Acórdão nº 359/15.5T8STR.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 31 de Outubro de 2018
Magistrado Responsável | ANTÓNIO LEONES DANTAS |
Data da Resolução | 31 de Outubro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I Em 13 de maio de 2014, AA foi vítima de um acidente de trabalho que consistiu numa queda nuns degraus de uma escadaria ao carregar uma garrafa de oxigénio, quando trabalhava sob autoridade e direção de CC, S.A., que tinha a sua responsabilidade por acidentes de trabalho transferida para a COMPANHIA DE SEGUROS BB, S.A.
Instaurado o competente processo no MINISTÉRIO PÚBLICO da comarca de Lisboa Oeste, foi o sinistrado submetido a exame médico e, realizada a tentativa de conciliação, as partes não se conciliaram.
Apresentou então o sinistrado petição inicial contra a Empregadora e contra a Seguradora, pedindo que a segunda seja condenada «a indemnizar o sinistrado, aqui autor nos precisos termos em que se vier a ser apurado»; que «os senhores peritos médicos que vierem a constituir a junta médica que se requereu te[nham] em conta o facto de o sinistrado ser esquerdino, devendo ainda a IPP que vier a ser atribuída ser bonificada pelo fator 1.5, tendo em conta o facto de o sinistrado não ser reconvertível no seu posto de trabalho» e que se condene a «primeira Ré a indemnizar o sinistrado na parte não transferida para a segunda Ré, ou seja o subsídio de prevenção, considerando-se o mesmo parte integrante da retribuição».
A ação instaurada foi contestada pelas Rés, considerando a Empregadora que o subsídio de prevenção não pode ser qualificado como retribuição mensal, uma vez que tal subsidio só era pago quando o Sinistrado estava de prevenção o que não acontece todos os anos. A Seguradora, por sua vez, alegando que apenas se responsabiliza pela remuneração anual transferida.
Foi ordenado o desdobramento do processo para exame por junta médica.
Procedeu-se a julgamento e foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente e, consequentemente, condenou as Rés a pagar ao Autor: «- Uma pensão anual e vitalícia de € 7.719,54 (sete mil setecentos e dezanove euros e cinquenta e quatro cêntimos), devida desde 24.01.2015; acrescida do subsídio por situação de elevada incapacidade no montante de 3.987,80 (três mil novecentos e oitenta e sete euros e oitenta cêntimos), e o montante de 522,73 (quinhentos e vinte e dois euros e setenta e três cêntimos) a título de indemnização por incapacidades temporárias, sendo a cargo: 1 - da Ré COMPANHIA DE SEGUROS BB, SA.: - Uma pensão anual e vitalícia no montante de € 7.119,72 (sete mil cento e dezanove euros e setenta e dois cêntimos), devida desde 20.01.2015; e - Um subsídio por elevada capacidade no montante de € 3.987,80 (três mil novecentos e oitenta e sete euros e oitenta cêntimos).
Valores estes acrescidas de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento.
2 - da Ré CC, S.A, - Uma pensão anual e vitalícia no montante de € 599,83 (quinhentos e noventa e nove euros e oitenta e dois cêntimos) devida desde 20.01.2015; e - Indemnizações por incapacidade temporária no montante de € 522,73 (quinhentos e vinte e dois euros e setenta e três cêntimos) Montantes estes acrescidos de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento.» Inconformados com esta decisão, dela apelaram as Rés para o Tribunal da Relação de Lisboa que conheceu dos recursos interpostos por acórdão de 6 de dezembro de 2017, com um voto de vencido, e que integrou o seguinte dispositivo: «Em conformidade com o exposto, acorda-se em julgar:
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A apelação interposta por CC, SA. procedente e, em consequência, revogar a sentença na parte em que condena esta Ré, absolvendo-se a mesma do pedido.
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A apelação interposta por DD, SA. procedente e, em consequência, modificar a matéria de facto como sobredito, e a sentença, condenando-se a Apelante a pagar ao Apelado o capital de remição de uma pensão anual vitalícia no valor de setecentos e quinze euros e noventa e cinco cêntimos (715,95€), desde 24/01/2015.
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Mantém-se o decisório quanto ao mais (juros de mora).
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Custas da 1ª apelação pelo Apelado e da 2ª por ambas as partes, na proporção de vencidas.
Notifique.» Irresignado com o assim decidido, vem o sinistrado recorrer de revista para este Supremo Tribunal, integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões: «A. O sinistrado, aqui recorrente, não se conforma com o douto acórdão do tribunal da relação e daí o presente recurso.
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Por um lado entende que não se pode retirar o valor ao parecer dos peritos especializados, sem mais, revogando a sentença do Tribunal a quo sem ordenar que seja ordenada nova perícia médica complementar, prova essencial para que se determine a IPATH.
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Violando dessa forma o acórdão do Tribunal da Relação o artigo 615°, n° 1, al. c) aplicável ex vi do artigo 674°, n° 1, al. c) do CPC, e ainda o artigo o artigo 20° da CRP, que consagra o principio da proibição de indefesa.
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O sinistrado, aqui recorrente entende que o princípio da proibição de indefesa está a ser violado, pois que se por um lado entende o tribunal da relação que o parecer de peritos especializados deve ser prévio e submetido à apreciação médico-legal, por outro lado, com o devido respeito, deveria anular a decisão da primeira instância a fim de ser efetuada nova perícia médica complementar, a fim de que se apurasse IPATH.
Ao decidir como decidiu está a postergar o direito de defesa do sinistrado.
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Salvo o devido e o merecido respeito, a sentença revogada não merece qualquer censura e por isso deve ser mantida na íntegra. O que se requer.
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I - Do conceito de retribuição G. Com o devido respeito, mal andou o tribunal da relação quando entendeu que o subsídio de prevenção não integra o conceito jurídico de retribuição porque não foi regularmente pago nos doze meses anteriores.
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No conceito de retribuição o C.T. no seu artigo 258° determina no seu n° 1 que "Considera-se retribuição a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho." I. Continua o n° 2 do mesmo artigo que "A retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, direta ou indiretamente, em dinheiro ou espécie".
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Ora, no domínio da sinistralidade laboral, o que o legislador pretende é compensar o sinistrado pela falta ou diminuição dos rendimentos provenientes do trabalho, entendendo-se que as prestações reparatórias atendam ao salário médio onde se integram todos os valores que a entidade patronal satisfazia regularmente e em função das quais o trabalhador programava a sua vida, neste sentido o acórdão do STJ de 17.03.2010, processo 436/09.1YFLIS.
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Entende o tribunal da relação que tal subsídio porque pago apenas em 7 meses do ano que antecedeu o sinistro, não integra o conceito de retribuição para efeitos de cálculo da pensão.
L. Salvo o devido respeito não se aceita tal posição que é no mínimo violadora dos direitos do sinistrado a ser ressarcido pelos valores que auferia à data do sinistro e dos que deixou de auferir por ocasião do mesmo.
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Pelo exposto deve o acórdão ser revogado mantendo-se na íntegra a sentença proferida no tribunal de primeira instância. O que se requer.
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II - Do reconhecimento de IPATH e consequente atribuição de subsídio de elevada incapacidade.
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Entende o Tribunal da relação que o sinistrado não alegou que não está capaz de conduzir o veículo, nem de proceder à carga, descarga e movimentação dos equipamentos. Que esta matéria não foi levada à base instrutória e é essencial para a qualificação da incapacidade. "E não foi ali conduzida porque nunca foi alegada".
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Que "nem esta nem qualquer outra matéria capaz de sustentar um juízo de incapacidade tão grave como veio a ser invocado apenas no desenvolvimento dos autos".
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Que "é as partes que cabe a alegação dos factos essenciais que constituem a causa de pedir, factos esses sobre os quais virá a incidir a prova" R. Salvo o devido respeito tais factos foram alegados pelo sinistrado na sua petição inicial, nomeadamente artigos 32.°, 33.º e 34.°, onde o recorrente alegou o facto de não ter sido reconvertível no seu posto de trabalho, devido a ter deixado de poder desempenhar as funções que desempenhava à data do sinistro, estando agora a desempenhar funções de telefonista.
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Sendo certo que para além de alegados na PI, foram provados em sede de julgamento, veja-se a prova gravada, onde foi provado nomeadamente que não mais pôde manusear as garrafas de oxigénio, não mais pôde conduzir o carro que lhe estava distribuído, não podendo transportar todo o material do armazém para o carro e deste para casa dos utentes e vice-versa.
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Tendo ainda sido emitido parecer de peritos especializados no âmbito do artigo 217.º da Lei 98/2009 onde de forma detalhada de explanou quais as tarefas que o sinistrado desempenhava antes do sinistro e quais as que deixou de desempenhar de forma permanente. Tal relatório foi completamente arrasado pelo tribunal da relação porque entende que deveria ter sido submetido à apreciação médico-legal.
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Porém, ao invés de anular a sentença da primeira instância a fim de se ordenar nova perícia médica complementar, o tribunal da relação, mal a nosso ver, mas sempre com o devido respeito, revogou, sem mais, a sentença proferindo acórdão prejudicial ao sinistrado, numa clara violação do princípio de proibição de indefesa, denegando assim justiça.
V. Por outro lado tal posição assumida pelo tribunal da relação, salvo o devido respeito, faz tábua rasa dos poderes de condenação extra vel ultra petitum estatuídos no artigo 74° do CPT, que determina que "o juiz deve condenar em quantidade superior ao pedido ou em objecto diverso dele quando isso resulte da aplicação à matéria provada, ou aos factos de que possa servir-se (...)".
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Acresce que, segundo o n° 1 do artigo 72° do CPT "se no decurso da produção de prova surgirem factos que, embora não articulados o tribunal considere relevantes para a boa decisão da causa, deve ampliar a...
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