Acórdão nº 079/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução10 de Setembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - Relatório -1 – A………, Lda, com os sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 10 de Outubro de 2013, que julgou totalmente improcedente a impugnação por si deduzida contra acto de liquidação de taxa de publicidade a que procedeu em 15.07.2010 a Directora da delegação regional de Viana do Castelo da EP – Estradas de Portugal S.A., no valor de €2.271,60, apresentando para tal as seguintes conclusões: I.

No que respeita á matéria de facto estabilizada no processo e devidamente elencada na douta sentença, e sem prejuízo daquilo que se dirá infra, na conclusão XXVI., nenhuma questão se coloca, pelo que é com base na mesma que há que analisar a principal questão de direito que se coloca nos autos.

II.

A E.P. – Estradas de Portugal, S.A. e a sua Directora da Delegação Regional de Viana do Castelo eram absolutamente incompetentes para a prática do acto impugnado (acto de liquidação de taxa de publicidade a que procedeu em 15.07.2010, remetida à recorrente a coberto do ofício n.º 1076, saída 50566, da mesma data).

III.

Como se lê na recente Recomendação da Provedoria de Justiça n.º 5/A/2012, a Lei 97/88, de 17 de Agosto, universalizou a licença municipal de afixação ou instalação de publicidade no espaço exterior e refere-se à intervenção de autoridades públicas com intervenção específica sobre determinadas parcelas do território concelhio, como sendo um parecer (artigo 2.º, n.º 2), parecer esse que é obrigatório e que precede a deliberação camarária.

IV.

Sendo que no DL 13/71, de 23 de Janeiro, se cometia à ex-JAE o poder de deferir ou recusar licenças e autorizações para a «implantação de tabuletas ou objectos de publicidade, comercial ou não, numa faixa de 100 m para além da zona non aedificandi respectiva» (artigo 10.º, n.º 1, alínea b)), a citada Lei n.º 97/88 pretendeu inequivocamente condensar num só procedimento administrativo o licenciamento sobre a afixação ou instalação de suportes publicitários no espaço público.

V.

Assim, a Lei 97/88, sem ter revogado o artigo 10.º, n.º 1, alínea b), do DL 13/71 – até por ser aqui delimitada a zona de jurisdição da antiga JAE em 100 m para além da zona non aedificando – reduziu o seu âmbito, pois deixa de aplicar-se às situações reguladas na nova lei (toda a publicidade e propaganda no espaço público, excepto em imóveis do domínio público). Ocorreu, assim, apenas uma derrogação. Nem se oponha que a primeira constitui lei geral, em face do DL 13/71, e este, por seu turno, lei especial, qualificação que excluiria a revogação, ainda que parcial (artigo 7.º, n.º 3, do Código Civil).

VI.

A única leitura plausível que concilia na Lei n.º 97/88, de 17 de Agosto, o disposto no artigo 2.º, n.º 2, com o artigo 1.º, n.º 1, é a de considerar que a extinta JAE (e, depois, o INSTITUTO DAS ESTRADAS DE PORTUGAL e a EP – ESTRADAS DE PORTUGAL, E.P.E) interviria com um parecer sobre a publicidade afixada ou inscrita nas áreas onde apenas dispusesse de jurisdição (zona de protecção à estrada); já, ao invés, nas áreas onde dispusesse de poderes dominiais (zona de estrada, entendida, segundo o artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, como a faixa de rodagem, bermas, valetas, passeios, banquetas, taludes, pontes, viadutos e terrenos para alargamento, para estacionamento, miradouros ou áreas de serviço) faria sentido uma licença dominial, inteiramente diversa da licença municipal.

VII.

A incompetência absoluta da E.P. resulta também da “sucessão de atribuições no sector das infra-estruturas rodoviárias, após a extinção da entidade pública empresarial”, como se lê na Recomendação da provedoria de Justiça n.º 5/A/2012, que aqui se dá por integralmente reproduzida.

VIII.

A EP-ESTRADAS DE PORTUGAL, EPE, foi transformada em sociedade anónima de capitais públicos (artigo 1.º do Decreto-lei n.º 374/2007, de 7 de Novembro), passando a adoptar um formato do direito privado, sendo que, a par da nova natureza societária, a EP, S.A., assumiu a qualidade de concessionária do Estado, isto é, a de um operador de mercado, cujo objecto se encontra delimitado pelos termos do contrato de concessão (artigo 4.º do mesmo diploma) e que, desta forma, satisfaz necessidades colectivas.

IX.

Sendo um facto que o regime jurídico do sector empresarial do Estado prevê que as empresas públicas podem exercer poderes e prerrogativas de autoridade de que goza o Estado (artigo 14.º, n.º 1 do Decreto-lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro), tais poderes são, todavia, atribuídos diretamente às empresas públicas, como resulta do n.º 2 do preceito, que estabelece que os poderes especiais são atribuídos por diploma legal, em situações excepcionais e na medida do estritamente necessário à prossecução do interesse público, ou constarão de contrato de concessão.

X.

Os poderes de autoridade da EP. S.A. são individualmente consagrados no artigo 10.º do Decreto-lei n.º 374/2007, obedecendo ao princípio geral de direito administrativo segundo o qual, a competência é de ordem pública e não se presume.

XI.

A atribuição de zelar pelo domínio público rodoviário não confere outro poder para além dos poderes tipicamente dominiais: embargar e demolir as construções efectuadas em zonas non aedificandi e zonas de protecção estabelecidas por lei (artigo 10.º, n.º 2, alínea b)), executar coercivamente as demais decisões de autoridade (alínea d)), proteger as instalações e o seu pessoal (alínea f)), instaurar e aplicar sanções em processo contraordenacional (alínea i)), o mesmo valendo para os poderes de encerrar instalações que causem perigo à estrada (artigo 10.º, n.º 3, alínea a) e de remover objectos que indevidamente ocupem o domínio público (alínea d)).

XII.

Mas nunca se individualizam em tais disposições poderes para licenciar ou dar parecer sobre a inscrição ou afixação de mensagens publicitárias.

XIII.

O diploma que criou o INIR, I.P. foi alterado pelo Decreto-lei n.º 132/2008, de 21 de Julho, a par da atribuição da concessão à EP – ESTRADAS DE PORTUGAL, S.A., sendo que sobre o sentido das alterações introduzidas consagra-se no preâmbulo do diploma que “Com a entrada em vigor do Decreto-lei n.º 380/2007, de 13 de Novembro, foram introduzidas grandes mudanças na configuração e papel de alguns agentes do sector. Em particular, o papel desempenhado pela EP - ESTRADAS DE PORTUGAL, S. A., no contexto do sector rodoviário, foi profundamente modificado. No novo modelo do sector rodoviário, a EP - ESTRADAS DE PORTUGAL, S. A., assume a qualidade de concessionária do Estado, isto é, um operador de mercado, não detendo, atualmente, quaisquer competências próprias ou de representação do Estado nos contratos de concessão vigentes”.

XIV.

O INIR, I.P. ficou com a incumbência de “exercer os poderes e as competências atribuídas ao concedente Estado, por lei ou por contrato” (artigo 3.º, n.º 4, alínea a), do Decreto-lei n.º 148/2007, de 27 de Abril, na redacção introduzida pelo DL n.º 132/2008, de 21 de Julho ).

XV.

A Recomendação em causa contém, abreviadamente, as seguintes conclusões: 1ª. No actual contexto normativo, não dispõe a EP – ESTRADAS DE PORTUGAL, S.A. de poderes para, na zona de proteção à estrada, conceder autorizações ou licenças pela implantação de tabuletas e objetos de publicidade e para liquidar e fazer cobrar a taxa prevista no artigo 15.º, alínea j) do Decreto-lei n.º 13/71, de 23 janeiro; 2.ª A prática de um ato administrativo alheio às atribuições da pessoa coletiva é sancionada com a nulidade, nos termos do artigo 133.º, n.º 2, alínea b), do Código do Procedimento Administrativo; 3.ª Representa um equívoco a convicção de caducarem ao fim de um ano as licenças ou autorizações que a EP – ESTRADAS DE PORTUGAL, S.A., tem vindo a conceder e a fazer reconhecer como facto tributário para liquidação anual de uma taxa no valor de € 56,79.

XVI.

Termina a mesma recomendação ao Exmo. Presidente do Conselho de administração da EP – ESTRADAS DE PORTUGAL, S.A., que o mesmo se abstenha de liquidar e cobrar taxas por licenças anuais para afixar ou instalar mensagens publicitárias nos 100 metros da zona non aedificandi de cada estrada nacional, compreendendo as situações ocorridas em anos anteriores.

XVII.

No caso da recorrente, não existiu, nem existe, qualquer licenciamento de publicidade.

XVIII.

Não havendo licenciamento, não pode haver lugar à cobrança de taxas de publicidade, já que o licenciamento de publicidade é o pressuposto da existência das taxas de publicidade e, consequentemente, da sua liquidação e posterior cobrança.

XIX.

O que a entidade impugnada fez – apesar de expressamente alertada na pronúncia relativa à audiência prévia apresentada pela ora impugnante para a ilegalidade da situação – foi ficcionar a existência de um licenciamento de publicidade e proceder à liquidação da taxa devida no pressuposto da existência de tal licenciamento, sendo que, todavia, o direito à cobrança de taxas de publicidade e a correspondente obrigação do seu pagamento somente nasce com o licenciamento respectivo e não antes dele, pelo que não existindo os pressupostos nem o facto gerador da obrigação da liquidação da taxa, a sua liquidação e a exigência do seu pagamento é completamente ilegal.

XX.

Mesmo que porventura se entendesse que a competência para o licenciamento continua a pertencer à EP – ESTRADAS DE PORTUGAL, SA, sempre os vícios do acto seriam os mesmos, pois que também nessa entidade não foi requerido e, consequentemente, tramitado, qualquer processo de licenciamento de...

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