Acórdão nº 895/12.5TAGRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelVASQUES OS
Data da Resolução28 de Janeiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO No 2º Juízo do [já extinto] Tribunal Judicial da comarca da Guarda o Ministério Público requereu o julgamento, em processo comum, com intervenção do tribunal singular, dos arguidos A... e B..., ambos com os demais sinais nos autos, imputando ao primeiro, a prática de um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelos arts. 15º e 137º, nº 1 do C. Penal e das contra-ordenações p. e p. pelos arts. , 13º, nºs 1 e 2, 24º e 27º do C. da Estrada, e à segunda, a prática de um crime de favorecimento pessoal, na forma tentada, p. e p. pelo art. 367º, nº 1 do C. Penal.

A assistente D...e a demandante E... deduziram pedido de indemnização civil contra o Fundo de Garantia Automóvel e o arguido A... com vista à sua condenação no pagamento da quantia de € 87.100, acrescida de juros de mora desde a data da notificação do pedido e até integral pagamento, por danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos.

Na audiência de julgamento de 29 de Abril de 2014 [acta a fls. 535 a 549-A] a assistente e a demandante civil requereu a intervenção de H..., na qualidade de proprietário do veículo conduzido pelo arguido.

Por despacho então proferido, a fls. 537 a 538, foi indeferido o requerimento de intervenção principal provocada do proprietário do veículo automóvel conduzido pelo arguido, o referido H....

Na audiência de julgamento de 12 de Maio de 2014 [acta a fls. 550 a 595] foi comunicada aos arguidos uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação e à arguida B... a alteração da qualificação jurídica que passou a ser a da prática de prática de um crime consumado de favorecimento pessoal, p. e p. pelo art. 367º, nº 1 do C. Penal, nada tendo sido requerido.

Por sentença de 12 de Maio de 2014, foi o arguido condenado, pela prática do imputado crime, na pena de dois anos de prisão, suspensa na respectiva execução pelo mesmo período de tempo, condicionada ao pagamento aos Bombeiros Voluntários da Guarda, no prazo de seis meses, da quantia de € 1.000, e pela prática das contra-ordenações p. e p. pelos arts. 13º, nºs 1 e 3 e 24º, nºs 1 e 3 do C. da Estrada, nas coimas de € 100 e € 400, respectivamente e, em cúmulo, na coima única de € 500, e foi a arguida condenada, pela prática de um crime consumado de favorecimento pessoal, na pena de quinze meses de prisão, substituída por quatrocentos e cinquenta horas de trabalho a favor da comunidade.

Mais foram o Fundo de Garantia Automóvel e o arguido A... condenados, solidariamente, no pagamento às demandantes da quantia de € 85.070, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a data da notificação do pedido e até integral pagamento sobre a quantia de € 70, e acrescida de juros de mora vincendos, à taxa legal, sobre a quantia de € 85.000.

* Inconformado com ambas as decisões recorreu o Fundo de Garantia Automóvel, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões: 1º – As Demandantes apresentaram Pedido de Indemnização Civil (P.I.C.) contra o Recorrente FGA e A... em virtude do acidente de viação ocorrido no dia 19.09.2012 em que faleceu o marido e pai daquelas.

  1. – O acidente, tal como alegado, teria sido causado por um veículo automóvel, conduzido pelo Demandado A... e que era propriedade de seu pai, veículo esse que à data do acidente não beneficiaria de seguro válido e eficaz.

  2. – O Recorrente contestou invocando a sua ilegitimidade por preterição do litisconsórcio necessário passivo, já que conjuntamente com o FGA apenas foi demandado o condutor do veículo e não o seu proprietário – o pai do Arguido – violando assim o disposto no artigo 62º do D.L. 291/2007 de 21.08.

  3. – No início da audiência de julgamento as Demandantes apresentaram requerimento para chamar à demanda o proprietário do veículo.

  4. – O Tribunal a quo indeferiu tal pretensão, pelos fundamentos supra transcritos e ao fazê-lo acabou não só por indeferir a intervenção principal provocada do proprietário como ainda acabou por se pronunciar sobre a excepção de ilegitimidade invocada pelo Recorrente.

  5. – Por considerar o Recorrente que o entendimento do Tribunal a quo, vertido naquele despacho, poderia em abstracto formar caso julgado, por tal motivo se recorre do mesmo pelos motivos infra expostos, conjuntamente com a sentença entretanto proferida.

  6. – Nessa sentença foi dado como provado nos pontos 1 e 20 da matéria de facto que o veículo causador do acidente, e sem seguro, era pertença do pai do Arguido.

  7. – E mesmo assim o Tribunal a quo, entendeu condenar o Recorrente a pagar às Demandantes as quantias fixadas em sentença, conjuntamente com o Demandado A....

  8. – A questão que o Recorrente pretende ver apreciada é o entendimento do Tribunal a quo que determinou esta condenação, plasmados tanto no despacho acima referido como na sentença ora proferida.

  9. – Prescreveu o legislador, e bem, que as acções para efectivação da responsabilidade civil decorrente de acidente de viação, quando o responsável seja conhecido e não beneficie de seguro válido e eficaz devem ser obrigatoriamente interpostas contra o Fundo de Garantia Automóvel e o responsável civil, sob pena de ilegitimidade, de acordo com o nº 6 do artigo 29º do aludido diploma.

  10. – E dúvidas não restam, pois que a jurisprudência há muito vem afirmando de forma unânime, que o proprietário do veículo é responsável pelo pagamento dos danos do acidente, solidariamente com o FGA e o condutor do veículo, pois é sobre ele que impendia a obrigação de celebrar seguro.

  11. – Assim, por tais motivos, entende o Recorrente que deveria o Tribunal a quo ter considerado o Demandado FGA como parte ilegítima nestes autos e ao não o fazer violou o disposto no artigo 62º do D.L. 291/2007 de 21.08.

11º - Atento tudo quanto exposto, requer-se a Vas.Exas. que se dignem julgar totalmente procedente o recurso apresentado pelo Recorrente, absolvendo-se da instância, só assim se fazendo a mais sã e elementar Justiça.

* Não houve resposta ao recurso.

* Na vista a que se refere o art. 416º, nº 1 do C. Processo Penal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, apondo o seu visto, limitou-se a dizer que o recurso não carece de intervenção do Ministério Público, por falta de interesse em agir.

* * Por despacho do relator de 19 de Novembro de 2014, foi rejeitado o recurso, na parte em que tinha por objecto o despacho de 29 de Abril de 2014, proferido na audiência de julgamento, que indeferiu o requerimento de intervenção principal provocada do proprietário do veículo automóvel conduzido pelo arguido, com fundamento na ilegitimidade do recorrente.

O Fundo de Garantia Automóvel apresentou reclamação dirigida ao Exmo. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.

Por despacho do relator de 10 de Dezembro de 2014, a reclamação não foi admitida enquanto tal, tendo sido convertida em reclamação para a conferência.

* Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.

* * II. FUNDAMENTAÇÃO

  1. Da Reclamação para a conferência Na reclamação que apresentou para a Conferência sustentou o Fundo de Garantia Automóvel que, ao indeferir o requerimento das demandantes civis de intervenção do proprietário do veículo conduzido pelo arguido, o despacho de 29 de Abril de 2014 pronunciou-se também quanto ao mérito da excepção dilatória de preterição de litisconsórcio necessário passivo por si suscitada na contestação, considerando-o parte legítima, por estar na acção cível juntamente com o condutor do veículo, e daí que, caso não interpusesse recurso deste despacho, para evitar o caso julgado material, não poderia evitar o risco de o ver ser-lhe oposto no recurso interposto da sentença quando esta afirmou a sua legitimidade nas descritas condições.

    No despacho do relator de 19 de Novembro de 2014, foi rejeitado o recurso, na parte em que tinha por objecto o supra citado despacho, com fundamento na ilegitimidade do recorrente, por não ter sido contra si proferida (art. 401º, nº 1, c) do C. Processo Penal).

    Vejamos.

    A questão que o Fundo de Garantia Automóvel impugna nas duas decisões – despacho e sentença – é precisamente a mesma, a de saber se é parte legítima estando na acção desacompanhado do proprietário do veículo causador do acidente, não obstante estar acompanhado do respectivo condutor. Por isso, não se justificam longos desenvolvimentos sobra a solução a adoptar.

    O caso julgado, tal como se encontra balizado no art. 581º do C. Processo Civil, visa impedir a existência de decisões concretamente incompatíveis, e forma-se sobre a pretensão do autor ou seja, sobre o efeito jurídico que este quer alcançar, à luz do facto invocado como seu fundamento. Assim, em regra, a força do caso julgado cobre apenas a concreta decisão contida na parte dispositiva da sentença, não se estendendo aos respectivos fundamentos, embora seja inquestionável que estes podem ser utilizados na fixação do sentido e alcance da decisão (cfr. Antunes Varela, Manual de Processo Civil, 2ª Edição, Coimbra Editora, 1985, pág. 709 e ss.). Por...

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