguido, salvo o devido respeito, no nosso entender, é reveladora de uma mera culpa negligente, no caso inconsciente, devendo o arguido ser punido de acordo com a moldura penal prevista para o crime de homicídio por negligência, p. e p. pelo art° 137°, n° 1 do Código Penal.
« Por outro lado, « 9°- Perante os factos dados como provados o tribunal "à quo" decidiu, "condenar o arguido, como autor material, de 2 (dois) crimes de homicídio por negligência...".
« 10°- Ora, a questão que se coloca é a de saber se estamos perante uma unidade ou pluralidades de crimes negligentes, atento o disposto no art° 30°, n° 1 do Código Penal.
« Por isso, « 11°- A questão fundamental passa pois por definir o critério que permita diferenciar os casos em que o tipo legal se preenche por uma vez, daqueles em que tal preenchimento é plúrimo.
« 12°- No caso em apreço, o arguido violou apenas o dever objectivo de cuidado no exercício da condução, por não fazer circular o veiculo que conduzia de modo adequado às condições da via violando normas objectivas de cuidado que enformam os artigos 13°, n° 1 e 2, 17°, n° 1, 25°, n° 1, alíneas c), d), e 27°, n° 1, todos do Código da Estrada, normas essas que estão intrinsecamente conexionadas entre si, daí o poder falar-se na violação única de uma regra de cuidado.
« Portanto, « 13°- No caso em apreço, o tribunal errou ao condenar o arguido pela pratica de dois crimes de homicídio por negligência, pelo que, se impõe a alteração da douta sentença neste sentido, isto é, o arguido deveria ter sido condenado apenas por ter cometido um crime de homicídio negligente p. e p. pelo n° 1 do art° 137° do Código Penal.
« 14°- Daí que ao decidir como decidiu o tribunal "à quo" violou o disposto no art° 30°, n° 1 do C.P.
« Por outro lado, « 15°- Na determinação da medida concreta da pena, a douta sentença recorrida não ponderou todas as circunstâncias anteriores e contemporâneas do crime, circunstâncias estas que não fazendo parte do tipo de crime, depõem a favor do arguido.
« 16°- Segundo o art° 71° do CP, a determinação da medida da pena deverá ser feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.
« 17°- Em face dos factos provados temos para nós que o tribunal desacertou na aplicação concreta da medida da pena violada do citado preceito legal.
« Dai que, « 18°- atenta a moldura penal abstracta para o tipo de crime p. e p. pelo art° 137°, n°1 do CP, e o facto de apenas o arguido ter cometido um único crime de homicídio, porquanto a sua conduta apenas viola uma regra de cuidado, a pena concreta a aplicar ao arguido não deveria ser superior a 8 meses de prisão.
« Independentemente, « 19°- do que supra se deixou referido, quanto à discordância com o facto de o arguido ter sido condenado pela cometimento de dois crimes de homicídio por negligência grosseira e bem assim na pena única de 15 (quinze) meses de prisão, não se aceita nem pode aceitar a douta decisão proferida quanto à não suspensão da pena aplicada.
« Com efeito, « 20°- nos termos do art° 50° do CP, o tribunal deve suspender a pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realiza, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição.
« 21°- Assim, no caso em apreço, quer se opte pela pena pugnada pelo arguido em sede do presente recurso, face às circunstâncias em que pretende ver alterada a douta decisão ora posta em crise, quer pela concretamente aplicada pela douta sentença, certo é que, em ambos os casos, se verificam os pressupostos de ordem formal e material de que depende a suspensão da execução da pena, por um lado, e ambas as penas concretamente aplicadas não excedem 3 anos de prisão, por outro.
« 22°- De facto, atenta a conduta do arguido antes e após a prática dos factos, nada havendo neste domínio que deponha contra ele, atenta a pacatez demonstrada, o facto de estar inserido socialmente, o facto de ter uma atitude colaborante com o tribunal, demonstrada na confissão, no essencial, dos factos imputados, não...
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