Acórdão nº 39/18.0YREVR.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelLOPES DA MOTA
Data da Resolução24 de Abril de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACÓRDÃO Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1.

AA AA, identificada nos autos, recorre para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão do Tribunal da Relação Évora que, julgando improcedente a oposição que deduziu, deferiu a execução do mandado de detenção europeu (MDE) emitido pela Juzgado de Instruccion nº 32 de Madrid, Reino de Espanha, com vista à sua entrega para efeitos de procedimento criminal por factos que, de acordo com a autoridade de emissão, constituem crimes de associação criminosa, de burla e de branqueamento de capitais, puníveis com pena de prisão superior a 3 anos, nos termos das disposições aplicáveis do Código Penal Espanhol.

  1. Arguindo nulidade do acórdão, da motivação que apresentou extrai a recorrente as seguintes conclusões, que se transcrevem: «i. A desmaterialização dos processos veio permitir aos Tribunais, Juízes e procuradores, o acesso rápido e seguro a toda a informação constante de um processo identificável pelo seu número permanente e único - NUIPC; ii. Ao Tribunal a quo, fácil seria ter optado por consultar, ou mandar consultar os autos indicados pela detida ao invés de se refugiar em pretensos motivos e, para concluir pela delonga que a defesa da detida provoca.

    iii. A circunstância de a ora detida estar privada da sua liberdade, não tendo qualquer possibilidade de aceder, de consultar, de procurar na sua casa qualquer notificação que permita clarificar ou auxiliar o Tribunal na sustentação da sua decisão é causa mais do que suficiente para que o Tribunal a quo optasse por cumprir o princípio do investigatório; iv. Nos autos identificados pela recorrente em sede de oposição estamos perante os mesmos factos que determinaram a emissão do MDE pelo Reino de Espanha; v. Por não identificação circunstanciada dos factos e sujeitos processuais, imputa o Venerando Tribunal a quo a possível consequência do não cumprimento do prazo de 60 dias para execução do MDE; vi. A obediência ao princípio da investigação, claro está, não derroga o princípio da livre apreciação da prova mas, não pode, ele mesmo ser derrogado sem que o Tribunal minimamente justifique as razões - jurídicas - que o determinaram! vii. Trata-se aqui de uma discricionariedade vinculada por parte do Tribunal, em obediência ao que deve ser um dos fins do processo penal, a descoberta da verdade e a realização da Justiça! viii. E, a ponderação deve, no caso concreto, materializar-se na dialéctica entre a tutela jurisdicional efectiva e o respeito por direitos fundamentais - absolutos -, como é a liberdade.

    ix. Recusar a aplicação do princípio da investigação em absoluto, não conceder à aqui recorrente a possibilidade, que como se viu está limitada pela sua condição, de sustentar, ainda que sumariamente, as razões da sua pretensão é, sem qualquer dúvida, derrogar as garantias de defesa plasmadas no n.º 1 do artigo 32.° da CRP.

    x. Ora, não tendo a aqui recorrente abdicado da regra da especialidade, tendo invocado factos - subsistência de processos penais anteriores -, e tendo fornecido a identidade única dos mesmos, estamos em crer que o Tribunal a quo deveria ter salvaguardado a ponderação devida e, em caso de recusa, ter xi. Prima facie, convidado a aqui recorrente a justificar sumariamente o alegado e, em ultima ratio, ter sustentado a sua posição com base num qualquer e hipotético argumento juridicamente sustentável e não, como o fez, no exercício de direito de defesa como putativa causa de entorpecimento do cumprimento do MDE!!! xii. Existe aqui, claramente, insuficiência de factos que determinam uma decisão equitativa e justa e que deveriam ter sido levadas a cabo pelo Tribunal a quo mesmo que, após convite à detida para tal.

    xiii. Não o tendo feito, viola o tribunal a quo o princípio da investigação, materializado, in casu, na violação do preceituado no artigo 340.° do CPP e, finalisticamente, na contribuição para a descoberta da verdade e realização da justiça.

    xiv. A violação desta faculdade vinculada sem qualquer tipo de fundamentação, constitui postergação dos direitos básicos de defesa consignados no artigo 20.° da CRP, xv. Assim sendo, é nula a decisão por violação da alínea d) do n.º 2 do artigo 120.° do CPP, xvi. Nulidade que se invoca e que torna o acto inválido nos termos do que dispõe o artigo 122.° do CPP.

    Termos em que deve ser declarada a nulidade do acórdão posto em crise por violação da alínea d) do n.º 2 do artigo 120.° do CPP sendo, em consequência, o mesmo inválido por força do que dispõe o artigo 122.° do CPP.» 3.

    Respondeu o Ministério Público no Tribunal da Relação Évora, defendendo a improcedência do recurso nos seguintes termos, em que conclui (transcrição): “(...) 2 - Pretende a Recorrente que, no uso da faculdade do art.º 340.º do Cód. Proc. Penal, o Tribunal consultasse ou mandasse consultar os autos por si indicados, face à sua situação de detenção, estava impossibilitada "de aceder, de consultar, de procurar na sua casa qualquer notificação que permita clarificar ou auxiliar o Tribunal na sustentação da sua decisão ", por outro lado, "no pouquíssimo tempo para preparação cabal da defesa por molde a que, os mandatários da detida (verdadeiros coadjuvantes e colaboradores), possam, em tempo, aceder e consultar os autos indicados." 3 - Nos termos do determinado no art.º 21.° da Lei n.º 65/2003, a oposição é deduzida aquando da Audição do detido, mas quando é solicitado prazo para deduzir oposição é ao Requerido que cabe apresentar defesa e elementos de prova.

    4 - Diz a Requerida que os factos dos outros são os mesmos do presente M. D. E. mas salvo o devido respeito, dúvidas se nos suscitam sobre a veracidade desta afirmação atentos os ilícitos indiciados no Reino de Espanha, por factos praticados nesse país, sendo certo que não haveria identidade de ofendidos.

    5 - A obtenção por este Tribunal dos elementos relativos aos processos mencionados no requerimento de oposição só terá lugar se os factos alegados, «forem idóneos a preencher causa que obste irremediavelmente, nos termos das normas aplicáveis, à execução do MDE» o que, manifestamente, não ocorre in casu.

    6 - Efectivamente «IV - A recusa facultativa regulada no art. 12.° tem de assentar em motivos ponderosos, ligados fundamentalmente às razões que subjazem, por um lado, ao interesse do Estado que solicita a entrega do cidadão de outro país para efeitos de procedimento criminal ou para cumprimento de pena ou de medida de segurança privativa da liberdade, e, por outro, ao interesse do Estado a quem o pedido é dirigido em consentir ou não na entrega de um nacional seu.» Ac do Supremo Tribunal de Justiça de 15-03-2006, Proc. n.º 06P782 e no mesmo sentido Ac desse Mais Alto Tribunal de 22-06-2006, Proc. n.º 06P2326.

    7 - Caberia à Requerida apresentar os elementos para apreciação do Tribunal, sendo certo que neste processo não cabe investigar, mas tão só executar a solicitação do Estado Requerente, só podendo solicitar elementos àquele Estado – cfr. art.º 5.°, n.º 5, 22.°, n.º 2, do Diploma.

    8 - Não se verifica a nulidade da al. d) do n.º 2 do art. 120.° do Cód. Proc. Penal, por duas ordens de razão: - não existem as fases de inquérito e de instrução no Processo de M. D. E.

    - não se verificou postergamento do art. 340° do Cód. Proc. Penal 9 - Não violou a douta decisão recorrida qualquer preceito, designadamente os arts. 340.° e a al. d) do n.º 2 do art.º 120.° do Cód. Proe. Penal”.

  2. Colhidos os vistos, cumpre decidir.

    1. Fundamentação 5.

    Detida e apresentada no Tribunal da Relação de Évora, foi a recorrente informada da existência do MDE e do seu conteúdo, tendo declarado que não consentia na sua entrega à autoridade de emissão, pelo que solicitou prazo para deduzir oposição, nos termos do disposto no artigo 21.º da Lei n.º...

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