Acórdão nº 13804/12.2T2SNT.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelFERNANDA ISABEL PEREIRA
Data da Resolução09 de Julho de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório: AA intentou, em 25 de Maio de 2012, no Tribunal da Comarca da Grande Lisboa-Noroeste a presente acção declarativa de condenação, sob a forma ordinária, contra Seguros BB, S.A.

e Companhia de Seguros CC, S.A.

, pedindo a condenação das rés no pagamento da quantia de € 40.990,00 por conta da perda total da sua viatura e da quantia de € 20,00 por cada dia de privação do uso da mesma, montante que liquidou em € 12.500,00 à data da apresentação em juízo da petição inicial, acrescidas de juros de mora a contar da citação e até integral e efectivo pagamento.

Alegou, em suma, ser proprietária de um veículo automóvel segurado pela primeira ré, que cobria os danos próprios daquele, sendo que o mesmo ficou danificado na sequência um acidente de viação causado exclusivamente por um condutor que tripulava um veículo segurado pela segunda. Mais alegou ser-lhe devida uma indemnização superior àquela que lhe foi proposta pela primeira ré para ressarcimento da perda total ocasionada pelo acidente e que se acha privada do uso daquela viatura até à presente data, tendo sofrido prejuízos.

Na contestação a ré Companhia de Seguros CC, S.A., aceitou os factos atinentes à responsabilidade pelo ressarcimento da autora e impugnou os demais, impugnando a ressarcibilidade do dano da privação do uso e alegando que, em todo o caso, a indemnização não podia exceder a data em que disponibilizou à autora a indemnização que entendia ser devida. Concluiu pela procedência parcial do pedido.

A ré Seguros BB, S.A., impugnou os factos atinentes à dinâmica do acidente e considerou que os montantes devidos a título da cobertura do contrato de seguro que mantinha com a autora não correspondiam aos por esta alegados, salientando não haver lugar à indemnização da privação do uso a partir do momento em que disponibilizou àquela a indemnização que entendia ser devida, Saneado o processo e realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, em 30 de Maio de 2013, que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência: - condenou a ré Seguros BB, S.A., a pagar à autora a quantia de € 17.582,00; - condenou a ré Companhia de Seguros CC, S.A., a pagar à autora a quantia de € 17.760; - condenou a ré Companhia de Seguros CC, S.A., a pagar à autora a quantia de € 5.000, acrescida de juros de mora vencidos desde a data da citação e vincendos até integral e efectivo pagamento; - absolveu a rés do demais peticionado.

Inconformadas, apelaram as rés. O Tribunal da Relação de Lisboa por acórdão de 29 de Maio de 2014 julgou procedente a apelação da ré Seguros BB, S.A., absolvendo-a do pedido, e parcialmente procedente a apelação da Companhia de Seguros CC, S.A., condenando esta ré a pagar à autora AA a quantia de € 17 760,00, acrescida de juros de mora a contar do trânsito em julgado do mesmo acórdão, absolvendo-a do mais peticionado, nessa medida revogando a sentença recorrida.

Deste acórdão interpôs a autora recurso de revista.

Alegou e aduziu, resumidamente, a seguinte síntese conclusiva: 1 - O pedido formulado pela Autora na presente acção judicial funda-se, por um lado, no instituto da responsabilidade civil extracontratual direccionado contra a 2a Ré Companhia de Seguros CC S.A. no âmbito do seguro obrigatório de responsabilidade civil emergente da circulação automóvel, cfr. nº 1 do artigo 4° do Decreto-Lei n.º 291/2007 de 21 de Agosto e, por outro, na responsabilidade civil contratual contra a Ré Seguros BB S.A., no âmbito do seguro facultativo de danos próprios em viatura automóvel ao abrigo do Regime Jurídico do Contrato de Seguro, aprovado pelo artigo 1º do Decreto-Lei nº 72/2008 de 16 de Abril, considerando, aliás, o teor das apólices de seguro nº … (…-HD-…) 1ª Ré e n.º …. (…-FB-…) 2ª Ré.

2 - Com efeito, concorrem na presente acção judicial duas formas de responsabilidade, a contratual e extracontratual, as quais confluem na fundamentação do pedido de indemnização formulado pela Autora.

3 - Resulta do teor do douto acórdão do Tribunal de 2ª Instância a interpretação de que, sendo a produção do acidente de viação em causa da exclusiva responsabilidade do condutor do veículo com a matrícula …-FB-…, deverão todos os danos emergentes ser suportados pela 2ª Ré, Companhia de Seguros CC, S.A., e não, em algum particular, pela Seguros BB, S.A..

4 - Assim, a decisão proferida pelo douto acórdão do Tribunal ad quem coarcta totalmente aquela faculdade, decidindo, como se aquela possibilidade inexistisse, omitindo, ademais, os fundamentos legais que sustentam esse impedimento ao não especificar os fundamentos de direito que justificam a decisão, traduzindo essa falta de fundamentação, necessariamente, uma nulidade processual nesta parte, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 615.° do CPC.

5 - Não permitindo, assim, o total ressarcimento dos danos que emergiram do sinistro e relativos à situação de perda total da viatura …-HD-…, propriedade da Autora, contratualizados com a 1ª Ré Seguros BB, S.A., ao abrigo das condições gerais e particulares previstas na apólice de seguro n. ° ….

6 - Deste modo, nesta parte, ao decidir como decidiu, o douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa violou entre outras as disposições constantes do n.º 2 do artigo 43.°, do artigo 18.° Regime Jurídico do Contrato de Seguro, aprovado pelo artigo 1° do Decreto-Lei n.º 72/2008 de 16 de Abril, do n.º 1 do artigo 483.°, do artigo 562.°, do artigo 564° n.º 1, do artigo 798.° todos do Código Civil e alínea a) do n.º 1 do artigo 615.° do CPC.

7 - Relativamente à privação do uso da viatura da Autora, para além dos factos dados por provados elencados nos pontos 10 e 11, resulta também do ponto 4. que "Até 9 de Agosto de 2010, a Autora deslocava-se todos os dias na viatura / referida em 1. para tratar de assuntos de cariz pessoal e familiar do dia-a-dia (resposta ao quesito 6°).

8 - Com o devido respeito, discorda-se do entendimento jurídico do douto acórdão, na medida em que a mera privação do uso de um bem traduz-se num dano autónomo de natureza patrimonial que mesmo no caso de falta de prova de prejuízos concretos e quantificados, deverá ser ressarcido com recurso à equidade nos termos do n.º 3 do artigo 566º do Código Civil.

9 - No caso em apreço, provou-se que a Autora utilizava todos os dias a viatura sinistrada para tratar de assuntos de cariz pessoal e familiar e que desde a data do acidente de viação até à venda da mesma, não mais a utilizou no seu dia-a-dia, provocando-lhe, por isso, transtornos diários.

10 - Por conseguinte, deverá a Autora ser ressarcida pela privação do uso do veículo automóvel, em conformidade com o exposto na douta sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância.

11 - Assim, também nesta parte, ao decidir como decidiu, o douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa violou entre outras as disposições conjugadas constantes no artigo 483.° n.º 2, artigo 487.°, artigo 562.° n.º 1, artigo 563,°, artigo 564.° e n.º 1 e 3 do artigo 566.° todas do Código Civil.

Finalizou, pedindo a revogação do acórdão recorrido em conformidade com as conclusões recursivas e com a douta sentença do Tribunal de 1ª Instância.

Contra-alegaram as rés, pugnando pela confirmação do acórdão recorrido.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

  1. Fundamentos: De facto: As Instâncias julgaram provados os seguintes factos: 1. Em 9 de Agosto de 2010, o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula …-HD-… estava registado a favor da Autora (alínea a)); 2. Pela apólice n.º …, a Ré “Seguros BB, S.A.” declarou, perante a Autora, assumir o pagamento das indemnizações resultantes da circulação da viatura aludida na alínea a) dos factos assentes, mais declarando “(…) Veículo Seguro (…) Ano/Mês da Matrícula: 2006/10 (…) Capital Seguro do Veículo € 36.933,75 Capital Seguro nos Extras: € 3.066,26 (…) COBERTURAS CAPITAIS FRANQUIAS Choque, Colisão e Capotamento € 40.000,01 (…) € 0,00 (…) Indemnização Extra Opção Max Conforme definido nas respectivas condições (…) Tabela de Desvalorização Para efeitos do disposto no Decreto-Lei n.º 214/1997 de 15 de Agosto, informa-se que o veículo Seguro atrás indicado se encontra sujeito à seguinte tabela de desvalorização “(…) Mês 1º Ano 3º Ano (…) (…) 2 (…) 3,00 27,80% (…) VMP (…) 91,80% 94,80% (…)...

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