Acórdão nº 215/15.7T8ACB.C1-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Setembro de 2018

Data26 Setembro 2018
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam no Pleno das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça: I1.

No âmbito do processo n.º 215/15.7T8ACB.C1-A, e após prolação do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 09.01.2017, a arguida AA, Lda (pessoa coletiva n.º 500 678 626, melhor identificada nos autos), veio interpor o recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, nos termos dos arts. 437.º, n.º 2 e 438.º, n.º 1, do Código de Processo Penal (doravante CPP), com fundamento em oposição entre o acórdão referido e o acórdão de 18.04.2012, do mesmo Tribunal da Relação de Coimbra, e prolatado no âmbito do processo n.º 430/11.2TBMLD.C1.

Em síntese, alega que os acórdãos em confronto estão em oposição sobre a mesma questão de direito relativa à possibilidade (ou não) de aplicação de admoestação [nos termos do art. 51.º, do decreto-lei n.º 433/82, de 27.10 (e alterações posteriores: decreto-lei n.º 356/89, de 17.10, decreto-lei n.º 244/95, de 14.09, decreto-lei n.º 323/2001, de 17.12 e lei n.º 109/2001, de 24.12 — Regime geral das Contraordenações, doravante RGCO)], às contraordenações ambientais graves, previstas no art. 34.º, n.º 2, do decreto-lei n.º 78/2004, de 03.04 [Regime da prevenção e controlo das emissões poluentes para a atmosfera; este diploma sofreu alterações pelo decreto-lei n.º 126/2006, de 03.07, tendo sido recentemente revogado pelo decreto-lei n.º 39/2018, de 11.06: cf. art. 43.º, al. a)].

2.

Em conferência, por acórdão de 17.05.2017, foi decidido que o recurso devia prosseguir por se verificar a necessária oposição de julgados sobre a mesma questão fundamental de direito, em situações factuais idênticas, e no domínio da mesma legislação.

  1. Após o cumprimento do disposto no art. 442.º, n.º 1, do CPP, o recorrente e o Ministério Público apresentaram as alegações.

    3.1.

    O recorrente concluiu as suas alegações nos seguintes termos: «1.º - Nos presentes autos o Tribunal de 1.ª Instância julgou improcedente as impugnações judiciais instauradas pela aqui Recorrente, a primeira impugnação da decisão administrativa proferida pela Inspecção Geral do Ambiente e do Ordenamento do Território que indeferiu o requerimento de redução da coima e a segunda impugnação interposta da decisão administrativa proferida pela Inspecção Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT) que condenou a mesma numa coima de 3.000,00€ e custas no valor de 100,00€ e em consequência manteve a decisão proferida IGAMAOT no âmbito da qual aplicou à Recorrente uma coima no valor de 3.000,00€, pela prática da contraordenação de violação da obrigação de autocontrolo prevista nos artigos 18.º e alínea d) do n.º 2 do artigo 34° do D.L. n.º 78/2004, de 3 de Abril, com as alterações introduzidas pelo D.L. n.º 126/2006 de 3 de Julho conjugado com a Portaria n.° 80/006 de 23.01.2006 e a condenou também em custas no valor de 100,00€.

    1. - A Recorrente interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra da supra referida sentença, entre outros motivos, pelo facto de não ter sido aplicada a pena de mera admoestação à Recorrente.

    2. - Na sequência desse recurso foi proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação de Coimbra que transitou em julgado em 26.01.2017 e no qual foi sufragado o entendimento de não ser aplicável ao caso concreto dos presentes autos a sanção de mera admoestação.

    3. - 0 Acórdão Recorrido está em clara oposição, porque foi proferido em último lugar, no domínio da mesma legislação, e relativamente à mesma questão de direito assenta em solução oposta, com o Acórdão Fundamento proferido em 18.04.2012 pelo Tribunal da Relação de Coimbra no Processo n.

      º 430/11.2TBAILD.C.

    4. - 0 Acórdão Recorrido sufraga o entendimento que a pena de admoestação não é aplicável às contra-ordenações legalmente classificadas como graves.

    5. - 0 Acórdão Fundamente do presente Recurso de Fixação de Jurisprudência sustenta que aquela classificação não obstaculiza tal opção, mostrando-se apenas necessário que a culpa do agente seja reduzida e que em concreto a gravidade da infracção seja reduzida.

    6. - As infracções porque ambas as Recorrentes foram condenadas no Acórdão Recorrido e no Acórdão Fundamento radicam ambas em ilícitos de natureza contra-ordenacional de incidência ambiental e são ambas classificadas na legislação como contra-ordenações graves; 8.º- 0 Acórdão Fundamento considerou que existe uma situação de reduzida gravidade quando: nos autos ficou demonstrada a conduta negligente; não ficou demonstrado qualquer dano efectivo para o ambiente; não foi contabilizado qualquer benefício económico para a Recorrente e a empresa não possui qualquer contraordenação anterior.

    7. - No Acórdão Recorrido foram dados como assentes os mesmos factos que foram determinantes para aplicação da sanção de mera admoestação no Acórdão Fundamento, nomeadamente foi dado como provado que a Recorrente agiu com negligência; a situação já tinha sido regularizada quando foi proferida a decisão administrativa; de acordo com os ulteriores Relatórios de Caracterizações de Efluentes Gasosos as medições estavam todas dentro dos parâmetros legais; não foi quantificado qualquer benefício económico por parte da Recorrente e a Recorrente não foi condenada por qualquer outra contra-ordenação.

    8. - Por outro lado, as medições que foram realizadas pela Recorrente estavam dentro dos parâmetros legais, logo, ainda que com o atraso na realização do autocontrolo, a verdade é que o Relatório de Caracterizações de Efluentes Gasosos demonstrou que as medições estavam dentro dos parâmetros legais, o que permite concluir que apesar da sua conduta negligente a Recorrente não causou qualquer dano efectivo ao ambiente: 11.º - 0 entendimento que veio a ser plasmado no Acórdão ora Recorrido foi contrário ao entendimento sufragado no Acórdão Fundamento, ou seja, foi o de considerar não ser aplicável às contra-ordenações ambientais graves a pena de mera admoestação.

    9. - No entender da Recorrente, estão pois verificados os requisitos substanciais da admissibilidade do Recurso de Fixação de Jurisprudência: a existência de dois acórdãos que respeitem à mesma questão de direito: a aplicação da pena de admoestação prevista no n.º 1 do artigo 51° do Regime Geral das Contra-ordenações às contra-ordenações ambientais classificadas como contra-ordenações graves; no domínio da mesma legislação; identidade das situações de facto no Acórdão Recorrido e no Acórdão Fundamento e existência de soluções opostas no Acórdão Recorrido e no Acórdão Fundamento.

    10. - Razão pela qual, impõe-se nos presentes autos a resolução de oposição de julgados sobre a mesma questão fundamental de direito: a interpretação/aplicação do artigo 51.º n.° 1, do Regime Geral das Contra-ordenações, para as contra-ordenações classificadas legalmente como contra-ordenações graves, nos termos do disposto no artigo 34.º, n.° 2, do D.L. n.° 78/2004, ou seja, saber se é admissível a aplicação de uma pena de admoestação pela prática de uma contra-ordenação classificada como grave, através da fixação de jurisprudência.

    11. - No entender da Recorrente, o artigo 51°, n.º 1, do Regime Geral das Contra-ordenações conjugado com o artigo 34.º, n.º 2, do D.L. n.

      º 78/2004 deve ser interpretado no sentido de ser admissível a aplicação de uma pena de admoestação pela prática de uma contra-ordenação classificada como contra-ordenação grave.

    12. - Dispõe o artigo 51° do Regime Geral das Contra-Ordenações que: "quando a reduzida gravidade da infracção e da culpa do agente o justifique, pode a entidade competente limitar-se a proferir uma admoestação." 16.º- Ou seja, para efeitos da aplicação da sanção de admoestação há que atender à culpa do agente e não à classificação que é feita quanto ao tipo de gravidade da contra-ordenação imputada.

    13. - 0 artigo 51° do Regime Geral das Contra-Ordenações não prevê que a pena de admoestação não possa ser aplicável às contra-ordenações classificadas como graves.

    14. - 0 n.º 3 do artigo 9.º do Código Civil estipula que na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.

    15. - Pelo que, se o legislador tivesse pretendido que a pena de admoestação não fosse aplicável às contra-ordenações classificadas como graves tinha consagrado tal facto expressamente no artigo 51° n.° 1° do Regime Geral das Contra-Ordenações, todavia neste caso em concreto o mesmo não o fez! 20.º- Na aferição da gravidade da infracção e da culpa do agente o Tribunal para efeitos da aplicação da pena de mera admoestação prevista no artigo 51° do Regime Geral das Contra-Ordenações, tem que atender se houve ou não benefício económico; se existiu ou não dolo, e qual a conduta do agente anterior e posterior à pratica da contra-ordenação.

    16. - Nos casos em que a conduta do agente é negligente a culpa é reduzida.

    17. - No entender da Recorrente, nos casos em que não existiu qualquer benefício económico; em que o agente regularizou a situação; em que a conduta foi considerada negligente e em que o agente é primário, deve ser considerado que a culpa do agente é diminuta e que por isso lhe pode ser aplicada a pena de admoestação conforme aliás foi também o entendimento sufragado no Acórdão Fundamento do presente recurso.

    18. - A não aplicação da pena de admoestação à Recorrente configura uma violação do principio da igualdade constitucionalmente consagrado no artigo 13° da Constituição da República Portuguesa.

    19. - Por um lado, porque permite que em duas situações idênticas sejam aplicadas penas diferentes: no Acórdão Fundamento é aplicada a pena de admoestação e no Acórdão Recorrido é aplicado uma pena mais gravosa, uma coima.

    20. - Por outro lado, aplica o mesmo tipo de pena em casos de dolo e negligência, ou seja, na fixação da pena não tem em conta o grau de culpa do agente.

    21. - Face a tudo o supra exposto a aqui Recorrente desde já requer aos Venerandos Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça que se dignem fixar jurisprudência no...

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