Acórdão nº 4529/18.6T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelJOSÉ AMARAL
Data da Resolução30 de Novembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO [[i]] Por sentença de 20-02-2020, foram julgados habilitados, como sucessores do primitivo autor AA, falecido em .../.../2019, os seus herdeiros BB (viúva), CC, DD, EE e FF (filhos), para em seu lugar prosseguirem nesta acção declarativa que, com processo comum, aquele intentara, em 04-09-2018, no Tribunal ..., contra a ré Companhia de Seguros A..., SA.

, e na qual formulou o seguinte pedido: “…deve a acção ser julgada provada e procedente e, em consequência:

  1. Declarar-se que o A. se encontra em situação de invalidez total e permanente desde .../.../2014; b) Declarar-se inválida e ineficaz a anulação/nulidade da adesão ao contrato de seguro celebrado com a Ré e titulado pela apólice ...08, efectuada pela Ré pela carta de 21/09/2015 junta como doc. nº ...1 da p.i.; c) Declarar-se válido e eficaz o contrato de seguro titulado pela apólice ...08 até Novembro de 2015, cobrindo os riscos de morte e de invalidez total e permanente do A.

  2. Declarar-se nula e excluída a cláusula de exclusão do ponto 2 do art. 2º das Condições Contratuais Especiais.

  3. Condenar-se a Ré a proceder à liquidação total do capital em dívida do empréstimo nº ...85 do A. à Banco 1... a que se refere o mútuo com hipoteca titulado pela escritura celebrada em 10 de Maio de 2007, junta como doc ....

  4. Condenar-se a Ré a pagar ou reembolsar o A. de todas as prestações mensais do empréstimo (nelas se incluindo o capital, juros, imposto de selo e prémio do seguro) que este pagou à Banco 1... desde Agosto de 2014, inclusive, até à data da liquidação total do empréstimo, acrescida de juros legais contados desde a data do vencimento de cada prestação até ao seu reembolso, a liquidar em momento ulterior.

  5. Condenar-se a Ré a pagar ao A. o capital do seguro remanescente ao capital em dívida do empréstimo.

    SUBSIDIARIAMENTE, CASO ASSIM SE NÃO ENTENDA, h) Condenar-se a Ré a restituir ao A. todos os prémios de seguro pagos desde o início do contrato de seguro (2/5/2007) até à data da sua cessação.

  6. Condenar-se a Ré nas custas do processo.” A causa de pedir invocada consubstancia-se na verificação, em .../.../2014, de incapacidade total e definitiva do autor, por doença, para o exercício de qualquer actividade, risco assumido pela ré mediante contrato de seguro do ramo vida, em Maio de 2007, com a consequente obrigação de esta pagar o capital estipulado.

    Como fundamentos, alegou, em síntese, na petição, que celebrou um contrato de mútuo com a Banco 1... e, por exigência desta e para assegurar o cumprimento das prestações dele derivadas, o autor celebrou também com a ré o aludido contrato de seguro, conforme apólice ...08, de 07-05-2007, com efeitos ao dia 02 anterior.

    Ocorrido o sinistro, o autor comunicou-o à seguradora, tendo esta tomado dele conhecimento em 11-09-2014, solicitando-lhe o accionamento da cobertura.

    Esta, após recusa, declarou anulado o contrato em 21-09-2015. Sucede que o direito de arguir a invalidade já caducara, pelo decurso do prazo, tanto mais que a ré continuou, mesmo depois de se inteirar da história clínica do autor, a debitar-lhe e ele a pagar-lhe os prémios, assim se tendo sanado também aquela. Além disso, a cláusula de exclusão invocada não é oponível ao autor por força do Regime das Cláusulas Contratuais Gerais (DL 446/85) por dela oportunamente não lhe ter sido dado conhecimento.

    Juntou documentos.

    A ré contestou, por excepções peremptórias (para tal arguindo a nulidade/anulabilidade da apólice por prestação de declarações desconformes à realidade e defendendo a pré-existência de doenças que desencadearam o sinistro e, consequentemente, o preenchimento de cláusulas excludentes da sua responsabilidade) e por impugnação (defendendo que não estão preenchidas, para o efeito, as condições estipuladas nas Cláusulas do Contrato).

    De tudo concluiu que: “…deve a excepção deduzida de nulidade/anulabilidade por falsas declarações ser julgada procedente por provada, ou a excepção peremptória inominada de pré existência ser julgada procedente por provada, ou de falta de cobertura por não estarem preenchidos os pressupostos do artº 2 ponto 2 das Condições Especiais do seguro Complementar Invalidez Total e Permanente que remete para as Condições Particulares, ou a acção julgada improcedente, por não provada, e, em qualquer dos casos, a Ré absolvida dos pedidos, com as legais consequências.” Respondeu o autor aos documentos, impugnando-os, e às excepções, dizendo ter caducado o direito de a ré arguir a invalidade, tanto pelo regime do artº 429º, do Código Comercial, como pelo do Decreto-Lei nº 72/2008 (que considera aplicável após as renovações subsequentes à sua entrada em vigor), reiterando que, de todo o modo, o vício sanou-se por confirmação e, bem, assim, que a ré não pode prevalecer-se da cláusula relativa à pré-existência de doença por força do RCCG, e concluindo que: “… devem ser julgadas não provadas e improcedentes as excepções alegadas pela Ré, declarando-se ainda nulas e/ou excluídas do contrato de seguro o nº 2 da cláusula 2ª das Condições Especiais do Seguro Temporário Anual Renovável com Complementares Seguro Principal e ainda o art. 2º das Condições Especiais do Seguro Complementar – Invalidez Total e Permanente e que estabelece a definição de invalidez total e permanente e ainda abusivas e contrárias à boa fé.” Na audiência prévia realizada em 14-03-2019, fixou-se o valor da acção, sanearam-se tabelarmente os autos, relegou-se para final o conhecimento das excepções, identificou-se o objecto do litígio, enunciaram-se os temas da prova e apreciaram-se os requerimentos probatórios, determinando-se diversas diligências.

    Por fim, em 03 e 12-05-2022 realizou-se a audiência final, nos termos e com as formalidades narrados nas respectivas actas, no seu decurso tendo sido inquiridas testemunhas e tomadas declarações de parte.

    Com data de 18-05-2022, foi proferida a sentença que culminou na decisão de julgar procedente a acção e, em consequência: “I- Declara-se que o falecido autor AA se encontrava em situação de invalidez total e permanente desde .../.../2014 até à data da sua morte.

    II- Declara-se inválida e ineficaz a anulação do contrato de seguro celebrado com a Ré e titulado pela apólice ...08, efectuada pela Ré pela carta de 21/09/2015.

    III- Condena-se a ré Companhia de Seguros A..., SA., a proceder à liquidação total do capital em dívida do empréstimo nº ...85 do A. à Banco 1... a que se refere o mútuo com hipoteca titulado pela escritura celebrada em 10 de Maio de 2007.

    IV- Condena-se a Ré Companhia de Seguros A..., SA., a reembolsar os autores de todas as prestações mensais do empréstimo (nelas se incluindo o capital, juros, imposto de selo e prémio do seguro) que estes pagaram à Banco 1... desde Agosto de 2014, inclusive, até à data da liquidação total do empréstimo, acrescida de juros legais contados desde a data do vencimento de cada prestação até ao seu reembolso, a liquidar em momento ulterior.

    V- Condena-se a Ré Companhia de Seguros A..., SA., a pagar aos autores o capital do seguro remanescente ao capital em dívida do empréstimo.

    VI- Relego para o incidente de liquidação a quantificação das quantias descritas em IV., e V., se necessário for.

    VII- Condeno a ré no pagamento das custas processuais.” A ré, inconformada, apelou a esta Relação no sentido de a revogar, rematando as concernentes alegações com o seguinte texto que apelidou de conclusões: “1. À data da celebração do contrato de seguro dos autos, em 7/5/2007 vigorava o artº 429º do Cód. Comercial e artº 20 das Condições Gerais do Contrato de Seguro, e assim não é de aplicar o disposto nos artºs 26 do Dec Lei 78/2008 de 16 de Abril, disposições violadas na decisão recorrida; 2. Pelo que se aplicam ao contrato dos autos as disposições previstas no título XV, artigos 425º a 462º do Código Comercial (o DL n.º 72/2008, de 16 de abril, que aprovou o regime jurídico do contrato de seguro, só entrou em vigor no dia 1 de janeiro de 2009 – cfr. artigo 7º do referido DL).

    1. Estatuía o artigo 429º do Código Comercial que “Toda a declaração inexacta, assim como toda a reticência de factos ou circunstâncias conhecidas pelo segurado ou por quem fez o seguro, e que teriam podido influir sobre a existência ou condições do contrato tornam o seguro nulo” e por sua vez, o § único desse artigo 429º referia que “Se da parte de quem fez as declarações tiver havido má fé o segurador terá direito ao prémio”.

    2. A sentença recorrida considerou, erradamente, que as falsas declarações prestadas pelo segurado, entretanto falecido, deviam ser apreciadas à luz do artº 26º do Dec. Lei 72/2008, invocando o seu artº 2º que contrariamente ao decidido em sua violação, prescreve a “ aplicação da lei actual aos contratos de seguro celebrados após a entrada em vigor do presente decreto-lei, assim como ao conteúdo de contratos de seguro celebrados anteriormente que subsistam à data da sua entrada em vigor, com as especificidades constantes dos artigos seguintes”; 5. Ao tempo da formação da vontade da Apelante que não é questão do conteúdo do contrato, vigorava o regime do artº 429º do Cod. Comercial, pelo que lhe era aplicável nesse domínio e não o Dec Lei 78/2008 de 16 de Abril.

    3. A não ser assim, existiria retroactividade, vide artº 12º do Cód. Civil, dispositivo que a sentença recorrida também viola; 7. A anulabilidade do contrato de seguro, decorrente da previsão contida no art. 429º do C. Com., não pressupõe a existência de um nexo causal entre o conteúdo da declaração inexacta ou reticente do segurado acerca do seu real estado de saúde e causa directa da morte; 8. De qualquer forma, o Tribunal considerou, erradamente, a falta de nexo causal entre as omissões ou inexactidões alterem a apreciação do risco para poder optar pela cessação do contrato nos termos do artigo 26º/4-b), da LCS, a Recorrente tinha que demonstrar a existência de nexo entre as circunstâncias omitidas e o sinistro e que em caso nenhum...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT