Acórdão nº 2641/13.7TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelMELO LIMA
Data da Resolução02 de Julho de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1. AA instaurou, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, 4.º Juízo, 2.ª Secção, a presente ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento – apresentando o formulário a que alude o artigo 98.º-C e 98.º-D do Código de Processo do Trabalho – sob forma do Processo Especial, contra «BB» pedindo que seja declarado ilícito o despedimento de que foi alvo, em 9 de maio de 2013.

Designada data para audiência de partes não foi possível a conciliação entre as mesmas.

  1. Regularmente notificada para o efeito, a Ré apresentou articulado motivador do despedimento, sendo que, na sua motivação, e no que ora releva, excecionou a incompetência internacional do Tribunal do Trabalho de Lisboa para julgar o pleito, concluindo pela procedência da arguida exceção ao abrigo do disposto nos artigos 24.º do Regulamento (CE) n.º 44/2001 e 108.º, 109.º, 493.º n.º 2 e 494.º alínea a), todos do CPC, com a sua consequente absolvição da instância nos termos do artigo 111.º, n.º 3, parte final, do CPC.

  2. Notificado, o Autor apresentou o seu articulado de resposta à motivação do despedimento, pedindo, no que ora releva e no que respeita à exceção dilatória da incompetência internacional do Tribunal do Trabalho de Lisboa, a improcedência da dita exceção, mormente com fundamento na sua extemporaneidade.

  3. Na réplica, a R. respondeu à questão da extemporaneidade, sustentando a sua improcedência. 5.

    No despacho saneador foi decidida – e julgada procedente – a exceção arguida pela Ré, conforme o seguinte dispositivo conclusivo: «Face ao exposto, julgamos procedente a invocada exceção de incompetência internacional e consequentemente declaramos a incompetência absoluta deste tribunal, absolvendo a R. da instância».

    No mesmo despacho, foi fixado à ação o valor de € 187.016,40, em conformidade com o disposto no artigo 98.º-P do Código de Processo do Trabalho.

  4. Inconformado com o despacho saneador que, concluindo pela procedência da exceção dilatória da incompetência internacional do tribunal para conhecer da ação e, em consequência, absolveu a R. da instância, dele o A. recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por Acórdão, constante de fls. 878 a 919, julgou improcedente a apelação, mantendo o despacho saneador recorrido.

  5. Novamente inconformado, interpôs o autor o presente recurso de revista, alinhando, a final, a seguinte síntese conclusiva: «1.

    Estava vedado ao Venerando Tribunal da Relação fixar a matéria de facto sem previamente dar oportunidade às partes de produzir prova, designadamente, a já por elas requerida nos articulados e de se pronunciar sobre a validade e resultado das provas produzidas e a produzir; 2. Não o fazendo, o Tribunal recorrido fez uma interpretação do art. 662º do NCPC contrária à Constituição, por violação dos princípios do contraditório, do processo equitativo e do acesso ao Direito e à tutela jurisdicional efetiva, previstos no art. 20 da Constituição; 3. Consequentemente, o Autor foi cerceado nos seus direitos, quer de oferecer provas, quer de discretear sobre o valor e resultado das mesmas; 4. A prova dos factos relevantes para a decisão sobre a competência internacional dos Tribunais portugueses podia ser feita por outros meios de prova que não apenas a prova documental, aliás, requeridos pelo Autor; 5. Por isso o Tribunal da Relação devia ter ordenado a baixa dos autos ao Tribunal de 1ª Instância a fim de ser produzida prova ou, fazendo uso dos poderes que lhe são conferidos pelas alíneas b) e c) do n.º 2 do art. 662.º do NCPC, ordenar a produção dos meios de prova requeridos pelas partes, dando-lhes oportunidade de se pronunciarem sobre a validade e resultado das provas produzidas: 6. Só depois de cumpridas aquelas formalidades, poderia o Tribunal da Relação fixar a matéria de facto; 7. Não se tendo facultado à[s] partes tal possibilidade, o Acórdão recorrido constitui uma "decisão surpresa", com violação do principio do contraditório e do direito de acesso aos Tribunais, que tem ínsita a proibição da indefesa; 8. E ao ter sido proferida a decisão ora em crise, sem que os Recorrentes tenham sido convidados a pronunciar-se sobre a matéria de facto a fixar, foi omitido um ato ou formalidade que a lei prescreve, com evidente influência na decisão da causa; 9. Consequentemente, cometeu-se uma nulidade que afeta a própria decisão, tornando-a nula; 10.

    A decisão sempre seria nula, por ter conhecido de questão que não podia tomar conhecimento; 11. De qualquer modo, o Tribunal recorrido não fundamentou a sua decisão de facto, nem analisou criticamente as provas, indicando as Ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, impedindo assim a possibilidade de se sindicar se fez uso correto da faculdade que a lei lhe confere; 12. A questão da Incompetência internacional deve ser decidida de acordo com a versão apresentada pelo Autor - no caso concreto, de acordo com o alegado pelo ora recorrente no formulário previsto no art. 98º C do CPT e no articulado designado por contestação/reconvenção; 13. A competência fixa-se no momento da propositura da ação e afere-se pelos termos em que o Autor configura a relação jurídica.

  6. Regra que não deve nem pode ser afastada só porque, na ação de impugnação de regularidade e licitude do despedimento, a posição das partes surge "invertida"; 15. O que é relevante é a posição assumida e os factos alegados pelo Autor; em detrimento da versão do Réu, independentemente de o primeiro articulado a ser apresentado ser o do Autor ou do Réu; 16. Ou de ser este ou aquele quem tem o ónus da prova; 17. Independentemente do nome que se atribui aos articulados ou de quem é o primeiro a expor a sua versão, o trabalhador continua a ser Indiscutivelmente o Autor; 18. Sendo quem primeiro se apresenta em Juízo, através do formulário previsto no art. 98 C no qual faz a identificação das partes, através do respetivo nome ou designação e domicílio; 19. A Ré foi Identificada como tendo domicílio em Portugal no qual, aliás, foi citada; 20. Para efeitos de se conhecer da competência internacional dos Tribunais Portugueses - competência absoluta - a lei não permite a produção de prova, ao contrário do que sucede quanto à competência relativa; 21.

    O Autor alegou factos suficientes para que se possa concluir pela competência dos tribunais portugueses para decidir a presente acção; 22. Ao contrário do decidido, a Ré tem o seu domicílio em Portugal; 23. O Autor Indicou como sede da Ré a Rua …, n.º …, BL .., …, Portugal, morada onde esta foi citada; 24. O que, desde logo, era suficiente para a considerar domiciliada em Portugal, uma vez que a competência absoluta se afere pelos termos em que o Autor propõe a ação; 25. Alegou ainda o Autor factos demonstrativos de que a R. tem em Portugal a sua administração central, o seu estabelecimento principal ou, pelo menos, agência, filial, delegação ou representação; 26. Portanto, os tribunais portugueses são competentes para dirimir o presente litígio; 27. Deve considerar-se assente, por acordo das partes, que os aviões que o Autor tripulava (os quais são simultaneamente instrumento e local de trabalho) estão matriculados em Portugal; 28. Tal é suficiente para considerar que o Autor efetuava habitualmente o seu trabalho em Portugal e determinante para atribuir competência aos Tribunais portugueses para dirimir o presente litígio; 29. Estando em causa a interpretação e aplicação de uma norma Comunitária é obrigatório submeter, como questão prejudicial, ao Tribunal de Justiça da União Europeia o esclarecimento das dúvidas acerca da sua interpretação; 30. Como tal, deverá promover-se o reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça, por forma a esclarecer se: • No caso em que o trabalhador é piloto de aviões e exerce a sua atividade no espaço aéreo de mais do que um Estado Contratante, o lugar onde o trabalhador efetua habitualmente o seu trabalho, na aceção da al. a) do n.º 2 do art. 19.º do Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho de 22 de dezembro de 2000, é aquele a partir do qual e ao qual o trabalhador volta após cada viagem por motivos profissionais e no qual o seu trabalho é organizado, são cumpridas a maioria das obrigações para com a entidade patronal e são proferidas as ordens e instruções relativas ao trabalho? • Tendo em conta o disposto no Considerando 13) do Regulamento em causa, no qual se prevê que no respeitante aos contratos de seguro, de consumo e de trabalho, é conveniente proteger a parte mais fraca por meio de regras de competência mais favoráveis aos seus interesses do que a regra geral, a citada norma em causa deve ser interpretada de forma mais favorável ao trabalhador? 31. A Jurisprudência do Tribunal de Justiça tem sido unânime no sentido de interpretar a norma em questão nos termos defendidos pelo Recorrente; 32. Tal entendimento Jurisprudencial deve ser respeitado pelos Tribunais portugueses; 33. Só porque o Autor pilotava aviões no espaço aéreo de vários países, não era lícito ao Tribunal concluir - como concluiu - que não prestava habitualmente o seu trabalho em Portugal; 34. Os factos alegados pelo Autor configuram um caso evidente de prestação habitual do trabalho em Portugal, sendo no nosso País o local a partir do qual o Autor efetuava o seu trabalho: onde regressava após as suas viagens; onde recebia instruções de organização do seu trabalho; e onde tinha lugar o cumprimento da maioria das obrigações do Autor para com a sua entidade patronal; 35. Os Tribunais portugueses sempre seriam competentes porque Portugal foi o lugar onde o Autor prestou mais recentemente o seu trabalho; 36. Surgindo dúvidas acerca da interpretação do Regulamento comunitário, deve promover-se o reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça para esclarecer se o sentido a atribuir à expressão "estabelecimento que contratou o trabalhador" pode ser o de centro de operações ou escritório...

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