Acórdão nº 51/14.8YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Julho de 2015

Data09 Julho 2015
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

* Acordam os Juízes Conselheiros que integram a Secção de Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1.

AA, Juiz ..., veio, ao abrigo do disposto nos artigos 168º e seguintes do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ), aprovado pela Lei nº 21/85, de 30 de Julho, interpor recurso da deliberação do Conselho Plenário do Conselho Superior da Magistratura, de 17 de junho de 2014, que decidiu atribuir-lhe a classificação de serviço de «BOM COM DISTINÇÃO».

Sob o pedido de que seja declarada nula ou, caso assim se não entenda, seja, nos termos do disposto no artigo 135º do CPA, anulada a deliberação impugnada, invocou os seguintes fundamentos, que se sintetizam: 1.1 Vício de omissão de pronúncia [Artigos 1º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e 615º, nº1, al. d) do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artº 178º do EMJ]: Posto que o período de inspeção compreendesse o exercício entre 27 de maio de 2008 e 31 de dezembro de 2012, a deliberação impugnada nada referiu quanto ao trabalho desenvolvido no hiato de 27 de maio a 15 de setembro de 2008: para além de não ter considerado o trabalho desenvolvido nesse período, «sequer teceu qualquer comentário quanto à sua (ir)relevância para a avaliação do A.».

1.2 Vício de falta de fundamentação [Artigos 268º/3 da Constituição da República Portuguesa (CRP); 124º, nº1, al. a) e 125º, nº1, do Código do Procedimento Administrativo (CPA); 16º do Regulamento Interno do Conselho Superior da Magistratura (RICSM)]: A fundamentação da deliberação impugnada revela-se manifestamente insuficiente, sobretudo se atendermos que aí foi fixado um novo conjunto de factos – numerados de 1 a 15, na pág. 39 da deliberação, sob o dístico «da reclamação ressalta a seguinte factualidade a apreciar» - sobre o qual o R. não teceu qualquer juízo valorativo, não se alcançando, por isso, em que medida é que o mesmo contribuiu, ou não, para o sentido decisório.

De igual passo, correspondendo a alínea B) da Reclamação apresentada pelo A., na sequência da deliberação do Conselho Permanente do CSM, de 18 de março de 2014, a um conjunto de refutações demonstrativas do erro nos pressupostos de facto de que tal deliberação padecia, a deliberação ora impugnada, «sobrevoando» «olimpicamente» as razões jurídico-fundamentais subjacentes à reclamação, limita-se a concluir no sentido da verificação de «um diferente entendimento/discordância», «mas sem que se detete qualquer vício que inquine a deliberação reclamada».

1.3 Violação do princípio da imparcialidade [Artigos 266º/2 da CRP; 6º, 44º, nº1, al. c), 47º/2 do CPA]: Quatro dos vogais do CSM, que assinaram a Deliberação sub iudicio – a saber: (i) Juiz ... BB (relator da Deliberação do Conselho Permanente do CSM, de 18 de março de 2014); (ii) Juíza ... CC (Relatora da Deliberação impugnada); (iii) Juiz ... DD; (iv) Juiz ... EE – «têm um interesse direto e pessoal na classificação de serviço que for atribuída em definitivo ao A.», «porquanto tal classificação irá influenciar o número de ordem que o mesmo ocupará em relação a estes quatro vogais do CSM em futuro movimento judicial.

» Dizer, concretizando: «[s]e o A. obtivesse na sequência do presente processo de inspeção a classificação de ‘MUITO BOM’, continuaria a ocupar a posição nº 155 quanto à antiguidade, mas já teria o número de ordem 37, o que significaria ocupar uma posição mais adiantada na classificação em relação a estes quatro ilustres vogais do CSM».

Destarte, estavam aqueles vogais impedidos de participar na produção da deliberação impugnada, antes «deveriam ter-se abstido de intervir no presente processo de inspeção.» À sobreposse: «entender-se que aos vogais do CSM não se aplicam os impedimentos consagrados no art.º 44º do CPA, ex vi do art.º 178º do EMJ, é realizar uma interpretação inconstitucional de tais preceitos, porquanto a mesma é manifestamente violadora dos princípios a que a Administração está vinculada, nomeadamente os da legalidade, da justiça e da imparcialidade, consagrados nos artigos 2º e 266º, nºs 1 e 2, da CRP.» 1.4 Erro manifesto na apreciação dos pressupostos jurídico-factuais [Artigos 33º, 34º/1 e 37º/1 do EMJ; 13º, 15º, 16º,nº1, als. a) e b) do Regulamento das Inspeções Judiciais (RIJ)]: No que tange à «capacidade humana para o exercício da profissão», resulta da Deliberação impugnada que «não há que relevar qualquer crítica, antes é de saudar a sua inegável capacidade e sensibilidade humana para o exercício da função de magistrado judicial».

No que à «adaptação ao serviço» diz respeito, deflui da Deliberação sub specie que, «não obstante se efetuarem alguns reparos (‘pontuais’ ou ‘ocasionais’)», não deixou de se afirmar que «[n]uma perspetiva de síntese conclusiva neste exercício da NUT a prestação do Sr. Juiz AA é muito positiva, e a orientação que imprime ao serviço a seu cargo, mostra-se ajustada às solicitações do cargo, à complexidade dos processos e às características do meio social e económico de cada uma das comarcas integradas».

No que concerne à «preparação técnica» do A., decorre da mesma Deliberação «que é, em regra, positiva ou muito positiva, ‘sendo indiscutível o acerto final das decisões e das penas cominadas e o bom recorte técnico das peças elaboradas, qualidades que atravessam os seus acórdãos’, no âmbito da jurisdição penal, e ‘manuseia com acerto os institutos jurídicos e apresenta uma visão integrada do ordenamento jurídico’, quando atuando no seio da jurisdição cível.» «É certo que a Deliberação impugnada não deixa de dar como assentes alguns reparos à preparação técnica do A.

» contudo, «tais reparos ou sugestões não são suficientes para deixarmos de afirmar que estamos perante uma prestação meritória», sendo certo, ainda, que «estamos perante reparos que não merecem consenso no seio dos processos de inspeção, como sejam os relativos à inclusão de juízos conclusivos ou de conceitos jurídicos na fixação da matéria de facto (…) ou não se afiguram como críticas relevantes (…) suscetíveis de influenciar a positividade da atuação do A.

» De todo o modo, «a classificação do serviço do A. há-de assentar não na análise individual de cada um dos critérios de avaliação instituídos no art.º 13º do RIJ, mas outrossim na imagem global do seu desempenho como resultado da soma das avaliações individuais apuradas.

» Ora, in casu, «a prestação funcional do A. não pode deixar de ser considerada global e amplamente meritória, porquanto da análise individual de cada um dos critérios de avaliação estabelecidos no artº 13º do RIJ, sempre resulta uma atuação positiva ou muito positiva, sendo que somente quanto à preparação técnica a prestação do A. mereceu reparos menos positivos, que, ainda assim, não deixam de ser excecionais».

Desta arte, «considerando, por um lado, a carreira e aprestação francamente positiva» por parte do A., e, por outro, a dimensão normativa dos preceitos aplicáveis, a classificação de serviço mais ajustável ao seu desempenho global durante o período sob inspeção, seria a de ‘MUITO BOM’, sob pena de «manifesto erro na apreciação dos pressupostos jurídico- factuais», a determinar a anulação, por ilegal, da Deliberação tomada.

  1. A Exma. Procuradora-Geral-Adjunta, na apreciação prévia prevista no artº 173º/1 do EMJ, pronunciou-se no sentido da inexistência de alguma questão que obstasse ao conhecimento do recurso.

  2. Citado, o Conselho Superior da Magistratura apresentou resposta, formulando a conclusão de que o recurso em apreço deve ser julgado improcedente, consignando, relativamente a cada um dos itens que sustentam aquele, as razões por que os mesmos devem improceder.

  3. Observada a notificação a que alude o artº 176º do EMJ, apresentaram alegações: 4.1 O Recorrente, Juiz AA: Depois de tecidas «breves considerações de direito» (sic), enunciou uma série de conclusões no sentido da verificação dos vícios que deixou apontados no peticionado recursivo - vícios já acima sintetizados e que despiciendo se tornaria, agora, repetir – rematando no sentido de que o recurso deve ser julgado procedente.

    4.2 O Conselho Superior da Magistratura: Deu «por reproduzida a resposta à alegação de recurso elaborada ao abrigo do disposto no artº 174º do EMJ.» 5. A Exma. Procuradora-Geral Adjunta: Emitiu Parecer no sentido de que «a Deliberação recorrida não enferma dos vícios apontados pelo recorrente e deverá ser mantida.

    » 6.

    Colhidos os Vistos e disponibilizado aos Ex. Mos Adjuntos o projeto, em suporte informatizado, é altura de decidir.

    II FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA 1. Delimitação objetiva do recurso Constituem themas decidendum saber se a Deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura, de 17 de junho de 204: i. Incorre no vício de omissão de pronúncia; ii. Incorre no vício de falta de fundamentação; iii. Viola o princípio da imparcialidade; iv. Incorre em erro manifesto na apreciação dos pressupostos jurídico-factuais.

  4. CONHECENDO 2.1 Vício da omissão de pronúncia.

    2.1.1 Desenha-o o Ex.mo Juiz Recorrente sob o seguinte quadro fáctico-argumentativo: (i) Abrangendo o período de inspeção o tempo de serviço compreendido entre 27 de maio de 2008 e 31 de dezembro de 2012, a Exma. Senhora Inspetora Judicial, no Relatório Final que elaborou, apenas considerou para a avaliação do mérito do Recorrente, as funções exercidas no período compreendido entre 15 de setembro de 2008 e 31 de dezembro de 2012; (ii) Na reclamação apresentada junto do Conselho Plenário do CSM, o Senhor Juiz/Recorrente, «para além de requerer esclarecimento quanto ao período efetivo a considerar», peticionou a retificação do erro e, desta arte, a contabilização, para efeitos da avaliação do seu mérito, do trabalho desenvolvido, durante cerca de três meses, enquanto juiz do Juízo Criminal do Tribunal da Comarca de ..., com a cumulação de funções no Tribunal da Comarca de Tábua e no Tribunal de Execução de Penas de ...; (iii) Porém, na Deliberação sob impugnação, o Plenário do CSM não só não considerou «o trabalho desenvolvido» no período em...

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