Acórdão nº 01222/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA DO C
Data da Resolução13 de Outubro de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo RELATÓRIO A.....…………., B…………….., C……………… e D…………., melhor identificados nos autos, intentaram acção administrativa especial, contra o Conselho de Ministros, o Ministério da Saúde e o Ministério das Finanças, peticionando a condenação destes na prática, entre o mais, [indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais] “do acto administrativo devido, assente na omissão de uma norma”, a emitir pelos RR com vista a regulamentar um suplemento remuneratório que é devido, em cada unidade funcional, aos membros do Conselho Clínico dos Agrupamentos de Centros de Saúde.

Em sede de oposição, veio o Ministério das Finanças suscitar a excepção da (i) incompetência em razão da matéria da jurisdição administrativa, (ii) a sua ilegitimidade passiva e (iii) a ineptidão da petição inicial, bem como, (iv) a prescrição do direito à indemnização por responsabilidade civil extra contratual e, no mais, impugnar a alegação dos autores.

Também o Ministério da Saúde veio deduzir oposição suscitando a (i) ineptidão da petição inicial e (ii) a prescrição do pedido indemnizatório e, no mais, impugnar a matéria alegada pelos autores.

Por último, o Conselho de Ministros deduziu oposição suscitando em sede de excepção (i) a sua ilegitimidade passiva, (ii) a ineptidão da petição inicial, (iii) a prescrição do direito à indemnização e, no mais, impugnar a alegação dos autores.

* Cumpridos os trâmites legais, foi proferido despacho saneador [cfr. fls. 331 a 340 dos autos], que conheceu das excepções suscitadas pelos RR no que tange à incompetência do tribunal em razão da matéria, da excepção da ineptidão da petição inicial e da ilegitimidade passiva do Conselho de Ministros, no sentido das respectivas improcedências, nos precisos termos que ali constam e, quanto à excepção da prescrição, nas suas diversas vertentes, decidiu-se que, tratando-se de mérito, só a final tal excepção seria objecto de apreciação e decisão.

* Decidiu-se ainda que, não havendo outras excepções ou questões prévias, não haveria lugar à abertura de um período de produção de prova, tendo-se notificado todos os intervenientes processuais, para alegarem por escrito.

* Os AA alegaram, formulando as seguintes conclusões: a) «A mais recente versão do DL 28/2008 é posterior à mais recente versão da Lei 35/2014.

b) O DL 28/2008 é legislação de natureza especial.

c) Em função disso, estamos perante um suplemento remuneratório que deverá ser regulamentado com recurso a um acto administrativo, por via da interpretação das regras da hermenêutica jurídica plasmada no artigo 7º, nº 2 e 3 do Código Civil.

d) Pelo que se verifica a competência da jurisdição administrativa.

e) Os pressupostos de atribuição do suplemento remuneratório previsto no DL 28/2008, diverge dos pressupostos de atribuição do suplemento remuneratório previsto na Lei 35/2014, pelo que estamos perante dois tipos de suplementos remuneratórios de natureza distinta, e por via dessa diferença, nunca se poderá regulamentar o suplemento em causa na Lei 35/2014, pela impossibilidade de este não se subsumir nos pressupostos de atribuição aí plasmados.

f) Não se verifica a prescrição quanto à tempestividade do pedido de indemnização deduzido».

* O Réu, Conselho de Ministros, alegou, formulando as seguintes conclusões: a) «Os AA reclamam a emissão de um despacho conjunto dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças, administração pública e saúde ao abrigo do artigo 29º do DL nº 28/2008, pelo que o Conselho de Ministros é parte ilegítima na presente ação; b) Verifica-se a prescrição do direito à indemnização reclamada pelos AA porquanto se encontra ultrapassado o prazo de 3 anos previsto no artigo 498º do Código Civil, aplicável ex vi artigo 5º do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei nº 67/2007, de 31 de dezembro, alterada pela Lei nº 31/2008, de 17 de julho; c) Por força do disposto no artigo 73º, nº 7, da Lei nº 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, deve entender-se que o segmento dos nºs 4 e 5 do artigo 29º do DL nº 28/2008 que estabelece que o valor do suplemento remuneratório é criado por despacho conjunto dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças, da Administração Pública e da saúde se encontra tacitamente revogado; d) Mesmo que se entenda que o DL nº 28/2008 tem a natureza de lei especial, o que é certo é que, a Lei nº 12-A/2008 pretendeu revogar todas as leis especiais que dispusessem o contrário do disposto em matéria de remuneração (logo, incluindo suplementos remuneratórios); e) Estabelece o nº 1 conjugado com o nº 11 do artigo 117º desta lei que os regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações definidos na Lei nº 12-A/2008 prevalecem sobre quaisquer leis especiais vigentes à data da sua entrada em vigor, o que claramente traduz uma intenção inequívoca de revogar todas as leis especiais anteriores; f) Dispunha a Lei nº 12-A/2008 e dispõe agora a LTFP, aprovada pela Lei nº 35/2014, que os suplementos remuneratórios são criados e regulamentados por lei; g) Quer isto dizer que não basta a lei consagrar o direito a auferir suplementos remuneratórios; é necessário também que o respetivo montante seja fixado por ato legislativo; h) Bem andou assim o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa quando, no Proc. 3182/11.2BELSB, decidiu no mesmo sentido, absolvendo os Réus Ministério das Finanças e Ministério da Saúde da instância, considerando que a regulamentação não poderia ser feita através de despacho conjunto; i) Foi também esse o entendimento do Supremo Tribunal Administrativo em acórdão de 9 de outubro de 2014, proferido no Processo nº 61/14, tendo concluído que “os actos normativos inseridos em diplomas legislativos perdem a natureza de normas administrativas e passam a ter a natureza de normas legais” e que se torna “(…) claro não caber na previsão do art. 77º do CPTA a possibilidade de impôr à entidade competente a prática de actos formalmente legislativos. O art. 77º do CPTA deve ser interpretado, no âmbito ou domínio de competência da jurisdição administrativa, e portanto só pode estar a referir-se a normas regulamentares, ou seja, normas material e formalmente administrativas, pois só estas, como vimos, se inserem no exercício da função administrativa”.

j) O suplemento previsto no artigo 29º do DL 28/2008 não era devido pela simples nomeação para determinado cargo mas por haver um acréscimo de trabalho, pressupondo funções e competências acrescidas; k) É irrelevante que, materialmente, se esteja perante o exercício da função administrativa já que, como referem Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo III, Coimbra Editora, 2006, pp. 615 e 616, “para efeitos de impugnação contenciosa, as “normas emanadas ao abrigo de disposições de direito administrativo”, a que designadamente se refere o artigo 72º do CPTA, não podem, pois, ser emanadas sob a forma de acto legislativo” (sublinhado nosso); l) Como bem decidiu o STA no acórdão supra citado, a regulamentação prevista no artigo 29º do DL nº 28/2008 deve fazer-se por ato legislativo, sendo a jurisdição administrativa incompetente para condenar à emissão do mesmo uma vez que resulta do artigo 4º, nº 3, a) do ETAF que a jurisdição administrativa não tem competência para declarar a ilegalidade por omissão de atos legislativos; m) Nesta matéria a forma é determinante: se está em causa uma alegada omissão de um ato legislativo os tribunais administrativos não são competentes para determinar se tal omissão existe ou não e muito menos para condenar o Governo a emiti-lo.

Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exas doutamente suprirão, deve a Ré Presidência do Conselho de Ministros (Conselho de Ministros) ser liminarmente absolvida da instância, por ilegitimidade passiva, nos termos dos artigos 576º, nº 2, 577º, al. e) e 278º, nº 1, al. d) do CPC (aplicável por remissão do artigo 1º do CPTA).

Ou, caso assim não entenda, Deve a presente ação administrativa especial ser julgada improcedente, por não provada».

* Igualmente o Ministério da Saúde apresentou alegações, concluindo: a) «O legislador reservou a ato legislativo (i.e., lei em sentido material) o poder regulamentar que antes da entrada em vigor da Lei nº 12-A/2008, poderia ser exercido mediante ato administrativo; b) Com a entrada em vigor da Lei nº 12-A/2008, a questão em apreço passou a ter aquela resposta por parte do legislador – e é de uma resposta legislativa que se trata; c) O mesmo sucede com o regime instituído pela Lei nº 35/2014, de 20 de junho (Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas), que veio revogar a Lei nº 12-A/2008; d) A sucessão de diplomas entre a Lei n.º 12-A/2008 e a Lei n.º 35/2014 não trouxe inovação ao nível do modo e da forma de criação dos suplementos remuneratórios dos trabalhadores em funções públicas, pois continua a exigir-se um ato legislativo para o efeito; e) Em caso algum poderia o Governo regulamentar os suplementos em discussão por via administrativa, pois tal via está absolutamente vedada em função da reserva de lei; f) A omissão invocada pelos Autores passou, por força da lei, a poder ser suprida apenas por ato legislativo da iniciativa da Assembleia da República ou do Governo; g) Acontece que a jurisdição administrativa não tem competência para declarar a omissão do exercício da função legislativa (cfr. artigo 4º do ETAF); h) O âmbito de jurisdição dos tribunais administrativos encontra-se constitucionalmente delimitado por referência ao conceito de relação jurídico-administrativa (cfr. artigo 212º, nº 3, da CRP); i) Sucede que o presente litígio não pode de modo algum qualificar-se como emergente de uma relação jurídico-administrativa; j) A ação de declaração de ilegalidade por omissão prevista no artigo 77º do CPTA tem como objeto a omissão de emissão de normas regulamentares, ou seja, de normas administrativas, e não de atos...

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