Acórdão nº 1021/22.8T8VFX-B.L1-4 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-02-01

Data de Julgamento01 Fevereiro 2023
Ano2023
Número Acordão1021/22.8T8VFX-B.L1-4
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa


1.–Relatório


1.1.Nos autos de providência cautelar a que se mostra apensa a acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento em que é autora AAA e ré BBB, foi decretada em 22 de Junho de 2022 a suspensão do despedimento por extinção do posto de trabalho de que foi alvo a requerente com efeitos a 15 de Abril de 2022, por decidão judicial transitada em julgado.

Entretanto, a trabalhadora formulou o seguinte requerimento a 12 de Outubro de 2022:

«[…]

"A Requerida não procedeu ao pagamento da totalidade da remuneração da Requerente referente ao mês de Agosto, pagou só até 25 de Agosto, nem à remuneração referente ao mês de Setembro. Como tal, neste sentido, requere-se que a Requerida seja notificada para proceder aos pagamentos em falta, nos termos e para os efeitos do disposto do nº 2, do artº 39º do Código do Processo [de Trabalho].

[…]»

Ouvida a ré empregadora, veio a mesma alegar que moveu um processo disciplinar à A. no âmbito do seu poder disciplinar, ainda que cautelarmente readquirido na sequência da suspensão da eficácia da decisão de extinção do posto de trabalho, e nele decidiu despedir a A. com invocação de justa causa, cessando assim o contrato de trabalho e, por consequência, a obrigação de pagar vencimentos a partir do dia 25 de Agosto de 2022, não estando suspensos os efeitos do despedimento à data do requerimento da A.. Mais alegou que a A. intentou uma outra acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude deste segundo despedimento, que corre termos no processo n.º 2866/22.4T8VFX-A, Juiz 2 do Juízo do Trabalho de Vila Franca de Xira, Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte.

Debruçando-se sobre o requerimento da trabalhadora e sobre os fundamentoa aduzidos pela empregadora, o Mmo. Juiz a quo emitiu em 18 de Outubro de 2022 despacho com o seguinte teor:

“No que respeita ao pagamento de retribuições de agosto e setembro veio a Ré/Requerida justifica o seu não pagamento em virtude de novo despedimento. Sem prejuízo do que se venha a concluir sobre a licitude do novo despedimento a título principal ou a sua suspensão a nível cautelar, a cessação do mesmo implica que cesse a obrigação do pagamento da retribuição.
Pelo exposto, indefere-se o requerido.

[…].”

1.2. A requerente, inconformada interpôs recurso desta decisão e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões:

1. Por sentença transitada em julgado a 12 de julho de 2022, proferida no âmbito do procedimento cautelar n.º 1021/22.8T8VFX, foi decretada a providência de suspensão de despedimento por extinção de posto de trabalho requerida pela aqui Recorrente, tendo o Tribunal considerado que a prova produzida nesta sede de apreciação sumária conduz à afirmação de provável inexistência de motivo justificativo da cessação do contrato cfr. requerimento inicial 22 de março de 2022, com a ref.ª CITIUS 41722683, e sentença de 22 de junho com a ref.ª 153232859.
2.Tendo sido requerida a impugnação da regularidade e licitude daquele despedimento, foi criado o apenso 1021/22.8T8VFX-A, o qual corre os seus termos no mesmo juízo;
3.No seguimento da sentença proferida no âmbito do procedimento cautelar, a Requerida/Recorrida decidiu despedir novamente a Requerente/Recorrente, desta vez por justa causa;
4. Vindo a alegar, em sede do processo n.º 1021/22.8T8VFX-A, que em face do novo despedimento da Requerente/Recorrente cessou o contrato de trabalho e, logo, a obrigação de proceder ao pagamento das suas retribuições cfr. requerimento datado de 14 de outubro de 2022 com a ref.ª CITIUS 43568052.
5. Ao contrário do que quer fazer crer a Requerida/Recorrida, a obrigação de proceder a tal pagamento é uma decorrência legal da procedência do pedido de suspensão do despedimento (artigo 39.º n.º 2 do CPT), que não pode ser influenciada pelo (novo) despedimento;
6. O Tribunal a quo veio dar razão à Requerida/Recorrida por via do despacho proferido a 19 de outubro de 2022, sobre o qual versa o presente recurso;
7. Salvo melhor opinião, o tribunal a quo andou mal, quando decidiu neste sentido, contrariando a sentença proferida anteriormente e violando assim caso julgado;
8. Sendo que o caso julgado um princípio constitucional, assente na tutela dos valores da certeza e segurança jurídica e da confiança, inerentes à ideia de Estado de direito democrático (artigo 2.º e 282 n.º 3 da CRP);
9. Nos termos do artigo 625.º do CPC, aplicável subsidariamente ao processo de trabalho, perante a existência de dois casos julgados contraditórios deve o segundo ser revogado, cumprindo-se a primeira decisão;
10. Caso assim não se entenda, sempre se dirá que o Tribunal a quo incorreu em erro na aplicação do direito, uma vez que, não existindo ainda decisão no âmbito da impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento por extinção de posto (proc. n.º 1021/22.8T8VFX-A), a providência cautelar não caducou;
11. O despacho recorrido surte o efeito prático de levantar a providência, sendo certo que não foram cumpridos os necessários formalismos (nomeadamente, o previsto no n.º 3 do artigo 373.º do CPC);
12. E também, reitera-se, não se verificam quaisquer causas de caducidade da providência, expressamente previstas nos artigos 40.º-A do CPT e 373.º do CPC;
13. O direito que a providência visa acautelar é o decorrente da eventual declaração de ilicitude do despedimento de extinção de posto, mormente, o direito da recorrente a receber as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento - cfr. artigo 390.º, n.º 1, do CT.
14. Logo, a decisão da qual se recorre aplicou mal o direito, nomeadamente, desrespeitou os artigos 39.º, n.º 2 e 40.º-A do CPT, bem como o artigo 373.º do CPC e o artigo 53.º da Constituição da República Portuguesa;
15. Deve, por isso, ser revogado o despacho ora colocado em crise, e substituído por outro que ordene a Recorrida/Requerida a vir demonstrar nos autos o pagamento das retribuições em dívida, nos termos do artigo 39.º, n.º 2, do CPT.”

1.3. A requerida apresentou contra-alegações que rematou com as seguintes conclusões:
A. Entende a Recorrente que foi violado o caso julgado e que a Recorrida não podia despedir a Recorrente enquanto estava, a título cautelar, reintegrada por força da providência cautelar decretada.
B. A Recorrente pretende que o Tribunal da Relação de Lisboa tome uma decisão que é objecto do processo n.° 2866/22.4T8VFX, que corre termos no Juiz 2 do Juízo de Trabalho de Vila Franca de Xira, Tribunal Judicial de Lisboa Norte.
C. O que significa que não pode o Tribunal da Relação de Lisboa pronunciar-se sobre o objecto de uma acção ainda em curso na 1.ª Instância.
D. Em segundo lugar, também o recurso é legalmente inadmissível, na medida em que a Recorrente quer aproveitar o despacho sobre um requerimento realizado no processo após o trânsito em julgado da sentença da providência cautelar e após esgotado o poder jurisdicional do Juiz nos presentes autos.
E. O despacho recorrido de que a Recorrente apela, não se enquadra para efeitos da alínea j) do n.º 2 do artigo 79.º-A do CPT e/ou da alínea g) do n.º 2 do artigo 644.º do CPC.
F. Os despachos recorríveis após a decisão final a que se referem as alíneas j) do n.º 2 do artigo 79.º-A do CPT e/ou da alínea g) do n.º 2 do artigo 644.º do CPC, são designadamente, os despachos que incidam sobre a reclamação da conta de custas, despachos que indefiram a emissão de certidões, e outros despachos legalmente previstos após findar o poder jurisdicional no processo.
G. O despacho recorrido não é mais do que um despacho interlocutório cujo recurso não está compreendido nas alíneas j) do n.º 2 do artigo 79.º-A do CPT e/ou da alínea g) do n.º 2 do artigo 644.º do CPC, motivo pelo qual, deve o recurso interposto ser rejeitado por ser legalmente inadmissível.
H. Conforme já afirmado, a sentença da providência cautelar já transitou em julgado, quando a Recorrente fez o pedido a este douto Tribunal, no processo que corre sob o apenso A e que foi concluído nos presentes autos.
I. O que significa que o presente recurso interposto pela Recorrente não legalmente admissível, por não se enquadrar nas decisões susceptíveis de recurso, prevista na alínea g) do n.º 2 do artigo 644.º do Código de Processo Civil e na alínea j) do n.º 2 do artigo 79.º-A do CPT.
J. Veio a Recorrente requerer que a Recorrida demonstrasse o pagamento do parcial do vencimento de Agosto de 2022 e do vencimento de Setembro de 2022, alegando que a Recorrida faltou ao pagamento de tais créditos laborais.
K. Ora, após o deferimento da providência cautelar no apenso a este processo, a Recorrida voltou a ter, ainda que a título cautelar, poder disciplinar sobre a Recorrente.
L. Foi precisamente por infracções detectadas pela Recorrida que esta moveu um processo disciplinar à Recorrente no âmbito do seu poder disciplinar, ainda que cautelarmente readquirido na sequência da suspensão da eficácia da decisão de extinção do posto de trabalho.
M. A Recorrente foi despedida no dia 25 de Agosto de 2022, através de decisão final no âmbito de um processo disciplinar.
N. Os efeitos do despedimento, à data do requerimento da Recorrente, não estavam suspensos, logo não existe qualquer obrigação legal de a Recorrida liquidar qualquer remanescente do vencimento de Agosto de 2022, bem como do vencimento de Setembro de 2022.
O. Logo, posto isto, a decisão interlocutória do Tribunal não ofende qualquer caso julgado, contrariamente ao alegado pela Recorrente e, assim deve ser rejeitado o recurso interposto pela Recorrente e, ainda que o mesmo venha a ser admitido, sempre deverá negado o provimento de acordo com os fundamentos acima referidos.
P. Caso se entenda que o recurso deve ser admitido, então
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