Acórdão nº 2081/16.6T8FAR.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelROSA RIBEIRO COELHO
Data da Resolução30 de Maio de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL I - AA propôs a presente ação contra a BB - Companhia de Seguros, S.A., pedindo a sua condenação a pagar-lhe uma pensão anual e vitalícia, desde 19.10.2000, as atualizações dessa mesma pensão, subsídios de férias e de Natal e juros de mora.

Para o efeito, alegou, em síntese, ter celebrado com a ré um contrato de seguro na modalidade de acidentes de trabalho de trabalhadores por conta própria e ter sofrido em 29.10.1999, quando exercia por conta própria a profissão de carpinteiro de cofragens, um acidente de trabalho consistente numa forte dor lombar; foi sujeito a diversos tratamentos e a ré pagou-lhe diversas incapacidades temporárias, até 08.04.2010.

Na sua contestação, a ré invocou a prescrição do direito do autor, com apelo ao que dispõe o art. 121.º do anexo ao DL 72/2008, de 16 de Abril, norma que encurtou para cinco anos o prazo de exercício dos direitos emergentes do contrato de seguro.

Em saneador-sentença, foi julgada procedente a exceção de prescrição do direito do autor, com absolvição da ré do pedido.

Conhecendo de recurso de apelação que o autor interpôs contra tal decisão, a Relação de Évora veio a proferir acórdão que, revogando-a, julgou improcedente a dita exceção perentória e ordenou o prosseguimento dos autos.

É deste aresto que a ré traz a presente revista, tendo apresentado alegações onde, pedindo a revogação do acórdão, formula as conclusões que passamos a transcrever: 1a) Considerou o Tribunal da Relação de Évora que, à data do evento gerador do suposto direito do recorrido, estavam em vigor os art°s 425° e seguintes do Código Comercial, e o art° 309° do Código Civil, pelo que era de vinte anos o prazo de prescrição para o exercício desse eventual direito.

2a) Considerou ainda o Tribunal da Relação que de nada releva invocar a introdução, pelo art° 121°, n° 2 do DL 72/2008, de 16 de Abril, de um regime específico de prescrição, ao fixar em cinco anos o prazo para o exercício de direitos emergentes do contrato de seguro.

3a) No entender do Tribunal da Relação o prazo previsto no art° 121°, n° 2 não é aplicável, uma vez que, de acordo com o art° 2o, n° 1, o novo regime apenas se aplica aos contratos de seguro celebrados após a sua entrada em vigor, ou seja, após 01/01/2009, quando o contrato dos autos foi celebrado em 1999.

4a) Certo é que, na ausência de regra específica no direito anterior, entendia-se ser de vinte anos o prazo de prescrição para o exercício dos direitos relativos ao contrato de seguro, por força do art° 309° do Código Civil, sendo igualmente certo que entrou em vigor um novo prazo de prescrição de cinco anos para o exercício desses direitos.

5a) A ser seguido o entendimento da douta decisão sob recurso, tal poderia permitir, por exemplo, que um beneficiário de seguro contratado em 2009, por facto gerador de uma prestação desse contrato, tivesse de exercer o seu direito, o mais tardar, até 2014, enquanto um beneficiário de seguro contratado em 2007 ou 2008 poderia exercer os seus direitos à mesma prestação até 2028.

6a) A ser assim, passariam a coexistir no tempo dois regimes de prazo de prescrição inteiramente diferentes para relações jurídicas idênticas, sendo o do beneficiário de seguro mais recente muito mais gravoso, porque mais reduzido do que o do beneficiário de seguro mais antigo.

7a) O objectivo do legislador não pode ter sido o de acolher uma desigualdade objectiva e uma injustificada diferenciação de regimes em situações de facto completamente idênticas.

8a) Por isso, devem ter aplicação o princípio geral na aplicação da lei no tempo, do art° 12° do Código Civil, e a regra para quando há alteração de prazos, do art° 297°, porque é de uma lei de alteração de prazos que se trata e é de uma sucessão de leis no tempo.

9a) A aplicação de um novo prazo de prescrição, mais curto que o antigo, de forma alguma atinge o titular do direito, uma vez que o novo prazo apenas se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, devendo o titular estar atento à alteração desse prazo na ponderação sobre a sua intenção de exercer um seu eventual direito.

10a) Tal assim o impõe a estabilidade das relações jurídicas e a certeza do Direito, estando inteiramente justificada a opção do legislador pela fixação de um prazo mais curto do que o anterior.

11a) Por outro lado, o art° 121° do DL 72/2008 é uma norma especial que se sobrepõe à norma geral do art° 309° do Código Civil.

12a) No caso dos autos, dado que quando entrou em vigor o DL 72/2008 ainda estava em curso o prazo de prescrição de 20 anos sobre a data do evento causador da prestação do seguro, iniciou-se em 01/01/2009, o prazo especial de prescrição de 5 anos para que o recorrido pudesse exercer o seu pretenso direito, o qual já se esgotou pela sua inércia.

13a) O entendimento defendido pela recorrente foi seguido pelo TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA, nos Acórdãos de 28/04/2016 [Processo: 437/03.3TTPTM-A.E1], 08/05/2014 [Processo: 1888/12.8TBFAR.E1], TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA, de 25/10/2016 [Processo: 55/15.3T8FCR-A.C1], e TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE, de 18/03/2010 [Processo: 01715/09.3BEBRG], SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO, de 12/08/2009 [Processo: 0748/09], todos apreciando a sucessão de leis no tempo, e seu reflexo na fixação de diferentes prazos de prescrição, à luz dos art° 12°s e 297° do Código Civil, todos disponíveis em www.dgsi.pt.

14a) Assim, verifica-se a prescrição do pretenso direito do recorrido, por terem decorrido mais de 5 anos desde a última causa de interrupção da prescrição, ou seja, 03/09/2010, tendo a recorrente sido citada na presente acção apenas em 28/07/2016.

15a) A douta decisão sob recurso violou, assim, os art°s 12°, 297°, 309° do Código Civil. e ainda os art° 2o e 121° do DL 72/2008, de 16 de Abril.

Nas contra-alegações apresentadas, o autor pugnou pela improcedência da revista.

Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo questão única sujeita à nossa apreciação a de saber se está, ou não, prescrito o direito do autor.

II – Os factos a considerar para a decisão a proferir e que vêm descritos como provados são os seguintes: 1. Por contrato de seguro do ramo acidentes de trabalho – trabalhadores por conta própria, titulado pela apólice n.º 2…2, com início em...

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