Acórdão nº 591/19.2T8OER-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 22 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelTOMÉ RAMIÃO
Data da Resolução22 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam no Tribunal da Relação de Évora I- Relatório: I…, com domicílio na Rua … Rio Maior, instaurou a presente ação declarativa comum contra a O…, S.A., com sede na Av. …, pedindo a condenação desta no pagamento de € 9.975,95, acrescido de juros de mora vincendos.

Alegou, em síntese, ter celebrado com a Ré, em 1997/01/14, um contrato de seguro de acidentes pessoais, sofreu um acidente de viação em 1998/10/19, na sequência do qual sofreu múltiplos ferimentos, que lhe importaram uma incapacidade parcial permanente de 67%, risco que se encontra coberto pelo contrato.

Citada, contestou a Ré, defendendo-se por exceção, alegando que o direito invocado pelo Autor ao prémio do seguro se encontra prescrito, uma vez que se lhe aplica o prazo de prescrição de 5 anos previsto pelo Regime Jurídico do Contrato de Seguro instituído pelo Decreto-Lei n.º 72/2008, de 16 de abril, por se tratar de contrato de seguro renovável, prazo que teve o seu termo em 2003/10/18, mas ainda que lhe fosse aplicável o prazo geral de prescrição de 20 anos, sempre se verificaria igualmente prescrito o direito invocado pelo Autor, na medida em o termo do mesmo se verificou em 2018/10/18, antes da propositura da presente ação.

Foi proferido despacho saneador no qual se decidiu julgar improcedente a invocada exceção de prescrição, identificado o objeto do litígio e fixado os temas da prova.

Desta decisão veio a Ré interpor o presente recurso, apresentando alegações e terminando com as seguintes conclusões: 1.

O presente recurso tem por objeto o despacho saneador proferido pelo Tribunal a quo, e que indeferiu a exceção de prescrição invocada pela Apelante em sede de Contestação; 2. O presente recurso é processualmente admissível, ao abrigo do disposto na alínea b) do n. º 1 do artigo 644.° do CPC, na medida em que o despacho recorrido incide sobre o mérito em causa, uma vez que se pronuncia sobre a exceção perentória de prescrição, ainda que no sentido da sua improcedência; 3. O Apelado intentou a presente ação peticionando a condenação da Apelante no pagamento da quantia de € 9.975,95 (nove mil, novecentos e setenta e cinco euros e noventa e cinco cêntimos), acrescida de juros vencidos e ainda nas custas de parte e demais custas e encargos judiciais; 4. O sinistro dos autos ocorreu em 19.10.1998; 5.

independentemente de qual o prazo de prescrição aplicável - 5 ou 20 anos - o certo é que, no momento em que o Apelado intentou a presente ação, o seu direito ao pagamento do capital seguro encontrava-se já prescrito; 6. O legislador adotou, na letra do n. º 1 do artigo 306.° do C.C, a conceção objetiva de início do decurso do prazo de prescrição, nos termos da qual este último começa a correr "quando o direito puder ser exercido", independentemente do seu conhecimento por parte do titular; 7. O Apelado celebrou com a Apelante um contrato de seguro de Acidentes Pessoais designado "Seguro Atlântico Renda", nos termos do qual ficou assegurada a cobertura de "lesões corporais sofridas pela pessoa segura, em consequência de acidente emergente de risco profissional e extraprofissional, incluindo a utilização de meios de transporte regular e prática acidental de desportos como amador"; 8. Desde o momento do sinistro, em 19.10.1998, tinha o Apelado todas as condições, quer fácticas, quer jurídicas, de exercer o seu direito; 9.

O Apelado passou 15 longos anos sem tomar qualquer diligência, quer extrajudicial, quer judiciai, tendo em vista o exercício do seu direito; 10. O Apelado não se encontrava perante nenhum estado de incapacidade, física ou psíquica, fáctica ou jurídica, que o impedisse de exercer o seu direito.

  1. Apenas no passado ano de 2013 o Apelado procurou exercer o seu direito, sendo que, para o efeito, nem sequer contactou diretamente a Apelante, mas sim o Instituto de Seguros de Portugal; 12. Desde a resposta que lhe foi endereçada pela Apelante, em maio de 2013, o Apelado deixou passar 5 longos anos sem nada fazer, apenas intentando a competente ação em 2018.

  2. A Cláusula 8.

    a, constante das Condições Especiais do Contrato de Seguro celebrado entre as Partes não pode, em caso algum, ser qualificada como um termo inicial para o exercício do direito ao capital seguro, mas tão somente como cláusula que tem por função fixar o momento a partir do qual será pago o capital seguro.

  3. O artigo 306.° do C.C assume, sempre e em qualquer caso, carácter imperativo, não podendo, assim, o seu regime ser derrogado por convenção das Partes nesse sentido.

  4. A possibilidade de exercício de um determinado direito - ou, dito de outro modo, a sua impossibilidade deve, sempre e qualquer caso, ser aferidas no quadro das regras constantes dos artigos 306.° e ss, do C.C e, bem assim, de forma objetiva e exigente, sob pena de, na prática, se esvaziar de sentido o regime jurídico- substantivo da prescrição.

  5. Ao ter decidido como decidiu, violou o Tribunal a quo os artigos 306.°, n. ºs 1 e 2 do C.C e, bem assim, o artigo 121.° do RJCS e os artigos 576.°, n. ºs 1 e 3 e 595.°, ambos do CPC.

    Nestes termos, e nos demais de Direito que V. Exas doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogado o despacho saneador recorrido, e substituído por um outro que absolva a Apelante do pedido.

    ***O Autor não contra-alegou.

    O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, em separado e efeito devolutivo.

    Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

    ***II – Âmbito do Recurso.

    Perante o teor das conclusões formuladas pela recorrente – as quais (excetuando questões de conhecimento oficioso não obviado por ocorrido trânsito em julgado) definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso - arts. 608.º, nº2, 609º, 620º, 635º, nº3, 639.º/1, todos do C. P. Civil -, constata-se que a única questão a decidir consiste em saber se decorreu, ou não, o prazo a prescrição do direito à indemnização reclamado pelo Autor.

    *** III – Fundamentação fáctico-jurídica.

    No saneador consignou-se: “Prescrição do direito de crédito do Autor.

    É pacífico entre as partes que o contrato de seguro em causa foi celebrado em 1997/01/14, estando sujeito a renovação periódica, e que o sinistro sofrido pelo Autor teve lugar em 1998/10/19.

    À luz destes factos, a primeira questão a decidir é qual...

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